Desde 2003, os países da UE não
podem mais depositar pneus inteiros nos aterros
sanitários e, agora, não podem
mais depositar nem pneus picados. A partir
de dezembro deste ano, a legislação
determina que os europeus deverão reutilizar
e revalorizar 85% do peso de cada veículo
(e nesse percentual incluem-se os pneus).
Em 2008, a lei torna-se ainda mais restritiva
para a emissão de gases na atmosfera,
o que vai interferir na queima de pneus como
combustível em fornos de cimenteiras
ou fábricas de papel.
A UE se opõe explicitamente ao despejo
do ônus dos resíduos de pneus
sobre seus países-membros mais pobres,
porém, adotou como instrumento de gestão
de resíduos a exportação
de resíduos de pneus para países
não-membros. Em janeiro, a União
Européia contestou a posição
do Brasil em relação aos pneus
reformados na OMC. Entre os dias 5 e 7 de
julho, acontece em Genebra, Suíça,
a primeira reunião da OMC para tratar
do assunto. O Brasil apresentou sua primeira
petição no dia 8 de junho e
sua tradução está disponível
no endereço eletrônico
http://www.mre.gov.br/portugues/ministerio/sitios_secretaria/cgc/pneus_primeira_peticao.doc,
enquanto que a UE preferiu manter sigilo sobre
seus argumentos.
A delegação brasileira que
vai a Genebra defender a proibição
da importação de pneus reformados
terá representantes dos ministérios
de Relações Exteriores, da Saúde,
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior, do Meio Ambiente, do Ibama e da
Casa Civil. A defesa do país estará
baseada em aspectos ambientais e de saúde
pública, conforme decisão da
Câmara de Comércio Exterior (Camex).
A defesa do Brasil sustenta que o resíduo
de pneu é um problema crescente e grave
de saúde pública, particularmente
em países de climas tropicais, já
que empilhados servem de criadouros para mosquitos
transmissores de dengue, febre amarela e malária.
A queima desse resíduo também
cria uma ameaça perigosa. Ela libera
óleo pirolítico, que contém
produtos químicos tóxicos e
metais pesados capazes de produzir efeitos
adversos à saúde, como perda
de memória, deficiência no aprendizado,
supressão do sistema imunológico,
danos nos rins e fígado. Esse óleo
pode viajar longas distâncias, contaminando
solo e água, além de penetrar
em lençóis freáticos.
Estudos demonstram que a poluição
de águas causada pelo escorrimento
derivado da queima de pneus pode durar até
100 anos.
A queima do pneu emite ainda fumaça
tóxica e pode representar riscos de
mortalidade prematura, deterioração
das funções pulmonares, problemas
do coração, depressão
do sistema nervoso e central. A céu
aberto, ela é 13.000 vezes mais mutagênica
que a queima de carvão em instalações
bem desenhadas e operadas apropriadamente.
E a incidência de incêndios de
pneus é comum. Só em Minas Gerais
foram registrados 338 incêndios de pneus
desde 2000, no Distrito Federal foram 64 desde
2002 e o Paraná registrou 63 somente
em 2005.
Os motivos de o Brasil manter a proibição
da importação desse resíduo
são vários. Como os próprios
países da UE defendem internamente,
o armazenamento de pneus em aterros não
é seguro do ponto de vista ambiental:
"eles tendem a voltar à superfície
e quebrar as coberturas das camadas, prejudicando
o assentamento da terra no longo prazo e a
sua reabilitação". Os europeus
ainda se preocupam com os pneus porque eles
"podem lixiviar substâncias químicas
orgânicas potencialmente prejudiciais"
e porque o aço dentro deles "pode
danificar as camadas da geomembrana".
Utilizados como combustível em fornos
de cimenteiras, em função do
alto conteúdo energético, os
pneus não deixam de emitir poluentes
para atmosfera na incineração.
A diferença da queima a céu
aberto é a presença de controles
de emissões, que reduzem, mas não
eliminam o volume de poluentes. A reciclagem
também é difícil por
não ser possível obter materiais,
a partir do pneu, com propriedades similares
às dos materiais originais usados na
sua produção. O custo para o
corte, a trituração e a granulação
é alto. Além disso, o uso de
grânulos finos no asfalto ainda não
teve o impacto ambiental totalmente avaliado.
A Europa utiliza apenas 1% de seus grânulos
de borracha para a superfície de estradas.
Há ainda outros usos dos resíduos
de pneus, como a fabricação
de solas de sapatos e de campos de golfe indoor,
mas inda permanecem em caráter experimental.
O controle sobre o tratamento dos resíduos
de pneus também é muito complexo.
Em 2005, oito empresas fabricantes foram multadas
pelo Ibama por não darem destinação
final ambientalmente adequada aos pneus chamados
inservíveis (que não podem mais
ser reformados), conforme Resolução
258/99 do Conselho Nacional do Meio Ambiente
(Conama), referente ao ano de 2004. O valor
total das multas chegou a R$ 20.543.895,00.
A Pirelli Pneus S/A e a Goodyear do Brasil
Produtos de Borracha Ltda. foram as duas empresas
que pagaram multas mais altas: R$ 6,5 milhões
e R$ 6 milhões, respectivamente.
Por não cumprimento da mesma resolução,
o Ibama também multou importadores,
que valendo-se de liminares judiciais, trazem
pneus usados para o país como matéria-prima.
O Ibama multou também empresas que
faziam a venda direta de pneus usados importados
(meia vida), o que é ilegal. Entre
2003 e 2005, cinco importadoras foram multadas
em R$ 4.880.592. A BS Colway Pneus Ltda foi
responsável pelo maior volume de pneus
não destinados devidamente nesse período.
Vários países mantêm,
como o Brasil, a proibição de
importação de pneus usados e
reformados. Argentina, Bangladesh, Bahrén,
Nigéria, Paquistão, Tailândia
e Venezuela proíbem a importação
desse resíduo. Marrocos, Macedônia,
São Vicente e Granadinas e Jordânia
exigem licença prévia para autorizar
esse tipo de importação. No
entanto, somente o Brasil é alvo de
contestação da UE na OMC.
A discussão sobre a importação
de pneus usados e reformados não se
dá apenas na esfera internacional.
O Brasil está debatendo o assunto internamente,
por meio do projeto de lei 203/91 que tramita
na Câmara dos Deputados. O projeto institui
a Política Nacional de Resíduos.
A votação do substitutivo do
projeto realizada no último dia 21
foi anulada pela Mesa Diretora da Câmara,
sob a alegação de que o relator,
deputado Feu Rosa (PP-ES), já havia
apresentado proposta sobre o mesmo assunto
na Casa.
O Ministério do Meio Ambiente contestou
o substitutivo, que liberava a importação
de resíduos como matéria-prima
ou insumo para as indústrias de reciclagem,
incluindo pneus usados e reformados. Se a
votação fosse mantida e o resultado
considerado válido, o Brasil poderia
abrir suas portas também para importar
de outros países lixos, como baterias
de automóveis esgotadas ou garrafas
PET. Diante da anulação da votação,
um novo relator será nomeado para apresentar
seu substitutivo ao projeto.