Entrevista
do Ministro Geddel Vieira Lima concedida ao
JB
26/12/2007 - Transposição:
ministro diz que críticas são
"mitos"
O ministro da Integração Nacional,
Geddel Vieira Lima, acredita que é
a desinformação a causa da maioria
das manifestações contrárias
à obra de transposição
do Rio São Francisco, que classifica
como projeto incompreendido. Em entrevista
concedida ao JB, ele dá detalhes da
obra e avisa que maior parte das críticas
são "mitos".
Como estão as obras
do Rio São Francisco?
As obras, o primeiro trecho dos dois canais
de aproximação e as estações
de bombeamento, estão sendo levadas
pelo Batalhão de Engenharia do Exército.
Na sexta-feira passada publicamos no Diário
Oficial o Consórcio São Francisco
como vencedor do primeiro lote da licitação
para o Eixo Norte, o que vai permitir que
a iniciativa privada entre no processo dando
maior celeridade ainda à execução
do projeto. Temos a convicção
que está tudo dentro do rigor exigido
pela lei e que não haverá mais
contratempo de ordem judicial.
Qual é o valor desse
lote?
O consórcio vencedor terminou com a
proposta de R$ 238 milhões, o que representa
um valor 14% abaixo do preço de referência.
Aí estão embutidas obras civis,
numa extensão de 39 quilômetros.
Qual é a previsão
para o outro canal?
A idéia é fazer com que o Eixo
Leste, que leva água à Paraíba
e Pernambuco, possa estar concluído
ainda no governo do presidente Lula e deixar
o Eixo Norte de tal forma viabilizado que
qualquer que seja o governo venha suceder
o presidente Lula tenha o dever, perante a
sociedade, de concluir a obra.
Essas licitações
incluem cuidados com o meio ambiente?
Não. As obras de cuidado com o meio
ambiente estão inseridas em 36 PBAs
(Planos Básicos Ambientais) que foram
exigências justamente impostas pelos
órgãos ambientais, pelo Ibama
e pelo Ministério do Meio Ambiente,
que já estão sendo tocados,
ao lado das obras de interligação
de bacias.
São obras financiadas
com recursos federais?
Todo o projeto é financiado com recursos
do Orçamento da União, com recursos
inscritos no Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC).
O Exército tem colaborado
em que partes?
Na parte inicial, que é o trecho referente
aos canais de aproximação, as
estações de bombeamento e as
barragens de Areias e de Tuputu, que são
barragens de acumulação. Quanto
ao Exército, gostaria de esclarecer
a alguns contrários à obra que
a participação do Exército
não é um ato de força,
é sempre bom lembrar a longa tradição
do Departamento de Engenharia do Exército
em obras públicas. No caso específico,
trata-se inclusive de uma região conflagrada,
que foi uma das razões que fez com
que levássemos o Exército. E
há também a questão do
polígono da maconha.
A transposição
é uma obra de infra-estrutura. O que
ela pode agregar de benefício à
população?
Esta pergunta me permite enfrentar logo um
mito e um tabu que tenta se criar. A outorga
da Agência Nacional de Águas
fala explicitamente que a prioridade da ligação
de bacias do São Francisco é
abastecimento e humano e alimentação
animal, numa área onde você não
tem segurança hídrica. E esse
é um primeiro conceito. Esse é
um projeto para fornecer segurança
hídrica. A região do Nordeste
Setentrional, dizem os sertanejos, é
uma área que chove mais para cima do
que para baixo, referindo-se aos 75% de evaporação,
fazendo com que das águas acumuladas
nos açudes você só possa
utilizar 22%. Portanto, o conceito desta obra
é uma obra estruturante, de segurança
hídrica. Outro mito dos críticos
é que eles dizem que quando houver
sobra de água, essa sobra será
utilizada para projetos de irrigação
de outros projetos de desenvolvimento. É
claro que sim. E é importante que seja
usada. As pessoas não vivem sem beber
água. Mas as pessoas não vivem
só de beber água. As pessoas
precisam de emprego, precisam de produção.
Como o senhor avalia a posição
de dom Cappio, contra a obra?
A minha manifestação desde o
início desse processo foi muito clara:
ela se sustenta no conceito da legitimidade.
