13 de novembro - "Eu
sou Chiquitano e sou brasileiro". Com
essas palavras, o cacique Cirilo Chiquitano,
da aldeia Fazendinha, na Terra Indígena
Portal do Encantado, concluiu o 1º Seminário
de Afirmação dos Povos Chiquitanos,
realizado entre os dias 10 a 12 de setembro,
no município de Cárceres, Mato
Grosso.
O encontro reuniu cerca
de quinhentos indígenas da etnia Chiquitano,
representando 27 comunidades da fronteira
do Brasil com a Bolívia. Organizado
pela Universidade do Estado do Mato Grosso
(Unemat), Ministério do Desenvolvimento
Agrario (MDA), e organizações
da sociedade civil, o evento contou com representantes
da Funai (Fundação Nacional
do Índio), do Incra (Instituto Nacional
da Reforma Agrária) e do Ministéio
do Meio Ambiente (MMA), além da participação
de indígenas Chiquitano que residem
na Bolívia, como Roberto Tomicha, que
e teólogo e doutor em História,
professor da Universidade Católica
de Cochabamba.
O encontro serviu para aproximar
as diversas comunidades de índigenas
Chiquitano que vivem na região da fronteira.
Os dados mais antigos da origem deste povo
remonta ao século XVII, quando foram
instituídas as missões jesuíticas,
chamadas de Reducciones, nas colônias
espanholas. Diversas etnias eram reunidas
para viverem junto nas missões. Deste
amálgama étnico, sobressaiu-se
a língua e a cultura dos Chiquitos,
atualmente Chiquitanos, tradicionais habitantes
das regiões pantaneiras. Atualmente,
há cerca de 40 mil Chiquitanos na Bolívia,
e cerca de 2 mil no Brasil.
A etnia foi reconhecida
há cerca de dez anos pela Funai. Viviam
- e muitos ainda vivem - como trabalhadores
rurais em fazendas da região. Na maioria
dos casos, tratavam-se de pequenas comunidades,
que viviam de forma subsistente. "Afirmação
étnica teve início, em grande
parte, com a construção do gasoduto
Brasil-Bolívia", afirma a antropóloga
Joana Aparecida Fernandes da Silva. E a questão
da identidade, numa terra onde as condições
de trabalho são difíceis, ainda
é muito reprimida.
A língua, no lado
brasileiro, foi praticamente perdida ao longo
do tempo. "A língua Chiquitano
ainda é viva na memória dos
velhos, que conversam entre si", afirma
a lingüista Aurea Cavalcante Santana,
indigenista da Funai, que faz pesquisas atualmente
para a classificação da língua
Chiquitano.
A primeira terra indígena
dos Chiquitano em processo de regularização
fundiária na Funai se chama Portal
do Encantado, que se encontra em fase de identificação.
Além disso, há quatro pedidos
de reconhecimento de territórios tradicionais,
ainda em análise pela Funai. "No
entanto, com a conscientização
da população indígena,
é possível que este número
aumente", afirma Joana.
Além de comidas típicas,
como a chicha (bebida fermentada) de milho
e de mandioca, e da patasca, no encontro houve
a apresentações de músicas
típicas e danças. Nas oficinas,
realizadas em pequenos grupos, foram debatidos
temas comuns a todas as comunidades, como
a dificuldade de afirmação da
identidade, a repressão da sociedade
local e o preconceito e a discriminação
que sofrem. Na comunidade de Vila Nova, por
exemplo, há uma intensa disputa com
posseiros, como lembrou o cacique Florêncio.
"Até para caminhar até
o rio para buscar água, precisamos
ter cuidado", disse.
"As nossas idéias
são livres, e queremos liberdade. Na
Bolívia também sofremos, também
vivemos a mesma luta e a mesma causa",
afirmou o padre Jorge Masaíim, que
veio da cidade boliviana de Santa Ana. "Mas
devemos muito a nossos antepassados, e devemos
lutar por nossa cultura."
Ao final do encontro, foi
feito um abaixo-assinado, para pedir urgência
na demarcação de terras e atenção
das autoridades públicas na proteção
do povo Chiquitano.