Energia nuclear livre de
emissões de CO2? Muito pelo
contrário
26 de Novembro de 2007 -
Relatório "Cortina de Fumaça:
Emissões de CO2 e outros impactos da
energia nuclear", do Greenpeace, desmente
a tese de que usinas atômicas são
'limpas' e contribuem no combate ao aquecimento
global.
Nos últimos tempos
virou moda dizer que a solução
para o aquecimento global é promover
a geração de energia por usinas
nucleares. Elas seriam, segundo seus defensores,
livres de emissões de gases do efeito
estufa e assim poderiam ajudar no combate
às mudanças climáticas.
Balela. As usinas atômicas podem até
ser menos poluentes do que usinas a carvão
mineral ou óleo combustível,
mas Angra 3 por exemplo tem um índice
de emissões indiretas de gás
carbônico (CO2) cinco vezes mais alto
do que a energia solar fotovoltáica
(solar) e eólica.
Os dados constam do novo
relatório do Greenpeace intitulado
Cortina de Fumaça: emissões
de CO2 e outros impactos da energia nuclear,
que foi lançado nesta segunda-feira
no Rio de Janeiro durante audiência
pública do processo de licenciamento
ambiental de Angra 3, realizada no Centro
de Convenções Cidade Nova. Ativistas
do Greenpeace protestaram no local, com latões
amarelos simulando tonéis de lixo nuclear
e uma faixa com a mensagem: "Angra 3
= lixo nuclear".
Para calcular as emissões
de CO2 de Angra 3, o Greenpeace analisou o
ciclo completo da energia nuclear no Brasil,
considerando as seguintes etapas: extração
de minério de urânio, fabricação
de combustível nuclear, transporte
de combustível, construção
da infra-estrutura da usina, gerenciamento
de rejeitos radioativos e descomissionamento
da usina ao fim de sua vida útil.
De acordo com o estudo,
as emissões de CO2 de Angra 3 comprovam
a ineficácia da energia nuclear na
mitigação das mudanças
climáticas e mostram que investir nesta
opção energética é
um desvio caro e perigoso no combate ao aquecimento
global. O documento “Cortina de Fumaça”
também detalha os outros impactos ambientais
da energia nuclear, especialmente o lixo radioativo,
problema que continua sem solução
em todo o mundo, e o histórico brasileiro
de insegurança nuclear.
“Para reduzir sua participação
nas mudanças climáticas, o Brasil
deveria investir os mais de R$ 7 bilhões
necessários para construir Angra 3
no combate aos 75% de emissões nacionais
de gases do efeito estufa provenientes do
desmatamento e do uso do solo”, afirma Rebeca
Lerer, coordenadora da campanha de energia
do Greenpeace. “Aliás, R$ 7 bilhões
é o valor inicialmente estimado por
nove ONGs sociais e ambientais e um grupo
de economistas na proposta para zerar o desmatamento
da Amazônia até 2015”.
Do ponto de vista energético,
o engenheiro elétrico Ricardo Baitelo,
autor do estudo “Cortina de Fumaça”,
comenta que o Brasil dispõe de tecnologia
e fartos recursos renováveis que inviabilizam
a energia nuclear em todos os aspectos.
Para o especialista do Greenpeace,
ao se considerar custos, subsídios,
longos períodos de construção,
riscos de acidentes e questões de segurança
inerentes à geração nuclear,
chega-se à conclusão de que
existem alternativas mais baratas, eficientes
e seguras para atender à crescente
demanda por energia e proporcionar o desenvolvimento
econômico e social do país.
“Com os mais de R$ 7 bilhões
previstos para Angra 3, seria possível,
por exemplo, construir um parque eólico
com o dobro da capacidade da usina nuclear,
que é de apenas 1350 MW, sem gerar
lixo tóxico e sem o risco de acidentes.
O governo Lula poderia ainda buscar inspiração
no Programa Nacional de Conservação
de Energia Elétrica (Procel), que com
apenas 12% do investimento de Angra 3 (ou
R$ 850 milhões), economizou 5.124 MW,
ou quatro vezes a capacidade da usina nuclear”,
explica Baitelo.
