PF tem "fortes evidências"
contra três pessoas por grilagem e desmatamento
em terra kayapó
10 de Agosto de 2006 - Terra Indígena
Kayapó/PA - Policiais federais em área
incendiada ilegalmente na terra indígena,
encontrada durante a Operação
Kayapó.
Brasília - O delegado Antônio
Delfino de Castro Neto aponta “fortes evidências”
contra possíveis grileiros e mandantes
do desmatamento em território indígena
no sudeste do Pará. Eles são
o principal alvo da Operação
Kayapó, desencadeada no dia 2. A ação,
chefiada por Castro Neto, reúne a Fundação
Nacional do Índio (Funai), a Polícia
Federal (PF) e o Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
(Ibama), com apoio de guerreiros kayapó.
“A gente não pode ainda divulgar os
nomes, mas existem fortes evidências
contra pelo menos três pessoas da região”,
conta o delegado, em entrevista à Agência
Brasil. “Os nomes se repetem sempre nos relatos
dos trabalhadores encontrados”.
Após retirar e ouvir 19 trabalhadores
que estavam instalados ilegalmente no território
dos índios, na última segunda-feira
(7), a PF começou a tomar depoimentos,
em Marabá e Tucumã (municípios
da região), de pessoas apontadas como
compradoras de terras. É comum fazendeiros
comprarem lotes dos grileiros (que fazem venda
ilegal), ordenarem a derrubada da vegetação
e a queima da área para colocar gado
no local no ano seguinte.
A operação também constatou
a presença de três garimpos clandestinos,
um dos quais pode envolver cerca de 100 pessoas,
e cerca de 20 focos de desmatamento – alguns
deles com cerca de 700 hectares (cada hectare
corresponde a um campo de futebol), informa
outro dos coordenadores da operação,
Eimar Araújo, da Funai.
Extração de madeira para venda
ilegal, o terceiro foco da empreitada, não
foi constatada até agora. Os policiais
apreenderam com os invasores três motosserras,
cinco espingardas e um revólver calibre
38, além de destruir os acampamentos
onde eles se abrigavam, conta Araújo.
E quanto a algum tipo de envolvimento do
poder público local nas invasões?
“Já foi falado por alguns que existem
reuniões com prefeitos, mas são
informações vagas. Por enquanto,
não podemos falar que há conivência
ou incentivo”, comenta o delegado Antônio
Delfino de Castro Neto.
A Terra Indígena Kayapó, uma
das maiores do país, tem 3,284 milhões
de hectares e aproximadamente 4 mil moradores.
Foi homologada em 1991 e envolve áreas
de quatro municípios: Bannach, Cumaru
do Norte, Ourilândia do Norte e São
Félix do Xingu.
Pedro Biondi
Operação Kayapó
identifica garimpo que pode envolver 100 pessoas
em terra indígena
9 de Agosto de 2006 - Brasília - Um
garimpo ilegal que pode envolver cerca de
100 pessoas foi uma das principais constatações
da Operação Kayapó, desencadeada
na última quarta-feira (2). A operação
também retirou 19 invasores da Terra
Indígena Kayapó, no sudeste
do Pará, e colheu informações
para chegar a quem está por trás
dos danos na área: grileiros (quem
vende ilegalmente lotes) e compradores. A
ação reúne a Fundação
Nacional do Índio (Funai), a Polícia
Federal (PF) e o Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
(Ibama), e conta com apoio de guerreiros kayapó.
A operação encontrou outros
dois garimpos de menor porte funcionando e
cerca de 20 focos de desmatamento – alguns
deles com cerca de 700 hectares (cada hectare
corresponde a um campo de futebol), informa
um dos coordenadores da operação,
Eimar Araújo, da Funai. Extração
de madeira para venda ilegal, o outro foco
da empreitada, não foi constatada até
agora. Os policiais aprenderam com os invasores
três motosserras, cinco espingardas
e um revólver calibre 38, além
de destruir os acampamentos onde eles se abrigavam,
conta Araújo, ex-administrador regional
da Funai em Marabá (PA).