Eu creio que é fundamental, tanto o
bispo como todos aqueles que têm manifestações
contrárias, que as façam. Mas
sempre com o intuito de trazer sua contribuição
honesta para que o governo possa incorporar
essas condições e melhorar cada
vez mais esse projeto importantíssimo
para o Nordeste Brasileiro. Dentro do conceito
de legitimidade o que não se pode aceitar
é essa posição que foi
adotada pelo bispo dom Cappio, por quem tenho
apreço e respeito pessoal, de "ou
faz do jeito que eu quero ou eu vou morrer
e vou botar a culpa no governo". Isso
é uma coisa que não poderíamos
aceitar, porque aí o Estado deixa de
existir. Todo diálogo e todo debate,
para ser produtivo, ele precisa ter um fim.
E quem estabelece o fim do diálogo
ou é o consenso ou é a legitimidade
de alguém para decidir. Nesse caso
específico, quem tem legitimidade para
implementar políticas públicas
é o presidente Lula. As pessoas podem
não gostar pessoalmente nem do governo
dele. Mas ninguém pode questionar a
legitimidade de implementar políticas
públicas que foi conquistada nas ruas.
O senhor acha que há
exagero, que estão mistificando essa
obra?
Só para você ver como esse assunto
está sendo tratado como mito: eu assinei,
na Bahia, ao lado do governador Jaques Wagner,
uma ordem de serviço para a retomada
de dois projetos de irrigação
importantes, o Salitre e o Bacio de Irecê.
Vou me referir apenas ao Bacio de Irecê.
A tomada de água autorizada pela Agência
Nacional de Águas para esse projeto
de irrigação vai tirar do São
Francisco 56 metros cúbicos por segundo,
antes, inclusive da Barragem de Sobradinho,
o que significa duas vezes e meia mais do
que a autorização do que vai
se tirar para a transposição
do Rio São Francisco, já depois
da Barragem de Sobradinho. E todos aplaudem
a implantação desse importante
projeto de irrigação no nosso
Estado. Veja como tem mitos envolvidos nesse
projeto.
Além da questão
dos mitos, essa obra é muito politizada,
principalmente no seu estado.
Essa discussão começou na época
do Império. Depois, o presidente Itamar
Franco tentou implementar, o presidente Fernando
Henrique tentou implementar, e o presidente
Lula, com muita coragem, está levando
adiante. E esse é um projeto que, fruto
exatamente do debate, vem evoluindo, está
sendo aprimorado, e hoje eu tenho absoluta
certeza de que é um projeto passível
de muito pouca crítica honesta do ponto
de vista intelectual.
O senhor garante que todas
essas obras da transposição
estão respaldadas na questão
ambiental, no ministério do Meio Ambiente,
com licenças prévias e permanentes,
como também na Agência Nacional
de Águas?
Sem sombra de dúvida.
Não teremos mais
problemas futuramente?
Espero que não. Se tivermos, vamos
trabalhar para resolver. E mais do que isso,
sempre abertos a incorporar sugestões
e críticas corretas. Veja por exemplo
que quando viajei da nascente à foz
do São Francisco, ouvi ribeirinhos
dizerem: "Mas como vocês vão
levar água tão distante se algumas
pessoas que habitam aqui nas barrancas do
rio ainda não têm água?"
Essa é uma crítica honesta.
Levei ao presidente que imediatamente autorizou
a criação do programa Água
para Todos, que nada mais é do que
atender num raio de 15 quilômetros de
distância, em cada margem do rio, direita
e esquerda, nos seus 2.800 quilômetros
de extensão, a todas as comunidades
que ainda não tiverem acesso à
água do Rio São Francisco. Essa
é uma evolução, é
um aprimoramento do projeto, fruto do debate,
fruto da crítica honesta e não
do sectarismo.
Quanto tempo o senhor levou
nessa viagem da nascente à foz?
Nós fizemos em sete dias, visitando
pontos críticos, visitando cidades,
visitando áreas, e até visitando
a Diocese da Barra, onde procurei o bispo
dom Cappio, que naquele momento preferiu se
ausentar, evitando esse contato que eu gostaria
muito que tivesse acontecido.
O senhor chegou a procurá-lo
não o encontrou?
Cheguei a procurá-lo. Inclusive foi
meu primeiro telefonema quando tomei posse
no dia 16 de março. Liguei a dom Cappio
e disse que gostaria muito de ouvi-lo, e que
humildemente o convidava para um encontro
no Ministério da Integração
Nacional ou me colocava a disposição
de ir a sua diocese para debater. Ele me disse
que consultaria o seu grupo e me retornaria.