“Passados mais de 30 anos
da decisão do governo militar de construir
a terceira usina nuclear brasileira, Angra
3 é um projeto marcado pelo atraso,
pela ilegalidade, pelos altos riscos e por
objetivos militares velados”, afirma Rebeca
Lerer, do Greenpeace. Para ela, a situação
se agravou com as declarações
feitas recentemente pelo ministro da defesa,
Nelson Jobim. Ao participar de evento sobre
segurança nacional, Jobim deixou transparecer
interesses militares por trás da recente
retomada do Programa Nuclear Brasileiro (PNB).
“Pode até soar absurdo, mas o uso militar
da tecnologia nuclear parece ser uma explicação
lógica para a decisão do governo
Lula de ressuscitar o PNB, começando
com o investimento bilionário de recursos
públicos no dinossauro radioativo Angra
3”.
Além de expor os
impactos ambientais de Angra 3, o Greenpeace
está questionando a legalidade da usina
na justiça com base em parecer escrito
pelo jurista José Afonso da Silva.
+ Mais
Comissão de Meio
Ambiente faz pressão contra Angra 3
30 de Novembro de 2007 -
Brasília (DF), Brasil — Requerimento
do Deputado Edson Duarte ao presidente do
Tribunal de Contas da União é
aceito e endossado pelos membros da Comissão.
A Comissão de Meio
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
da Câmara dos Deputados encaminhará
ao presidente do Tribunal de Contas da União
solicitação para que se manifeste
sobre a construção da usina
nuclear Angra 3. A solicitação
baseia-se nos termos da Representação
elaborada pelo Deputado Edson Duarte (PV/BA)
perante o TCU, com assessoria técnica
do Greenpeace, requerendo a paralisação
de quaisquer atos de construção
da usina, porque baseada em Decreto presidencial
de 1975, revogado desde 1991.
A determinação
de construção da usina Angra
3 não padece apenas de falta de um
ato do Executivo que lhe dê fundamento,
mas viola a determinação constitucional
de que qualquer assunto que trate sobre energia
nuclear no Brasil deverá necessariamente
passar pelo Congresso Nacional, a quem caberá
dar a última palavra sobre o assunto.
A solicitação
da Comissão de Meio Ambiente questiona,
por fim, a continuidade da contratação
da empresa Andrade Gutierrez para a execução
das obras, uma vez que a licitação
da qual foi vencedora ocorreu há mais
de vinte anos, e porque Angra 3 é obra
nova, para a qual deverá haver nova
licitação.
O Greenpeace e o Partido
Verde tomaram uma série de medidas
judiciais contra a construção
da usina, todas elas baseadas em parecer do
professor e jurista José Afonso da
Silva e na ilegalidade da empreitada.
“É preciso que o
presidente Lula respeite a Constituição
Federal e o Estado Democrático de direito.
Caso insista na construção de
Angra 3, Lula terá que assumir o ônus
de ser o primeiro presidente democrático
a ressuscitar o programa nuclear brasileiro”,
afirmou a coordenadora da campanha antinuclear
do Greenpeace, Beatriz Carvalho.
+ Mais
Artigo do Greenpeace sobre
a aventura nuclear brasileira é publicado
na Folha de S. Paulo
28 de Novembro de 2007 -
Publicamos artigo na edição
desta quarta-feira do jornal Folha de S. Paulo
sobre o fantasma nuclear que volta a assombrar
o Brasil com força total. Confira abaixo:
Atenção ao
uso da energia nuclear
Frank Guggenheim e Beatriz
Carvalho G. Santos
O atual governo federal
segue a tendência histórica de
tratar a questão nuclear com a aura
do segredo
Desde a construção
da primeira usina nuclear do mundo nos anos
50, existe uma polêmica quanto à
necessidade e os riscos desse tipo de energia.
Nesse meio século desde então,
os argumentos a favor e contra essa tecnologia
não se renovaram, assim como não
se renovou a tecnologia utilizada.
