22 de
Março de 2008 - Luana Lourenço - Repórter
da Agência Brasil - Brasília - A poluição
tornou 70% das águas de rios, lagos e lagoas
do Brasil impróprias para o consumo. É
o que aponta relatório editado pela organização
não-governamental Defensoria da Água,
ligada à Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil (CNBB).
A pesquisa, que traz dados do
período 2004-2008, envolveu 423 pesquisadores,
830 monitores de campo e cerca de 1.500 voluntários,
que identificaram 20.1000 áreas de contaminação
em todo o país.
Em relação à
primeira edição do documento, divulgado
em 2004, a contaminação das águas
superficiais cresceu 280%, dado que torna do Dia
Mundial da Água, celebrado hoje (22), um
momento de reflexão sobre a necessidade de
medidas urgentes.
“Nesse ritmo, se nada for feito,
nos próximos quatro anos 90% das águas
estarão impróprias para o contato
humano, sendo que atualmente mais de 70% já
é imprópria para o consumo”, diz o
texto dos pesquisadores.
As principais causas da contaminação
são atribuídas principalmente ao agronegócio
e à atividade industrial. “Há uma
falta generalizada de controle e de fiscalização
da geração, da destinação
e do tratamento de resíduos, sejam eles urbanos,
de saúde ou residenciais”, avalia o secretário-geral
da Defensoria da Água, Leonardo Morelli.
De acordo com o relatório
da ONG, a mineração, a produção
de suco de laranja e de derivados da cana-de-açúcar
são “destaques negativos” pelos problemas
ambientais provocados pelo descarte inadequado de
resíduos industriais e pelas conseqüências
sociais ligadas aos empreendimentos, como exploração
de mão-de-obra e avanço sobre áreas
indígenas.
O documento critica ainda a “euforia”
com a produção de biodiesel, o que,
segundo a ONG, demonstra “uma tendência para
a economia agrícola, com empresas petrolíferas
altamente contaminadoras apropriando-se indevidamente
do discurso do uso de elementos naturais que na
verdade mascaram as tentativas de sobrevida dos
combustíveis fósseis”.
O lançamento de esgotos
diretamente nos rios e a exposição
de resíduos em lixões também
são apontadas como causas do crescimento
contínuo da poluição das águas,
principalmente em áreas urbanas.
“A existência de lixões
continua sendo uma realidade irrefutável
em mais de 4,7 mil municípios sendo que a
deposição de resíduos sem controle
ou proteção continua ocorrendo nas
margens de cursos de água e proximidades
de nascentes”, relata o texto.
Um agravante, segundo a ONG, é
que menos de 3% dos lixões enquadram-se na
categoria de “aterros controlados”, por exemplo.
Além disso, o país conta com cerca
de 20 aterros devidamente licenciado e com capacidade
para receber lixo hospitalar infectante.
De acordo com o relatório,
as 20.1000 áreas de contaminação
mapeadas pelos pesquisadores afetam diretamente
cinco milhões de pessoas, além de
outras 15 milhões de vítimas de impactos
indiretos.
+ Mais
A dez quilômetros de Brasília,
moradores ainda convivem com esgoto a céu
aberto
22 de Março de 2008 - Luana
Lourenço - Repórter da Agência
Brasil - Brasília - O serralheiro José
Silva faz parte do grupo de 30% de brasileiros que
não têm suas casas atendidas por serviços
de coleta de esgoto. Morador da Estrutural, bairro
pobre do Distrito Federal - a dez quilômetros
de Brasília - ele e outros 40 mil moradores
sofrem diariamente com a falta de saneamento, visível
nas ruas atravessadas por filetes e poças
de esgoto.
“É um problema sério.
Atrapalha até o trabalho da gente; às
vezes chega um carro para eu fazer uma solda e eu
tenho que dizer que não posso. Porque não
posso trabalhar dentro da água”, relata.
“Sem saneamento básico,
uma cidade não consegue ir para a frente.
Não tem jeito. O comércio, por exemplo,
só não se desenvolve mais por causa
disso. Se você vê uma loja arrumada,
mas tem uma poça de esgoto na frente dela
você não vai entrar, é difícil
para a gente”, acrescenta o líder comunitário
Carlos Roberto, o Gaúcho.
Em quase todas as ruas, entre
as casas simples, os filetes de água escura
e mau-cheirosa fazem parte da paisagem. Sem tratamento,
o esgoto da cidade têm destino certo: o Córrego
Cabeceira do Vale, que passa a poucos quilômetros.
A dona-de-casa Kariele Duarte,
moradora do bairro há nove anos, disse que
não agüenta mais a situação.
Ela conta que há alguns anos o quadro não
era tão ruim, mas piorou depois que a administração
local começou a passar tratores nas ruas
e tentar cobrir as poças com cascalho. “Eles
fecham as poças em uma rua e a água
vem para a outra. Quando chove, fica impossível
passar aqui”, conta, enquanto mostra a água
acumulada na porta de casa.
