08/03/2007
- O Fórum Permanente de Presidentes
de Conselhos Distritais de Saúde Indígena
divulgou hoje, 8 de março, uma nota
à imprensa e uma carta aberta à
sociedade denunciando a situação
em que se encontra a saúde indígena
no Brasil. Leia abaixo a nota e a carta aberta.
Ao final da reunião
do Fórum Permanente de Presidentes
de Conselhos Distritais de Saúde Indígena,
que se encerrou hoje (8 de março) em
Brasília, lideranças indígenas
representando os Conselhos de Saúde
de mais de 30 Distritos Sanitários
Especiais Indígenas, que atendem a
população indígena de
19 estados brasileiros, aprovaram uma Carta
Aberta denunciando o descaso com a saúde
indígena e propondo a adoção
urgente de um conjunto de medidas para “destravar”
a saúde indígena.
Na carta, os membros do
Fórum denunciam que as situações
dramáticas que têm chegado ao
noticiário nacional – como a desnutrição
entre crianças indígenas no
Mato Grosso do Sul, o crescimento da Hepatite
Delta entre os povos indígenas do Vale
do Javari, no Amazonas, e o risco de nova
epidemia de malária entre os Yanomami
– são sintomas de uma crise de gestão
do Subsistema de Atenção à
Saúde Indígena, atualmente sob
a responsabilidade da Fundação
Nacional da Saúde – FUNASA.
Apesar do volume de recursos
destinados à saúde indígena
ter crescido mais de 100% desde o início
do primeiro mandato do Presidente Lula, os
resultados alcançados estão
muito longe de corresponder a este grande
investimento. Os problemas gerenciais – inclusive
com denúncias de malversação
dos recursos públicos – indicam a necessidade
urgente de mudanças no perfil da instituição
responsável e dos seus gestores.
O Fórum Permanente
de Presidentes dos Conselhos Distritais de
Saúde Indígena, instituído
pela portaria Nº. 644, de 27 de março
de 2006, tem por finalidade zelar pelo cumprimento
das diretrizes do Sistema Único de
Saúde, das Leis Complementares Especificas
a Saúde Indígena, promover o
fortalecimento das ações do
controle social em saúde e atuar na
formulação e no controle da
execução da política
nacional de atenção a saúde
indígena. O Fórum tem caráter
consultivo, propositivo e analítico
e é composto por presidentes dos Conselhos
Distritais de Saúde Indígena
dos 34 Distritos Sanitários Especiais
Indígenas.
Carta aberta do
Fórum Permanente de Presidentes de
Conselhos Distritais de Saúde indígena
Onde está
o dinheiro da saúde indígena?
Desde o início do
primeiro mandato do Presidente Lula, aumentou
em mais de 100% o volume de recursos públicos
investidos na atenção à
saúde dos povos indígenas, que
passou de aproximadamente R$ 203 milhões
para quase R$ 460 milhões por ano.
No entanto, a situação atual
é de descaso com os povos indígenas.
No Distrito Sanitário Especial Indígena
do Vale do Javari a Hepatite cresce devido
à baixa cobertura vacinal e a busca
ativa atingiu apenas 10% da população
de mais de 3 mil pessoas, podendo atingir
os índios isolados; o fantasma da malária
volta a assombrar os Yanomami e demais povos
indígenas do Norte do país;
faltam ações conjuntas intersetoriais
de combate à desnutrição
no país, a exemplo do Mato Grosso do
Sul.
Existem registros de alto
índice de DST e de câncer de
colo uterino. Segundo os dados do próprio
órgão responsável, a
Fundação Nacional de Saúde
– FUNASA, a mortalidade infantil indígena
é o dobro da média nacional.
Esta situação teve como resultado
mais de 50 ocupações de instalações
da FUNASA só em 2006 por comunidades
indígenas revoltadas com a falta de
assistência.
Na falta de investimento
em infraestrutura os profissionais de saúde
mal conseguem chegar às comunidades
indígenas para dar assistência
à saúde. A falta de uma política
adequada de recursos humanos contribui para
a alta rotatividade dos profissionais. As
ações em saneamento básico
nas comunidades indígenas não
ocorrem ou não correspondem às
prioridades identificadas pelas comunidades,
sendo executadas muitas vezes sem a devida
qualidade. As Casas de Saúde Indígena
– CASAI continuam em condições
precárias, agravando os riscos à
saúde de pacientes e acompanhantes.
Em alguns distritos as ações
estão paradas por atrasos no repasse
de recursos da Secretaria de Assistência
a Saúde (SAS).
