12/03/2008
- Vindas de diferentes municípios e comunidades
do Vale do Ribeira, cerca de 400 pessoas se concentraram
na manhã desta quarta-feira, 12/3, em frente
ao Ibama, em São Paulo, para protestar contra
o parecer do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente
e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) que
concluiu pela viabilidade ambiental da usina hidrelétrica
de Tijuco Alto. Se construída, vai gerar
energia exclusivamente para a Companhia Brasileira
de Alumínio – CBA e muitos prejuízos
à população e à biodviversidade
local.
Eram 5h40 da manhã desta
quarta-feira quando os primeiros ônibus pararam
em frente à sede do Ibama, em São
Paulo, vindos de várias localidades do Vale
do Ribeira, trazendo lideranças e representantes
de comunidades remanescentes de quilombos, ribeirinhos,
pescadores e de movimentos sociais e ambientais
que atuam na região. Eles entraram no edifício,
ocuparam escadas e calçadas e iniciaram seu
protesto contra o parecer do instituto concluindo
pela viabilidade ambiental da usina hidrelétrica
de Tijuco Alto, que a Companhia Brasileira de Alumínio
– CBA – quer construir no rio Ribeira de Iguape.
(Saiba mais).
Dez minutos depois chegava a superintendente do
instituto em São Paulo, Analice Novais Pereira.
Ela informou que o Ibama havia convidado as lideranças
para conversar. Na terça-feira, 11/3, organizações
da sociedade civil tinham divulgado carta aberta
ao povo brasileiro intitulada “A UHE Tijuco Alto
não interessa ao país e menos ainda
ao Vale do Ribeira”. No texto, as organizações
informam que, se construída, a usina irá
gerar energia exclusivamente para a Companhia Brasileira
de Alumínio (CBA). E ressalta que não
há interesse público em sua construção.
Por isso o Ibama não pode autorizá-la.
Lembra ainda que o Vale do Ribeira abriga o maior
remanescente contínuo de Mata Atlântica
de todo o País e sua riqueza socioambiental.
"Terra é pra plantar,
não pra alagar"
Portando faixas contra as barragens,
gritando slogans – “Terra é pra plantar,
não pra alagar”, “Águas para a vida
não para a morte” - e entoando canções,
o protesto foi engrossado por manifestantes de Cananéia,
que chegaram às 7h. Os representantes dos
manifestantes foram recebidos às 9h pela
superintendente do instituto e as negociações
se estenderam até o meio da tarde.
A reunião foi interrompida
por volta do meio-dia. Um dos líderes do
Movimento dos Ameaçados por Barragens (Moab)
e da Associação Quilombo de Ivaporunduva,
José Rodrigues da Silva, integrante da comissão
que se reuniu com Analice Pereira, desceu para informar
os que esperavam do lado de fora. "Colocamos
que somos contra o parecer do Ibama em relação
a Tijuco Alto. Dissemos que o Vale do Ribeira é
muito diferente de outras regiões do Estado
de São Paulo e do Brasil. Que o Vale tem
muita história, biodiversidade, é
diferente". Rodrigues disse ainda que a comissão
deixou claro à superintendência e a
um dos analistas que assinou o parecer – e estava
na reunião -, que não aceitam decisões
quando a população que vai ser prejudicada
não é ouvida. "Participamos de
cinco audiências públicas no ano passado,
e nelas pedimos mais informações à
CBA quanto ao projeto. A CBA não nos informou,
não respondeu às nossas perguntas
e o Ibama também não. O que colocamos
não foi considerado". O líder
quilombola reiterou que as comunidades querem que
as propostas que fizeram sejam analisadas, incluindo
um estudo da bacia hidrográfica do rio Ribeira.
"Eles vão falar com Brasília
e daqui uma hora vão nos chamar para dar
a resposta. Não vamos sair daqui enquanto
não tivermos uma resposta que esteja dentro
da nossa proposta".
Estritamente vigiados
Desde as primeiras horas da manhã,
a manifestação foi acompanhada de
perto pela Polícia Militar, cuja presença
não intimidou os manifestantes. O Movimento
dos Ameaçados por Barragens (Moab) trouxe
faixas endereçadas às construtoras
de barragens, pedindo respeito às pessoas
e ao meio ambiente; à ministra do Meio Ambiente,
Marina Silva com os dizeres: "O governo brasileiro
não pode entregar às grandes empresas
o que ainda resta da Mata Atlântica no Estado
de São Paulo". Outra faixa denunciava
que o Ibama só defende os interesses dos
grandes, mencionando as barragens no Rio Madeira,
a transposição do Rio São Francisco,
o Porto de Peruíbe e Tijuco Alto. O protesto
teve o apoio do MAB (Movimento dos Atingidos por
Barragens) e do MST.
