20-12-2006 – Brasília - Apesar de
todo o clamor da sociedade civil contra os
transgênicos, deputados aprovam Medida
Provisória, com emendas acatadas pelo
relator Paulo Pimenta (PT-RS), que abre a
porteira dos transgênicos no Brasil
A Câmara dos Deputados deu de ombros
para a biossegurança brasileira e aprovou
nesta quarta-feira (20/12), por 247 votos
a favor, 103 contra e 2 abstenções,
a Medida Provisória 327 que altera
as regras para o plantio de transgênicos
no entorno das Unidades de Conservação.
A votação aprovou também
duas emendas acatadas pelo relator da MP,
Paulo Pimenta (PT-RS), que libera o algodão
transgênico da Monsanto plantado ilegalmente
no país e reduz o número de
votos necessários na CTNBio (Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança)
para aprovações comerciais de
organismos geneticamente modificados.
“Essa votação e a consequente
aprovação da MP é uma
clara indicação do descaso do
Congresso e do governo com a proteção
ambiental, com a biossegurança brasileira,
com as leis feitas pela própria casa
e principalmente com a opinião da maioria
dos eleitores, que não querem transgênicos
no seu prato”, afirmou Gabriela Vuolo, coordenadora
da campanha de Engenharia Genética
do Greenpeace.
A aprovação da MP 327 pôs
em xeque a biossegurança do país
e descaracterizou a lei aprovada em 2005,
que estabeleceu normas para a liberação
de novas variedades transgênicas no
Brasil. "O mais chocante de tudo é
que até a liderança do governo,
que tinha uma posição contrária
às emendas, votou a favor delas”, concluiu
Gabriela.
Para protestar contra a MP 327, o Greenpeace
fez na Câmara dos Deputados uma manifestação
bem humorada. Dois papais noéis e dois
duendes do Greenpeace ficaram hoje por três
horas em frente ao espaço cultural
da Câmara dos Deputados, onde estes
estavam reunidos para discutir os encaminhamentos
para a votação da pauta de hoje,
que incluía a decisão a respeito
da MP dos transgênicos.
Os papais noéis e os duendes perguntavam
aos deputados qual presente de Natal eles
gostariam de dar ao Brasil. Se eles fossem
a favor da MP, ganhavam um crachá com
o símbolo dos transgênicos. Se
fossem contra, ganhavam um cartão de
Natal.
Inocêncio de Oliveira (PFL – PE) não
se avexou a colocar o crachá, e falou
todo orgulhoso: “Eu sou a favor dos transgênicos”.
Rodrigo Maia, líder da bancada do PFL
na Câmara, partido que apresentou boa
parte das 19 emendas à MP, foi outro
que aceitou de bom grado a credencial dos
transgênicos. “Estou com a minha bancada,
que em grande parte é a favor da MP”,
afirmou.
Os papais noéis presentearam com cartões
de Natal os deputados contrários, como
Marcelo Ortiz (PV – SP), que considerou preocupante
o fato de a MP desrespeitar o posicionamento
científico de especialistas e desconsiderar
o impacto ambiental dos transgênicos.
“Temos que respeitar o princípio da
precaução”, afirmou.
Os trabalhos no plenário da Câmara
começaram por volta das 15h30. Paulo
Pimenta (relator da MP) defendeu seu texto,
que aprovou duas das 19 emendas apresentadas.
João Alfredo (PSOL-CE) foi um dos mais
enfáticos a rebater o posicionamento
do relator. Para ele, a acusação
de Pimenta de que a CTNBio estava parada é
falsa. “De abril a novembro, 370 processos
de pedidos de liberação para
pesquisa com transgênicos foram avaliados,
e 95% foram aprovados”, disse.
Sobre a redução do quórum,
Alfredo esclareceu que as votações
ocorriam por maioria simples. Apenas para
comercialização eram necessários
os 2/3, já que a decisão envolve
maior discussão, vários setores
da sociedade e maior risco ambiental. “É
balela que o algodão transgênico
ilegal vai ser legalizado para ser usado como
biodiesel. Afirmaram isso na época
da legalização da soja da Monsanto,
mas ela foi comercializada como alimento”,
concluiu.
Também fizeram veementes defesas contra
a MP o deputado Henrique Fontana (PT-RS),
líder do partido na Câmara, e
Sarney Filho (PV-MA). Ambos lembraram aos
deputados presentes ao plenário que
o Princípio da Precaução
deveria ser levado em consideração
em relação à votação
da MP para impedir possíveis prejuízos
futuros ao meio ambiente e à saúde
humana.
