02
Apr 2007 - Por João Gonçalves
/ Comunicador WWF-Brasil - Santarém,
Pará – Em uma manhã nublada
de terça-feira, três caminhonetes
4x4 deixaram o centro de Santarém rumo
à BR-163. Era bem cedo, um pouco mais
de seis horas, de um dia abafado, ainda que
uma garoa fina insistisse em cair. Um dos
motoristas comentou: “Hoje vai ser um dia
frio”. Mas naquele horário a temperatura
não deveria estar abaixo dos 28°C.
Um dia típico do inverno amazônico.
O grupo, de quinze pessoas,
era formado por jornalistas europeus, membros
do WWF-Brasil e do IPAM (Instituto de Pesquisa
Ambiental da Amazônia) e motoristas.
No bagageiro, equipamentos de filmagem, mochilas
com 1001 utensílios, água e
comida. O almoço seria feito no campo,
já que a viagem duraria o dia todo,
com o objetivo de documentar projetos e comunidades
ao longo dos primeiros – ou últimos
- 100 quilômetros da rodovia Cuiabá-Santarém,
a BR-163.
Logo na saída da
cidade, a placa indicativa da quilometragem
assusta: Brasília 2.910 quilômetros,
São Paulo 3.922 quilômetros e
Porto Alegre 5.045 quilômetros. Capital
mais próxima? Cuiabá 1.1000
quilômetros. Construída nos anos
70, a BR-163 é parte de um programa
de desenvolvimento para a região amazônica,
com o objetivo de ocupar e distribuir terras.
Ligação entre
Cuiabá (MT) a Santarém (PA),
a estrada possui 1.1000 quilômetros
(984 quilômetros no estado do Pará
e 772 quilômetros no estado do Mato
Grosso). Apesar de ter sido finalizada em
1972, 956 quilômetros ainda não
foram pavimentados e mesmo os que já
foram, apresentam trechos em péssimo
estado de conservação. Desde
1998, quando o governo federal anunciou a
pavimentação da rodovia, para
solucionar o escoamento da produção
de soja do centro-oeste do Mato Grosso, foram
antecipados impactos negativos à conservação
ambiental da região. O crescimento
populacional em torno de 6%, principalmente
no sudoeste paraense, acelerou processos de
grilagem e especulação imobiliária.
A conseqüência foi a ocupação
desordenada do território e a exploração
não-sustentável dos recursos
florestais. Estudos referentes a outras rodovias
da Amazônia apontam que os primeiros
50 quilômetros das suas margens concentram
80% do desmatamento da região.
Verificar essas ameaças,
bem como possíveis soluções
de desenvolvimento sustentável, foram
o tema central da viagem pela rodovia. No
trecho próximo a Santarém, o
único asfaltado no estado do Pará,
a BR-163 é margeada, ao lado direito,
pela Floresta Nacional (FloNA) Tapajós.
Decretada em 1974, com uma área aproximada
de 545 mil hectares, a unidade abriga inúmeras
espécies de pássaros e árvores,
tendo como objetivo básico o uso múltiplo
sustentável dos recursos florestais
e a pesquisa científica. A permanência
de população tradicional na
área é permitida e hoje existem
aproximadamente 1900 famílias, divididas
em 29 comunidades e organizadas em 9 associações
comunitárias e uma cooperativa.
Enquanto a margem direita
está protegida pela FloNa Tapajós,
a margem esquerda alterna áreas conservadas
com grandes espaços degradados, seja
por plantação de soja, seja
por grandes áreas de pastagem. E é
neste trecho da viagem que as caminhonetes
precisam parar na beira da BR-163 para dar
espaço para uma boiada de aproximadamente
1.000 cabeças de gado. Quatro boiadeiros
utilizam o pequeno trecho asfaltado da BR-163
para mover o gado de uma fazenda à
outra.
Passada a boiada, a viagem
continua. Antes de acabar o asfalto, as caminhonetes
entram em um dos ramais da rodovia. Estes
são pequenas estradas de terra abertas
ao longo da BR-163, que formam a conhecida
espinha de peixe, criando pontos com altos
índices de desmatamento.
O ramal escolhido termina na sede da empresa
Maflops (Manejo Florestal e Prestação
de Serviços). Iniciativa do empresário
Antonio Abelardo Leite, o empreendimento desenvolve
atividades de exploração madeireira
sustentável em áreas de assentamentos
de reforma agrária na região.
“Pensamos em longo prazo, atuando em áreas
pré-determinadas. Sempre deixamos certa
quantidade de árvores remanescentes,
que serão as futuras árvores
exploradas nos próximos ciclos. Também
mantemos árvores matriz, que geram
sementes para novas árvores que serão
cortadas no terceiro, quarto ciclo de corte”,
explica o empresário, durante o manejo
de uma árvore, citando que é
favorável ao asfaltamento da BR-163
de maneira sustentável.
