12 de Abril de 2008 - Marco Antônio
Soalheiro - Enviado Especial - Roosewelt Pinheiro/Abr
- Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR)
- Policiais federais fazem primeira incursão
à área onde terão que garantir
a paz social
Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR) -
Onze caminhonetes, pelo menos 20 agentes fortemente
armados, delegados e um negociador formam o contingente
que participa da primeira incursão da Polícia
Federal e da Força Nacional de Segurança
na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, iniciada
na Vila Surumu.
A missão agora é
somente garantir a paz social, mas na prática,
a chegada dos policiais deixou moradores assustados
e acirrou o clima de troca de acusações
entre favoráveis e contrários à
permanência dos arrozeiros na área.
“Trouxe inquietação.
A comunidade está revoltada. Não precisamos
de ninguém para fazer a nossa segurança”,
criticou Deise Henrique, mulher de um tuxaua (cacique)
ligado aos arrozeiros.
Inicialmente, o comboio policial
foi na direção da Escola Estadual
Padre José de Anchieta, onde as aulas foram
suspensas após depredação no
início do ano. De bicicleta, o jovem Felipe
dos Santos acompanhava a movimentação
e falou baixo para não ser ouvido pelos federais.
“Era para eles [policiais] terem
vindo quando estávamos em cima da ponte,
mais preparados”, disse Santos, em alusão
à base de resistência armada que moradores
tinham montado na ponte sobre o rio Surumu para
a possível desintrusão de não-índios.
Na porta da escola, o negociador
da PF esclarece para um grupo de mulheres que a
presença policial não tem mais como
objetivo retirar ninguém da área.
“O papel do negociador é diminuir atritos
quando há tensão entre a comunidade
e a própria polícia”, explicou o delegado
Fernando Segóvia, coordenador geral da operação.
O diretor da escola, Evaldo da
Silva Alves, diz ao negociador que as mulheres “são
gente do Paulo César [Quartiero, líder
dos arrozeiros]” e é xingado pelo grupo.
“A presença da polícia vai ser boa.
Aqui estamos ameaçados por pistoleiros e
tem de ter continuidade o processo de desintrusão”,
argumenta Alves.
Amazonina Batista, 57 anos e 15
filhos, diz que índios ligados ao Conselho
Indígena de Roraima (CIR) não são
moradores da Vila Surumu, mas vão lá
para provocar os que apóiam os arrozeiros.
“Eles chegam aqui na marra, ameaçando e isso
eu não aceito. Fazem barreira na rua e nos
impedem de passar”.
O comboio policial retrocede e
segue rumo ao outro lado da rua de terra batida
da Vila Surumu, onde se concentram índios
que opõem aos arrozeiros. Os relatos de ameaça
continuam, mudando apenas o acusador. O tuxaua da
comunidade do Barro, Alcides Constantino, reclama
da destruição das pontes de acesso
à vila e credita o ato ao líder dos
arrozeiros.
“A pessoa [Quartiero] não
respeita as leis. É uma área indígena
já homologada. Os pistoleiros dele passam
aqui com arma fazendo pouco da gente”. O tuxaua
confirma a montagem de uma barreira da sua comunidade,q
eu diz ser necessária para a proteção.
A professora Leontina Magalhães
responsabiliza pessoas ligadas aos arrozeiros pela
depredação da escola e diz que os
policiais devem ficar atentos aos criminosos da
região.
Uma bomba caseira foi encontrada
pelos policiais dentro da Igreja Católica
da comunidade: “Segundo ao administrador da igreja,
alguém pôs a bomba lá. Ela será
apreendida e pessoas serão ouvidas no inquérito
que apura a fabricação de bombas caseiras
aqui”, relatou o delegado Segóvia.
A noite cai em Vila Surumu e os
policias vão embora com a promessa de voltar
a partir de segunda-feira para instalar bases permanentes
ao longo da Terra Indígena Raposa Serra do
Sol. Mas não deixam saudade em todos. “Xô
urubus”, grita uma moradora aliada aos arrozeiros.