Falta normatização
e transparência na aplicação
dos recursos repassados fundo a fundo aos
municípios e aos hospitais de referência.
Sobra ingerência política na
gestão da saúde indígena.
O modelo inadequado de convênios de
assistência complementar vem culminando
na criminalização das entidades
conveniadas. A centralização
da aquisição de insumos (em
especial medicamentos) no nível central,
contrariando os princípios do SUS,
vem dificultando o controle social e facilitando
a malversação de recursos públicos;
desrespeito as deliberações
dos Conselhos Distritais.
Esta piora na relação
custo-benefício dos investimentos públicos
na saúde indígena demonstra
graves falhas de gestão do subsistema,
atualmente sob a responsabilidade da Fundação
Nacional de Saúde – FUNASA.
Medidas urgentes
para destravar a Saúde Indígena
Para reverter esta situação
nós conselheiros indígenas dos
distritos sanitários especiais indígenas
membros do Fórum Permanente de Presidentes
dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena
reunidos entre 7 e 8 de Março de 2007
na cidade de Brasília, vimos em público
manifestar o desejo da melhora da saúde
indígena colocando as seguintes propostas
para tomada de providências:
Mudar o perfil técnico
e administrativo da instituição
responsável pela gestão do subsistema
de atenção à saúde
dos povos indígenas, adequando-o ao
cumprimento da sua missão de prover
atenção à saúde
de forma diferenciada de acordo com as necessidades
de cada povo indígena do país.
Garantir que o perfil do
gestor público da saúde indígena
respeite os critérios estabelecidos
pela política nacional de atenção
à saúde indígena e por
este Fórum: que atue independente da
ideologia partidária; que tenha conhecimento
e experiência com povos indígenas
e na área da saúde pública,
identificação com a causa indígena,
experiência com a área social;
que seja dinâmico, comprometido com
as deliberações das conferências
nacionais de saúde indígena,
responsável, acessível, aberto
ao diálogo, disponível para
visitar as comunidades indígenas e
para resolver problemas, conhecedor de política
pública e do subsistema de saúde
indígena; que promova ação
intersetorial e que tenha um passado idôneo
sem envolvimento com corrupção.
Que a instituição
responsável pelo subsistema e os demais
órgãos do estado Brasileiro
mantenham postura de respeito no trato com
a população indígena,
consultando o movimento indígena e
as instâncias de controle social sempre
que tomem providências nas questões
de interesse dos povos indígenas.
O gestor público
deve prover condições para viabilizar
o Controle Social na saúde indígena
respeitando o direito à participação
em cumprimento da legislação
(Leis 8.080/90; 8.142/90; 9.836/99).
O gestor público
deve cumprir o que determina a política
nacional da saúde indígena a
lei 9.836/99 e as deliberações
da II, III e IV Conferência Nacional
de Saúde Indígena no que se
refere à Autonomia Administrativa e
financeira dos Distritos Sanitários
Especiais Indígenas – DSEIs.
À não municipalização
da saúde indígena.
Cadê o dinheiro
da saúde indígena?
Destravar a saúde indígena!
Chega de invisibilidade!
Brasília, 8 de Março
de 2007
Povos indígenas do Alto Rio Negro estão
sem assistência de equipes de saúde
07/03/2007 - Depois que a Foirn e a Funasa
romperam em novembro o convênio que
mantinham há cinco anos para o atendimento
à saúde indígena, nenhuma
equipe de médicos, enfermeiros e dentistas
se deslocou para as áreas por falta
de equipamentos e insumos. As populações
estão sendo assistidas por agentes
de saúde indígenas e o número
de mortes aumentou.
Em novembro do ano passado,
quando o convênio para atendimento à
saúde indígena entre a Fundação
Nacional de Saúde (Funasa) e a Federação
das Organizações Indígenas
do Rio Negro (Foirn) foi rompido, os profissionais
foram retirados das áreas deixando
22 povos indígenas que habitam seis
Terras Indígenas na região do
Alto Rio Negro sem assistência. De acordo
com o coordenador técnico do Distrito
Sanitário Especial Indígena
(Dsei), Sizinando Pontes, a mudança
provocou descontinuidade no atendimento. A
partir de dezembro, entretanto, novo convênio
foi assinado com a Associação
dos Trabalhadores de Enfermagem de São
Gabriel da Cachoeira (Atesg) e cinco equipes
foram mantidas em áreas estratégicas,
mas incompletas, sem médicos, enfermeiros
e dentistas. De acordo com Pontes, houve problemas
com os motores dos barcos que estavam sucateados
e sem condição de uso, o que
impediu o deslocamento.