No Brasil, a tecnologia
nuclear foi importada dos Estados Unidos e
da Alemanha durante a ditadura militar por
um governo autoritário, que não
se prestava a dar maiores informações
à população quanto aos
verdadeiros propósitos da corrida pelo
domínio da tecnologia atômica.
Na metade deste ano, o governo
do presidente Lula anunciou oficialmente a
retomada do programa nuclear brasileiro, por
meio da determinação de construção
da usina nuclear Angra 3. Até a semana
passada, os argumentos oficiais passavam pela
necessidade de diversificação
da matriz energética e do desenvolvimento
tecnológico brasileiro, além
da pungente necessidade de uma energia "limpa"
para mitigar os efeitos do aquecimento global,
propósito para o qual a geração
nuclear seria eficiente.
Os quase R$ 8 bilhões
de investimentos necessários para a
construção da usina, os sete
anos que se irão transcorrer até
que ela entre em funcionamento, a gravidade
e as extensões no tempo e no espaço
de um acidente nuclear, a falta de solução
definitiva para o armazenamento do lixo radioativo,
o fato de a maioria dos produtores históricos
de energia nuclear ter congelado a construção
de novas usinas e estar em processo de descomissionamento
das que já possuem, nada disso entrou
na conta de contras que pudessem demover o
governo de se lançar nessa aventura.
No entanto, a exploração
da energia atômica sempre serviu a um
propósito menos honroso e infinitamente
menos popular do que a mera geração
de eletricidade: a fabricação
e o uso militar de armas atômicas.
Segundo Robert Oppenheimer,
físico norte-americano que chefiou
o projeto Manhattan para a construção
das bombas lançadas sobre Hiroshima
e Nagasaki, "quem disser que existe uma
energia atômica para a paz e outra para
a guerra está mentindo", não
fazendo questão de esconder que exatamente
a mesma técnica pode ser usada tanto
para gerar energia quanto para fabricar a
bomba.
Há alguns dias, fomos
brindados com uma nova linha de argumentação
em defesa do uso de energia nuclear no Brasil,
agora apontando para a direção
que sempre, em uníssono, negaram os
assessores do nosso presidente. A energia
nuclear deverá ser empregada para fins
militares, foi a mensagem que se pôde
destacar da fala do ministro Nelson Jobim
durante a quarta Conferência Internacional
do Forte de Copacabana.
Segundo o ministro, porque
o Brasil possui uma grande reserva de petróleo,
deverá utilizar-se de um submarino
nuclear que faça a sua proteção
contra possíveis ataques externos,
inclusive terroristas. Seguiu-se a essa declaração
outra, a de que o aditivo ao Tratado de Não-Proliferação
Nuclear deverá ser visto com reservas,
uma vez que cria maiores mecanismos de controle
sobre o uso da energia nuclear pelos países
signatários.
O atual governo segue a
tendência histórica de tratar
a questão nuclear com a aura do segredo,
por meio de declarações eufêmicas
que ora descartam, ora sugerem o uso militar
da energia atômica.
Não nos esqueçamos
de que foi o atual presidente da Eletronuclear,
o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva,
quem comandou um programa nuclear paralelo,
iniciado em segredo durante a ditadura militar
e assim mantido até que a mídia
passou a divulgar a informação
de que estava em andamento um programa nuclear
com finalidades exclusivamente militares.
É fundamental que
a população esteja alerta e
ouça com atenção o que
está -e principalmente o que não
está- sendo dito nas declarações
oficiais do governo Lula. Sempre haverá
a possibilidade de que novos motivos, esperados
ou não, possam justificar uma nova
mudança no discurso e o acionamento
das nossas instalações nucleares
em nome da segurança nacional.
Frank Guggenheim, médico
doutor em imunologia, é diretor-executivo
do Greenpeace Brasil. Foi diretor da divisão
farmacêutica da indústria Roche,
onde atuou de 1988 a 2000.
Beatriz Carvalho G. Santos,
advogada, é coordenadora da campanha
antinuclear do Greenpeace.