A presença ostensiva da
força policial se estenderá até
o julgamento de mérito no Supremo Tribunal
Federal de ações que contestam o decreto
de homologação da Raposa Serra do
Sol.
+ Mais
Agentes da PF farão a segurança
de terra indígena em Roraima
11 de Abril de 2008 - Marco Antônio
Soalheiro - Enviado especial - Boa Vista (RR) -
Agentes da Polícia Federal se dirigem neste
momento para a terra indígena Raposa Serra
do Sol. A partir de hoje (11), eles serão
responsáveis por garantir a segurança
pública na reserva.
“Nossa idéia é fazer
com que não haja conflitos entre ninguém
que está lá dentro. Vamos manter a
ordem e a paz social”, afirmou o delegado Fernando
Segóvia, coordenador geral da operação
Upatakon 3.
O delegado reiterou que a PF não
irá fazer a retirada dos não-índios
da Raposa Serra do Sol. A determinação
para que a PF atuasse na garantia da segurança
foi feita pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na
decisão que negou recurso da Advocacia Geral
da União contra a suspensão da operação.
"A partir de segunda-feira
(14), vamos instalar as bases permanentes da Polícia
Federal e da Força Nacional de Segurança
em pontos estratégicos da reserva",
disse Segóvia.
Os policiais vão permanecer
na terra indígena até o julgamento
de mérito das ações pendentes
no STF com relação a homologação
de Raposa Serra do Sol. Inicialmente, 300 homens
farão a segurança no local.
+ Mais
Índios da reserva Raposa
Serra do Sol discutem segurança alimentar
11 de Abril de 2008 - Paula Laboissière
- Repórter da Agência Brasil - Brasília
- Discutir segurança alimentar sem ter sua
terra reconhecida é a tarefa de Iranilde
Barbosa, indígena da etnia Macuxi que vive
na reserva Raposa Serra do Sol, no estado de Roraima.
Ao participar hoje (11) do segundo dia da Conferência
Especial pela Soberania Alimentar, pelos Direitos
e pela Vida, em Brasília, ela disse que a
situação “precária” em que
vivem os índios da América Latina
e do Caribe torna difícil assegurar o direito
à alimentação.
“Temos indígenas que estão
trabalhando nas grandes plantações
de cana-de-açúcar e de arroz como
escravos. Eles só têm a perder com
isso. O que eles [os proprietários das terras]
querem são os índios que estão
com saúde. Depois que adoecem, eles demitem”,
afirmou ela.
Iranilde lembrou que a terra indígena
Raposa Serra do Sol foi homologada em 2005, mas
a luta pela titulação da área
e pela retirada dos arrozeiros da região
permanece ainda hoje.
“Nossa terra, mesmo quando é
homologada, é invadida pelos não-indígenas
que plantam grande quantidade de acácia e
de arroz, o que nos impede de trabalhar. Não
podemos ter uma vida saudável porque, se
não tivermos a terra, não vamos ter
alimentação ou moradia.”
Ela contou que, por causa do conflito
na região, vários indígenas
acabam migrando para as cidades mais próximas,
onde a maioria vira mendigo e passa necessidades.
“Somos o povo que está
mais vulnerável a essas condições,
porque o governo não dá subsídio
para que a gente possa construir, plantar ou ter
uma alimentação saudável. Já
os grandes latifundiários têm esse
apoio do governo e dos bancos .”
Os índios de Raposa Serra
do Sol, segundo Iranilde, vivem em um pedaço
de terra que, além de disputado por muitos,
não oferece a possibilidade de métodos
tradicionais de subsistência para o povo Macuxi,
como a caça e a pesca.
“Roraima é um dos estados
da Região Norte que tem a maior área
de terras indígenas. O governo tem que tirar
aquelas pessoas [não-índios] de lá
para que a gente possa trabalhar e ter a nossa alimentação.
Esse povo trouxe mal para nós, levou bebida,
doenças e muita desunião dentro da
nossa pobre comunidade. Não é que
a gente não queira trabalhar, mas como vamos
trabalhar em um local onde a gente não tem
paz nem segurança?”