21 de
Março de 2008 - Luana Lourenço - Repórter
da Agência Brasil - Brasília - A comemoração
pela assinatura do decreto presidencial que ampliou
e criou novas unidades de conservação
não durou muito para ambientalistas e pescadores
da Ilha de Cassurubá, região do Parque
Nacional de Abrolhos, no sul da Bahia.
Entre as medidas anunciadas pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva no 21
de dezembro de 2007, em cerimônia no Palácio
do Planalto, estava a criação da Reserva
Extrativista de Cassurubá. No entanto, até
hoje (21) , três meses depois, o decreto não
foi publicado no Diário Oficial da União
(DOU), o que, na prática, significa que a
unidade ainda não existe. Os demais decretos
foram publicados em edição extra do
DOU no mesmo dia da assinatura.
A Casa Civil, responsável
pela publicação, informou que devolveu
o texto do decreto ao Ministério do Meio
Ambiente (MMA) por causa de “uma questão
técnica”. Em fevereiro, a ministra do Meio
Ambiente, Marina Silva, disse à Agência
Brasil que o texto estava sob análise da
“área técnica” do MMA. Procurada pela
reportagem em mais de uma ocasião, a assessoria
do ministério não confirmou o andamento
do decreto nem informou quando será encaminhado
para publicação.
“Isso foi um desgaste, a comunidade
está desanimada. Estamos preocupados se o
fato de o decreto não ter sido publicado
quer dizer que não poderemos trabalhar com
a Resex [Reserva Extrativista]”, relatou Marilene
Costa, representante da Associação
de Marisqueiras de Ponta de Areia e Caravelas. A
regulamentação de reservas extrativistas
prevê o uso sustentável dos recursos
naturais da área pelas populações
tradicionais, com subsistência baseada no
extrativismo. De acordo com Marilene, cerca de 900
pessoas sobrevivem da pesca e da mariscagem na área.
"Os pescadores estão
indignados. Ficamos inclusive numa situação
complicada, sem respostas para dar à comunidade”,
contou Jorge Galdino, diretor da organização
não-governamental (ONG) Artimanha, responsável
por mobilizar a população em prol
da criação da unidade.
+ Mais
Mega-empreendimento influencia
criação de reserva extrativista, diz
comunidade
21 de Março de 2008 - Luana
Lourenço - Repórter da Agência
Brasil - Brasília - Organizações
não-governamentais e líderes comunitários
não descartam a influência do setor
de carcinicultura (criação de camarões)
na demora para criar uma unidade de conservação
em Cassurubá, na região do Arquipélago
de Abrolhos, sul da Bahia.
“Não podemos garantir se
é o que de fato está impedindo a unidade,
mas com certeza os carcinicultores fizeram pressão
política entre os partidos e parlamentares
que os apóiam e na Casa Civil”, aponta o
coordenador do Programa Marinho da ONG Conservação
Internacional, Guilherme Dutra. “Temos a informação
de que isso teria também a influência
do setor de óleo e gás, por causa
de alguns blocos (de exploração) que
estão vizinhos à área da reserva”,
acrescenta.
O diretor da organização
não-governamental (ONG) Artimanha, Jorge
Galdino, responsável por mobilizar a população
em prol da criação da unidade, diz
que “há ações de interesse
político para frear a reserva”.
O sul da Bahia é alvo de
interesse do setor de carcinicultura, representado
na região de Cassurubá pela Cooperativa
de Criadores de Camarão do Extremo Sul da
Bahia (Coopex), que conta com apoio de parlamentares,
inclusive no Senado Federal. A idéia é
criar, em parte destinada à Reserva Extrativista
(Resex), um mega-empreendimento de carcinicultura,
o maior do Brasil, na área de 1.517 hectares,
num investimento de R$ 60 milhões. Uma liminar
concedida a pedido do Ministério Público
Federal suspendeu o processo de licenciamento ambiental
da obra.
“A não-publicação
foi uma coisa completamente inusitada. Tudo passa
a ser possível nesse contexto. A gente espera
que exista um mínimo de consistência
por parte do governo federal para dar um final a
essa questão. Se essa liminar cai, o processo
[de licenciamento] não teria impedimentos
para continuar adiante”, defende Guilherme Dutra.
De acordo com ambientalistas e
representantes da comunidade de pescadores, a instalação
de um mega-empreendimento de carcinicultura traria
danos irreversíveis à biodiversidade
e prejuízos sociais para as populações
tradicionais.
De acordo com o chefe do Parque
Nacional de Abrolhos, Marcelo Lourenço, a
construção dos criatórios de
camarões degradaria os manguezais, o que
comprometeria uma parte do ciclo de vida de espécies
que vivem nos corais. “Tem um potencial de impacto
ambiental bastante significativo. A destruição
do manguezal prejudica o Parque Nacional, o turismo,
a pesca artesanal”, explica.
“Um projeto como esse utiliza
uma quantidade de água muito grande do estuário,
essa água entra carregada de larvas de vida
marinha e retorna carregada de matéria orgânica
em decomposição e produtos químicos.
No médio prazo a gente estaria matando o
berçário do banco de corais de Abrolhos”,
acrescenta Guilherme Dutra, da Conservação
Internacional.
Cerca de 900 pessoas trabalham
atualmente com pesca artesanal na região
de Cassurubá. De acordo com a representante
da Associação de Marisqueiras de Ponta
de Areia e Caravelas, Marilene Costa, a comunidade
também é contrária ao empreendimento.
“A criação de camarões seria
péssima para a gente. Vi [em criatórios]
no Ceará como as pessoas vivem em situação
ruim, vi a degradação dos manguezais”,
conta.
"São usos incompatíveis,
enquanto a Resex busca garantir a integridade do
manguezal para a sustentabilidade das famílias
que utilizam os recursos naturais para subsistência,
o empreendimento de carcinicultura busca a privatização
da área, o que prejudica a população
e principalmente o ambiente”, afirma o chefe do
Parque Nacional de Abrolhos.