Infelizmente, para tristeza minha, nove meses
se passaram e o dom Cappio não me deu
retorno. Eu poderia ter aprendido muito com
ele e certamente incorporar as suas experiências
para melhorar esse projeto.
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Artigo do Ministro Geddel
Vieira Lima: Transposição e
concórdia
26/12/2007 - Escrevendo
às vésperas do Natal e imbuído
do espírito reflexivo do Réveillon,
vejo 2008 como um ano propício a novas
esperanças sobre a questão mais
incompreendida de 2007 - o projeto de Interligação
de uma pequena parte das águas do rio
São Francisco com o Nordeste Setentrional.
As reflexões de fim
de ano já me ajudaram a tomar uma importante
decisão de Ano Novo: lutar para vencer
a desinformação acerca deste
que é um dos mais importantes projetos
de desenvolvimento sustentado do Semi-árido
brasileiro, nossa região mais pobre
e desigual.
A greve de fome do bispo
de Barra, Dom Luís Flávio Cappio,
evidenciou ainda mais a necessidade de melhorarmos
a comunicação sobre a obra.
Prova disso é a carta de negociação
para por fim à greve, assinada pelo
religioso e movimentos sociais que o assessoram.
A maioria dos oito pontos reivindicados já
está sendo cumprida pelo governo, sobretudo
no quesito principal da revitalização.
A “elaboração
e implementação de um programa
de revitalização”, um dos itens
da carta, está em curso ao longo dos
2.800 quilômetros do São Francisco
e também de seus afluentes, com as
“ações amplas e diversificadas”
requeridas pelo religioso e seguidores. Mais
de 170 municípios da bacia estão
fazendo saneamento ou já estão
com licitações em curso para
iniciar essas obras fundamentais de despoluição
das águas. Além disso, há
ações de replantio de mata ciliar,
contenção de margens e controle
de erosão, dragagem e educação
ambiental, num conjunto de medidas abrangentes
e de caráter continuado.
Dos oito pontos, apenas
os dois primeiros são divergentes:
a suspensão da obra e a redução
do volume de água a ser transposta.
Mas esses pontos se fundamentam na idéia
equivocada dos signatários do contra,
para os quais o projeto de Interligação
vai matar o São Francisco. O Ibama
licenciou e a ANA (Agência Nacional
de Águas) outorgou que apenas 1,4%
da vazão será retirada. A fração
é mínima, mas suficiente para
atender 12 milhões de pessoas que vivem
em situação de insegurança
hídrica nas cidades do semi-árido.
Uma comparação
mostra o grau do preconceito. Agora em dezembro,
reiniciamos na Bahia dois projetos de irrigação,
o Salitre e o Baixio, que nada mais são
do que transposições - também
levam a água do São Francisco
de um lugar para outro. Ocorre que a parte
retirada pelo Salitre e Baixio soma o triplo
do volume do projeto de Interligação.
Neste caso, porém, não se ouviu
nem dos baianos mais oposicionistas uma crítica
sequer. Ao contrário, o Salitre e o
Baixio, que vão gerar, quando concluídos,
200 mil empregos no demonizado agronegócio,
foram recebidos com louvor ou pelo menos com
silêncio reverente.
Fazer de 2008 um ano de
esclarecimento e de combate aos preconceitos
em torno do projeto de Interligação
vai nos ajudar a aperfeiçoá-lo
ainda mais. Estou irmanado a Dom Cappio e
aos movimentos sociais na luta para aprovar
no Congresso a emenda constitucional que assegura
R$250 milhões por ano para investimentos
na revitalização da bacia.
O Ministério da Integração
Nacional também terá condições
em 2008 de acelerar o ritmo do abastecimento
para as populações difusas,
como pediu o bispo e seus assessores. Em 2007
avançamos nos trâmites burocráticos
para começar o Ano Novo aduzindo água
a 1.800 comunidades dos cinco estados banhados
pelo São Francisco, conforme o Programa
Água para Todos.
Vamos também atender
com mais cisternas e poços quem vive
na zona rural de Pernambuco, Paraíba,
Rio Grande do Norte e Ceará. Enquanto
realizamos o projeto estruturante de segurança
hídrica, que é a Interligação,
continuaremos cumprindo as ações
complementares do Atlas do Nordeste, elaborado
pela ANA em parceria com o Ministério
da Integração.
