13-03-2007
- São Paulo - Vimos à público
solicitar providências com relação
à falta de definição
de regras claras para liberação
de sementes transgênicas para o uso
comercial. Ao contrário das liberações
restritas para estudo científico –
como tem pautado o trabalho da Comissão
até aqui –, a liberação
para uso comercial pode ter conseqüências
irreversíveis se feita sem os devidos
estudos de impactos e riscos e sem a denifição
de medidas de segurança.
Portanto, é do interesse
público que esse tema seja abordado
da forma mais cuidadosa e transparente possível,
mediante a exigência de estudos e exposição
clara e objetiva dos métodos de avaliação
de risco, medidas de segurança e a
definição de responsabilidade
legais.
A presidência da CTNBio
tem utilizado reiteradas vezes o argumento
da autoridade científica dos membros
como garantia da legitimidade das decisões.
Como cientistas, sabemos que a ciência
preza pela exigência de métodos
e procedimentos claros e, no caso de organismos
vivos, da necessidade de procedimentos éticos
adequados.
No sentido de contribuir
para o esclarecimento da comunidade científica
e atendendo ao interesse público de
promover o acesso a informações
que devem ser de caráter público,
rogamos que a CTNBio responda publicamente
e com clareza as seguintes perguntas:
1 – Quais são os
estudos realizados e referendados pela comunidade
científica para a liberação
de cada espécie de semente transgênica?
2 – Quais são os critérios e
métodos para a avaliação
de uma soliticação?
3 – Quais seriam os tipos de medidas de segurança
indicadas no caso de aprovação?
4 – Quais são as medidas preventivas
a serem adotadas para evitar a contaminação
de cultivares naturais com sementes geneticamente
modificadas?
5 – A quem é atribuída a responsabilidade
legal, no caso de dano ou contaminação
pela liberação das sementes
transgênicas?
6 – Quais são as medidas reparadoras
para o caso de contaminação
involuntária?
7 – Quais são as garantias que a CTNBio
pode dar à população
à respeito do cumprimento das normas
de segurança alimentar (Convenção
de Roma)?
8 – Qual é a responsabilidade de cada
um dos membros da Comissão ou das entidades
que representam, sobre suas decisões?
Ao nosso ver, do ponto de
vista legal, a falta de definição
de regras, procedimentos e responsabilidades
significa uma ameaça de violação
à Declaração de Roma
sobre Segurança Alimentar Mundial,
de 1996, e a Convenção das Nações
Unidas sobre a Diversidade Biológica,
de 1992, das quais o Brasil é signatário.
Por outro lado, há
graves ameaças de violação
de direitos constitucionais consagrados a
saber:
• ao direito à dignidade
da pessoa humana (Art. 1o. inciso III)
• ao princípio da “cooperação
entre os povos para o progresso da humanidade”
que regem as relações internacionais
da República Federativa do Brasil (Art.
4o. inciso IX), devido ao descumprimento dos
tratados nos quais o Brasil é signatário.
• Ao direito à saúde e à
segurança (Art. 6o.)
• Desrespeito aos princípios da ordem
econômica, contidos no caput e incisos
V e VI do Art. 170, a saber:
- A ordem econômica tem como fim assegurar
uma existência digna a todos (caput)
- O princípio da defesa do consumidor
(V)
- O princípio da defesa do meio ambiente,
mediante tratamento diferenciado conforme
o impacto ambiental dos produtos e serviços
e de seus processos de elaboração
e prestação (VI)
Desrespeito ao artigo 225,
que estabelece que:
• Todos têm direito
ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preservá-lo para
as presentes e futuras gerações.
A Constituição
deixa clara ainda que incumbe ao Poder Público
(Art. 225, incisos II, IV e V):
• II – preservar a diversidade
e a integridade do patrimônio genético
do país;
• IV – exigir, na forma da lei, para atividade
potencialmente causadora de significativa
degradação do meio ambiente,
estudo prévio de impacto ambiental,
a que se dará ;
• V – controlar a produção,
a comercialização e o emprego
de técnicas, métodos e substâncias
que comportem risco para a vida, a qualidade
de vida e o meio ambinte.
O artigo 225, o parágrafo
3, estabelece ainda que as condutas e atividades
consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão
os infratores, pessoas físicas ou jurídicas,
a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação
de reparar os danos causados.
Por fim, cabe dizer que
é característico do regime tecnocrata
a impermeabilização do governo
para a tomada de decisões pouco populares.
Ao não se alinhar com os interesses
republicanos, tende-se ao esvaziamento da
função pública e da política,
enfraquecendo severamente a democracia ao
apartar os anseios e demandas da sociedade
civil plenamente apoiadas no Estado de Direito.
Entendemos que o sistema democrático
se pauta pela participação dos
cidadãos nos temas públicos
que os afetam, que devem ser tratados com
transparência, responsabilidade e ética
adequados.
