23 de Setembro de 2007 -
Sabrina Craide - Repórter da Agência
Brasil - Brasília - Um dos pontos que
devem gerar polêmica na Política
Nacional de Resíduos Sólidos,
encaminhada pelo governo federal ao Congresso
Nacional, trata da importação
de pneus usados para
serem recauchutados no Brasil. O secretário
de Recursos Hídricos e Ambientes Urbanos
do Ministério do Meio Ambiente (MMA),
Luciano Zica, explica que a proposta não
especifica os produtos cuja importação
será proibida, mas defende que os pneus
entrem nessa lista .
“Nós já temos
42 milhões de pneus usados por ano
para tratar aqui no Brasil. Se fosse bom importar
pneus, a Europa, ao invés de exportar
pagando caro para tirar os pneus de lá,
estaria importando”, argumenta. Para Zica,
o pneu é danoso ao meio ambiente e
à saúde, e cada país
deve cuidar dos resíduos que gera.
“Nós já temos os nossos para
cuidar, não temos que querer cuidar
dos outros.”
O artigo 30 do projeto encaminhado
pelo governo diz que será proibida
a importação de resíduos
sólidos e rejeitos cujas características
causem danos ao meio ambiente e à saúde
pública, ainda que para tratamento,
reforma, reúso, reutilização
ou recuperação. Segundo Zica,
caberá aos órgãos técnicos
dos ministérios a definição
de quais produtos poderão ou não
ser importados.
“Se for provado que o pneu
não é danoso ao meio ambiente
e à saúde, ele poderá
ser importado. Agora, na minha opinião,
o pneu faz mal e vou trabalhar para que seja
proibida a importação”, comenta
Zica.
Para o presidente da Associação
Brasileira da Indústria de Pneus Remoldados
(Abip), Francisco Simeão, o projeto
do governo é considerado “natimorto”,
ou seja, já nasce morto. Ele diz que
a proposta é um retrocesso, pois não
traz as soluções de que o Brasil
precisa. Simeão avalia que o projeto
será rejeitado no Congresso, pois é
“frágil” e não traz novidades
em relação a propostas analisadas
anteriormente. De acordo com a Abip, no ano
passado foram importados 7,1 milhões
de pneus usados.
Simeão diz ainda
que existe um preconceito contra os pneus
usados importados. “A recauchutagem de pneus
usados gera quatro empregos para cada um gerado
na robotizada indústria de pneus novos,
que não cumpre as suas obrigações
ambientais.” E reclama do que chama de “luta
de mercado”, ou seja, a resistência
das indústrias de pneus novos.
“Os pneus remoldados que
produzimos a partir da matéria-prima
importada são vendidos ao consumidor
com garantia de cinco anos, são aprovados
e atestados pelo Inmetro com a mesma durabilidade
e segurança dos pneus novos, e são
vendidos 40% mais baratos. Portanto, é
uma massa crítica insuportável
para os fabricantes de pneus novos, que tiveram
de baixar os preços”, afirma. Segundo
Simeão, os pneus novos mais populares
são vendidos por cerca de R$ 200, enquanto
os remoldados custam em média R$ 120.
Francisco Simeão
afirma que não é possível
recauchutar os pneus fabricados no Brasil.
Segundo ele, além da qualidade inferior
dos produtos, as estradas brasileiras são
ruins e os usuários têm pouco
cuidado com os pneus. Enquanto isso, diz ele,
os pneus fabricados na Europa, por exemplo,
têm estrutura mais forte, as estradas
são melhores e os usuários são
mais cuidadosos.
Apesar de acreditar que
a proposta não será aprovada
no Congresso, Simeão faz uma projeção
para o cenário brasileiro, caso seja
proibida a importação de pneus.
“As fábricas brasileiras, que hoje
empregam 10 mil pessoas, iriam para países
do Mercosul, como Uruguai e Paraguai, e lá,
de forma livre, importariam as carcaças
de pneus usados e exportariam os pneus remoldados
para o Brasil, uma vez que já existe
uma decisão do Mercosul pela qual o
Brasil é obrigado a receber pneus remoldados
dos países do bloco”, afirma.
Para o empresário
e ex-deputado Emerson Kapaz, que foi o relator
da Comissão Especial de Resíduos
Sólidos da Câmara dos Deputados,
“é hora de comprar essa briga de uma
vez por todas”. Ele reconhece que as pressões
contra a tentativa de impedir a importação
de pneus usados são fortes, mas diz
que a proposta tem que ser aprovada. “É
preciso muito cuidado, porque o lobby dos
importadores de carcaças de pneus usados
para recauchutagem é muito forte, ele
tem tentáculos em todos os partidos”,
afirma.
A importação
de pneus usados vem motivando uma batalha
judicial nos últimos anos. No ano passado,
a Presidência da República, por
meio da Advocacia Geral da União (AGU),
ingressou com um questionamento no Supremo
Tribunal Federal (STF) contra decisões
em todo o país que autorizaram a importação
de pneus usados. Segundo a AGU, desde 1991
diversas portarias e decretos foram editados
para proibir essa importação,
mas uma série de decisões judiciais
vem autorizando a entrada dos pneus usados
no país. A questão continua
em análise, sem previsão de
conclusão, no tribunal.
Além disso, o Brasil
venceu uma disputa sobre o assunto, contra
a União Européia (UE), na Organização
Mundial do Comércio (OMC). Com isso,
foi autorizado a manter o veto ao ingresso
desse tipo de material.