05/05/2008
- Se depender da visita realizada no último
dia 02 de maio à Usina São Martinho,
em Pradópolis, na região de Ribeirão
Preto, no Estado de São Paulo, o Brasil tem
boa chance de ter a Alemanha como aliada na polêmica
criada em torno da produção de biocombustíveis.
Como maior produtor de cana-de-açúcar
do mundo e responsável junto com os Estados
Unidos por 70% do etanol produzido no planeta, o
País enfrenta agora a acusação
de estar contribuindo para a alta dos preços
dos alimentos, fato contestado pela Unica – União
da Indústria de Cana-de-Açúcar
e pela Secretaria do Meio Ambiente do Governo do
Estado de São Paulo. Durante a apresentação
feita à comitiva de cerca de 20 parlamentares
e ambientalistas alemães, que acompanhavam
o embaixador Prot Von Kunow e o cônsul geral
Heinz-Peter Behr, além do representante do
Ministério do Meio Ambiente da Alemanha,
Jochen Flasbarth, os técnicos brasileiros
usaram dados concretos para mostrar que este tipo
de cultura ocupa pouco mais de 1% das áreas
agricultáveis do país, ficando atrás
da soja, do arroz e do milho, entre outros grãos
considerados essenciais para a alimentação.
Em compensação, fornece 50% do combustível
utilizado no país, principalmente para os
veículos “flex”, que já representam
80% da produção automobilística
brasileira.
Apesar do setor estar em franca
expansão - com cerca de 300 usinas instaladas
em todo o país, sendo quase metade delas
no Estado de São Paulo e a previsão
de crescimento de 11% na produção
de álcool a partir da safra de 2008/2009
- , o secretário estadual do Meio Ambiente,
Xico Graziano, afirmou que a ampliação
do cultivo da cana tem ocorrido principalmente em
áreas de pastagens degradadas. Ele esclareceu
que em São Paulo esse processo tem se revelado
benéfico nos aspectos sócio-ambientais,
além de contribuir para a recomposição
da cobertura vegetal natural do Estado, referindo-se
aos Projetos Ambientais Estratégicos, que
vêm sendo desenvolvidos pelo Governo em parceria
com os produtores, como é o caso do “Etanol
Verde” e da recuperação das matas
ciliares.
“Com o protocolo firmado com mais
de 80% dos produtores de cana em todo o Estado,
conseguimos antecipar em cerca de sete anos o fim
da prática da queima, que vem sendo substituída
pela colheita mecanizada” relatou o secretário
do Meio Ambiente. “Além de reduzir o impacto
negativo sobre a qualidade do ar e sobre a saúde
das populações vizinhas aos canaviais,
a mudança também está contribuindo
para a recuperação das florestas,
na medida que a mecanização inviabiliza
o cultivo nas áreas de declive acentuado,
como é o caso das margens dos rios, que voltam
a ser recobertas pela vegetação natural”,
concluiu Graziano.
Para reforçar o papel positivo
da cana na substituição de parte do
consumo de combustíveis fósseis, o
técnico da Secretaria do Meio Ambiente, Oswaldo
Lucon, deu ênfase à redução
das emissões de dióxido de carbono,
com a substituição dos derivados de
petróleo pelo biocombustível, lembrando
que no Brasil 14% da energia renovável vem
da cana-de-açúcar, quase o mesmo potencial
das hidrelétricas, que respondem por 14,8%.
A preocupação com
o desemprego, revelada por um dos deputados integrantes
da comitiva, também foi esclarecida pelo
presidente da Única, Marcos Jank, que reconheceu
que em São Paulo a mecanização
substituirá cerca de 150 mil cortadores.
“Mas estamos criando vagas mais qualificadas para
metade desse contingente, que será aproveitado
na operação dos equipamentos”, afirmou
Jank, revelando também que está em
curso um protocolo com o governo federal, garantindo
a realocação e o treinamento do restante
dos trabalhadores para outros setores do mercado.
Com isso, ele concluiu que o salto de qualidade
iniciado por São Paulo deverá se refletir
rapidamente nas outras regiões produtoras
do país.
Quanto à possível
pressão da cultura da cana sobre biomas importantes
como a Amazônia, as autoridades brasileiras
- entre as quais, os representantes do Ministério
do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco,
secretário executivo, e Egon Krakhecke, secretário
do Desenvolvimento Sustentável - garantiram
que o risco não existe. Além das políticas
ambientais em curso no País, eles apontaram
como impeditivos o clima e o solo amazônico,
e apresentaram dados que indicam a distância
de pelo menos 2,5 mil quilômetros entre as
áreas de cana do centro-sul e a floresta,
e de 2 mil quilômetros entre a área
usada por essa cultura no Nordeste, as duas principais
regiões produtoras do país.
Satisfeito com as explicações,
Jochen Flasbarth disse que a visita teve como objetivo
levar esclarecimentos ao consumidor alemão,
segundo ele extremamente exigente em relação
aos produtos que tenham impactos no meio ambiente
ou que sejam prejudiciais aos trabalhadores e populações
envolvidas. À frente da comitiva, ele substituiu
o Ministro do Meio Ambiente da Alemanha, Sigmar
Gabriel, que não pôde participar da
visita a uma das maiores usinas brasileiras, por
problemas de saúde. O aceno positivo de Flasbarth
motivou Capobianco a convidá-lo a ser parceiro
do Brasil nas discussões sobre os biocombustíveis,
na próxima conferência mundial que
está sendo organizada para avaliar o impacto
do etanol na produção de alimentos.
Embora divida com os Estados
Unidos a supremacia na produção do
etanol, utilizado basicamente para abastecer a frota
interna de veículos, o Brasil não
incorreu no mesmo erro de utilizar um alimento básico
como o milho, para transformá-lo em alternativa
aos combustíveis fósseis, segundo
argumentam especialistas e autoridades brasileiras.
Isso também não ocorre na maioria
dos países produtores da cana-de-açúcar,
que ocupa cerca de 20 milhões de hectares
das áreas agrícolas em todo o mundo,
enquanto mais de 1 bilhão de hectares são
utilizados para a produção de alimentos.
Texto: Eli Serenza Fotografia: José Jorge