16-04-2007 - São
Paulo - Carta aberta enviada ao ministro da
Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende,
também desaprova decisão do
presidente da CTNBio, Walter Colli, de impedir
organizações da sociedade civil
de assistir à última reunião
da Comissão.
Professores da PUC de São
Paulo divulgaram nesta segunda-feira uma carta
aberta ao ministro Sérgio Rezende,
da Ciência e Tecnologia (MCT), criticando
a postura da Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança (CTNBio)
e de seu presidente, Walter Colli, em relação
à participação da sociedade
civil nas reuniões da Comissão.
Os professores pedem também
que a CTNBio não aprove qualquer liberação
comercial de organismo geneticamente modificado
antes que seja feito um sério debate
público sobre os riscos envolvidos
nessa liberação, de preferência
em uma nova audiência pública.
“Em se tratando da adoção
de tecnologias polêmicas que poderiam
comprometer seriamente a nossa qualidade de
vida e a das futuras gerações,
só um amplo debate público poderia
conferir a legitimidade necessária
às decisões governamentais pertinentes,
não havendo motivo, portanto, para
se subtrair ao escrutínio social e
tomar decisões a portas fechadas”,
afirmam os professores na carta.
Segue abaixo a íntegra
do documento:
CARTA ABERTA AO MINISTRO
DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA
São Paulo, 16 de
abril de 2007
Ao Excelentíssimo
Senhor Ministro
Da Ciência e Tecnologia
Dr. Sérgio Rezende
Senhor Ministro,
Diante dos fatos recentemente
noticiados sobre a Audiência Pública
promovida pela CTNBio no dia 20 de março
para debater sobre uma eminente liberação
de cultivo comercial de milhos transgênicos,
a tumultuada reunião da mesma Comissão
no dia seguinte e tomando conhecimento do
teor da carta enviada por professores da USP
à CTNBio às vésperas
da Audiência Pública, nós,
professores da PUC-SP, atuantes em diferentes
áreas do conhecimento, dirigimo-nos
ao Sr. Ministro para manifestar a nossa insatisfação
quanto ao modo pelo qual a presidência
da CTNBio vem conduzindo o processo deliberativo
desse órgão público,
que desrespeita não só os requisitos
constitucionais de transparência, e
legalidade administrativa, mas também
a , a transparência e o senso de responsabilidade
requeridos na prática científica.
Considerando que muitos
cientistas, bem como um grande leque de entidades
da sociedade civil ligadas à questão
ambiental, à saúde, ao direito
do consumidor, à agricultura ecológica
e familiar, bem como aos povos indígenas
alimentam o temor de que a liberação
comercial de milhos transgênicos implique
em sérios riscos para o meio ambiente,
a saúde, a segurança alimentar
e o patrimônio cultural de povos indígenas
e comunidades tradicionais, esperávamos
que tal decisão só viesse a
ser tomada após cuidadoso exame dos
seus prós e contra, consultando a CTNBio,
a quem a nova Lei de Biossegurança
concedeu poderes plenos para tal, cientistas
de diferentes visões e áreas
do conhecimento, bem como ouvindo e respondendo
às inquietações e questionamentos
da sociedade civil. Em vez disso, no entanto,
a CTNBio:
1. Recusou-se a convocar
uma Audiência Pública para discutir
a liberação comercial dos milhos
transgênicos, procedimento previsto
na Lei de Biossegurança, votando a
maioria dos seus membros contra proposta neste
sentido feita por alguns dos seus conselheiros.
2. Obrigada a realizar a
Audiência Pública por força
de liminar obtida na Justiça Federal
por entidades da sociedade civil, a CTNBio
estabeleceu regras que desfiguravam inteiramente
o seu caráter, pois ao mesmo tempo
que cerceava a livre manifestação
da sociedade civil e o debate científico
ao selecionar arbitrariamente alguns poucos
oradores críticos à sua posição,
proibia os seus próprios conselheiros
de responderem às questões levantadas
em plenário.
3. O presidente da CTNBio
não respondeu à solicitação
enviada com antecedência pela entidade
da sociedade civil Greenpeace, para assistir
à sua reunião mensal – solicitação
feita de acordo ao que prevê a Lei de
Biossegurança, - e chegou a requerer
o emprego de força policial para retirar
os representantes daquela entidade do salão
de reuniões, sendo disso impedido pela
interferência de representante do Ministério
Público. Este representante também
teve que dissuadir o presidente da CTNBio
de transferir a reunião para lugar
secreto, pois isto tornaria a própria
reunião nula. Não querendo deliberar
sobre a liberação comercial
de milhos transgênicos na presença
de representantes da Greenpeace (que apenas
queriam assistir à reunião,
pois a legislação não
lhes permite voz), o Presidente da CTNBio
preferiu suspender a reunião.
4. Em clima de guerra, o
Presidente da CTNBio anuncia medidas para
impedir “a invasão da próxima
reunião, dias 17, 18 e 19 de abril
por totalitários”, enquanto vários
dos seus membros enviam cartas aos jornais
acusando os oponentes de uma liberação
açodada de transgênicos, de estarem
obstruindo e sabotando o funcionamento da
Comissão.
