9 de Julho de 2007 - Aline
Bravim - da Agência Brasil - Brasília
- O líder guarani-kaiowá Ortiz
Lopes, 46 anos, foi assassinado ontem (8)
à noite a tiros em Coronel Sapucaia
(MS), município da fronteira com o
Paraguai. Lopes estava à frente do
movimento que pedia o reconhecimento da terra
indígena Kurusu
Amba (correspondente à fazenda Madama,
entre Coronel Sapucaia e Amambai).
Em Kurusu Amba, no início
do ano, já havia sido assassinada outra
líder indígena que participara
da ocupação, Zulita Lopes. Xurete,
como era também conhecida, era líder
espiritual do grupo. Ela foi morta durante
a desocupação forçada
da área.
Segundo nota à imprensa
do Conselho Indigenista Missionário,
Ortiz Lopes vinha sofrendo ameaças
de morte, já havia escapado de um outro
atentado e, ontem, segundo contou sua esposa,
foi morto por um homem que o chamou na porta
de casa, por volta das 18h30.
"Ao perguntar quem
era, a vítima se dirigiu à porta
e foi recebida por tiros. Enquanto disparava
sua arma, o assassino informou: 'Os fazendeiros
mandaram acertar contas com você'",
narra a nota do Cimi.
De acordo com outra liderança
indígena da região, que pede
para não ser identificada devido às
ameaças de morte, os fazendeiros da
região tinham marcado uma reunião
com Ortiz nesta terça-feira (10), para
fecharem acordos relacionados às terras
em questão. "Os fazendeiros ofereceram
R$ 100 mil para que ele não mexesse
nas terras Kurusu Amba. Como o nosso líder
não aceitou, os fazendeiros disseram
a ele que viraria inimigo", conta a testemunha.
O grupo guarani-kaiowá
que reivindica Kurusu Amba está acampado
próximo à aldeia de Taquaperi,
também em Coronel Sapucaia (MS). Segundo
o líder ouvido pela Agência Brasil,
a Fundação Nacional do Índio
(Funai) de Mato Grosso do Sul e grupos de
direitos humanos já prestaram assistência
à família de Ortiz Lopes e aos
índios da região.
"Vamos continuar reivindicando
as terras, porque os fazendeiros fizeram um
acordo conosco que iriam nos entregar as terras
em abril do ano que vem", diz essa liderança.
"Vamos continuar, porque a luta continua.
Eles calaram a nossa liderança, mas
a luta continua."
A Polícia Federal
de Ponta Porã foi procurada, mas ainda
não informou se vai entrar nas investigações
sobre a morte de Ortiz. Segundo o Cimi, quatro
líderes indígenas que participaram
da ocupação em Kurusu Amba no
início do ano seguem presos, sob acusação
de roubo.
Lideranças que participavam
hoje de um encontro em Rio Brilhante (MS)
divulgaram nota expressando "revolta
e tristeza" pelo assassinato de Ortiz.
O evento discute as conseqüências
socioambientais para os Guarani-Kaiowá
dos projetos industriais que prevêem
a instalação de 31 usinas de
açúcar e álcool no Mato
Grosso do Sul nos próximos anos. "Ortiz
morreu lutando, porque não queria ver
seus parentes trabalhando como escravos nas
usinas de álcool – o que acontece com
a maioria dos homens adultos do povo Guarani
Kaiowá", diz a nota.
Os índios que reivindicam Kurusu Amba
procedem da área indígena Taquaperi,
no município de Amambai. A Taquaperi
é uma das oito áreas indígenas
criadas pelo antigo Serviço de Proteção
ao Índio, entre os anos 20 e 30, próximas
às nascentes cidades do sul de Mato
Grosso do Sul. Com a expansão do agronegócio,
nos anos 60 e 70, milhares de índios
Guarani-Kaiowá foram expulsos das áreas
que ocupavam à beira de córregos
da região, nos "fundos de fazendas",
sendo levados para essas áreas, que
ficaram superlotadas.
Desde os anos 80, os Guarani-Kaiowá
tentam retomar as áreas de ocupação
tradicional na região. Com a falta
de terras, pobreza e violência dominaram
as comunidades indígenas. Hoje, os
quase 40 mil Guarani-Kaiowá de MS,
vivendo em cerca de 50 mil hectares de terra,
sofrem com um índice de assassinatos
que é praticamente o dobro da média
brasileira e taxas de suicídios, principalmente
entre os jovens, que estão entre as
mais altas do mundo. Diante da impossibilidade
de organizar uma vida econômica autônoma,
os índios apelam para o trabalho nas
usinas de álcool.
+ Mais
Movimentos pedem investigação
federal do assassinato de líder guarani-kaiowá
13 de Julho de 2007 - Luana
Lourenço - Repórter da Agência
Brasil - Brasília - Uma articulação
de movimentos sociais do Mato Grosso do Sul,
entre eles o Conselho Indigenista Missionário
(Cimi), entregou hoje (13) uma representação
ao Ministério Público Federal
em Mato Grosso do Sul para que o assassinato
do líder indígena guarani-kaiowá
Ortiz Lopes, morto no último domingo,
seja investigado pela Polícia Federal
e não por autoridades locais.
Segundo o representante
do Cimi, Egon Heck, a representação
levada ao MPF é baseada em depoimentos
de Marluce Lopes, viúva de Ortiz, e
de outros líderes guarani-kaiowá,
que relacionam a morte do índio a sua
atuação na luta pela terra indígena
Kurusu Amba. A área corresponde à
fazenda Madama, entre os municípios
de Coronel Sapucaia e Amambai, na região
da fronteira com o Paraguai, e é motivo
de disputa entre índios e fazendeiros.
