27/04/2006
- Brasília – Dois especialistas contestam
conclusões do relatório dos
fiscais agropecuários que investigaram
a ocorrência de uma pulverização
com agrotóxicos na área urbana
e em pequenas propriedades de Lucas do Rio
Verde, no Mato Grosso. Os técnicos
concluíram que o que aconteceu foi
uma "deriva", ou seja, "o deslocamento
não intencional de produto químico
após a sua emissão". Isso
aconteceria por condições climáticas
(ventos fortes e inversão térmica).
Para James Cabral, engenheiro
agrônomo do Fórum Matogrossensse
de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad),
o documento do Ministério da Agricultura
em Cuiabá é "bastante ingênuo".
"Tem uma carga de irresponsabilidade
muito grande. O que a gente constatou é
que uma enorme diversidade de plantas foi
atingida e que apresentavam o mesmo sintoma",
diz em entrevista à Agência Brasil.
O documento foi elaborado pelos fiscais agropecuários
Márcia Albuquerque e Antonio Hideu
Inoue, nove dias após o ocorrido.
O engenheiro James Cabral
esteve na cidade sete dias após o fato,
a pedido do Departamento de Saúde Coletiva
da Universidade Federal de Mato Grosso. Em
companhia do doutor Wanderley Antonio Pignati,
eles fotografaram e coletaram amostras das
plantas atingidas, entrevistaram autoridades
municipais, chacareiros e moradores e encaminharam
ao Ministério Público local
a denúncia para que fosse instaurado
inquérito civil. Eles também
elaboraram a notificação, com
detalhes do que observaram na cidade, encaminhada
às autoridades sanitárias do
estado e do governo federal.
O professor César
Koppe Grisólia, do Departamento de
Genética e Morfologia da Universidade
de Brasília (UnB), autor do livro Agrotóxicos:
mutações, câncer e reprodução,
explica que a investigação precisa
de técnicas capazes que fazer um mecanismo
de prova e contra-prova. "É responsabilidade
do Ministério da Agricultura fazer
a coleta de amostras dentro das normas técnicas.
Devem ser coletadas no mínimo três
amostras em frascos separados e armazenadas
em locais diferentes para possibilitar prova
e contra-prova. Elas devem ser mantidas sob
refrigeração constante e devem
ser coletadas logo após a contaminação.
Alguns agrotóxicos desaparecem rapidamente",
explica.
Após o contato dos
agrotóxicos com a luz ou calor, os
princípios ativos do produto mudam,
segundo o professor. "No caso de não
haver vestígios dos agrotóxicos
no prazo, pode-se pesquisar os seus metabólitos,
que são resíduos deixados pelos
agrotóxicos, produto da sua degradação",
diz.
Para o engenheiro James
Cabral, a citação do relatório
de que não houve "injúrias"
em gramíneas não é verdade.
"O que mais descarta essa possibilidade
de doença é que nos verificamos
in loco que foram atingidas mais de 40 espécies
de diferentes tipos de plantas. Foram atingidas
plantas agrícolas, plantas cítricas,
plantas ornamentais, plantas fitoterápicas,
plantas hortícolas e plantas florestais
todas com a mesma sintomatologia. É
muito questionável qualquer documento
que apresente uma versão que isso é
um problema fitopatológico", contesta.
Com relação
ao "exame laboratorial", citado
pelos fiscais federais agropecuários
do Ministério da Agricultura em Cuiabá,
o professor da Universidade de Brasília
César Koppe também diz que não
funcionam para detectar o objeto da investigação.
"Exames fitossanitários servem
para pesquisar fungos e outras doenças,
são exames totalmente diferentes. Não
tem validade em questões jurídicas
para se provar que se cometeu um crime. Os
exames têm que ser específicos
para resíduos de agrotóxicos."
A Agência Brasil procurou
a fiscal agropecuária Márcia
Albuquerque para comentar as críticas
sobre o relatório de Lucas do Rio Verde,
mas ela não quis comentar o assunto,
alegando que o documento era conclusivo.