03-11-2006 - O clima é tenso na região
de Prainha, onde comunitários colocaram
fogo em uma balsa e apreenderam outras duas
cargas com madeira extraída ilegalmente
da região.
Comunitários da região do rio
Uruará em Prainha, município
às margens do rio Amazonas, no Pará,
atearam fogo ontem a tarde em uma balsa carregada
com toras de madeira extraídas ilegalmente
da região. Outras duas balsas estão
retidas. O conflito aconteceu na comunidade
Santa Cruz, que fica a uma hora e meia de
lancha rápida da cidade. Segundo o
Conselho Popular da região do Uruará,
mais de 12 madeireiras exploram a floresta
ilegalmente e usam o rio Uruará para
transportar as toras até o rio Amazonas
sem que as autoridades façam algo de
efetivo.
“Como organização pacifista,
o Greenpeace não apóia este
tipo de manifestação e está
muito preocupado com o clima de violência
que se instalou na região graças
à ausência do Estado. O clima,
que já é tenso, poderá
piorar ainda mais se autoridades federais
não intervirem imediatamente”, disse
Marcelo Marquesini, do Greenpeace. “Não
é de hoje que parte da comunidade denuncia
a destruição da floresta provocada
pela retirada ilegal de madeira e grilagem
de terras na região”.
O estopim do confronto foi a morte de um
jovem da vila de Santa Maria do Uruará,
há um mês, atropelado por uma
carreta de uma das empresas. Como resposta,
os comunitários bloquearam o rio Uruará
e detiveram cinco balsas com madeira ilegal,
que foram depois apreendidas pelo Ibama. A
madeireira Tigre e Timber chegou a apresentar
documentos (DOFs), mas eles não respaldavam
as cargas.
Boa parte da região é reivindicada
pelas comunidades para a criação
da reserva extrativista (resex) Renascer.
A área é vizinha à resex
Verde para Sempre, localizada no município
de Porto de Moz. De acordo com o Plano de
Ação para Prevenção
e Controle do Desmatamento do governo federal,
a resex Renascer deveria ter sido criada entre
2005-2006 e até agora não há
previsão para a sua criação.
Parte das madeireiras que operam na região
exploravam ou compravam madeira ilegal da
área vizinha em Porto de Moz, mas depois
da criação da reserva, em dezembro
de 2004, e de sucessivas operações
de fiscalização, a exploração
ilegal de madeira ali caiu consideravelmente.
A falta de passos concretos na criação
da resex e do combate a madeira ilegal contribuem
para o quadro de conflito. Autoridades locais,
como o prefeito da cidade, Joaquim Vieira
Nunes (PSDB), são contra a criação
da reserva ou qualquer medida conservacionista
e não escondem seu apoio aos madeireiros.
Para piorar, a polícia local tem dado
cobertura aos madeireiros nos últimos
meses. Mesmo sendo madeira ilegal, policiais
militares acompanham o transporte das cargas
nos barcos-empurradores ou liberam as balsas
apreendidas pelos comunitários durante
os protestos. Os comunitários temem
retaliações, já que várias
lideranças já foram ameaçadas
de terem suas casas incendiadas.
A pedido das comunidades o Greenpeace esteve
na região e documentou a intensa retirada
de madeira. Mais de mil quilômetros
de estradas ilegais construídas por
madeireiros já interligam os municípios
de Uruará, Placas, Medicilândia,
Santarém e Prainha. “Observamos desmatamentos
ilegais em áreas planas – aptas para
o plantio de soja – vindos da Gleba Pacoval,
na região de Santarém. A história
se repete: a exploração ilegal
de madeira continua abrindo portas para a
grilagem e desmatamento. Se nada for feito
rapidamente, não restará floresta
para as comunidades”, complementou Marquesini.
O governo federal foi avisado da situação
de conflito na região. Em agosto, técnicos
do Ibama em Santarém enviaram um relatório
à diretoria do Ibama (Disam) alertando
para o fato. A presidência da Câmara
Municipal de Prainha também enviou
um breve relato ao Ministério do Meio
Ambiente (MMA) em setembro. Até agora,
muito pouco foi feito. Para o Greenpeace,
só a presença constante do Estado
e o fortalecimento dos órgãos
do governo que atuam na região – como
Ibama, Incra, Polícia Federal – poderá
garantir o futuro da floresta e os direitos
das comunidades locais.
Foto: Greenpeace