A Funasa já enviou
motores de popa, mas não são
suficientes. Enquanto isso, as comunidades
estão sendo atendidas por Agentes de
Saúde Indígena e também
pelo pajés. “Nem mesmo resgates estão
sendo efetuados” diz um profissional que prefere
não ser identificado, por temer represálias.
Com a época de seca, a navegação
nos rios da região torna-se lenta e
é uma tarefa que exige perícia.
Em caso registrado na comunidade de São
Joaquim, próximo à divisa com
a Colômbia, a não-liberação
de uma aeronave para o resgate de uma índia
doente acabou em morte. “Quantos mais terão
que morrer para que a Funasa envie as equipes
pra área?” questionam as lideranças
indígenas da região.
Enquanto isso cerca de 80
profissionais entre médicos, dentistas,
enfermeiros e agentes de saúde aguardam
equipamentos para realizar seus trabalhos
em campo. A previsão do Dsei é
que no final da semana de 12 de março
algumas equipes já possam se deslocar
para as áreas. Parte dos profissionais
demitidos pela Foirn foram recontratados pela
Atesg para manter os serviços de saúde
indígena enquanto o órgão
federal estruturava seu funcionamento como
gestor da saúde indígena na
região. Mas quase quatro meses depois
e o quadro é de incerteza.
Erivaldo Almeida Cruz, diretor
da Foirn, explica que quando o convênio
acabou, a Funasa se responsabilizou pelos
insumos, equipamentos e medicamentos. “Mas
a Funasa não está assumindo
o papel a que se propôs. Ela se comprometeu
e nós acreditamos. O atendimento não
está acontecendo e mesmo as equipes
que foram mantidas em algumas áreas
não dão conta”, diz
André Baniwa, presidente
do Conselho Distrital de Saúde Indígena
do Alto Rio Negro, escreveu um artigo endereçado
ao presidente da República responsabilizando-o
pela situação em que se encontra
a saúde indígena.
O convênio assinado
entre a Fundação e Atesg vale
até março para os profissionais
de nível superior. “A Funasa está
em negociações com a prefeitura
de São Gabriel da Cachoeira que assumirá
a folha de pagamento desses profissionais
a partir daí”, explica Pontes. Já
os de nível técnico continuam
com a Atesg até dezembro de 2007, quando
os convênios costumam ser renovados.
Outro agravante apontado por Pontes é
que o Dsei contava com o apoio das Forças
Armadas, e em fevereiro muitos militares se
foram porque acabou o tempo de permanência
em São Gabriel e os substitutos só
vão chegar em abril. Diante desse quadro,
a morbidade aumentou. “Mas surtos ou epidemias
não ocorreram”, garante Pontes.
A paralisação
dos serviços em campo e a incerteza
das futuras condições de contratação
e de trabalho têm incentivado os profissionais
a buscar emprego em outras instituições,
como dentistas migrando para quadros do Exército
na região, o que reduz ainda mais a
oferta já escassa de profissionais
de nível superior para atendimento
à população aldeada.
Na mitologia indígena,
como a povo Baniwa a qual pertenço,
a desobediência é fator determinante
para o caos e é também responsável
pela mudança de valor. A população
indígena está passando por uma
situação bem difícil
no que se refere ao serviço de saúde
nas comunidades indígenas no Brasil
inteiro. Os índios chegam a seqüestrar
funcionários da Funasa para chamar
a atenção para o fato de que
o modelo vigente não funciona mais,
que é preciso mudança urgente.
Muitas invasões por indígenas
aconteceram nas sedes locais da Funasa no
ano passado e ainda continuam, para brigar
por repasse de recursos para a continuidade
da assistência de saúde às
comunidades indígenas. O que significa
isso? Boa ou má gestão da saúde
indígena? O governo não governa
junto com o povo, o governo é desobediente
e sacrifica os povos indígenas negando
as últimas deliberações
das Conferências nacionais de saúde
indígena que recomendam entre outras,
a implantação de Unidades Gestoras
como novo modelo para avançar na qualidade
de prestação de serviço
com controle social.
