24/10/2006
- Uma recente liminar do Tribunal Regional
Federal da 1ª Região, que liberou
a construção da hidrelétrica
Paranatinga II no rio Culuene, no Mato Grosso,
causou revolta no Parque Indígena do
Xingu. Em carta divulgada na semana passada,
diversas lideranças xinguanas manifestam
indignação e angústia
quanto aos impactos da obra sobre o Culuene
- um dos principais formadores do rio Xingu
-, a reprodução dos peixes,
a dieta alimentar das comunidades indígenas,
a fauna e flora locais e o patrimônio
cultural dos índios do Alto Xingu.
A decisão do Tribunal
Regional Federal da 1ª Região
(TRF) de liberar a construção
da Pequena Central Hidrelétrica Paranatinga
II, tomada no último dia 20 de setembro,
caiu como uma bomba no Parque Indígena
do Xingu. Em carta divulgada na semana passada,
diversas lideranças xinguanas manifestam
preocupação quanto aos impactos
da obra sobre o rio Culuene, a reprodução
dos peixes, a dieta alimentar das comunidades,
a fauna e flora locais e o patrimônio
cultural do Alto Xingu. Saiba mais sobre a
polêmica clicando aqui e leia, abaixo,
a carta na íntegra.
Parque do Xingu, 18 de outubro
de 2006.
Nós, povo Indígena
do Xingu, vimos por meio deste, manifestar
toda nossa indignação e angústia
diante de decisão liminar proveniente
do Tribunal, na qual foi permitida a continuidade
da obra da Pequena Central Hidrelétrica
de PARANATINGA II até a produção
de decisão de mérito sobre a
questão. A comunidade indígena
se vê ameaçada por esta realidade
alarmante que reflete uma política
governamental focada em interesses da elite
econômica, a qual vai flagrantemente
de encontro aos direitos sócio-ambientais
constitucionalmente assegurados.
É desesperadora a
perspectiva dos graves impactos que serão
gerados se a PCH PARANATINGA II vier a se
efetivar. Somos Povos da Floresta e a relação
de respeito que mantemos com meio ambiente
propicia a manutenção da vida
e da biodiversidade. A tão falada sustentabilidade,
que os não-índios colocam como
fundamental à sobrevivência e
a existência das próximas gerações,
mas poucos fazem para efetivar, foi por nossos
antepassados, e é por nós, naturalmente
buscada, pois nossos modos e cultura não
se pautam por práticas degradantes,
visando interesses utilitaristas de uma classe,
e sim ações que atendam aos
interesses do coletivo e que não ocasionem
danos ao meio natural que nos envolve e nos
fornece toda a riqueza que necessitamos para
viver.
Logo, contraditório
nos parece, que o Estado Brasileiro, do qual
fazemos parte, realize ou legitime práticas
que atentam contra a existência de nossa
coletividade. Nossa diversidade e nossa contribuição
para a vida no Planeta não são
reconhecidas e respeitadas. Apesar do ordenamento
jurídico nacional e internacional determinar
o dever estatal de proteção
das comunidades indígenas o modo de
vida do homem branco é colocado como
referencial e a as diferenças são
vistas como ameaças a serem, aos poucos,
eliminadas.
Lutamos contra este estado
de coisas. Os gritos do Xingu devem ser ouvidos!
Temos o direito de participar e decidir sobre
projetos que interfiram em nossas terras,
em nossas culturas, em nossas crenças,
em nosso modo de vida.
Não queremos que
o Rio Kuluene seja poluído com o óleo
eliminado pelas turbinas.
Não queremos que os peixes desapareçam
devido à barreira artificial que está
sendo construída e que impedirá
a subida de inúmeras espécies,
que fazem parte da dieta alimentar do povo
Xinguano;
Não queremos ter nosso regime alimentar
fique comprometido pela falta dos peixes;
Não queremos o restante da fauna terrestre
desapareça;
Não queremos que espécies da
flora desapareçam;
Não queremos que o local ‘sagrado’
do primeiro surgimento de Kuarup seja inundado;
Não queremos uma obra que está
voltada para os interesses de um empresariado
que somente objetiva acumular riquezas às
custas da morte.
NÃO QUEREMOS A PCH
PARANATINGA II!
E sim queremos que a Constituição
Federal, a Convenção n°
169 da OIT e a Carta da Terra, com seu conjunto
de Princípios - entre eles, Princípio
do Direito à Vida Saudável,
Princípio da Dignidade, Princípio
da Participação social, Princípio
do Respeito à Diversidade, Princípio
da Proteção do Meio ambiente-,
sejam efetivadas!
Somos povos resistentes!
São mais de cinco séculos de
opressão -fruto da estupidez do homem
branco que não considera que diversidade
é evolução. Continuaremos
na luta!
Finalizamos esta carta atentando
para a responsabilidade e o compromisso do
Poder Judiciário com a Justiça
Social, a fim de que práticas abusivas
e desumanas não se tornem lugar comum
em nosso País.
Amigos e amigas autoridades
do País, defensores da Natureza, solicitamos
apoio de todos para preservamos juntos a nossa
grande riqueza: rios, matas, peixes e flora
do nosso país que resta de pouco em
nossa reserva do Parque do Xingu.
Por favor, nos ajude!
COMISSÃO INDÍGENA
DO MOVIMENTO DO PARQUE DO XINGU agradece desde
pelo apoio de todos e solidariedade.