05.04.2006 - Araticum,
baru, jatobá, pequi são nomes
de frutos do Cerrado bastante conhecidos da
comunidade Vereda I Norte, no município
de São João D´Aliança,
próximo ao Parque Nacional da Chapada
dos Veadeiros, ao norte de Goiás. A
novidade vivenciada no sábado 25 de
março foi descobrir maneiras de saborear
as delícias do Cerrado em inusitadas
receitas preparadas por 25 pessoas que participaram
da Oficina de Aproveitamento de Frutos do
Cerrado. O curso foi organizado pelo WWF-Brasil,
por meio do Projeto de Educação
Ambiental na Gestão e Conservação
dos Recursos Hídricos da Bacia do Alto
Tocantins.
Mas o que os frutos do Cerrado tem a ver com
a conservação dos recursos hídricos?
Considerando que a educação
é um processo e a educação
ambiental uma necessidade constante para a
mudança de hábitos, a idéia
do projeto é aproveitar momentos de
capacitação associando temas
relacionados à conservação
do bioma como um todo. Segundo o coordenador
do escritório regional do WWF-Brasil
na Chapada dos Veadeiros, Marco Aurélio
Rodrigues, a linha mestra das oficinas é
trabalhar o cuidado e a proteção
das nascentes e cursos d´água,
a preservação da flora nativa
e o aproveitamento dos frutos para a melhoria
da alimentação da família.
O aproveitamento dos frutos também
pode ser uma alternativa de renda para populações
carentes.
Caçula da turma,
Ester de nove anos ajudou no preparo das diversas
receitas (Foto: WWF-Brasil / Denise Oliveira).
As ações do projeto são
realizadas desde 2002 e abrangem as sub-bacias
do Cocal (município São Gabriel)
e Brancas e Tocantinzinho (município
São João da Aliança).
Capacitar agentes ambientais e professores,
recuperar nascentes, analisar e monitorar
a qualidade da água, fazer plantios
de espécies da flora local e oferecer
orientações sobre boas práticas
agrícolas são apenas algumas
das muitas atividades realizadas na região
com a participação das comunidades
que solicitam as atividades.
O curso
A “cabana da D. Maria” foi o espaço
ideal para abrigar as 25 pessoas da comunidade
Vereda, agentes ambientais do município
de São Gabriel e da comunidade Bandeira,
além de técnicos do WWF-Brasil.
Outra Maria, dessa vez Maria Aparecida da
Silva, ministrou a oficina a partir de suas
vivências e pesquisas com a flora do
cerrado. De acordo com Maria Aparecida, os
turistas que visitam a Chapada dos Veadeiros
querem conhecer as tradições
locais, experimentar e conhecer novos sabores.
“Há espaço para novos produtos
com as características locais, mas
é preciso formar pessoal e aumentar
a oferta de produtos”, afirma.
Maria Aparecida começa a oficina falando
sobre as características dos frutos
do Cerrado, a coleta, os cuidados com as árvores,
e prossegue com comentários sobre os
prejuízos acarretados pelos desmatamentos.
Várias plantas e animais do Cerrado
aparecem na lista de espécies ameaçadas
de extinção do Ibama. É
uma aula de valorização do bioma,
que é complementada pelas informações
repassadas pela consultora do WWF-Brasil,
Marília Fonseca, sobre os recursos
hídricos.
O amor ao Cerrado e o princípio culinário
da experimentação levaram Maria
Aparecida a desenvolver e colecionar um grande
número de receitas utilizando-se da
substituição de ingredientes
tradicionais pelos sabores inigualáveis
dos frutos nativos. O pequi (Caryocar brasiliense
Camb.), por exemplo, tradicional iguaria da
culinária goiana ganhou nova apresentação
em pratos tradicionais, como a farofa, e em
outros inusitados, como a bebida doce chamada
“chocolate de pequi”. A farinha do jatobá
(Hymenaea stigonocarpa) foi utilizada no preparo
de biscoitos e bolos. Já o baru (Dipteryx
alata Vog), cuja árvore alcança
até 15 metros, foi moído e usado
no preparo de pães e também
como tira-gosto. A semente de baru tem gosto
semelhante a do amendoim e pode ser consumida
natural ou torrada. Com o araticum (Annona
crassiflora Mart.), também conhecido
como pinha-do-cerrado, bolachas e pães
surgiram à mesa.
O resultado da oficina foi
uma farta degustação de sabores
e riquezas do cerrado (Foto: WWF-Brasil /
Denise Oliveira).
Para a “Turma do Baru”, formada por Ramon,
Diego, Deijari e Eliseu, a novidade foi além
da utilização desse fruto do
cerrado. Era a primeira vez que os quatro
rapazes se lançavam aos desafios da
cozinha. “Estamos acostumados com o trabalho
na lavoura de feijão ou em serviços
nas fazendas vizinhas. Esta é a minha
primeira experiência na cozinha”, afirmou
Deijari. Na avaliação de Ramon,
a atividade estava divertida. “Agora temos
de ver se fica bom no final”, disse, enquanto
concentrava-se nas medidas dos ingredientes
do pão de baru.
Josias, Lia, Roselisse, Moisés e Marta
dedicaram-se ao jatobá. A massa de
biscoito, feita à base de farinha,
rendeu bem e mais de cinco bandejas de sequilhos
foram preparadas para orgulho da equipe. Juntaram-se
à “Turma do Araticum”, as agentes ambientais
Suzana Neves Vieira, 24 anos, do município
de São Gabriel de Goiás, e Ana
Carolina Viana do Nascimento, da comunidade
Bandeira. Suzana realiza trabalhos de educação
ambiental na Escola Cecília Meirelles,
no seu município. “Aprendi muita coisa
sobre os frutos do cerrado. Será muito
proveitoso repassar as informações
para os alunos da escola e também fazer
uma oficina prática como essa”, comentou.
Já Ana Carolina, 25 anos, que realizou
o curso de educação ambiental
a convite do WWF-Brasil, o aproveitamento
do frutos do cerrado em receitas foi uma novidade.
“A gente costuma comer o araticum ao natural.
É muito gostoso. Agora que aprendi
a fazer pães e bolos poderemos preparar
e oferecer no café da manhã
aos turistas que recebemos em nossa comunidade.
Além de ver a paisagem, eles poderão
conhecer sabores que desconhecem”, avaliou.
Parte do grupo de 25 pessoas
que integrou a oficina de aproveitamento de
frutos do Cerrado (Foto: WWF-Brasil / Denise
Oliveira)
Para a professora e coordenadora da escola,
Maria de Fátima Nunes Silveira do Amaral,
que há oito anos mora na comunidade,
a iniciativa das diversas oficinas do Projeto
de Educação Ambiental na Gestão
e Conservação dos Recursos Hídricos
da Bacia do Alto Tocantins é muito
importante para despertar nos jovens a responsabilidade
ambiental, além de ampliar o conhecimento
sobre temas às vezes esquecidos. “Nossa
comunidade rural é muito unida. Esses
encontros são como portas que se abrem.
Com o conhecimento, valorizamos mais nosso
ambiente e vislumbramos novas oportunidades”,
concluiu.