No Estado do Amazonas, a
Coordenação Regional tem falado
de mudanças para melhorar a saúde
indígena. Criou condições
inaceitáveis para parceiros não-
governamentais com estratégia para
mudanças. A mudança de um trabalho,
dependendo da condição, pode
significar melhoramento ou “pioramento” no
serviço e na gestão. Depois
da mudança aqui no Rio Negro já
podemos contar mais de 100 dias sem assistência
nas comunidades indígenas. Essa assistência
parou no dia 15 de Novembro de 2006. As comunidades
indígenas são mais de 700, agravando
o sofrimento dos 27 mil indígenas no
Rio Negro. São 25 pólos base.
A dificuldade é claramente vista quando
o chefe do Distrito Rio Negro diz: - “vou
fazer somente o possível, gente!”
Os profissionais que foram
treinados entre 12 e 16 de fevereiro de 2007,
baseados na cidade de São Gabriel da
Cachoeira, mesmo com planejamento e agendas
de viagem, dificilmente cumprirão esta
missão por causa da condição
de viagem (e cobranças podem ocorrer
na reunião do conselho distrital no
período de 5 a 9 de Março de
2007). Porque estão sem motores, sem
voadeiras, carros quebrados e material de
trabalho como equipamentos odontológicos,
de enfermagem e médicos quando existem,
são insuficientes e estão sucateados.
Assim também é a infra-estrutura
precisando de reformas e outras construções
de pólos bases; Os serviços
de enfermagem e odontológicos ficam
muito prejudicados, e as comunidades indígenas
precisam deste serviço. É um
direito que está sendo violado com
isso.
Sabemos que é responsável
por isso, o presidente da República
Luiz Inácio Lula da Silva, porque não
quer mexer na Funasa. A Funasa é responsável
por comprar equipamentos, materiais, e não
está dando certo porque não
está comprando, não está
construindo pólos base e outros não
estão sendo reformados. Saneamento
básico não chega às comunidades
indígenas que mais precisam.
Sem mudança estrutural
a saúde indígena continuará
travada. O senhor Presidente do Brasil precisa
abrir o olho para isso e resolver esse problema
porque ele está omisso em relação
aos direitos humanos e aos direitos indígenas
nacionais e internacionais.
André Fernando
Liderança indígena da Etnia
Baniwa
Presidente do Conselho Distrital de Saúde
Indígena do Alto Rio Negro
+ Mais
Índios queimam
ponte no Alto Rio Negro em protesto contra
morte
08/03/2007 - A ponte da
BR-307 que liga a sede do município
de São Gabriel da Cachoeira a Cucui
povoado localizado na fronteira trinacional
Colômbia Venezuela, Brasil, no Alto
Rio Negro fez a quarta vítima em curto
período de tempo
No dia, 27 de fevereiro
último, quando retornava de São
Gabriel para Cucuí, o índio
baré Valdomiro Pereira da Silva caiu
da ponte, totalmente apodrecida, sobre as
pedras e morreu na hora.
Revoltados com a tragédia
e o descaso das autoridades que não
tomam providências de conservação,
um grupo de índios da localidade ateou
fogo aos "restos" da ponte.
De acordo com lideranças
indígenas da região, a ponte
estava em situação precária
e sem manutenção há dez
anos. Da mesma forma que a estrada, a BR-307.
Vários documentos solicitando providências
foram encaminhados ao comando da 21ª
Companhia de Engenharia e Construção
do Exército (antigo Batalhão
de Engenharia e Construção -
BEC), mas sem sucesso.
A falta de iniciativa para
resolver o problema talvez se explique pela
baixa relação de custo-benefício
que essa estrada apresenta. Para se ter uma
idéia, os 204 km da BR-307, consumiram
dez anos de trabalho do Batalhão de
Engenharia e Construção (1972/1982),
e sua manutenção custava em
2000 cerca de 800 mil reais por ano. Sem contar
que durante o “inverno” (período das
chuvas), entre abril e outubro, a BR fica
parcialmente intransitável.
Na mesma estrada, mas já
na cidade de São Gabriel, outra ponte
em mau estado ameaça pedestres e motoristas.
Trata-se daquela situada no trecho entre a
sede do município e o porto de Camanaus
na beira do Rio Negro, o mais importante da
região e porta de entrada de passageiros
e cargas, no trecho entre Manaus e São
Gabriel. Por ali passam diariamente cerca
de 150 veículos de variados portes.
Há décadas a ponte tem apenas
a base de concreto, e a parte superior é
de madeira deixando visível a fragilidade
e o risco que correm os condutores de veículos
e os pedestres. Ali também aconteceram
vários acidentes seguidos de mortes.
Ao que parece será preciso uma tragédia
de enormes proporções para que
as autoridades tomem as providências
necessárias.