29/06/2006
- Por decisão majoritária, Supremo
Tribunal Federal se considerou competente
para julgar todas as ações que
questionem a demarcação da terra
indígena em Roraima, o que pode estancar
a recente onda de concessão de liminares
que impede a finalização do
trabalho de desintrusão de fazendeiros
Foram julgadas ontem (28/06)
no Supremo Tribunal Federal – STF duas ações
judiciais (Reclamações nº.
3331 e nº. 3813) que pedem que todos
os processos relativos à demarcação
da Terra Indígena Raposa Serra do Sol,
em Roraima, sejam por ele analisados. Por
dez votos a um, os ministros do tribunal decidiram
ser de sua competência o processamento
e julgamento de diversas ações
que questionavam a validade da Portaria nº.
534, do Ministro da Justiça, que estabelece
os limites da área indígena.
Desde 2004, deputados e
fazendeiros da região vêm questionando
o processo demarcatório da terra indígena
junto ao STF, o que atrasou a conclusão
do processo administrativo. O mesmo acontece,
há mais tempo, na Justiça Federal
de Roraima, na qual já foram ajuizadas
diversas ações pedindo a nulidade
da demarcação da área,
sob o argumento de que isso estaria lesando
o patrimônio público estadual,
já que supostamente se estaria reduzindo
substancialmente a área do Estado de
Roraima. No começo do ano passado,
no entanto, o STF julgou improcedente todas
essas ações, abrindo caminho
para que o processo administrativo de demarcação
fosse finalizado .
Apesar disso, desde o ano
passado a Justiça Federal em Roraima
vem proferindo liminares em diversas ações
possessórias interpostas por fazendeiros
locais, que não aceitam a demarcação
da TI e se recusam a sair da área,
mesmo com o pagamento das benfeitorias pela
Fundação Nacional do Índio
(Funai). Essas liminares vêm atrasando
a finalização do processo de
regularização fundiária
da área e expulsando indígenas
de aldeias que estão dentro dos limites
da terra indígena. Em todas as suas
decisões o juiz argumenta que o processo
administrativo de demarcação
é inválido, baseado exclusivamente
nas conclusões de um laudo pericial
que, além de haver sido apresentado
em um processo já julgado extinto,
ainda apresenta graves falhas de metodologia
e de conteúdo, como ficou demonstrado
em análise efetuada por técnicos
do Ministério Público Federal.
O relator das duas ações
em curso no STF, ministro Carlos Ayres Britto,
entendeu ser de competência daquela
corte julgar todas as ações
possessórias que tenham como objeto
disputa por terras inseridas dentro dos limites
da TI Raposa-Serra do Sol. Esse posicionamento,
aliás, havia sido exposto no julgamento
de outras ações parecidas, o
que apenas confirma a coerência da decisão
de ontem. O único ministro a divergir
dessa posição foi Marco Aurélio
Mello que entende ser de competência
dos juízes de primeiro grau julgar
ações possessórias, mesmo
que incidam dentro de terra indígena
homologada.
Espera-se agora, que a decisão
do STF seja respeitada, e que todas as ações
sejam realmente julgadas de maneira uniforme
pelo tribunal. A decisão, vai contrariar
o Juiz Helder Girão Barreto, da 1ª
Vara Federal de Boa Vista, que em várias
ações possessórias interpostas
por fazendeiros deferiu medidas liminares
quase idênticas, nas quais alega ser
de competência da Justiça Federal
de primeira instância o julgamento de
tais casos, apesar de decisão anterior
do STF determinando o contrário. Segundo
seu magistério, "nunca, jamais,
em tempo algum da história constitucional
republicana esta matéria (disputa sobre
direitos indígenas) foi de competência
originária do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,
como penso haver demonstrado em trabalho acadêmico"
(Decisão Liminar no Processo nº
2006.42.00.000098-7 e no Processo nº
2006.42.00.000737-0, ambos em curso na 1ª
Vara Federal da Seção Judiciária
de Roraima).
O processo de desintrusão,
realizado pela Funai e pelo Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária
(Incra), é a última etapa do
procedimento demarcatório. Leia mais.
No caso da Raposa-Serra do Sol, está
longe de terminar, apesar do esforço
concentrado de ambas as instituições.
Há ainda várias liminares da
Justiça Federal de Roraima que impedem
a continuidade do trabalho. Com a decisão
de ontem, esses processos serão julgados
pelo STF, que deverá avaliar se há
fundamento para mantê-las ou não.
Raul Silva Telles e Carolina Pinheiro.