Nós, professores
da PUC-SP, como cientistas de diversas áreas
do saber e como cidadãos, consideramos
que os procedimentos acima relatados, adotados
pela presidência da CTNBio e pela maioria
dos seus membros, são incompatíveis
com a democracia e com uma ciência responsável.
Em se tratando da adoção de
tecnologias polêmicas que poderiam comprometer
seriamente a nossa qualidade de vida e a das
futuras gerações, só
um amplo debate público poderia conferir
a legitimidade necessária às
decisões governamentais pertinentes,
não havendo motivo, portanto, para
se subtrair ao escrutínio social e
tomar decisões a portas fechadas.
Em se tratando de ciência,
além do mais, a é uma condição
sine qua non, pois só aquele conhecimento
que se submete livremente à crítica
– pode pretender tal qualificativo. Chama-nos
a atenção, por isso, que nenhum
daqueles cientistas – sabidamente críticos
à posição majoritária
da CTNBio - tenha sido “selecionado” para
falar durante a mencionada Audiência
Pública. Da mesma forma, é chocante
que os membros da CTNBio tenham sido proibidos
pelo seu Presidente de responder às
questões colocadas pelos oradores durante
a Audiência Pública.
Também repudiamos
a pretensão de alguns dos conselheiros
– inclusive a de seu presidente –de considerar
como ciência apenas aquela área
do conhecimento a que eles estão afeitos,
ou seja a biotecnologia. A biossegurança
requer uma visão multidisciplinar,
na qual se incluem não só diversas
outras disciplinas acadêmicas, mas também
os saberes das comunidades tradicionais e
dos povos indígenas, a quem devemos
todo o saber acumulado sobre a biodiversidade
e sem os quais, não existiriam as indústrias
de biotecnologia.
Finalmente, como cientistas
que somos, consideramos que o cientista não
só tem um compromisso com a busca de
conhecimento, mas com as consequências
deste conhecimento que ele ajuda a construir,
estando preso, portanto, tanto a uma ética
da convicção, quanto a uma ética
da responsabilidade. Por isso, não
compreendemos porque membros da CTNBio se
molestam e se ofendem com a presença
de representantes da sociedade civil em reuniões,
os quais sem direito à voz ou votom,
apenas poderão ouvir as razões
pelas quais aqueles conselheiros deliberarão
a favor ou contra a liberação
comercial de variedades de milho transgênico.
Não é compreensível que
se esconda de cidadãos da República
as razões pelas quais órgãos
públicos deliberam a respeito de medidas
que poderão prejudicar esses mesmos
e outros cidadãos, a não ser
que se queira fugir às suas responsabilidades
públicas e científicas.
Pelas considerações
acima expostas, vimos solicitar ao Exmo. Sr.
Ministro que não permita que a CTNBio
delibere sobre a liberação comercial
de milhos transgênicos antes que se
proceda efetivamente a um sério debate
público sobre os riscos envolvidos
nesta liberação. Para tal, acreditamos
ser necessária a realização
de pelo menos uma outra Audiência Pública,
onde de fato possa haver um debate científico
e não uma sabatina de alguns “eleitos”.
Insistimos também na conveniência
de se autorizar a assistência de reuniões
da CTNBio por parte de entidades e indivíduos
que o solicitem, sempre que o façam
conforme os termos da lei. Não há
melhor forma de um órgão público
obter o respeito dos cidadãos a quem
serve, do que funcionar de forma transparente
e democrática, mostrando a todos a
competência e a seriedade do seu trabalho.
Respeitosamente,
1. Ana Amélia da
Silva – Departamento de Sociologia
2. Ana Maria Trapé Trinca – Departamento
de Psicodinâmica
3. Carmen Junqueira – Departamento de Antropologia
4. Cláudio Gonçalves Couto –
Departamento de Política
5. Dulce Maria Tourinho Baptista – Departamento
de Sociologia
6. Edgard de Assis Carvalho – Departamento
de Antropologia
7. Franklin Winston Goldgrup – Departamento
de Psicodinâmica
8. Gustavo de Oliveira Coelho de Souza – Departamento
de Geografia
9. Leila Blass – Departamento de Sociologia
10. Lúcio Flávio Rodrigues de
Almeida – Departamento de Política
11. Marcos Bernardino de Carvalho – Departamento
de Geografia
12. Maria Carmelita Yazbek – Faculdade de
Serviço Social
13. Maria Margarida Cavalcanti Limena – Departamento
de Sociologia
14. Marlise A. Bassani – Faculdade de Psicologia
15. Marijane Vieira Lisboa – Departamento
de Sociologia
16. Matilde Maria Almeida Melo – Departamento
de Sociologia
17. Maurício Broinizi Pereira – Departamento
de História
18. Mônica Muniz Pinto de Carvalho de
Souza – Departamento de Sociologia
19. Raquel Raichelis Degensajn – Faculdade
de Serviço Social
20. Rinaldo Sérgio Vieira Arruda –
Departamento de Antropologia
21. Vera Lúcia Vieira – Departamento
de História