Como professores de Políticas
Públicas da Universidade de São
Paulo (USP), membros da comunidade científica
brasileira e cidadãos de uma sociedade
pautada por valores democráticos e
republicanos, solicitamos uma posição
clara e pública das entidades envolvidas.
Assinam:
Prof. Dr. Alessandro Soares
da Silva
Prof. Dra. Cristiane Kerches
Prof. Dr. Fernando de A Coelho
Prof. Dra. Flávia Mori Sarti Machado
Prof. Dra. Graziela S. Perosa
Prof. Dr. Jaime Crozzati
Prof. Dr. Jorge Alberto S. Machado
Prof. Dr. José Carlos Vaz
Prof. Dr. José Renato de Campos Araújo
Prof. Dr. Manuel Cabral de Castro
Prof. Dr. Marcelo Nerling
Prof. Dra. Maria Cristina Pompa
Prof. Dra. Marta Maria Assumpção
Rodrigues
Prof. Dr. Pablo Ortellado
Prof. Dr. Wagner Iglesias
Prof. Dr. Vivian Urquidi
São Paulo, 13 de
março de 2007
Uma cópia desta carta
está sendo enviada ao Gabinete da Presidência
da República, à Procuradoria
Geral da República do Ministério
Público Federal e às presidências
da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal.
+ Mais
Carta aberta a Lula pede
defesa da biossegurança nacional
12-03-2007 – Brasília
- Presidente recebe apelo de 85 entidades
da sociedade civil e de 87 parlamentares para
que vete duas emendas incluídas na
Medida Provisória 327 - uma que altera
o quórum de votação na
CTNBio e outra que autoriza o uso de algodão
transgênico plantado ilegamente no país.
O presidente Lula recebeu
na última sexta-feira mais um forte
apelo pela biossegurança brasileira.
Uma carta aberta, assinada por 85 entidades
da sociedade civil, 81 deputados federais
e 6 senadores, foi protocolada junto à
Presidência da República. Na
carta, as entidades e parlamentares expressam
sua preocupação com o texto
final da Medida Provisória 327e pedem
que o presidente vete as emendas aprovadas
pelo Senado.
O texto original da MP que
o governo encaminhou ao Congresso Nacional
visava regulamentar o plantio de transgênicos
no entorno de Unidades de Conservação
Ambiental – as chamadas zonas de amortecimento.
No entanto, durante sua tramitação
na Câmara dos Deputados, em dezembro
de 2006, duas emendas foram incluídas:
uma que altera o quórum de votação
da CTNBio para a aprovação de
pedidos de liberação comercial,
e outra que autoriza a utilização
do algodão transgênico plantado
ilegalmente no país. No último
dia 27 de fevereiro, o Senado ratificou a
decisão da Câmara dos Deputados,
acatando as duas emendas inseridas.
“Está claro que o
governo rompeu um acordo com a ministra do
Meio Ambiente ao orientar sua base de apoio,
tanto na Câmara quanto no Senado, a
aprovar as emendas”, disse Gabriel Fernanes,
da AS-PTA, entidade que integra a Campanha
por Um Brasil Livre de Transgênicos.
“Agora o presidente precisará definir
se vai manter seu compromisso com a ministra
ou se vai defender os interesses do agronegócio”.
Na Câmara, PT, PC
do B, PV e PSOL votaram contra as emendas.
Em seu pronunciamento, o então líder
do PT na Câmara, deputado Henrique Fontana,
declarou que o quórum qualificado para
aprovações comerciais na CTNBio
era um avanço da legislação.
No Senado, vários representantes do
PT também foram contra as emendas.
O senador Aloizio Mercadante, por exemplo,
afirmou que autorizar e legalizar o algodão
transgênico, que não teve autorização
da CTNBio, era um erro, porque a própria
Comissão já havia definido que
esse plantio deveria ser destruído.
"As mudanças
no texto original da MP colocam em risco o
meio ambiente, a saúde da população
e a agricultura brasileira”, disse Gabriela
Vuolo, da campanha de engenharia genética
do Greenpeace. “Foi por isso que tantas vozes,
de bases tão diferenciadas, se uniram
para fazer esse apelo ao presidente”.
Além das 85 organizações
da sociedade civil, a carta enviada ao presidente
da República conta com assinaturas
de Deputados de 12 partidos diferentes (PT,
PV, PSOL, PSB, PMDB, PSDB, PTB, PSC, PC do
B, PR, PFL e PDT) e de senadores de 4 partidos
(PT, PC do B, PSOL e PSB) – inclusive da líder
do PT na Casa, senadora Ideli Salvatti. Além
disso, cerca de 7 mil pessoas assinaram a
um apelo virtual lançado pelo Greenpeace
na semana passada, pedindo que o presidente
Lula vete as emendas à MP 327.
O texto encaminhado
pelo Senado à Presidência tem
até o dia 22 de março para ser
sancionado ou vetado.