10/08/2006
- Em nota pública lançada ontem,
dia 9 de agosto, a Coordenação
das Organizações Indígenas
da Amazônia Brasileira (Coiab) pede
saída imediata do presidente da Funai,
Mércio Gomes, e exige do governo federal
a imediata instalação da Comissão
Nacional de Política Indigenista, que
deverá substituir a Funai como principal
articulador da política indigenista
no âmbito federal.
A Coordenação
das Organizações Indígenas
da Amazônia Brasileira, a maior organização
indígena brasileira, lançou
nota pública exigindo a imediata saída
de Mércio Gomes da presidência
da Fundação Nacional do Índio
(Funai). A organização alega
solidariedade às lideranças
indígenas do Xingu, que enxergam na
inoperância do órgão indigenista
uma das principais causas que permitiram a
construção de uma usina hidrelétrica
no rio Culuene (saiba mais), um dos afluentes
do rio Xingu, no norte do Mato Grosso.
A nota exige também
a imediata instalação da Comissão
Nacional de Política Indigenista (CNPI),
que já deveria haver sido instalada
pelo governo federal há quase dois
meses, mas que até o momento não
teve sequer seus integrantes oficialmente
nomeados. O colegiado, antiga reivindicação
do movimento indígena, deve ser o embrião
de uma novo órgão que terá
a missão de articular e organizar as
políticas federais voltadas aos povos
indígenas (saiba mais), função
que vem sendo exercida pela Funai.
Veja abaixo a íntegra
da nota.
Coiab exige exoneração
do Presidente da Funai, Mércio Gomes,
aderindo reivindicações dos
povos indígenas do Xingu e de outras
regiões da Amazônia
A Coordenação
das Organizações Indígenas
da Amazônia Brasileira (COIAB), como
instância máxima de articulação
do movimento indígena nesta região,
vem por meio desta nota pública manifestar
o seu apoio e solidariedade aos povos e organizações
indígenas do Xingu, que há alguns
meses vêm se posicionando e mobilizando
contra a implantação de empreendimentos
hidrelétricos que impactarão
de forma irreversível as suas terras,
ameaçando de morte o Rio Xingu e afluentes,
os peixes e outras formas de vida, enfim,
os recursos naturais e da biodiversidade que
compõem o bioma local, e exigindo pela
inoperância da Funai e pela prática
antiindígena de seu Presidente, a exoneração
do antropólogo Mércio Pereira
Gomes.
A indignação
pela gestão adversa aos interesses
indígenas do Senhor Mércio Gomes,
fica evidente quando caciques, lideranças
e organizações indígenas
de diferentes regiões da Amazônia
se posicionam publicamente apoiando as demandas
do movimento indígena do Xingu. Assim,
lideranças Kaiapó, presididos
pelo cacique Raoni, depois de impugnar a construção
da BR 163, Cuiabá-Santarém,
e de se queixar da falta de apoio da Funai,
afirmam e exigem: “Este presidente que está
na Funai não gosta de índio.
Nós não confiamos mais nesse
presidente. Ele só fala nos jornais
que índio tem muita terra. Pouco índio
para muita terra. Desde que ele falou isso,
perdemos a confiança nesse Mércio
Pereira Gomes. Ele vem comparando a terra
dos índios com as terras dos países
da Europa e alguns estados do Brasil. Para
nós está claro que ele quer
diminuir a terra dos índios. Presidente
(Lula) tirem logo este presidente da presidência
da Funai. Está na hora de um índio
assumir o comando da Funai”. Da mesma forma
a Organização dos Povos Indígenas
do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia
(OPIN) manifesta apoio ao movimento indígena
do Xingu, endossando o pedido de exoneração
imediata do Presidente da Funai, Mércio
Gomes, a nomeação de um índio
no cargo e a construção de uma
política indigenista que atenda as
necessidades e perspectivas dos povos indígenas.
O Conselho Indígena Tapajós
(CITA), também se diz revoltado com
a situação vivida pelos povos
indígenas e solidário com os
povos indígenas do Xingu que exigem
a retirada de Mércio Gomes da presidência
da Funai. “Pois se não atende a nós
indígenas quem ele atende? Se não
está a favor da causa indígena
está contra”, afirma o Cita. A Organização
Indígena de Tocantins (OIT) também
se manifesta a favor da reivindicação
do Movimento Indígena do Xingu, pedindo
a retirada imediata do presidente da Funai,
preferindo um índio à frente
do órgão indigenista. O Conselho
Indígena Mura (CIM), também
se solidariza e concorda com as reivindicações
dos povos indígenas do Xingu, uma vez
que a Funai não tem mesmo ajudado a
resolver os problemas dos povos indígenas.