Apesar de tudo isso e de a maioria esmagadora
dos brasileiros (mais de 70%, segundo pesquisa
do ISER) serem contrários aos transgênicos,
os deputados brasileiros mais uma vez mostraram
profundo descaso pela vontade da sociedade
civil, pensando mais em interesses próprios
e de poucos grupos econômicos poderosos.
Agora, para entrar em vigor, a MP terá
que ser aprovada no Senado e receber a sanção
presidencial.
Lobby transgênico fica sem presente
de Natal
21-12-2006 – Brasília - MP 327 aprovada
na Câmara dos Deputados não é
votada no Senado por falta de parlamentares
na Casa. Pedido de verificação
de quórum foi feito pela senadora Heloísa
Helena (PSOL-AL).
O Papai Noel transgênico, gordo de
tanto comer royalties, entalou na chaminé
do Senado e deixou o agronegócio e
a indústria de biotecnologia sem presentes
de Natal.
Os defensores da Medida Provisória
327, que altera as regras brasileiras para
o plantio de transgênicos no entorno
das Unidades de Conservação
Ambiental, não conseguiram levar adiante
o plano de votar a MP às pressas no
Senado por falta de quórum.
A senadora Heloísa Helena (PSOL-AL)
pediu na manhã desta quinta-feira uma
verificação de quórum
na sessão extraordinária que
discutiria a MP e constatou que não
havia senadores suficientes na Casa, conseguindo
adiar a votação.
A MP fora aprovada na quarta-feira pela Câmara
dos Deputados em tempo recorde e o mesmo poderia
acontecer no Senado, graças ao forte
lobby do agronegócio e da indústria
de biotecnologia.
O Greenpeace continuará atuante para
que o assunto não seja discutido às
pressas com o objetivo de atender exclusivamente
aos interesses da bancada ruralista e de empresas
multinacionais como Monsanto, Bayer e Syngenta,
que querem comercializar suas sementes geneticamente
modificadas sem a devida discussão
dos impactos ambientais que elas possam provocar
no Brasil.
A MP 327 trata da redução da
extensão das zonas de amortecimento,
que são áreas de contenção
entre plantações de transgênicos
e Unidades de Conservação. No
entanto, duas emendas foram embutidas na proposta
original e acatadas pelo relator da MP, o
deputado Paulo Pimenta (PT-RS), desvirtuando
o texto inicial. Uma libera o algodão
transgênico da Monsanto plantado ilegalmente
no país e a outra reduz o número
de votos necessários na Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança
(CTNBio) para aprovações comerciais
de produtos transgênicos.
O Greenpeace realizou quarta-feira um bem-humorado
protesto na Câmara dos Deputados para
tentar sensibilizar os parlamentares sobre
os riscos que o país corre ao escancarar
suas portas para os transgênicos. Ativistas
fantasiados de Papai Noel e também
de duendes entregaram cartões de Natal
a deputados e líderes de bancadas pedindo
que não aprovassem a MP. Aos parlamentares
que defenderam a MP, foram entregues crachás
com o "T" símbolo dos transgênicos.
Durante as discussões em plenário
que precederam a votação, muitos
deputados fizeram veementes ataques à
MP, expondo suas deficiências e derrubando
os argumentos de seus defensores - como a
história de que a CTNBio está
paralisada e por isso o quórum de aprovação
comercial deve ser reduzido. Como bem lembraram
os deputados Henrique Fontana (PT-RS), médico
e líder da bancada petista na Câmara,
e João Alfredo (PSOL-CE), a Comissão
aprovou a maior parte das centenas de pedidos
feitos para pesquisas com transgênicos.
A aprovação de liberação
comercial, no entanto, depende de debates
mais aprofundados, para evitar possíveis
catástrofes futuras.
Artigo - Tratoraço transgênico
20-12-2006 - Em março deste ano, diante
de representantes estrangeiros e jornalistas
presentes na Conferência sobre Diversidade
Biológica (CDB), em Curitiba, o presidente
Lula discursou afirmando que a biodiversidade
é o maior tesouro do planeta. Alardeou
com pompa e circunstância que o Brasil
se orgulha de proteger seu meio ambiente.
Passou uma imagem muito diferente da realidade
que se apresenta depois que os visitantes
dão as costas e vão embora.
