(25/02/2008) A
exuberância natural, a alta diversidade biológica
e a imensa planície de áreas alagáveis
do Pantanal Matogrossense podem ser ameaçadas
pelos impactos nos recursos hídricos do Cerrado.
Os principais rios do Pantanal
nascem nos planaltos e nas chapadas do Cerrado.
Estudos realizados por pesquisadores da Embrapa
Cerrados (Planaltina-DF) concluíram que o
Cerrado contribui com a vazão que flui em
oito das 12 regiões hidrográficas
brasileiras, sendo fundamental para os rios Paraguai,
Parnaíba, São Francisco e Tocantins-Araguaia.
Na porção brasileira
da região hidrográfica do rio Paraguai,
o Cerrado está presente em cerca de 62% de
sua área e responde por quase 136% da vazão
nela produzida. Com essa estimativa, fica evidente
a dependência do Pantanal em relação
aos recursos hídricos gerados no Cerrado.
Isso porque a vazão, que cruza os limites
do Cerrado em direção ao Pantanal,
é aproximadamente 35% maior do que a vazão
que deixa o Brasil pelo rio Paraguai.
Déficit hídrico
Os pesquisadores Jorge Furquim Enoch Werneck Lima
e Euzebio Medrado da Silva observaram que o balanço
hídrico do Pantanal é negativo em
relação à geração
de vazão. Isso significa que a evapotranspiração
(total de água perdida para a atmosfera)
em sua área é superior a precipitação,
provocando inclusive, o consumo de parte dos recursos
hídricos superficiais provenientes do bioma
Cerrado.
Ou seja, no restante da bacia
hidrográfica, não ocupada por Cerrado,
a evapotranspiração é muito
superior ao total precipitado na forma de chuva,
provocando um grande déficit hídrico.
É como se toda a precipitação
nessa área fosse “consumida” pela evapotranspiração
e, ainda, necessitasse de 35% a mais dos recursos
hídricos superficiais vindos do Cerrado para
suprir essa deficiência.
Dessa forma, o Pantanal, que fica
na parte mais baixa da região hidrográfica
do Paraguai, funciona como um vasto reservatório
raso e como grande espelho d’água, contribuindo
de maneira significativa com a “perda” de água
para a atmosfera por evaporação.
Clima de semi-árido
O déficit hídrico
também ocorre na região hidrografia
do rio Parnaíba. Nessa região, o Cerrado
está presente em aproximadamente 66% de sua
área e gera cerca de 106% da vazão
média que o rio Parnaíba lança
no oceano.
O balanço hídrico
negativo existe em função do total
precipitado, nas áreas não ocupadas
pelo Cerrado, ser inferior ao total evapotranspirado.
Uma das razões para que isso aconteça
é que grande parte do restante dessa região
constitui área de clima semi-árido.
Na bacia do rio São Francisco,
o Cerrado contribui com 94% da vazão e na
região hidrográfica Tocantins-Araguaia
com quase 71% da vazão que flui em seus rios.
As 12 bacias hidrográficas em que a contribuição
hídrica do Cerrado foram analisadas são
Amazônica, Tocantins-Araguaia, Atlântico
Nordeste Ocidental, Parnaíba, São
Francisco, Atlântico Leste, Paraná,
Paraguai, Atlântico Nordeste Oriental, Atlântico
Sudeste, Uruguai e Atlântico Sul.
Primeiro estudo
Esse é o primeiro estudo
que analisa as 12 grandes regiões hidrográficas.
Isso porque a última pesquisa sobre contribuição
hídrica do Cerrado para as grandes bacias
hidrográficas é de 2002, tendo como
base a antiga divisão hidrográfica
nacional em que o extinto Departamento Nacional
de Água e Energia Elétrica (DNAEE)
dividia o território nacional em oito grandes
bacias hidrográficas.
A partir de 2003, o Conselho Nacional
de Recursos Hídricos alterou a divisão
hidrográfica até então utilizada
e o território brasileiro foi dividido em
12 grandes regiões hidrográficas.
Sendo a área do Cerrado
uma região com cabeceiras de bacias hidrográficas
é fundamental a ampliação dos
conhecimentos referentes ao seu comportamento hidrológico
e aos impactos sobre seus recursos hídricos.
Além da importância em termos hidrológicos,
o Cerrado possui enorme destaque no cenário
agrícola. Conta com 61 milhões de
hectares de pastagens cultivadas, 14 milhões
de hectares de culturas anuais, 3,5 milhões
de hectares de culturas perenes e florestais, além
de ser responsável por 55% da produção
nacional de carne bovina.
Os pesquisadores da Embrapa Cerrados
– unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária,
vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento- chamam atenção para
a necessidade da ocupação do Cerrado
ocorra sob base sustentáveis, gerando o máximo
de benefícios com o mínimo de impactos.
Para isso é fundamental
a existência de dados e informações
técnicas sobre a região para subsidiar
a tomada de decisão pelas instituições
envolvidas no processo de aproveitamento e gestão
de seus recursos naturais.
Liliane Castelões