“O principal agora é evitar que essas
pessoas voltem”, comenta, em entrevista à
Agência Brasil. A Funai anunciou a construção
de um posto de vigilância e fiscalização
e a permanência de uma equipe, pelo
menos, até o fim do mês. “Vamos
propor que esse prazo seja estendido o início
de outubro, que é o período
de desmatamento. Não havendo desmatamento,
não haverá queimadas nem plantio
de capim para formação de pastos.”
Na região, é comum fazendeiros
colocarem gado nas áreas desmatadas
após cerca de um ano.
Os garimpos ilegais, contudo, não
foram desativados por causa da oposição
de alguns índios que defenderam a permanência
da atividade e do número limitado de
agentes da Polícia Federal que puderam
sobrevoar o local, como explica o funcionário
da Funai. “No avião e no helicóptero
usados, só cabiam cinco agentes.” Araújo
ressalva que, de modo geral, os Kayapó
estão colaborando bastante com a retirada
dos invasores.
O delegado que chefia a equipe, Antônio
Delfino de Castro Neto, diz que provavelmente
em setembro uma nova etapa da ação
conjunta incidirá sobre os garimpos.
A Terra Kayapó tem 3,284 milhões
de hectares e aproximadamente 4 mil moradores,
formando uma das maiores áreas indígenas
do país. Foi homologada em 1991 e envolve
áreas de quatro municípios:
Bannach, Cumaru do Norte, Ourilândia
do Norte e São Félix do Xingu.
Pedro Biondi
Trabalho precário se repete
nos acampamentos dentro da área kayapó,
afirma delegado
10 de Agosto de 2006 – Terra Indígena
Kayapó/PA – Trabalhador encontrado
desmatando área indígena entrega
motosserra e outros equipamentos a delegado
da Polícia Federal, durante a Operação
Kayapó.
Brasília - Isolados no meio da floresta
amazônica, a horas de carro do posto
de saúde mais próximo, sem equipamento
para comunicação, em barracões
improvisados, praticamente sem medicamentos
e informações sobre o local
onde estavam. O cenário era praticamente
o mesmo para os 19 invasores encontrados pela
Operação Kayapó em áreas
indígenas no sudeste do Pará,
segundo o chefe da ação, o delegado
Antônio Delfino de Castro Neto, da Polícia
Federal (PF).
“São pessoas muito humildes, que às
vezes nem sabiam por quanto iam trabalhar”,
conta Castro Neto, em entrevista à
Agência Brasil. “Na maioria das vezes,
o trabalhador era levado para lá pelo
patrão, que levava também o
rancho, como eles chamam aquele conjunto de
itens básicos de alimentação
[composto por feijão, arroz, açúcar,
sal e óleo, entre outros itens]. O
trabalhador entrava lá com a dívida
do valor do rancho, o que caracteriza trabalho
degradante”.
O delegado reafirmou que encaminhará
os casos ao Ministério do Trabalho
e Emprego, que poderá avaliar se constituem
mesmo trabalho degradante ou até escravo.
O último envolve também alguma
forma de negação de liberdade,
como retenção de documentos,
vigilância de capatazes armados, endividamento
ou impossibilidade de abandono do local.
“A apuração desses casos é
um pouco complicada”, comenta o policial.
“É preciso encontrar de novo os trabalhadores,
e eles muitas vezes vão para outras
fazendas”.
Antônio Delfino de Castro Neto também
aponta “fortes evidências” contra possíveis
grileiros e mandantes do desmatamento na Terra
Indígena Kayapó. Eles são
o principal alvo da Operação
Kayapó, desencadeada no dia 2. A ação
reúne a PF, a Fundação
Nacional do Índio (Funai) e o Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis (Ibama), com apoio de guerreiros
desse povo.
Na última segunda-feira (7) a polícia
começou a tomar depoimentos, em Marabá
e Tucumã (municípios da região),
de pessoas apontadas como compradoras de terras
no local.