A Coiab entende como justas
e adere o posicionamento de suas organizações
de base e exige do Governo Lula a exoneração
imediatamente do Senhor Mércio Gomes
do cargo de presidente da Funai, por ter sido
nos últimos anos, de fato um dos não
índios que mais trabalhou contra os
direitos indígenas mesmo presidindo
o órgão que tem por obrigação
zelar pela garantia dos direitos indígenas.
Em efeito, entre outros
feitos, Mércio Gomes é o principal
responsável pela paralisia das demarcações
das Terras Indígenas, chegando a declarar
publicamente, de forma deslavada, que está
na hora do Supremo Tribunal Federal (STF)
limitar o direito territorial dos povos indígenas,
que já teriam ou querem terra demais.
A serviço de um Ministro da Justiça
que não queria saber nada da questão
indígena, Mércio exerceu no
Governo Lula o papel de amortecedor das demandas
e reivindicações dos povos e
organizações indígenas,
organizações estas que ele não
reconhece como interlocutores legítimos.
O Senhor Mércio Gomes,
sempre justificou a sua má gestão
com o limitado volume de recursos disponíveis
no orçamento da Funai. No entanto,
conforme denuncias veiculadas em jornais e
revistas de circulação nacional
nas últimas semanas, para ele nunca
faltaram recursos, de tal forma que o Tribunal
de Contas da União está investigando
o porquê o presidente da Funai teria
gastado 252 mil reais na compra de 235 bilhetes
aéreos nos últimos 35 meses,
em viagens principalmente para o Rio de Janeiro
(118), alguns para fora do país e outros
poucos para terras indígenas.
É esse o tipo de
gestor que o Governo do Presidente Lula mantém
a frente do órgão indigenista,
endossando práticas que afrontam a
dignidade dos povos indígenas e constituem
ofensa para as condições de
miséria e morte em que muitos destes
povos vivem, decorrentes da falta de regularização,
desintrusão ou proteção
de suas terras e da ausência ou precariedade
das políticas públicas de saúde,
educação e sustentabilidade
voltadas a eles.
Por tudo isto, a Coiab exige
que o Governo do Presidente Luis Inácio
Lula da Silva atenda com urgência as
demandas dos povos indígenas do Xingu,
comuns a muitos povos da Amazônia, no
sentido de colocar fim a quaisquer procedimentos
de licenciamento ou implantação
de empreendimentos hidrelétricos que
impactam Terras Indígenas, que acontecem
sem garantir a esses povos o direito ao consentimento
prévio e informado, conforme a Convenção
169 da Organização Internacional
do Trabalho (OIT) e a Constituição
Federal.
A Coiab exige ainda, acompanhando
o grito de suas bases, a exoneração
imediata do antropólogo Mércio
Pereira Gomes, provadamente contrário
aos interesses dos povos indígenas,
que aspiram a ter um novo patamar de relacionamento
com a Funai e todos os órgãos
de governo envolvidos com os direitos indígenas,
no contexto de uma nova política indigenista
há muito tempo prometida pela atual
administração federal.
A Coiab exige, por fim,
que o Governo Lula, dê uma demonstração
de vontade política e de identificação
histórica com as causas populares e
sobretudo indígenas, regularizando
as terras indígenas conforme prometeu
na campanha eleitoral de 2002, resolvendo
situações graves de abandono
na saúde indígena como no Vale
do Javari e no Mato Grosso do Sul, reafirmando
junto ao Fundo Global do Meio Ambiente (GEF)
que o Projeto de Preparação
do Programa Nacional de Proteção
da Biodiversidade em Terras Indígenas,
mais conhecido como GEF Indígena, é
prioritário para seu Governo, e instalando
imediatamente a Comissão Nacional de
Política Indigenista (CNPI), como passo
fundamental na construção e
efetivação de uma nova estrutura,
prática e dinâmica institucional
da Política Indigenista, no horizonte
de uma nova relação do Estado
brasileiro com os povos indígenas,
longe da política tutelar, paternalista
e assistencialista, enfim, integracionista
atual, que contradiz os princípios
do respeito à diversidade e especificidade
étnica e cultural dos povos indígenas
garantidos pela Constituição
Federal vigente.
Manaus, 09 de agosto
de 2006.
Coordenação das Organizações
Indígenas da Amazônia Brasileira
(Coiab)