25/04/2007
- Conectada à internet desde 2004,
escola indígena do Médio Rio
Içana promove a inclusão digital
realizando oficina para ensinar alunos que
nunca tiveram contato com computadores ou
com a internet a utilizar o sistema e as máquinas.
Também promoveu a atualização
no uso da internet entre os professores
Convênio celebrado
entre o ISA e o programa Gesac, do Ministério
das Comunicações (MC), em 2004,
promoveu a inclusão no mundo digital
não apenas dos alunos da escola Pamáali,
no Médio Rio Içana, mas também
da Federação das Organizações
Indígenas do Rio Negro (FOIRN) e da
sede do ISA, em São Gabriel da Cachoeira,
noroeste do Amazonas, com a instalação
de antenas de satélite.
O ponto de presença
Gesac - como é conhecido o projeto
do MC - implantado na escola Pamáali
está estruturado em forma de telecentro
escolar e comunitário, já que
não atende só aos alunos e professores,
mas também equipes de saúde
do Distrito Sanitário Especial Indígena
(DSEI) e comunidades próximas à
escola.
De 9 a 15 de abril, com
assessoria do ISA São Gabriel, aconteceu
uma oficina para treinar aqueles que ainda
não tinham tido essa oportunidade e
ampliar os conhecimentos dos professores com
relação ao uso da internet.
Participaram 40 alunos de duas turmas do ensino
fundamental, com mediação dos
professores. Eles faziam a tradução
do conteúdo para a língua baniwa
para que os alunos pudessem compreender melhor
os temas abordados e auxiliavam a prática
no computador.
Os itens abordados englobaram
desde princípios da informática
básica, história da computação,
até a revolução tecnológica
que criou a rede mundial de computadores,
a internet. Correio eletrônico, redação
de e-mails e pesquisas utilizando programas
de busca foram ensinados. Todos escreveram
e-mails e fizeram pesquisas sobre temas como
meio ambiente, cultura dos povos indígenas
no Brasil, esporte, música e outros.
E as descobertas foram muitas. Durante a oficina,
os alunos também foram apresentados
ao programa Gesac para que entendessem de
que forma a internet chega na escola e para
que ela serve.
O aluno Maurício
Campos, por exemplo, contou que, antes de
ter feito a pesquisa, imaginava que existiam
somente duas culturas no Brasil: a dos índios
e a dos brancos. “Descobri que a cultura do
povo brasileiro na verdade são vários
pedacinhos de outras culturas de povos, como
portugueses, espanhóis, negros, árabes,
italianos, japoneses e nós indígenas
também!”.
Conceitos foram criados
em baniwa
Os conceitos de inclusão
e exclusão social também foram
debatidos, pois a exclusão digital
hoje significa também exclusão
social. E os alunos relataram situações
concretas de seu cotidiano de transição
de exclusão para inclusão social,
revelando a compreensão do tema. O
ponto de presença Gesac na escola foi
citado como exemplo. Antes de 2004, a Pamáali
estava excluída do mundo da internet
e das tecnologias de informação
e comunicação. Hoje a situação
é diferente e a escola já desenvolve
um projeto de inclusão digital.
Os termos técnicos
geralmente em inglês, que fazem parte
da linguagem digital foram rapidamente apreendidos
pelos estudantes que passaram a traduzir os
conceitos para língua baniwa e coripaco.
Por exemplo, o conceito de inclusão
digital para um dos grupos de alunos, quer
dizer na língua em baniwa: “Ihiehe
pheewakawa malikaikha yalanawmai i dzaarokha,
ikatsa khaleka paakeeta phiome heekoapi ikapakanaa
nheette lideenhikanaa. Metsa kametsa kadzoka
lipitanana, makaoña-kanadalikadat sani,
ima neenika nhaa pakaoñanipe”. Tradução:
inclusão digital promove acessos à
comunicação e informação
a comunidades, por meio de tecnologias que
hoje o mundo disponibiliza a todos os povos.
Os conceitos de software
livre e software proprietário também
foram criados na língua baniwa. Além
da oportunidade que tiveram de aprender a
lidar com as máquinas e a conectar-se
à internet, pesquisar e passar a se
comunicar com o mundo, os participantes poderão
repassar os conhecimentos à sua comunidade.
Pontos de presença
O telecentro da Pamáali
passou a funcionar como ferramenta para alunos
e professores desenvolverem suas pesquisas
em bibliotecas virtuais do mundo inteiro,
em sites de busca, em artigos científicos,
instituições de pesquisas parceiras
como o Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas
da Amazônia) e a Fundação
Oswaldo Cruz. Atualmente, alunos e professores
possuem e-mail e cadastro em programas de
comunicação instantâneas,
permitindo que se comuniquem entre si e com
outras pessoas na cidade de São Gabriel
ou com parentes indígenas de outros
municípios e estados. Os computadores
também são usados para digitação
de trabalhos, monografias de conclusão
de curso e ainda documentos internos e externos
referentes à escola.
A única restrição
de uso mais contínuo do telecentro
é a limitação de energia
elétrica. Os computadores são
alimentados por placa solar e gerador à
gasolina. Nos dias de sol, a escola aproveita
bastante os computadores, porém, em
períodos de chuva, o gerador é
ligado, só que em intervalos mais curtos,
pois a gasolina que o alimenta é limitada
e nem sempre a escola possui em grande quantidade.