A operação também constatou
a presença de três garimpos clandestinos,
um dos quais pode envolver cerca de 100 pessoas,
e cerca de 20 focos de desmatamento – alguns
deles com cerca de 700 hectares (cada hectare
corresponde a um campo de futebol), informa
outro dos coordenadores da operação,
Eimar Araújo, da Funai. Extração
de madeira para venda ilegal, o terceiro foco
da empreitada, não foi constatada até
agora. Os policiais apreenderam com os invasores
três motosserras, cinco espingardas
e um revólver calibre 38, além
de destruir os acampamentos onde eles se abrigavam,
conta Araújo.
A Terra Indígena Kayapó, uma
das maiores do país, tem 3,284 milhões
de hectares e aproximadamente 4 mil moradores.
Foi homologada em 1991 e envolve áreas
de quatro municípios: Bannach, Cumaru
do Norte, Ourilândia do Norte e São
Félix do Xingu.
Pedro Biondi
Polícia Federal vai apurar
se detidos em terra Kayapó estavam
submetidos a trabalho degradante
6 de Agosto de 2006 - Terra Indígena
Kayapó/PA - Policial acompanha dois
invasores encontrados desmatando uma área
na terra indígena, no sudeste do Pará.
A Operação Kayapó, destinada
a combater grilagem de terras, extração
ilegal de madeira e garimpo, só deve
terminar em trinta dias, prevê o delegado
da Polícia Federal Delfino de Castro
Neto.
Terra Indígena Kayapó (Pará)
- “Caímos numa bocada fria”, resume
Antônio Carlos Ferreira Ramos, um dos
trabalhadores detidos e depois liberados pela
Polícia Federal durante a Operação
Kayapó. Sem saber que se tratava de
área indígena, garante, ele
conta que foi "contratado" por um
fazendeiro da região, com dois de seus
13 irmãos e três conhecidos.
A empreitada seria de 20 dias dentro da floresta
amazônica, sem aparelhos para comunicação
nem veículos para deslocamento e com
um kit de saúde composto por “um cartão
de meracilina [um antibiótico], Apracur,
Doril [analgésicos] e uma aguardente”.
O delegado que chefia a operação,
Antônio Delfino de Castro Neto, informou
que encaminhará os dados sobre as condições
em que os trabalhadores foram encontrados
ao Ministério do Trabalho e Emprego,
para avaliar se configuram trabalho degradante
ou até trabalho escravo.
Os seis ergueram um acampamento improvisado
e faziam as necessidades no mato. Uma onça,
inclusive, teria assuntado o vira-lata filhote
que assegurava a segurança do grupo.
“Receberíamos R$ 5 mil por 10 alqueires”,
conta Ramos, 33 anos, pai de três filhos.
A área corresponde a cerca de 50 campos
de futebol. Segundo ele, o grupo teve um adiantamento
de R$ 400 mais o rancho (itens de alimentação:
arroz, feijão, óleo, açúcar
e sal, entre outros), que subtrairia R$ 1.700
do total acertado. “Ele [o mandante] nos deixou
aqui e ficou de trazer carne, mas não
voltou.”
Em entrevista à Agência Brasil,
o presidente da Fundação Nacional
do Índio (Funai), Mércio Pereira
Gomes, descreveu a invasão da área:
"Foi ousada e rápida, e quem fez
isso é madeireiro e grileiro profissional.
Isso significa a possibilidade de levar pessoas
em regime degradante".
Segundo explica o trabalhador detido, o serviço
se divide entre o “motoqueiro” (quem opera
a motosserra), o “meloso” (seu ajudante que
abastece ) e os responsáveis pelo roço
(o corte da vegetação rasteira),
no caso quatro pessoas. Ele diz que o serviço
é pesado, mas que não é
o mais cansativo que já teve, e que
a função do motoqueiro é
a mais perigosa.
Ao serem detidos, os trabalhadores tiveram
de entregar à polícia a motosserra,
as foices, a espingarda de baixo calibre (geralmente
usada para caça) e os outros pertences
que mantinham no acampamento.