Fui empossado ministro em
março desde ano. Nestes nove meses,
tiramos do papel o projeto de Interligação,
aumentamos as obras de Revitalização
e tocamos obras deixadas inacabadas há
10 anos, como o Salitre e o Baixio. Executamos
e arrumamos a casa para fazer muito mais em
2008. Mas a maior obra que espero realizar
é a da concórdia. Se, no passado,
fui contrário à transposição
porque antes o projeto retirava um volume
muito maior da água do rio e não
previa a revitalização, hoje
sou seu grande defensor. O diálogo
só o tem aprimorado. Por isso, estou
sempre aberto a ouvir sugestões.
Vamos no Ano Novo desenvolver
um ambiente de conhecimento compartilhado.
Precisamos dividir crenças e visões
de mundo numa relação de confiança.
Um futuro melhor depende da nossa capacidade
de desprendimento e solidariedade.
Fonte: site do PMDB/BA
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Ministro Geddel Vieira Lima
fala sobre o Projeto São Francisco
27/12/2007 - Brasília
– O Ministro da Integração Nacional,
Geddel Vieira Lima, fala sobre o Projeto de
Integração do Rio São
Francisco com as Bacias Hidrográficas
do Nordeste Setentrional. O ministro garante
que a obra beneficiará muitos e não
prejudicará ninguém.
Um dos grandes argumentos
de quem é contra o Projeto São
Francisco é de que os canais irão
passar por grandes fazendas e beneficiar latifúndios
e não a população mais
pobre. Como o senhor responde isso?
É só analisar
a outorga que foi concedida pela Agência
Nacional de Águas (ANA), que é
responsável pela liberação
de licenças para uso e exploração
de água. Lá está escrito
de forma inquestionável que a prioridade
é para consumo humano e dessedentação
animal. Mas vamos aproveitar para dizer que
não podemos criminalizar a produção.
As pessoas não vivem sem água,
mas também não vivem só
de água. Precisam do emprego, precisam
de renda, precisam de comida. Exatamente por
isso, a sobra de água deve sim ser
utilizada para beneficiar a produção,
além do consumo humano e a dessedentação
animal, que são absolutamente prioritários.
Um engano muito freqüente
em relação a esse projeto é
o de que o curso do rio irá ser desviado.
O que o projeto prevê de fato?
O que nós vamos fazer
na realidade é bombear 26 m³/s
para atender e matar a sede de nossos irmãos
do Nordeste Setentrional. O que significa
dizer que a cada 100 litros, a proposta é
tirar 1,4 litros para esse projeto que se
assemelha a tantos projetos de irrigação
que utilizam água do Rio São
Francisco. Como, por exemplo, ao sistema de
abastecimento da cidade de Aracaju, que nada
mais é do que uma transposição
de águas. As águas do Rio São
Francisco se integram à Bacia do Rio
Sergipe, para abastecer, 100 km depois, a
cidade de Aracaju, que é uma cidade
fora da Bacia do São Francisco. Essa
ligação foi feita por soluções
de obra de engenharia (canais, túneis,
aquedutos). São soluções
de engenharia, pois hoje temos tecnologias
extremamente modernas e testadas para esse
tipo de obra.
Qual a garantia de que o
projeto não terá um impacto
ambiental negativo na Bacia do São
Francisco?
A garantia é que
um órgão do rigor do Ibama,
que tem respeitabilidade em todo país
e até fora do país demorou tanto
tempo para conceder as licenças, estabeleceu
36 Planos Básicos Ambientais, que visam
proteger o ambiente e que o Ministério
da Integração Nacional está
levando adiante com muita seriedade. Inclusive,
tenho sugerido e criado uma comissão
interministerial para acompanhar a implementação
de todos esses Planos, que vão mitigar,
vão amenizar qualquer problema ambiental
que eventualmente possa surgir.
Quando serão retomadas
as oras do Projeto de Integração
do Rio São Francisco com as Bacias
Hidrográficas do Nordeste Setentrional?
Na volta do recesso do Exército.
Nós anunciamos, a partir da decisão
do Supremo Tribunal Federal, os vencedores
iniciais da licitação dos lotes,
que terão a participação
da empresa privada. E, assim que o exército
retorne, no início de janeiro, vamos
dar seqüência a essa obra. Nós
estamos convencidos de que a realização
dessa obra é importante para o Brasil,
importante para o Nordeste, beneficia muitos
e não prejudica ninguém.