Há ainda sólidas evidências
de que o acidente causou sérios impactos
na saúde de milhões de pessoas.
Além dos efeitos diretos causados pela
radioatividade, houve uma série de
danos ocasionados pela crise econômica
e social provocada pela perda de área
agrícola, remoção forçada
de 300 mil pessoas, além da falta de
informação e fatores políticos.
Essas conclusões se opõem de
forma drástica às declarações
feitas pela AIEA no ano passado. A agência
não especificou em seu relatório
que os 4 mil casos fatais referiam-se apenas
a um grupo específico (e relativamente
pequeno) de 600 mil pessoas, entre a população
removida e os que trabalharam na 'limpeza'
das áreas contaminadas (conhecidos
como liquidatários). Na verdade, calcula-se
que 2 bilhões de pessoas foram submetidas
à radiação liberada pelo
acidente.
Os dados da AIEA escondem a verdadeira dimensão
de Chernobyl e não levam em consideração
outras doenças que não o câncer,
além de tentar explicar muitas das
doenças como 'radiofobia', sem considerar
evidências médicas claras de
que a exposição da glândula
tireóide à radiação
causa distúrbios psicológicos.
"É assustador que a AIEA tente
atenuar os impactos do acidente nuclear mais
grave de toda a História", disse
Guilherme Leonardi, coordenador da campanha
de energia do Greenpeace Brasil. "Negar
os danos de Chernobyl pode ter graves conseqüências,
como o repovoamento de áreas ainda
contaminadas. A AIEA não pode continuar
com seu papel de fiscalizador internacional
da energia nuclear se não consegue
nem admitir as mortes que o acidente de Chernobyl
causou”, concluiu.
No Brasil, a Comissão Nacional de
Energia Nuclear (CNEN), assim como a Agência
Internacional, acumula as funções
de estimular a energia nuclear e fiscalizar
a segurança da sua utilização.
Essa perigosa contradição foi
um dos problemas apontados pelo relatório
sobre segurança nuclear da Comissão
de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados,
aprovado por unanimidade em 21 de março
deste ano. O grave acidente do Césio-137
em Goiânia em 1988 mostrou deficiências
na área de segurança nuclear
que persistem até hoje, conforme concluiu
a Câmara dos Deputados.
Enquanto o governo federal ainda insiste
na discussão da expansão do
Programa Nuclear Brasileiro, principalmente
com a construção de Angra 3,
o Greenpeace luta pelo abandono total dessa
energia, que é cara, perigosa, suja
e gera um problema com o lixo nuclear que
até hoje não tem solução.
Essa tecnologia obsoleta deve ser substituída
por fontes modernas de energias renováveis,
seguras e limpas, para as quais o país
possui imenso potencial.
Leia as principais conclusões
do relatório:
• A incidência de câncer aumentou
bruscamente em Belarus, Ucrânia e Rússia.
Entre 11000 e 2000 houve um aumento de 40%
em todos os cânceres na Bielorússia
e um aumento de 52% na região de Gomel.
Na Ucrânia, houve um aumento de 12%
e, na região de Zhytomir, a morbidade
aumentou quase três vezes. Na região
russa de Bryansk, a incidência de câncer
cresceu 2,7 vezes.
• Somente em Belarus, cerca de 7 mil cânceres
de tireóide a mais foram identificados
até 2004. Um recente estudo mostrou
que a doença em crianças aumentou
88,5 vezes, em adolescentes, 12,9 vezes e,
em adultos, 4,6 vezes. Estima-se que, em Belarus,
entre 14 mil e 31,4 mil cânceres adicionais
de tireóide aconteçam em 70
anos.
• Para a Ucrânia, cerca de 24 mil cânceres
de tireóide são esperados, dos
quais 2.400 fatais.
• Esse aumento dramático de câncer
de tireóide não era esperado.
Após o acidente, aguardava-se apenas
um pequeno aumento. Esses casos de câncer
são extremamente agressivos. Com um
pequeno período de latência e
uma proliferação para além
da tireóide em quase 50% dos pacientes,
forçam cirurgiões a conduzirem
repetidas operações para remover
metástases residuais.
• A leucemia começou a aumentar significativamente
na maioria das populações expostas
cerca de 5 anos após o acidente. Estima-se
que a população de Belarus poderá
sofrer 2.800 casos adicionais de leucemia
entre 1986 e 2056, sendo mais de 1.880 fatais.
• Foi observado um aumento significativo de
cânceres de intestino, reto, mama, vesícula
biliar, rim, pulmão e outros. Entre
1987 e 1999, cerca de 26 mil casos de câncer
induzido por radiação foram
registrados em Belarus, dos quais 18,7% de
câncer de pele, 10,5% de câncer
de pulmão e 9,5% de câncer de
estômago.
• Enfermidades nos sistemas de circulação
sangüínea e linfática aumentaram
na Ucrânia, Bielorússia e Rússia.
Em Belarus, doenças no sistema circulatório
sangüíneo aumentaram 5,5 vezes
dez anos após o acidente. Na Ucrânia,
doenças sangüíneas e circulatórias
sangüíneas aumentaram por um fator
de 10,8 a 15,4 entre aqueles que viviam em
áreas contaminadas.
• Impactos da radiação no sistema
reprodutivo: a acumulação de
radionuclídeos no sangue feminino levou
a um aumento na produção do
hormônio masculino testosterona, causando
a expressão de características
masculinas. De outro lado, a impotência
se tornou mais comum em homens de 15-30 anos
que vivem em regiões contaminadas pela
radiação. Crianças de
territórios poluídos sofreram
retardamento do desenvolvimento sexual. Mães
sofreram de ocorrência tardia e distúrbios
de menstruação e problemas ginecológicos
mais freqüentes, anemia durante e após
a gravidez, anomalias durante o trabalho de
parto e parto prematuro.
• O acidente de Chernobyl destruiu sociedades
inteiras em Belarus, Ucrânia e Rússia.
Uma complexa interação entre
fatores provocou a realocação
de pessoas, perdas de territórios agrícolas
e contaminação de alimentos,
crise econômica, gastos de reparos,
problemas políticos, uma deficitária
força de trabalho etc. Surgiu uma crise
sócio-econômica generalizada.