De acordo com o procurador
do MPF em Dourados Charles Pessoa, se a análise
da representação indicar a relação
do assassinato de Lopes com a disputa pela
terra, a investigação passará
para competência federal. "Quando
há violação do direito
dos índios sobre as terras que ocupam,
a Constituição Federal é
desrespeitada e demanda atuação
de autoridades federais", explica.
Por enquanto, o caso está
sob a responsabilidade da Polícia Civil
do município de Coronel Sapucaia, que
abriu inquérito para investigar o assassinato
e começou a ouvir as testemunhas na
última quinta-feira.
De acordo com o delegado
Claudinei Galinari, a indicação
dos motivos do crime e de possíveis
suspeitos só será feita após
tomada de mais depoimentos e realização
de levantamento em cidades onde o líder
guarani-kaiowá morou recentemente.
Galinari adiantou que a
Polícia Civil pretende trabalhar com
diversas linhas de investigação
e não descartará a hipótese
de crime cometido a mando de fazendeiros da
região pela disputa das terras.
Para o representante do
Cimi, a Polícia Civil não é
a autoridade mais indicada para investigar
o assassinato de Lopes. "Existe um clima
antiindígena articulado pelo poder
político-econômico da região,
e isso pode comprometer a atuação
da polícia local. A Polícia
Federal tem mais isenção, mais
objetividade para apurar o caso, chegar aos
responsáveis e punir os culpados",
afirma.
Heck teme que o assassinato
de mais líder guarani-kaiowá
cause o agravamento da violência entre
índios e fazendeiros da região.
"A comunidade está fragilizada,
o clima está muito tenso, alguns índios
nos disseram que estão desacreditados
da Justiça. Estamos preocupados com
o que pode acontecer daqui para a frente."
Em janeiro, a líder
espiritual Zulita Lopes foi morta na mesa
região durante a ocupação
forçada da área. De acordo com
a Polícia Federal de Ponta Porã,
responsável pelo caso, até hoje
o inquérito não foi enviado
à Justiça porque a investigação
ainda está em andamento.
Além do Cimi, o pedido
de investigação federal é
endossado por entidades como a Central Única
dos Trabalhadores (CUT), o Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra (MST) e a Comissão
Pastoral da Terra (CPT).
+ Mais
Senador faz alerta sobre
operação na Raposa Serra do
Sol, mas Polícia Federal nega
13 de Julho de 2007 - Amada
Mota - Repórter da Agência Brasil
- Manaus - Durante discurso ontem (12) no
Senado Federal, o senador Mozarildo Cavalcanti
(PTB-RR) denunciou o planejamento de uma operação
da Polícia Federal (PF) para retirar
os não-indígenas da Reserva
Raposa Serra do Sol no norte de Roraima. Em
seu discurso, o senador disse ter recebido
de um policial federal um documento que revela
dados do que seria uma verdadeira "operação
de guerra" contra os arrozeiros, pequenos
produtores e alguns pecuaristas que vivem
no local. A Polícia Federal negou que
haja qualquer ação planejada.
Cavalcanti não revelou
o nome do autor da denúncia, mas relatou,
que, segundo o documento, "a Polícia
Federal deverá utilizar um efetivo
de 500 homens, vindos de todas as capitais
brasileiras". "Vejam bem, é
uma operação de guerra, para
a qual terão de deslocar policiais
federais de todo o País, para quê?
Para combater o narcotráfico? Para
combater bandidos? Para combater alguma subversão
da ordem em Roraima? Não, para combater
trabalhadores que estão lá produzindo
e gerando mais de 6.000 empregos diretos e
indiretos", disse.
O senador destacou também
que o documento estabelece cerca de 40 dias
para a operação e prevê
a utilização de veículos
do exército para ocupação
da área, infra-estrutura de acampamento
- como barracas, sacos de dormir, estrutura
para banho, sanitários e higiene pessoal
- e ainda a disponibilização
de um posto de atendimento médico de
emergência local.
Apesar o discurso, o superintendente
da Polícia Federal em Roraima, Cláudio
Lima de Souza, não confirma a informação
e diz que na próxima segunda (16) iniciará
um inquérito policial para investigar
a questão no órgão federal.
Ele garantiu que não existe nenhum
planejamento sobre a suposta operação,
mas que a polícia federal pode entrar
em ação, se houver uma ordem
legal da presidência da república,
por exemplo.
"Desconheço
essa informação. Já mandei
instaurar um inquérito policial para
apurar a veracidade dessa informação
e descobrir que policial federal que tem esse
conhecimento e não passou isso para
mim. Se o nosso diretor-geral, o Ministério
da Justiça ou o presidente da República
determinar a ação da Polícia
Federal, vamos entrar em ação,
mas neste momento não há nenhum
de nossos homens no local para retirar ninguém".
atesta Souza.
A reserva indígena
Raposa Serra do Sol foi homologada pelo governo
federal em 2005. Além dos mais de 18
mil indígenas das etnias Macuxi, Wapixana,
Ingarikó, Taurepang e Patamona, o local
abriga produtores rurais, pecuaristas e até
usinas de arroz. Os confrontos começaram
há dois anos, quando a homologação
da terra indígena determinou a saída
dos moradores não-indios. De acordo
com a Associação dos Arrozeiros
de Roraima, a produção de arroz
na reserva Raposa Serra do Sol é responsável
por 25% do PIB estadual e emprega pelo menos
oito mil pessoas direta e indiretamente. Contudo,
a homologação dá direito
aos índios ao território.