30/11/2007 - Suelene Gusmão
- O governo federal colocou em consulta pública
pela internet o anteprojeto de lei sobre Acesso
a Recursos Genéticos, Conhecimentos
Tradicionais e Repartição de
Benefícios. A proposta pretende substituir
a atual Medida Provisória 2.186-16,
de 2001, aprimorando a legislação
no que se refere à pesquisa e bioprospecção
e estabelecendo mecanismos para a repartição
de benefícios
com as comunidades indígenas e tradicionais.
A consulta ficará no ar até
28 de fevereiro de 2008 no endereço
eletrônico www.planalto.gov.br.
As sugestões poderão
ser encaminhadas à Casa Civil da Presidência
da República, Palácio do Planalto,
4o andar, sala 3, Brasília-DF, CEP
70.150-900, com a indicação
"Sugestões ao projeto de lei que
dispõe sobre o acesso aos recursos
genéticos e seus derivados" ;
ou pelo e-mail: recursosgeneticos@planalto.gov.br
.
No texto do documento está
assegurado o cumprimento dos compromissos
assumidos pelo Brasil junto à Convenção
sobre Diversidade Biológica (CDB),
que passou a vigorar a partir de 1993, principalmente
no que diz respeito à questão
da repartição de benefícios.
A Convenção
da Biodiversidade Biológica reconheceu
a soberania dos países sobre os recursos
genéticos existentes em seus territórios.
Isso alterou o entendimento, de que estes
recursos eram bem da humanidade e que poderiam
ser explorados livremente. A partir deste
marco legal, os países passaram a estabelecer
regras para o acesso aos recursos genéticos,
como forma de garantir que os benefícios
decorrentes de sua repartição
fossem distribuídos de maneira justa
e eqüitativa, com apoio à conservação,
à pesquisa e ao uso sustentável
da biodiversidade.
Para resolver questões
surgidas após a ratificação
pelo Brasil da CDB, como a biopirataria, por
exemplo, foi editada pela primeira vez, em
junho de 2000, a Medida Provisória
2.186, eficiente em dar respostas às
questões então colocadas, mas
com várias lacunas para o desenvolvimento
positivo das questões surgidas dos
problemas relacionados ao acesso aos recursos
genéticos.
Desde então, os setores
diretamente envolvidos no assunto vêm
se reunindo e debatendo a questão.
O resultado deste debate está expresso,
em parte, no anteprojeto agora colocado em
consulta pública. O que se espera é
que a participação neste processo
possa aperfeiçoar a legislação.
Inovações
- Entre as inovações propostas
pelo anteprojeto está o estabelecimento
de um tratamento abrangente e unificador à
questão do acesso e à repartição
de benefícios, estimulando seu uso
ético e sustentável. Para isso,
vai assegurar a definição de
regras claras e garantir segurança
jurídica para o uso dos recursos genéticos
e seus derivados e dos conhecimentos tradicionais
associados, fazendo com que diminua os custos
de transação e elimine várias
etapas da burocracia.
Na nova proposta de legislação,
a etapa relacionada à pesquisa e à
bioprospecção está mais
flexibilizada. A proposta é facilitar
o processo de acesso à coleta para
pesquisa e torná-la menos onerosa.
Pela atual legislação, antes
de iniciar o processo o cientista era obrigado
a pedir uma autorização ao Ibama.
Pela nova proposta basta apenas informar sobre
a atividade no Cadastro Nacional de Pesquisa.
Quanto à bioprospecção
(atividade de investigação sobre
algo da natureza com interesse em transformá-lo
num produto econômico), o novo é
a dispensa de contrato com o provedor, antes
uma exigência, bastando apenas que se
faça o registro da atividade também
no Cadastro Nacional de Pesquisa.
No que diz respeito à
repartição de benefícios
a novidade é a instituição
de uma Contribuição de Intervenção
no Domínio Econômico (Cide) a
partir da qual os fabricantes de novos produtos
comerciais contribuirão para dois fundos
governamentais. Serão 50% destinados
ao Fundo para Conservação e
Repartição de Benefícios
e 50% ao Fundo para Desenvolvimento Científico
e Tecnológico. A cobrança da
contribuição só ocorrerá
uma vez e não ao longo de toda a cadeia.
O novo texto propõe
ainda o estabelecimento de um sistema de gestão
federal compartilhado, entre os ministérios
do Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia,
Indústria e Comércio, Agricultura,
Pecuária e Abastecimento.
A proposta é que
haja uma queda no custo de toda a transação,
pois a pré-definição
das regras sobre a repartição
permitirá um controle mais simples
sobre a pesquisa em desenvolvimento. Um outra
importante inovação é
o financiamento direto de projetos de conservação
e uso sustentável evitando fraudes
e compra da terra para uso próprio.
Proteção -
O Brasil detém cerca de 20% de toda
a biodiversidade existente no mundo. São
mais de 200 mil espécies nativas catalogadas,
incluindo animais, plantas, fungos e microorganismos.
Tudo isto equivale a apenas 10% do que existe
no território e nas águas jurisdicionais
brasileiras. O Brasil também possui
uma variada sociodiversidade, com mais de
200 etnias indígenas e comunidades
tradicionais, responsáveis pelo acúmulo
de conhecimentos tradicionais associados à
biodiversidade, decorrentes de seu estilo
e modo de vida tradicionais.
A proteção
e valorização adequadas deste
patrimônio natural e cultural de forma
ética e sustentável demonstraram
a necessidade de aprimoramento da legislação
sobre o assunto, no sentido de permitir sua
utilização para o desenvolvimento
social, econômico, científico
e tecnológico do Brasil. Com as inovações
da nova legislação, o que se
pretende é a inserção
da biodiversidade brasileira nas cadeias produtivas,
detendo práticas de biopirataria e
de apropriação indevida dos
recursos genéticos e dos conhecimentos
tradicionais associados.
Embora trate da regulamentação
do acesso a recursos genéticos, o anteprojeto
não disciplina atividades de extrativismo,
nem atividades que utilizam a biodiversidade
in natura, como o comércio de frutos,
plantas ou animais, no todo ou de suas partes.
Também não trata dos recursos
genéticos das espécies exóticas.
A primeira iniciativa brasileira
no sentido de regulamentar o acesso a recursos
genéticos no Brasil ocorreu em 1995,
com o projeto de lei 306/95 de autoria da
então senadora pelo Acre, Marina Silva.
Na ocasião, o projeto foi amplamente
debatido por representantes de organizações
não-governamentais, do setor privado,
universidades e governos estaduais. O PL recebeu
substitutivo que foi aprovado no Senado. No
final de 1998 foi encaminhado à Câmara
dos Deputados.