Enquanto as lideranças
negociavam com o Ibama, às 10h30 começou
um Ato Público. Entre os que se revezaram
ao microfone estavam o Bispo da Diocese de Registro,
Dom José Luís Bertanha, representantes
de comunidades e líderes estudantis. O prefeito
de Iporanga, Ariovaldo da Silva Pereira veio prestar
sua solidariedade ao movimento. “Eu sempre me posicionei
a favor das comunidades e acho que a usina vai trazer
um transtorno muito grande a elas. Vejo com preocupação
a barragem de Tijuco Alto”. Iporanga é um
dos municípios do Vale do Ribeira onde se
localizam muitas cavernas que foram fechadas à
visitação em fevereiro passado pelo
Ibama. O prefeito informou que por conta disso,
o município está parado, que há
muitas pessoas envolvidas com as atividades voltadas
ao turismo. “Simplesmente, o Ibama, sem aviso prévio,
fechou as cavernas à visitação.
É como se uma grande indústria fosse
fechada da noite para o dia, sem nenhuma satisfação”.
Preocupado com as conseqüências
que a barragem representa aos pescadores de Cananéia,
seu Ernane, aposentado, contou que uma senhora,
sua vizinha, acabou multada pela polícia
ambiental por ter carpido uma roça de mandioca.
“A roça não tem mais que 600 pés
de mandioca e esse processo contra ela corre há
mais de quatro anos”, explicou Hernane, cuja mulher
é pescadora e faz parte da Cooperativa de
Cananéia. "Essas coisas a gente sente
que é muito pesado. Nós não
podemos sobreviver e o Antônio Ermírio
destrói o Brasil construindo barragens. É
muito difícil aceitar isso”.
As negociações encerraram-se
às 16h30 com um acordo entre o Ibama e os
movimentos sociais e ambientais em torno de dois
pontos fundamentais. O primeiro deles é que
nenhuma decisão será tomada sem antes
ouvir as questões e dúvidas da população
do Vale do Ribeira em relação à
barragem e o segundo será avaliar a possibilidade
de realizar reunião pública na região
para que a equipe técnica do órgão
possa justificar seu parecer, ouvir os pontos apresentados
pela população e, se for o caso, reformular
o parecer. Amanhã, 13/3, uma reunião
foi marcada em Brasília para estabelecer
com o Ibama uma agenda para a realização
dessas ações.
Leia abaixo a ata da reunião
que chegou ao acordo celebrado entre o Movimento
dos Atingidos por Barragens (MAB), o Movimento dos
Ameaçados por Barragens (Moab) e o Ibama
Ata da reunião entre MAB,
Moab e Ibama
Reunidos na sala da presidência
do Ibama em 12.03.08 para tratar do processo de
licenciamento da UHE Tijuco Alto, chegamos ao seguinte
acordo:
O Ibama se compromete a receber,
analisar, responder e levar em consideração
na sua análise todos os questionamentos sobre
aspectos técnicos e sociais do empreendimento
que chegarem ao conhecimento do órgão.
O Ibama se compromete a se reunir
amanhã (13.03.08) novamente com esse colegiado
para definir um prazo para receber esses questionamentos.
O Ibama se compromete a até
o dia 14.03.08 definir se realizará uma reunião
publica para discutir o parecer técnico já
apresentado e ouvir todos os questionamentos que
surgirem. Essa reunião seria na região
(Vale do Ribeira) e seus resultados constariam formalmente
do processo.
O Ibama se compromete, por fim,
a não emitir qualquer posição
final quanto à viabilidade do empreendimento
sem antes responder e analisar todas as questões
levantadas pela sociedade.
Ficou acertada a realização
de uma reunião, até a primeira semana
de abril, entre a coordenação nacional
do MAB e a presidência do Ibama para tratar
de aspectos relacionados ao licenciamento de outras
hidrelétricas. O MAB se compromete a enviar
ao Ibama, até dia 14.03.08, a pauta de reivindicações.
Concordamos em desocupar o prédio
do Ibama-SP.
Lemos, assinamos e concordamos com o relatado
Adilson Oliveira Silva
Mayra Jankowsky
Bazileu Alves Margarido
Roberto Messias Franco
André Sartori
Marco Antonio Tievelier
Raul Silva Telles do Valle
ISA, Inês Zanchetta.