Há semanas, o próprio presidente
acusou ambientalistas, índios e Ministério
Público de atrapalhar o desenvolvimento
do país. Num discurso feito para agricultores
e tendo como anfitrião o governador
do Mato Grosso, Blairo Maggi, Lula criou tremenda
saia justa até com a ministra do Meio
Ambiente. Deixou claro que o agronegócio
é prioridade nacional - mesmo que signifique
passar por cima das questões ambientais.
Antes disso, no final de outubro, Lula assinou
medida provisória (MP) diminuindo a
distância mínima entre as áreas
de plantio de transgênicos e as Unidades
de Conservação (UCs). Sem consultar
a sociedade civil, passou por cima do princípio
da precaução e abriu precedente
que fragiliza essas áreas não
só na questão dos transgênicos,
mas em todos os assuntos que possam ter impactos
sobre o meio ambiente. Quem saiu ganhando
foram as multinacionais de biotecnologia,
que vinham plantando ilegalmente no entorno
das UCs e não se intimidaram nem depois
de pagar multa determinada pelo Ibama.
A MP chegou à Câmara dos Deputados
e trancará a pauta a partir do dia
18 de dezembro. A bancada ruralista não
perdeu tempo. Quer aproveitar a votação
para aprovar o seu "pacote de maldades".
A idéia é pegar carona para
alterar medidas que garantem a biossegurança
no país, promovendo um tratoraço
transgênico. No final das contas, a
impressão que fica é de que
a bancada do agronegócio está
sempre insatisfeita e não se cansa
de reabrir discussões encerradas.
A Lei de Biossegurança, por exemplo,
foi aprovada no início de 2005 depois
de meses de discussão. Com ela, vários
mecanismos para garantir a biossegurança
brasileira foram estipulados e aprovados,
inclusive as regras para liberação
de novo transgênico no meio ambiente.
Essas regras garantem um procedimento formal
a ser seguido e protegem o meio ambiente e
os consumidores. Porém, como criança
mimada que só se satisfaz quando tem
tudo o que quer, a bancada ruralista quer
mudar as regras do jogo. O mais curioso é
que o Congresso que aprovou a Lei de Biossegurança
em 2005 é o mesmo que hoje discute
as mudanças de última hora.
Uma das propostas ruralistas é retirar
a competência da Anvisa (Agência
Nacional de Vigilância Sanitária)
sobre o registro de agrotóxicos e deixar
tudo sob responsabilidade exclusiva do Ministério
da Agricultura. Com a proposta absurda, a
bancada espera facilitar a liberação
de transgênicos - especialmente os resistentes
ou tolerantes a agrotóxicos e que apresentam
quantidade de resíduo maior que a considerada
segura para a saúde humana (como o
milho Liberty Link, da Bayer, e o algodão
RoundUp Ready, da Monsanto). Excluindo a Anvisa
do processo, as questões de saúde
deixariam de ser levadas em conta e apenas
os aspectos agronômicos seriam considerados.
Outra discussão que os ruralistas
querem reabrir é a liberação
das sementes "suicidas", a tecnologia
conhecida como Terminator. Essas sementes
- estéreis - foram proibidas durante
a última Reunião das Partes
da CDB. O Brasil, além de signatário
do acordo, sediou e secretariou a última
reunião. Mesmo assim, a bancada insiste
em pedir a aprovação dessa tecnologia.
Para completar o tratoraço transgênico,
os ruralistas querem mudar o funcionamento
da CTNBio (Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança) e diminuir
o quórum necessário para as
aprovações comerciais. Se isso
for aprovado e as regras da Lei de Biossegurança
forem mudadas, podemos ter uma situação
em que só oito brasileiros serão
responsáveis por avaliar a segurança
de novo transgênico. Até o presidente
Lula disse que essa não é situação
razoável. E ainda teríamos excluídos
da discussão setores fundamentais representados
pelos ministérios do Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior,
Justiça e Desenvolvimento Agrário,
entre outros.
A manobra dos ruralistas é sorrateira.
Querem mudar as regras do jogo da biossegurança
com a bola rolando e pelas entrelinhas de
uma medida provisória que trata de
tema específico - as zonas de amortecimento.
O Congresso Nacional não pode se deixar
levar pelo canto da sereia e jogar fora as
discussões e deliberações
tomadas em 2005, que garantem a biossegurança
brasileira. A derrota não será
apenas dos parlamentares. Será do país.
Foto: Greenpeace