“A gente só faz paliativos.
A solução só vai vir com o
sistema de águas pluviais”, reconhece Carlos
Roberto.
Os irmãos Andressa e Felipe
Gomes, de 10 e 9 anos, conhecem de perto as dificuldades
listadas pelos adultos. “Não dá para
brincar aqui, toda hora o pé fica sujo da
água do esgoto”, lamenta Felipe. A irmã
conta que na última temporada de chuvas,
chegou a ficar com lama na altura dos joelhos. “Minha
mãe não deixa a gente ficar muito
na rua por causa disso. Dizem que a água
pode dar doença também”.
A Companhia de Saneamento Ambiental
do Distrito Federal (Caesb) estima que sejam necessários
R$ 57 milhões para implantar rede de esgotos
na Estrutural. O dinheiro, segundo o governo local,
devem ser liberado nos próximos meses. Os
projetos técnicos já estão
concluídos e a licitação para
as obras está em andamento, de acordo com
a Caesb.
“É a realização
de um sonho você saber que vai ter águas
pluviais e rede de esgotos, porque com isso vem
toda a infra-estrutura da cidade”, disse o líder
comunitário.
+ Mais
Dos 5,5 mil municípios,
apenas 39% têm destinação adequada
de resíduos sólidos
22 de Março de 2008 - Antonio
Arrais - Repórter da Agência Brasil
- Brasília - Dos 5.564 municípios
brasileiros, apenas 39% têm meios de destinação
adequada para os resíduos sólidos
coletados, enquanto os 61% dos municípios,
que não dão destino adequado, "contribuem
para a degradação do meio ambiente,
do solo, das águas e, principalmente, estão
colocando em risco a saúde pública
da população, num quadro bastante
precário", segundo o assessor Jurídico
e de Assuntos Institucionais da Associação
Brasileira de Empresas de Limpeza Pública
e Resíduos Especiais (Abrelpe), Carlos Silva
Filho, em entrevista à Rádio Nacional.
De acordo com o assessor, a situação
mais crítica está concentrada nas
Regiões Norte e Nordeste, onde os percentuais
de municípios que não dão destinação
adequada aos resíduos sólidos chegam
a 85% e 76%, respectivamente. Situação
inversa é registrada nas Regiões Sudeste,
puxada pelo estado de São Paulo, e a Sul.
Carlos Silva Filho citou o que
ele considera um dado mais preocupante ainda: além
do alto percentual de municípios que não
fazem destinação adequada dos resíduos
sólidos, no ano de 2007 "dez milhões
de toneladas de resíduos urbanos sequer foram
coletados, o que demonstra, com certeza, que eles
não tiveram destino adequado".
O diagnóstico dessa situação
precária, segundo o representante da Abrelpe,
se deve "a um conjunto de fatores, como a falta
de uma cultura sobre a real necessidade de adequação
da destinação dos resíduos
sólidos, a falta em muitos municípios
de locais adequados para a construção
de aterros sanitários ou depósito
ou qualquer outra forma de recepção
de resíduos adequada, mas, principalmente,
à falta de recursos a serem aplicados nesse
setor".
Segundos dados citados por Carlos
Silva Filho, a média de gastos dos municípios
brasileiros, em 2007, com esse setor de resíduos
sólidos, está em R$ 2,20 por mês,
por domicílio de quatro pessoas, o que significa
mais ou menos entre R$ 0,60 a R$ 0,80 por dia, por
pessoa:
"Então não
dá para fazer nada com esse valor tão
pequeno", alerta o especialista.
Para Carlos Silva Filho, não
há necessidade de uso de recursos públicos
na melhoria dos serviços do setor, "porque
existem empresas privadas dispostas a investir nesse
setor, embora falte aplicação desses
recursos públicos em pesquisas de tecnologias
alternativas e de reciclagem, o que significaria
a aplicação de políticas públicas
de apoio ao setor".
O representante da Abrelpe lembrou
que, na semana passada, a Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou
uma regulamentação de que o pet (garrafa
de plástico) agora pode ser reciclado para
poder fazer pet para alimentos novamente, porque
a tecnologia permite isso.
"Nós temos que ter
o cuidado de não deixarmos que esse pet vá
para um aterro sanitário, mas que volte para
a cadeia produtiva, para se tornar pet novamente
e volte para a sua utilização normal",
disse Carlos Silva Filho.
+ Mais
Apesar da legislação
moderna, Brasil tem que cumprir lição
de casa, diz WWF
22 de Março de 2008 - Luana
Lourenço - Repórter da Agência
Brasil - Brasília - A legislação
de águas do Brasil, que inclui a Lei das
Aguas, sancionada em 1997, e o Plano Nacional de
Recursos Hídricos, aprovado em 2006, está
entre as mais modernas do mundo. No entanto, é
preciso garantir a implementação para
obter resultados internos significativos na preservação
de rios, lagos, lagoas e das regiões costeiras.
