125/06/2006
- Brasília - A transposição
de águas do Rio São Francisco
para as bacias do Nordeste setentrional terá
grande impacto biológico e por isso
não deveria ser realizada. A opinião
é do professor e pesquisador da Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG) Alexandre Godinho.
Ele prevê efeitos
graves para as bacias que vão receber
volume extra de água e diz que talvez
existam técnicas mais propícias
para fornecer água aos moradores do
Nordeste. O estudioso comentou para a Agência
Brasil a carta elaborada na semana passada
pelos participantes do 1º Encontro de
Pescadores e Pescadoras da Bacia do São
Francisco.
O texto afirma que a situação
dos estoques pesqueiros da região é
precária e pede a suspensão
do projeto do governo federal, bem como da
construção de novas barragens,
argumentando que eles poderiam acelerar o
processo de degradação.
Godinho lembra que a bacia
é explorada há séculos
e enfrenta, entre outros problemas, poluição,
represamentos, pesca intensiva e desmatamento,
acrescentando que a insuficiência de
chuvas ao longo de mais de uma década
contribuiu para a escassez de pescado.
Com relação
à transposição, ele diz
que na Bacia do São Francisco os impactos
devem ser relativamente pequenos, especialmente
porque uma parte da água seria retirada
da Represa de Itaparica. No trecho de retirada
a montante (acima) do reservatório,
prevê impacto um pouco maior.
Já nas bacias receptoras
(Apodi-Mossoró, Jaguaribe, Paraíba,
Piranhas-Açu), alerta Godinho, muitas
espécies do São Francisco seriam
introduzidas. "Aí o impacto pode
ser muito expressivo", comenta. Ele aponta
como ainda mais preocupante a idéia
de uma transposição compensatória
das bacias do Tocantins e do Paraná
para a do São Francisco, que não
está no projeto atual.
A introdução
de espécies pode causar graves baixas
entre populações de animais
ou plantas de um lugar. Muitas vezes, os invasores
competem com as espécies naturais dali,
alimentam-se delas ou lhes transmitem doenças.
Alexandre Godinho diz que
a baixa quantidade de peixes, relatada pelos
pescadores, entre a Represa de Três
Marias e a Represa de Sobradinho muito provavelmente
se deve à falta de chuva durante a
década de 90 e o início da de
2000.
"Se um rio não
tem cheia, a tendência natural é
a queda da produção pesqueira",
afirma. O professor diz que a recuperação
já está em curso com as chuvas
dos últimos dois anos e recomenda,
para acelerar o processo, a liberação
parcial do volume de represas durante a cheia
para a suplementação de águas.
Lembra, porém, que a técnica
esbarra nos interesses das empresas de energia
e na instalação de pessoas nas
várzeas, durante a seca.
O professor defende
também uma melhor regulamentação
na atividade pesqueira, com base no conhecimento
científico: "A gente precisa saber
quantos pescadores o rio suporta". Ele
participa de um levantamento, conduzido pelo
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama),
que visa à definição
de alvos e metas para conservação
da biodiversidade da região.
Pedro Biondi* / *Colaboraram Cecília
Jorge e Isabela Vieira