Cacique Raoni entrega ao
presidente Lula carta contra a mineração
em TIs e pela demarcação
da TI Kapôt Nhinore (PA)
12/11/2007 - A carta foi
entregue em 7/11 pelo cacique Kaiapó
Raoni, durante cerimônia em Belo Horizonte
(MG), na qual ele recebeu prêmio do
Ministério da Cultura
O documento que Raoni entregou
ao Presidente da República resume a
preocupação de alguns povos
indígenas como Mebengôkre (Kaiapó),
Panará, Yudjá e Tapajuna, que
o elaboraram durante curso de formação
de professores na aldeia Piaruçu. Na
carta, eles escrevem que não querem
a construção de hidrelétricas
em suas terras, não querem mineração
e pedem a demarcação da Terra
Kapõt Nhinore, do povo Kaiapó,
em identificação desde 2004,
situada no Pará. Leia a carta na íntegra.
Aldeia Piaraçu, 03
de novembro de 2007.
Ao Presidente da República
do Brasil Luís Inácio da Silva
–Lula
C/c para:Tarso Genro – Ministro
da Justiça
Márcio Meira – Presidente
da Funai
Nós estamos muito preocupados com o
futuro dos nossos povos.
Queremos a demarcação
do Kapôt Nhinore nesse ano. Há
muito tempo estamos lutando pela demarcação,
porque essa terra é sagrada e muito
importante para o nosso povo Meb?ngôkre.
Todos os anos os pescadores e fazendeiros
estão invadindo e destruindo nossos
recursos naturais e locais sagrados dentro
do Kapôt Nhinore.
Além disso, sabemos
que o seu Governo quer construir seis usinas
hidrelétricas no rio Xingu e outras
em seus afluentes, como no Tepwatinhõngô,
que os brancos chamam de Jarina. Nós
não vamos deixar construir essas usinas
hidrelétricas que vão destruir
nossos territórios, os nossos recursos
naturais e a vida dos nossos povos.
Queremos a Funai fortalecida,
recebendo e administrando todos os recursos
que existem para os povos indígenas
que estão espalhados em vários
ministérios e órgãos
governamentais. Não aceitamos a estadualização
e municipalização da saúde
e educação indígenas.
Cada povo vai decidir como os recursos serão
repassados e administrados para o atendimento
de suas comunidades.
Não aceitamos a mineração
em terras indígenas e principalmente
sem autorização da comunidade
indígena. Não queremos a entrada
de mineradores, garimpeiros, madeireiros,
pescadores e qualquer tipo de invasores em
nossos territórios.
Queremos que os direitos
indígenas conquistados na Constituição
de 1988 sejam respeitados.
Presidente Lula, o Governo
Brasileiro precisa respeitar e proteger os
povos indígenas.
Assinam a carta:
Terra Indígena Kapoto
–Jarina:
Aldeia M?tyktire:
Raoni M?tyktire
Karupi M?tyktire
Iodji M?tyktire
Pekãn M?tyktire
Beptok M?tyktire
Nokere Tapajuna
Jabuti M?tyktire
Aldeia Kremoro (Kapôt):
Patoit M?tyktire
Mokuka M?tyktire
Yteí M?tyktire
Bekà M?tyktire
Ngôkontkaire M?tyktire
Tõtire M?tyktire
Mojkara M?tyktire
Aldeia Krumare:
Bàka-ê M?tyktire
Aldeia K?npo:
Porekrô M?tyktire
Kiabjêti M?tyktire
Aldeia Piaraçu:
Bedjai M?tyktire
Meybã M?tyktire
Pichanhã Juruna
Terra Indígena Xingu
Aldeia Tuba-Tuba:
Tinini Juruna
Karandindi Juruna
Aldeia Pakisamba:
Nhãnhã Juruna
Terra Indígena M?krangôtire
Aldeia Angô’ã
pari:
Krange M?krangôtire
Aldeia Kamêrêkàkôp:
Karàkra M?krangôtire
Pidjôbãrã M?krangôtire
Aldeia Kororoti:
Nikàjti M?krangôtire
Xik M?krangôtire
Betoti M?krangôtire
Bekôre M?krangôtire
Aldeia Kub?kàkre:
Kadjure Kaiapó
Ima Kaiapó
Màdmari Kaiapó
Nhàkêt Kaiapó
Ytumti Kaiapó
Aldeia Pykany:
Bekrê Kaiapó
Wakõtire Kaiapó
Aldeia Kendjam:
Pykatire Kaiapó
Môpdjô Kaiapó
Kàprõt Kaiapó
Bepngri Kaiapó
Terra Indígena Kaiapó
Aldeia Kriny:
Kanhõk Kaiapó
Tôdkrã Kaiapó
Ngôtyk Kaiapó
Ire-ô Kaiapó
Mikin Kaiapó
Aldeia Gorotire:
Amjôti Kaiapó
Môj-y Kaiapó
Aldeia Kikretum:
Koãtoro Kaiapó
Bebajti Kaiapó
Aldeia Kokraimoro:
Kenti Kaiapó
Kôkti Kaiapó
Nepnoi Kaiapó
Banka-ê Kaiapó
Braire Kaiapó
Aldeia Pykararakre:
Kaixokai Kaiapó
Kadjaitnhõrõ Kaiapó
Aldeia Kubekrankêj:
Paijtyk Kaiapó
Ykakôro Kaiapó
Rotkaire Kaiapó
Aldeia Tekrejarotire:
Parityk Kaiapó
Aldeia Mojkairaik:
Bemoti Kaiapó
Kaijkware Kaiapó
Oro Kaiapó
Aldeia Àykre:
Krwyite Kaiapó
Ômre Kaiapó
Aldeia Kawatxi:
Aikjabôrô Kaiapó
Aldeia Krãjaipari:
Pangrai Kaiapó
Bekwyika Kaiapó
Aldeia Pururu:
Kub?-i Kaiapó
Terra Indígena Panara
Aldeia Nãsepotiti:
Perankô Panara
Kupêri Panara
Akâ Panara
Teseia Panara
Kretoma Panara
Pâtikâ Panara
Tukokian Panara
Sykia Panara
Assinam também a
carta:
30 professores M?tyktire
e Mekrangôtire
10 professores Panara
3 professores Tapajuna
3 professores Juruna (Yudja)
+ Mais
Morre Jorge Terena, líder
indígena e sociólogo
12/11/2007 - Liderança
indígena respeitada no Brasil e no
exterior, Jorge morreu na última sexta-feira
em Manaus, vítima de um acidente vascular
cardíaco. Formado em sociologia nos
Estados Unidos e uma das principais lideranças
indígenas do Brasil, foi velado e enterrado
na Terra Indígena Aldeinha, do povo
Terena, no Mato Grosso do Sul.
