24 de Julho de 2007 - Pedro
Biondi - Enviado especial* - Pedro Biondi/Abr
- Aldeia Ipatse (Parque Indígena do
Xingu) - Integrantes do Coletivo Kuikuro de
Cinema registram a chegada de visitantes
Aldeia Ipatse (Parque
Indígena do Xingu) - “Sorria! Você
está sendo filmado” poderia ser a placa
de boas-vindas da principal aldeia dos Kuikuro.
Cada um que desce do avião monomotor
é capturado por jovens pintados – ou
melhor, pelas lentes deles. Com urucum no
cabelo e tinta de jenipapo no corpo, o grupo
de cineastas/jornalistas comunitários/produtores
de vídeo registra tudo o que acontece
no fim de semana de festa.
Um dos integrantes do Coletivo
Kuikuro de Cinema, Maricá Kuikuro,
25 anos, confirma: a intenção
é mesmo fazer um espelho, colocar do
outro lado os turistas, fotógrafos,
cinegrafistas e jornalistas que desembarcam
com sede de imagens e depoimentos. “A gente
faz já planejado, para pegar a pessoa
desapercebida”, diz. “O repórter [não-índio]
vem, pergunta a todos, desapercebidos. O pessoal
pode gaguejar, não saber responder.”
Enquanto a ala masculina
ou a feminina, às vezes ambas, apresentam-se
nas danças do beija-flor, da coruja,
do martim-pescador ou do papagaio, a equipe
com entrevistador, câmera e sonoplasta
registra tudo munida de filmadoras, escadas
para garantir os melhores ângulos e
microfones do tipo boom, que vão na
ponta de uma haste longa e evitam ruídos
indesejados. Grande parte dos registros culturais
reunidos no recém-inaugurado Centro
de Documentação Kuikuro foi
gravada pelo coletivo de audiovisual. Eles
também captam a movimentação
da imprensa na praça central da aldeia.
Até o cacique visitante
Kuiusi, dos Suyá, porta um gravador
para registrar os cantos e os sons das flautas
e percussões, assim como o chacoalho
dos guizos metálicos nos tornozelos,
que acompanham a poeira vermelha levantada
pelos pés descalços.
Pelo coletivo dos jovens,
Jairão (ou Mahajugi) Kuikuro, 20 anos,
leva uma prancheta com uma lista de perguntas
em português aos participantes. Em pleno
afã jornalístico, indaga às
pessoas se elas têm medo de que a cultura
da etnia se esvaia. “A maioria responde que
não”, diz. Depois de uma breve entrevista,
pede licença: “Eu preciso trabalhar”.
Nas produções
kuikuro exibidas no último sábado
(21), os cineastas mesclam narrativas tradicionais,
humor, ficção e referências
a pessoas da comunidade. Um dos diretores,
Maricá, é filho do chefe Tabata.
Ele aparecia, pouco mais que um bebê,
na série Xingu – A Terra Mágica,
gravada em 1984, aprendendo a pescar com flecha.
Na nova série do jornalista Washington
Novaes, que tem como subtítulo A Terra
Ameaçada, o jovem índio foi
assistente de câmera. O irmão
de Jairão, Takumã, dividiu com
Maricá a direção de Imbé
Gikegü – Cheiro de Pequi e Nguné
Elü – O Dia em que a Lua Menstruou.
O DVD com os dois trabalhos,
lançado no último domingo (22),
resulta de parceria entre a Vídeo nas
Aldeias, a Associação Indígena
Kuikuro do Alto Xingu (Aikax) e o projeto
Documenta Kuikuro. É o primeiro da
coleção Cineastas Indígenas.
Para as pessoas filmadas
que tinham esperança de que o material
ficasse só no arquivo, informa Maricá
Kuikuro: os vídeos serão editados
e distribuídos para cada aldeia do
Alto Xingu.