09/06/2006 - Pequeno
município com menos de 20 mil habitantes
localizado na Bacia do rio Xingu, no norte
do Mato Grosso, está se mobilizando
para defender o meio ambiente e planejar o
futuro em meio a maior crise econômica
de sua história. A cidade também
criou o projeto Adote uma nascente - que envolve
proprietários rurais, técnicos
e estudantes na recuperação
de áreas degradadas - e criou um parque
municipal com pouco dinheiro, muito trabalho
e ajuda dos alunos.
Um pequeno município
com menos de 20 mil habitantes localizado
na Bacia do rio Xingu, no norte do Mato Grosso,
está se mobilizando para defender o
meio ambiente e planejar o futuro em meio
a maior crise econômica de sua história.
A prefeitura de Marcelândia, cerca de
670 quilômetros ao norte de Cuiabá,
elaborou um ambicioso plano que pretende conciliar
conservação ambiental, desenvolvimento
econômico e ordenamento territorial.
Trata-se do projeto Fortalecimento do Planejamento,
Ordenamento e Gestão Territorial e
Ambiental de Marcelândia.
A iniciativa prevê
a implantação de um sistema
eletrônico de informações
territoriais, a elaboração de
um Plano Diretor, do Zoneamento Ecológico-Econômico
(ZEE) e de um programa de desenvolvimento
sustentável municipais. A intenção
é traçar cenários sócio-econômicos,
para um período de 10 anos, e planejar
a expansão da sede urbana do município
e de algumas obras de infra-estrutura, identificar
e viabilizar alternativas econômicas
sustentáveis e criar Unidades de Conservação,
entre outros objetivos. A campanha ´Y
Ikatu Xingu, que pretende proteger e recuperar
as nascentes e as matas ciliares do rio Xingu
no Mato Grosso, também está
entre os parceiros do projeto.
“O município tem
20 anos e nunca tivemos nenhum planejamento.
O carro-chefe de nossa economia sempre foi
a indústria madeireira, mas nunca ninguém
se preocupou com a sustentabilidade”, afirma
Sirleni Juliani, secretária de Planejamento
de Marcelândia e coordenadora do projeto.
Ela conta que já foram organizadas
seis reuniões para informar e sensibilizar
diversas comunidades sobre o assunto e que
serão realizadas ainda várias
consultas comunitárias. Os eventos
também vão servir como subsídio
para a elaboração de um diagnóstico
sócio-econômico participativo.
Sirleni estima que mais
de 70% das 70 madeireiras instaladas na região
fecharam as portas, o restante opera com capacidade
ociosa e o desemprego subiu a níveis
alarmantes depois da suspensão dos
planos de manejo florestal ocorrida por conta
das Operações Curupira I e II,
promovidas pelo Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) e pela Polícia Federal (PF),
no Mato Grosso, no ano passado. Dezenas de
pessoas, incluindo funcionários do
próprio Ibama e da Fundação
Estadual do Meio Ambiente (Fema), foram presas
acusadas de participar de uma quadrilha de
exploração ilegal de madeira.
“Nosso município já estava em
um momento de transição, com
a agricultura familiar começando a
despontar como alternativa econômica,
mas as operações do Ibama não
nos deram tempo de planejar melhor a mudança.
Agora sim vamos planejar nosso futuro”, acredita
a secretária.
Mas os esforços de
Marcelândia em defesa de um futuro sustentável
não se resumem a ações
de planejamento. Uma parte significativa dos
mananciais localizados no município
apresenta pontos com assoreamento e degradação
das matas ciliares (vegetação
que margeia e protege os corpos de água).
De seus 1,4 mil quilômetros de matas
de beira de rio, quase 10% estão desmatados.
Por causa disso, a prefeitura deu início,
em maio, ao projeto Adote uma Nascente, que
vai envolver proprietários rurais,
técnicos e estudantes, de oito a 15
anos, de oito escolas públicas e particulares
do município.
Uma turma de cada uma das
escolas foi escolhida pelo projeto e ficou
responsável por realizar, com a ajuda
dos professores, um levantamento sobre o problema
das nascentes. Depois disso, técnicos
da prefeitura visitaram os estudantes para
apresentar vídeos, projeções
e slides e municiá-los com publicações,
apostilas e bibliografia sobre o assunto.
A partir daí, as crianças e
adolescentes produziram pesquisas, relatórios,
redações e desenhos sobre meio
ambiente e temas correlatos, como desmatamento,
saneamento básico e doenças
transmissíveis. Também foram
produzidos peças de teatro, jograis
e espetáculos de dança. Os trabalhos
foram apresentados durante a semana do Meio
Ambiente (5 a 9 de junho) e o I Simpósio
de Preservação dos Mananciais
de Marcelândia, que ocorreu na quinta-feira,
dia 8 de junho.
Ainda durante o evento,
oito proprietários de áreas
com nascentes degradadas, também previamente
escolhidos pelo projeto, assinaram um termo
de cooperação que vai permitir
as visitas de campo dos alunos, de julho a
dezembro, e pelo qual se comprometeram a adotar
suas orientações. Acompanhados
de seus professores, de técnicos da
prefeitura e da Empresa Mato-grossense de
Pesquisa, Assistência e Extensão
Rural (Empaer), os alunos vão fazer
um diagnóstico e levantar alternativas
para a recuperação de cada uma
das oito áreas. A partir daí,
os proprietários vão cercá-las
e reflorestá-las. O viveiro municipal
vai doar mudas de espécies nativas
para o trabalho.
Os alunos de Marcelândia
já haviam participado de outro projeto
ambiental. Bem no centro da cidade, havia
um matagal com três nascentes que servia,
na prática, como depósito de
entulho, incluindo restos de construção
civil e animais mortos. Contaminadas por resíduos
de oficinas mecânicas próximas,
as nascentes chegaram a ser represadas para
a instalação de um parque, mas
a iniciativa não foi à frente.
O atual secretário
municipal de Meio Ambiente, Emerson Geraldo
da Silva, resolveu arregaçar as mangas
para tentar resolver o problema mesmo sabendo
que a prefeitura estava em uma difícil
situação financeira, praticamente
sem dinheiro para realizar a obra. Com pouco
mais de R$ 80 mil, muito trabalho de alguns
poucos funcionários da prefeitura e
a ajuda dos estudantes, nasceu o Parque Municipal
dos Buritis.
As ruas ao redor da área,
com pouco mais de 2,5 hectares, foram aterradas
e também foram instaladas algumas canaletas
para tentar controlar a erosão no local.
O mato foi roçado e as nascentes foram
protegidas. A prefeitura construiu passeios
e uma ponte sobre o canal da represa. Depois
disso, os alunos retiraram o lixo do local
e auxiliaram o plantio de mais seis mil mudas
de espécies nativas e também
frutíferas. O parque vem sendo freqüentado
para caminhadas e transformou-se num ponto
de encontro de Marcelândia.