O chefe da Divisão Técnica
do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama)
em Marabá (PA), Gudmar Regino Dias,
comenta que invasores como eles podem pagar
pela atividade ilegal, conforme as apurações
concluírem, mas que a intenção
da operação é chegar
a quem tem vendido (grileiros) e comprado
ilegalmente lotes dentro da Terra Indígena
Kayapó.
Imagens de satélite, de novembro,
indicaram a presença de cerca de 50
invasores na terra indígena. Desde
a última quarta-feira (2), a Operação
Kayapó reúne a Fundação
Nacional do Índio (Funai), a Polícia
Federal e o Ibama para combater a venda de
terras, a extração clandestina
de madeira (freqüentemente conjugada
à grilagem) e o garimpo. A ação
tem duração prevista de 30 dias.
Pedro Biondi
Planejada desde 2005, Operação
Kayapó teve adiamento por causa de
chuvas
6 de Agosto de 2006 - Terra Indígena
Kayapó/PA – A Aldeia Kikretum, uma
das que formam a terra indígena no
sudeste do Pará. Ao fundo, o Rio Fresco.
Brasília - A Operação
Kayapó, desencadeada pela Polícia
Federal (PF), pela Fundação
Nacional do Índio (Funai) e pelo Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama), começou
a ser planejada no final de 2005 com a análise
de imagens de satélite que identificaram
clareiras de desmatamento na terra indígena
no sudeste do Pará. Depois disso, ainda
teve que conciliar as ameaças dos Kayapó
que queriam expulsar os invasores por conta
própria e aguardar as cheias do período
de chuvas.
“No final do ano passado é que nós
descobrimos por fotos de satélites
que existia essa devastação”,
explicou o presidente da Funai, Mércio
Pereira Gomes. “Fizemos um sobrevôo
e vimos que foi uma invasão planejada
com muita rapidez. A invasão na terra
Kayapó foi ousada. Eles [os invasores]
penetraram mais de 20 quilômetros na
área indígena. Então,
tivemos que responder na mesma moeda.”
Diante da ameaça dos guerreiros kayapó
de entrar em conflito com os invasores que
praticavam grilagem e desmatavam a terra indígena,
o presidente da Funai foi pessoalmente em
maio até a aldeia Kikretum para negociar
a situação. “Fui empenhar minha
palavra e levei dois agentes da Polícia
Federal. Os índios falaram: ou vocês
organizam o bem ou chamamos 100 guerreiros
e a gente não sabe o que vai acontecer.”
Após esse período, o interior
do Pará teve um ciclo de chuvas que
impossibilitou a operação. “Trinta
agentes estavam prontos para entrar. Quando
eles foram em maio, foi interrompida a operação
porque estava chovendo muito. Agora, estão
lá de maneira emergencial porque a
gestão territorial precisa ser instalada”,
disse Gomes.
Nas batidas iniciais, a partir da última
quarta-feira (2), os agentes da PF encontraram
áreas recém-incendiadas, um
barracão de invasão anterior
com evidências de que alguém
tinha abandonado o local momentos antes e
trabalhadores que confessaram desmatamento
ilegal na terra kayapó. Além
disso, novo sobrevôo da terra indígena
mostrou que alguns dos 19 focos de desmatamento
identificados em 2005 quase dobraram em tamanho,
segundo funcionário da Funai que participa
da ação.
Aloisio Milani
Funai defende gestão territorial
para prevenir invasões de terras indígenas
6 de Agosto de 2006 Tucumã/PA - Foto
de satélite da Terra Indígena
Kayapó em novembro, mostrando focos
recentes de desmatamento. O mapeamento foi
encomendado ao Sistema de Proteção
da Amazônia (Sipam) pela Fundação
Nacional do Índio (Funai).
Brasília - A Fundação
Nacional do Índio (Funai), uma das
articuladoras da Operação Kayapó,
defende a ampliação de um programa
de gestão territorial para prevenir
novos casos de grilagem, garimpo e desmatamento
dentro de áreas demarcadas. A operação,
desencadeada na última quarta-feira
(2), busca retirar invasores de terras indígenas
no sudeste do Pará.