“A gasolina custa em média R$ 3,50
o litro, a escola não tem condições
de tê-la sempre para sustentar o nosso
gerador”, diz Alfredo Brazão, coordenador
Pamáali. “Nós aqui conseguimos
promover a inclusão digital dentro
do tempo que temos, tanto os alunos como professores
conseguem fazer seus trabalhos, suas pesquisas,
enviar e-mails etc. Aqui temos um objetivo
bem definido do porquê queremos estar
no mundo digital e assim aprendemos a nos
adaptar ao tempo que nos é possível.
Por isso acredito que conseguimos cumprir
com nossa missão junto à filosofia
da Escola e a do Gesac”.
O telecentro da Pamáali
A Pamáali, o ISA
e a FOIRN formam, de acordo com a gestão
do Programa Gesac, pontos de presença
da sociedade civil organizada em São
Gabriel da Cachoeira. Na Escola, a administração
do ponto fica a cargo de Aparecida Rodrigues
que é “ADM 4”, denominação
criada pelo programa para organizar uma rede
de administradores responsáveis pela
gestão dos pontos. Suas funções
compreendem organizar acessos, realizar atividades
e eventos que promovam a inclusão digital
dentro e fora da escola. “Cada vez mais estamos
organizando atividades que envolvem o ponto
de presença. Por exemplo, esta foi
a nossa primeira oficina de inclusão
digital destinada a alunos que ainda não
tinham contato com o mundo digital”. De acordo
com Aparecida, outras atividades estão
previstas tais como cursos de informática
básica, de manutenção
de computadores, oficina de multimeios e outras.
“Temos uma oficina de animação
agendada para o 2º semestre e estamos
planejando outras conforme acertos junto à
Acep e ao interesse dos alunos e professores”.
O telecentro da escola possui hoje três
computadores: um PC, doado pelo Gesac, e ainda
dois laptops comprados com recursos próprios.
O sistema operacional utilizado é GNU/Linux,
na versão Kurumin. O acesso à
internet possui algumas restrições,
como acessar sites que não tenham cunho
educativo ou lazer cultural são expressamente
proibidos pela política de funcionamento
do telecentro. A coordenação
da escola afirma que pretende ampliá-lo,
porém a maior dificuldade é
a compra de outros laptops já que os
PCs consomem muita energia. “Sabemos que o
governo federal pretende adquirir laptops
de baixo custo para uso educativo e cultural.
Também vamos pleitear esses equipamentos
e esperamos que eles [o governo] olhem para
os povos indígenas que, têm sua
proposta de inclusão digital e nos
insira nesses projetos”, afirma o coordenador
da Escola Pamáali.
Alguns dos alunos e professores
usam a internet para se aperfeiçoar.
O professor Juvêncio Cardoso é
um deles. Está matriculado no curso
de cidadania e direitos indígenas,
oferecido gratuitamente por um site chamado
“índios online”. “Por meio desse curso,
aprendi muita coisa sobre nossos direitos.
Além de aprender coisas novas, mantive
contato com outros povos do Brasil que participam
desses cursos, conversávamos via fórum
e trocávamos experiências a respeito
dos acontecimentos nas nossas comunidades
e organizações”, explica.
Website para a escola
A meta futura da escola
é a criação de um website.
Os baniwa e coripaco pretendem apresentar
ao mundo um pouco das atividades da escola
e sua cultura. “Estamos correndo atrás
de financiamento para o nosso site, estamos
animados e discutindo o conteúdo. Queremos
que o site seja um instrumento de divulgação
do que acontece na escola e nas nossas comunidades
e que outras pessoas também entrem
em contato conosco por meio dele”, diz Brazão.
A Escola já divulga ações
por meio da Teia, um site do portal do IDBrasil
e ainda por meio de um blog recém-criado,
durante a Oficina de Inclusão Digital.
A coordenação
da oficina ficou a cargo da jornalista Andreza
Andrade do ISA. “Realizar oficinas de inclusão
digital nas comunidades do Rio Negro faz parte
de uma estratégia estabelecida entre
os pontos de presença Gesac da sociedade
civil organizada em São Gabriel da
Cachoeira”. Ela explica que as oficinas pretendem
incentivar o aprendizado das ferramentas que
as novas tecnologias de informação
oferecem e a comunicação entre
os povos indígenas, para que possam
promover a valorização cultural,
mobilização e promoção
dos seus direitos e cidadania.
Escola Pamáali
A Escola Pamáali
localiza-se no Médio Rio Içana,
próxima da foz do igarapé Pamáali,
considerado lugar sagrado para aqueles povos.
Para chegar até lá são
necessários cerca de um dia e meio
de viagem, porque além da distância,
é preciso ultrapassar fortes corredeiras.
A Pamáali foi criada no ano 2000, quando
após uma grande assembléia,
os povos baniwa e coripaco decidiram organizar
uma escola de acordo com a vivência
nas suas comunidades, que valorizasse a sua
língua e cultura. Crianças,
jovens e adultos de diversas localidades do
Içana e afluentes formam o grupo de
estudantes recebidos na Pamáali. O
ensino é via pesquisa, cada aluno desenvolve
um trabalho de pesquisa relacionado com os
projetos da escola, tais como: piscicultura,
manejo agroflorestal, manejo de lagos, avicultura,
artesanatos, entre outros, ou seja, são
atividades que promovem o desenvolvimento
sustentável das comunidades.