O líder indígena
Jorge Terena, 53 anos, faleceu sábado,
em Manaus, no Hospital Santa Júlia,
em onde estava internado, vítima de
um acidente cardiovascular. Uma das principais
lideranças indígenas do Brasil,
ele coordenou o departamento etnoambiental
da Coordenação das Organizações
Indígenas da Amazônia Brasileira
(Coiab) e atualmente era consultor da The
Nature Conservancy (TNC). Foi um dos signatários
da Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho, que deu aos índios
cortadores de cana-de-açúcar
do Mato Grosso do Sul os direitos da Consolidação
das Leis do Trabalho. Depois de homenageado
e velado em Manaus, seguiu para Mato Grosso
do Sul, onde foi velado e enterrado na TI
Aldeinha, onde nasceu.
+ Mais
Índio com diploma
não é índio?
31/8/2006 - Jorge Terena
- Revista Galileu - Brasil
Algumas pessoas ainda acham
estranho um índio ter bacharelado,
mestrado e doutorado, mas muitos deles já
são formados em áreas como história,
direito, ciências sociais, engenharia,
pedagogia e outras. A maioria dos que conseguiram
essa formação não tiveram
ajuda do governo para tal, e continuam não
tendo.
Os estudantes indígenas
às vezes passam por dificuldade nas
cidades, mas por compromisso com suas comunidades
insistem em adquirir ferramentas científicas
e tecnológicas. Isso os permite discutir
de igual para igual com os governos um planejamento
de políticas públicas indígenas
condizente com a realidade. Mas por que tanta
dificuldade para ajudar um pequeno número
de indígenas a concluir os estudos?
Índio não precisa estudar?
Há 20 anos, o governo
militar achava que lugar de índio era
só na aldeia e queria mandar os estudantes
indígenas de Brasília de volta
para casa. Na época, os alunos adotaram
uma frase de protesto: "Posso ser o que
você é sem deixar de ser o que
sou!". Contudo, a visão de que
o índio que sai da aldeia abandona
a própria cultura ainda persiste como
preconceito. Ele não pode ter diploma
e continuar sendo índio?
As escolas indígenas
têm várias faces hoje. Podem
ser mera imposição de modelos
educacionais ou podem adotar métodos
que não desprezam o pluralismo e a
identidade cultural dos povos. Por isso é
preciso fazer uma distinção
entre educação indígena
e a educação escolar indígena.
A educação
indígena é o processo com que
cada povo transmite conhecimento (em língua
nativa) para garantir a sobrevivência
e a reprodução cultural. Não
é uma educação dentro
de quatro paredes como todos estão
acostumados, mas uma educação
cotidiana. Quando um pai indígena leva
o filho para caçar ou coletar material
de artesanato, a criança passa por
um processo de transmissão cultural
de valores, história e crenças.
Já a educação
escolar indígena deve congregar tanto
o conhecimento tradicional dos povos quanto
a cultura técnica e científica
da sociedade brasileira como um todo. Um choque
entre as educações escolar e
indígena se deu por conta da existência
de concepções de mundo diferentes.
A educação
escolar seguia modelos dominantes, num incentivo
à acumulação de bens,
à competição e ao individualismo,
contrária aos processos pedagógicos
dos povos indígenas, que enfatizam
diferentes formas de organização
social. Mas a educação escolar
indígena deve servir como um instrumento
a serviço da autonomia de cada povo,
que deve decidir o que é uma escola
verdadeiramente indígena. É
difícil para o Ministério da
Educação integrar ações
de ensino indígena nos três níveis
de aprendizado. Se a educação
escolar indígena ainda é capenga,
imagine a superior. Existem algumas poucas
experiências em universidades com licenciaturas
específicas para atender à demanda
de estudantes indígenas por cursos
superiores. Mas será que estes cursos
podem ajudar a solucionar os problemas enfrentados
pelos povos no cotidiano?
Como os índios têm
dificuldades para ingressar em universidades
públicas, eles estão buscando
o ensino particular, e a Funai não
dispõe de verba para atender à
demanda. Só um sistema integrado de
educação escolar indígena,
desde a educação básica
até a superior, poderá garantir
os princípios da especificidade, diferenciação
e autonomia, que respeite a diversidade cultural,
lingüística e as pedagogias próprias
dos povos indígenas.
Jorge Terena é sociólogo
formado pela Universidade de Maryland (EUA),
integrante do povo Terena (MS) e consultor
etnoambiental da Coiab (Coordenação
das Organizações Indígenas
da Amazônia Brasileira)