“As idéias de gestão territorial
surgiram há pelo menos dez anos”, explica
o presidente da Funai, Mércio Pereira
Gomes, em entrevista à Agência
Brasil. “Elas significam a consciência
de que demarcar terra não é
tudo. Não termina o processo. É
preciso que os índios conheçam
claramente os limites do seu território.
E eles têm que encontrar meios, com
a Funai, ONGs [organizações
não-governamentais], associações
ou recursos de outros ministérios,
para ter num primeiro momento uma participação
de vigilância”.
“A gestão compreende algo mais também.
Ter conhecimento das áreas de produção,
extrativismo, de possibilidades econômicas
e num nível mais sofisticado até
monitoramento por satélite. Com o projeto
Sivam [Sistema de Vigilância da Amazônia],
por exemplo, deveríamos ser capazes
de acessar imagens recentes sobre o que está
acontecendo. É necessário recompor
um sistema de vigilância com alta tecnologia”,
defende Gomes.
Ele reconhece que ainda não existe
um sistema claro para todas as grandes áreas
indígenas da Amazônia para a
questão de gestão territorial.
“Temos alguns exemplos, mas não temos
a totalidade, principalmente com monitoramento
via satélite”, diz. Por isso, de acordo
com o presidente da Funai, foi necessária
a realização de uma operação
com a Polícia Federal, força
competente pela legislação para
lidar com os índios brasileiros.
Aloisio Milani
Kayapó pedem respeito à
terra demarcada e ameçam invasores
6 de Agosto de 2006 - Terra Indígena
Kayapó/PA – O cacique Moro-ô
Kayapó e, ao fundo, jovens guerreiros
na Casa dos Homens da Aldeia Kikretum. A casa
é um espaço político
e simbólico, onde se realizam reuniões
e cerimônias.
Terra Indígena Kayapó (Pará)
- Em postura de porta-voz e pintado de preto
com carvão e genipapo – padrão
de guerra que “traz morte” –, Kukôy
Nokaton Kayapó avisa que não
é dia de dar detalhes sobre a vida
na Aldeia Kikretum. Na Casa dos Homens, um
espaço simbólico e político
do grupo, o índio adianta que vai apenas
intermediar e traduzir as palavras dos caciques
Moro-ô Kayapó e Koantô
Kayapó sobre a insistência dos
invasores das terras de seu povo e a operação
que reúne Fundação Nacional
do Índio (Funai), Polícia Federal
(PF) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) para tirá-los de lá.
Na língua kayapó, ele encaminha
o mote inicial a Koantô: a Operação
Kayapó. Enquanto uma dúzia de
velhos guerreiros se esmera no acabamento
de flechas com ferrão de arraia e duas
dúzias de jovens guerreiros observam
a visita, o cacique comenta o assunto, e Kukôy
repassa a fala ao repórter: “A nossa
terra foi demarcada pelo governo federal.
O índio nunca invadiu a área
do branco, e o branco tem que respeitar a
área indígena”.
Ele continua: “A gente preparou festa de
guerra para expulsar o posseiro da terra indígena,
só que a Funai não deixou ir
lá, falou para esperar a Polícia
Federal. O governo precisa apoiar a Funai
com recurso para fazer ponto de apoio para
segurar essa terra, senão sempre acontece.”
E conclui: “Se a Polícia Federal retirar
e o pessoal voltar, quem vai resolver é
a gente. O homem branco morre e o índio
também morre."
Imagens de satélite, de novembro,
indicaram a presença de cerca de 50
invasores na terra indígena. Desde
a última quarta-feira (2), a Operação
Kayapó adentra as matas do território
dos índios para combater a venda ilegal
de terras, a extração clandestina
de madeira (freqüentemente conjugada
à grilagem) e o garimpo.
“Por que homem branco quer invadir? Porque
desmatou tudo que é floresta, e esta
região é a única que
tem o pulmão do Brasil”, diz o cacique
Moro-ô.