Depois do almoço
na sede da empresa, a próxima parada
é a Comunidade Santo Antônio.
Uma pequena vila do assentamento de Reforma
Agrária Moju, para qual a Maflops presta
serviço de manejo florestal. Em média
um lote do assentamento, possui 100 hectares,
dessa área 20% pode ser desmatado,
o que normalmente acontece para a construção
da casa, de uma horta familiar ou de um pimental,
os 80% restantes só podem ser utilizados
de maneira sustentável. É nesse
espaço que entra a empresa. “Os meus
80% já foram explorados pela Maflops,
agora eles só podem entrar lá
de novo em 20 anos”, explica Seu Neguinho,
presidente da associação de
moradores locais.
Assentado desde 2001, Neguinho
é natural do Maranhão e veio
ao Pará trabalhar para o garimpo de
ouro na região de Itaituba. “Antes
eu andava de um lado pra outro e não
tinha nada. Hoje eu estou sossegado, tenho
meu terreno, minha casa, minha família
e 2.300 pés de pimenta”, afirma ele,
citando que uma grande pressão para
os assentados são as propostas de compras
dos lotes: “vem gente aqui oferecendo 100
mil reais pelo nosso lote. A gente não
tem informação, então
muito caboclo se ilude e vende. Acham que
é muito dinheiro, que vai resolver
a vida. Mas quando chegam na cidade vêem
que não dá para nada e acabam
passando fome.”
Já são 16
horas, tempo de retornar para Santarém.
A volta acontece por um ramal paralelo ao
anterior, que após quase duas horas
de viagem, alcança um trecho não-asfaltado
da BR-163. A paisagem da estrada de terra
chega a ser bucólica. Não passa
ninguém. Durante trinta minutos na
região, somente um caminhão
de madeira e outro do Exército cruzam
o caminho. Um pouco adiante, sentido Santarém,
o Exército está trabalhando
em obras de melhorias. Apesar da relutância
em conversar com membros de ONG, um dos cabos
envolvidos explica que se trata da construção
de uma galeria fluvial e que as obras de pavimentação
serão intensificadas após o
período de chuvas, em maio.
Entre o asfalto e a terra,
um pouco mais de 100 quilômetros da
BR-163 foram percorridos aquele dia. Já
escuro, no retorno para a cidade, fica a última
citação do Seu Neguinho: “A
Amazônia é uma beleza, mas se
devastarem ainda mais do que já está,
nós vamos sofrer muito por isso, mais
ainda, nossos filhos”.
Projeto Diálogos
O WWF-Brasil atua na área de influência
da BR-163 por meio do Projeto Diálogos,
uma parceria com CDS/UnB (Centro de Desenvolvimento
Sustentável / Universidade de Brasília),
CIRAD (Centro de Cooperação
Internacional em Pesquisa Agronômica
para o Desenvolvimento), ICV (Instituto Centro
Vida) e IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental
da Amazônia), financiado pela União
Européia. O objetivo do projeto é
apoiar o diálogo entre diversos atores
da sociedade, setores público e privado,
tendo em vista a construção
e implementação de políticas
que visem a sustentabilidade social, econômica
e ambiental na área de influencia da
BR-163, na Amazônia Brasileira.
+ Mais
Mais de 150 projetos da
Rede WWF estão disponíveis no
Google Earth
03 Apr 2007 - Quem quiser
conhecer o trabalho da Rede WWF agora conta
com o Google Earth para visualizar o impacto
do trabalho da maior organização
de conservação da natureza do
planeta.
Desde o início de
março, 150 destaques da ação
da Rede WWF no mundo estão destacados
no programa que oferece, gratuitamente, imagens
via satélite de diferentes partes do
mundo.
Por enquanto, o serviço
está disponível apenas em inglês
e é necessário baixar o programa
por meio da página www.earth.google.com.
Quando terminar de baixar o aplicativo, você
acha o WWF procurando no menu Layers >
Featured Content > Global Awareness.
Ao focalizar os projetos,
assinalados pelo famoso Panda do WWF, você
consegue compreender a importância e
a dimensão do desafio da conservação
natureza, além de conhecer a atuação
da instituição em diferentes
áreas.
"Ficamos felizes que
a Rede WWF tenha escolhido o Google Earth
como a plataforma para ilustrar seu incrível
trabalho de conservação da natureza",
afirmou John Harke, diretor dos serviços
Google Earth e Google Maps™."Google Earth
tem mostrado ser uma potente ferramenta para
que seus usários conheçam e
aprendam mais sobre o mundo e os desafios
ambientais"
O Google Earth é
um programa gratuito desenvolvido e distribuído
pelo Google cuja função é
apresentar um modelo tridimensional do globo
terrestre, construído a partir de fotografias
de satélite obtidas em fontes diversas.
Com isso, é possível identificar
cidades, paisagens e até ter uma idéia
das agressões ao meio ambiente, como
o desmatamento e a ocupação
ilegal de terras.