A avaliação é do coordenador
do Programa Água para a Vida da organização
não governamental WWF Brasil, Samuel Barreto.
“Do ponto de vista da política
pública, o Brasil tem uma das políticas
mais avançadas do mundo. A Europa, por exemplo,
só conseguiu aprovar em 2000 sua política
de águas. Mas ainda é preciso fazer
a lição de casa, porque ao andar por
todo o país o que a gente percebe é
que os rios estão sendo degradados”, alertou
Barreto em entrevista ao programa Revista Brasil,
da Rádio Nacional.
A solução, de acordo
com Barreto, passa pela implementação
das políticas nacionais e estaduais de recursos
hídricos, mas o primeiro passo, segundo ele,
deve ser a conscientização com mudanças
de hábitos de consumo de água.
“Por causa da grande quantidade
de recursos hídricos do país dá
impressão de que a água nunca vaia
acabar, e não é verdade. É
importante que cada cidadão faça sua
parte, revendo os hábitos de uso dentro de
casa”, sugeriu.
Para comemorar o Dia Mundial da
Água, o WWF lançou a campanha Nascentes
do Brasil. O objetivo, segundo Barreto, é
“convocar a sociedade e os governos” para a necessidade
de preservação dessas áreas,
que entre outros serviços ambientais, servem
as bacias hidrográficas que abastecem as
áreas urbanas.
“Atividades crescendo de forma
desordenada, invadindo as áreas periféricas,
desmatando, com problema de lixo e de esgoto correndo
para dentro desses ambientes, do aterramento de
nascentes, comprometem a qualidade e a quantidade
de água. O ritmo de degradação
é muito maior do que a resposta dada pelos
órgãos públicos para proteger
essas áreas”, afirmou.
+ Mais
Apenas 25% do esgoto coletado
no país é tratado
22 de Março de 2008 - Luana
Lourenço - Repórter da Agência
Brasil - Brasília - Os números do
saneamento básico mostram que o Brasil ainda
tem muito a avançar na data em que a Organização
das Nações Unidas (ONU) comemora o
Dia Mundial da Água. O índice médio
de coleta de esgotos no país é de
69,7%, sendo que o tratamento atinge apenas 25%.
Os números são do Sistema Nacional
de Informações sobre Saneamento, do
Ministério das Cidades.
A ONU elegeu 2008 como o Ano do
Saneamento e deve recomendar aos países a
formulação de políticas públicas
para universalizar o acesso a esse serviço.
“No mundo todo, 2,6 bilhões de pessoas não
têm acesso a saneamento e estão expostas
diariamente a doenças, como diarréia
e cólera”, aponta o representante da ONU
para Alimentação e Agricultura (FAO),
José Turbino.
Os números de coleta e
tratamento de esgotos no Brasil refletem diferenças
regionais históricas do país: no Sudeste,
o índice de coleta é de 91,4%, já
na região Norte, não chega a 9% das
habitações. “Temos uma distribuição
desigual do desenvolvimento e, evidentemente, a
conseqüência disso é que as políticas
públicas muitas vezes também acompanham
esse desnível. [A diferença] é
decorrência da falta de políticas de
saneamento no âmbito nacional em sucessivos
governos”, avalia secretário de Recursos
Hídricos e Ambiente Urbano do MMA, Luciano
Zica.
Entre as capitais, as diferenças
chegam a mais de 90%. Enquanto em cidades como São
Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília
e Porto Alegre a coleta de esgoto atinge quase toda
a população (com índices superiores
a 85%), em Porto Velho, apenas 2,2% têm saneamento
básico. Os dados fazem parte de um relatório
do Instituto Socioambiental (ISA), que traça
um panorama do alcance de sistemas de saneamento
no país.
“Um dos principais desafios do
Brasil é a coleta e tratamento de esgoto,
em especial nas áreas mais urbanizadas. Tivemos
um período muito grande de descaso, há
um déficit a ser cumprido. Temos que parar
de transformar o Brasil, que é o país
dos rios, no país dos esgotos”, alerta uma
das coordenadoras do ISA Marussia Whately.
Além de investimentos em
programas de saneamento, Whately também aponta
a necessidade de políticas específicas
para tratamento de resíduos sólidos,
avaliação compartilhada pelo representante
do MMA. “A questão do ambiente urbano e dos
resíduos sólidos foram agregadas ao
debate dos recursos hídricos, que até
bem pouco tempo eram políticas bem desfocadas.
Teremos condições de trabalhar de
forma harmônica segmentos que têm impactos
diretos na qualidade da água; não
há como dissociar a questão do lixo
da boa gestão da água”, avalia Zica.
O Ministério das
Cidades prevê a aplicação de
R$ 40 bilhões até 2010, no chamado
PAC do Saneamento, em referência ao Programa
de Aceleração do Crescimento. A previsão
de investimentos precisa ser cumprida para que o
país alcance a meta estabelecida pela ONU
nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.