Pedro Biondi
Chegar a quem ordena desmatamento
é difícil, diz coordenador da
Operação Kayapó
6 de Agosto de 2006 - Marabá (Pará)
- A apuração dos indícios
aponta um fazendeiro de Ourilândia,
município do sudeste paraense, como
mandante do desmatamento e da queima de 60
alqueires constatados na primeira batida da
Operação Kayapó no território
desses índios na região. Talvez,
no entanto, não seja fácil comprovar
isso e punir o responsável, indicam
os relatos do ex-administrador da Funai em
Marabá Eimar Araújo.
“O invasor compra a terra do grileiro [aquele
que comercializa terras que não lhe
pertencem], contrata o peão lá
fora e coloca para desmatar. É difícil
a gente encontrar as pessoas que compraram
a área”, contou o ex-administrador
regional, um dos coordenadores da operação,
à reportagem da Radiobrás.
“Geralmente os fazendeiros mandam o peão
derrubar [a mata] e ficam em Ourilândia,
Tucumã [também na região],
Goiânia. Até gente na Bahia tem
terra dentro da área indígena”,
concordou o chefe do Núcleo de Apoio
da Funai em Tucumã, Odenildo Coelho
da Silva. Segundo Silva, reincidências
são comuns: “O índio põe
o invasor para fora e ele volta, alegando
que não sabia que a área é
dos Kayapó.”
A operação reúne Funai,
Polícia Federal (PF) e Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) para combater a grilagem de terras,
a extração ilegal de madeira
e o garimpo na Terra Indígena Kayapó.
A multa para a devastação dos
60 alqueires foi calculada em R$ 450 mil pelo
chefe da Divisão Técnica do
Ibama em Marabá (PA), Gudmar Regino
Dias.
Geralmente, as áreas desmatadas e
incendiadas pelos invasores se destinam a
virar pasto, num ciclo que segue o calendário
das estações. “O desmatamento
se dá de julho a setembro”, explicou
Eimar Araújo, da Funai. “Em outubro-novembro,
época das primeiras chuvas, os fazendeiros
jogam, de avião, as sementes. Seis
meses depois, a área estará
pronta para gado.”
Muitas vezes, a punição do
responsável precisa esperar a conclusão
o ciclo. “A gente pega os pontos GPS [de localização
via satélite] da área, fotografa
para constatar o dano, espera o infrator formar
a pastagem e se instalar para, então,
autuá-lo”, narrou Gudmar Regino Dias,
do Ibama.
Pedro Biondi
Rotina dos Kayapó inclui treinamento
de guerreiro, caça, festas e futebol
6 de Agosto de 2006 - Terra Indígena
Kayapó (Pará) - Só depois
de intermediar a entrevista com os dois caciques
da Aldeia Kikretum sobre as invasões
na terra indígena, o índio Kukôy
Nokaton Kayapó aceita falar um pouco
sobre o cotidiano da comunidade e autoriza
a conversa com um jovem guerreiro. Kukôy
Nokaton deixa sua postura de porta-voz e conta
como é a rotina de caça e festas,
além do pouco contato dos índios
com a cidade. Os caciques são os que
prioritariamente vão aos centros urbanos,
para resolver assuntos específicos
– não a passeio – diz.
Próximo ao círculo da conversa,
o jovem guerreiro Bepkrit Kayapó, 22
anos, lista as atividades de um jovem da aldeia:
preparar-se para dançar nas festas
tradicionais, proteger a área, buscar
alimento no mato. “Nossos avós ensinam
a nossa história desde quando a gente
dorme no colo. E a gente já ensina
as coisas para os mais novos”, diz. O que
ele gostaria de ser? “O guerreiro mais poderoso
que tem, e defender o nosso povo”, responde.
O modo de vida tradicional também
convive com a televisão, revela Bepkrit.
“Os habitantes da aldeia gostam de assistir
a telejornais e novela, tanto os homens como
as mulheres", diz. E futebol. Entre as
casas com paredes de diferentes materiais
(pau-a-pique, alvenaria, telhas de amianto
e tábuas) – todas, porém, com
telhado de palha de buriti –, estão
dois campos de terra para praticar o esporte
em que o Brasil é conhecido no mundo
inteiro.
Pedro Biondi
Foto: Marcello Casal Jr/ABr