15 de
Maio de 2008 - 09h16 - Última modificação
em 15 de Maio de 2008 - 09h59
Ana Luiza Zenker
Repórter da Agência Brasil
Marcello Casal Jr/ABr
Brasília- Paulo César Quartiero, prefeito
de Pacaraima e líder dos arrozeiros que lutam
contra a demarcação da Terra Indígena
Raposa Serra do Sol, no estado de Roraima, obtém
liberdade e sai da Superintendência da Polícia
Federal
Brasília - Ao deixar, ontem (14) à
noite a carceragem do Departamento da Polícia
Federal (DPF) em Brasília, o prefeito de
Pacaraima (RR) e um dos líderes dos produtores
de arroz que ocupam parte da Terra Indígena
Raposa Serra do Sol, Paulo César Quartiero,
voltou a negar que tivesse qualquer arma ou explosivo
em sua fazenda. De acordo com a Polícia Federal,
no entanto, o prefeito foi preso em flagrante porque
escondia explosivos na Fazenda Depósito,
de sua propriedade
Em entrevista exclusiva à
Agência Brasil, Quartiero acusa o ministro
da Justiça, Tarso Genro, de incitar o conflito
por parte dos índios da região contra
os arrozeiros e diz que a política do governo
federal é entregar as terras do estado a
organizações não-governamentais
estrangeiras. Ele garantiu que os produtores não
vão entregar Roraima e não vão
permitir que o governo federal entregue a Amazônia.
Confira a íntegra da entrevista:
Agência Brasil - O senhor vai voltar imediatamente
para Roraima?
Paulo César Quartiero - Logo que for possível,
voltarei para Roraima e reassumirei a prefeitura
e também a atividade lá, como agricultor.
ABr - No dia seguinte à
sua prisão, o ministro da Justiça,
Tarso Genro, disse que a ação da Polícia
Federal anulou o principal foco de tensão
na região e proporcionou uma "distensão"
do conflito. A sua volta não poderia acirrar
os ânimos de novo?
Quartiero - Não, ao contrário, a minha
volta vai acalmar. O que está levando o conflito
a Roraima é a presença da força
federal lá, sob ordens do Tarso Genro, isso
está desestabilizando a nossa região.
Eles estão lá, dizem que para manter
a ordem, e desde que chegaram para manter a ordem,
a ordem foi para o espaço. Nós sempre
propusemos a judicialização da questão,
isso nós dissemos, não precisa Operação
Upatakon 3 [deflagrada pela Polícia Federal
para retirar os não-índios de Raposa
Serra do Sol]. Queremos a judicialização,
vamos aguardar a decisão do Supremo Tribunal
Federal e nós, como escravos da lei que somos,
iremos obedecer, seja qual for. Isso nós
colocamos em ata, junto com o governador, com o
presidente do Tribunal de Justiça de Roraima
e com as autoridades do estado. Em contrapartida,
o ministro da Justiça manda um exército
invasor de 500 homens, um custo extraordinário
para a Nação brasileira, para ir lá
humilhar, intimidar e tentar tirar os agricultores
na ponta do fuzil. Quem está fazendo terrorismo
é o ministro da Justiça. Hoje, em
Roraima, há um terrorismo de Estado, que
usa as instituições federais para
implantar um clima de insegurança, de perseguição
e intimidação da nossa população.
E isso não vai dar certo, porque a nossa
população pode ser pobre, pode ser
pequena, mas é briosa e tem sentimento, tem
patriotismo e vai reagir sim.
ABr - O senhor comentou, quando
estava saindo do Departamento de Polícia
Federal, que as bombas na verdade que existem por
lá são o Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária [Incra], a Fundação
Nacional do Índio [Funai] e o Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
[Ibama], e que na sua propriedade o senhor não
tinha conhecimento de que havia alguma arma. O fato
é que a polícia diz que foram encontradas
armas e explosivos e que, por isso, o senhor foi
preso. Se não havia armas, qual foi o motivo
da prisão?
Quartiero - A Polícia Federal já saiu
de Boa Vista [capital do estado] com a ordem de
me prender e a todos os trabalhadores da minha fazenda.
Eles já levaram ônibus para trazer
as pessoas. Quando eu cheguei na PF em Boa Vista,
preso, o superintendente foi cumprimentar o Romero
[Fernando Teixeira, delegado da PF] pelo cumprimento
da missão, que era me prender. Eles iam achar
qualquer coisa lá. E quando foram fazer aquela
busca e apreensão, eu não estava lá,
eu estava a nove quilômetros. Por que não
me convidaram para acompanhar a busca? Não,
chegaram lá, colocaram todos os funcionários
de cara no chão, com arma nas costas e na
cabeça, trancaram a entrada da imprensa,
de toda a imprensa que estava lá e fizeram
a revista. Por que não levaram alguém
para conferir o que eles estavam encontrando? Tudo
muito suspeito, uma coisa fabricada.
ABr - E esses explosivos que a
polícia afirma que encontrou teriam saído
de onde, então?
Quartiero - Não encontraram explosivo nenhum,
porque não tinha. Não encontraram
nada. A nossa reação lá foi
buscando a justiça, e o ministro da Justiça
usando a força contra a população
de Roraima. Houve manifestação popular.
E essa coisa de dizer que é arrozeiro contra
índio não existe, o que existe é
a população de Roraima contra a política
do governo federal, que está subordinado
ao interesse internacional. Isso é o que
há em Roraima.
ABr - No dia anterior à
prisão, houve o conflito com os índios.
Houve alguma ordem para os seus funcionários
atirarem?
Quartiero - Aquele acontecimento foi fabricado.
Os índios entraram na minha fazenda liderados
por funcionários da Funai, com viaturas da
missão católica e com o respaldo e
apoio da Polícia Federal. Foi uma invasão
feita para ter um conflito e morrer alguém,
para eles terem uma bandeira, poderem apresentar
algum mártir. Ali foi uma invasão
oficial. E os nossos funcionários foram lá
e houve um confronto. Nós tínhamos
determinado a defesa do imóvel, sem uso de
violência. Mas quando a violência é
empregada também... quando chegaram lá
foram flechados e eu não estava lá,
não sei, imagino que foram reagir a isso
e houve o confronto, saíram feridos, como
em todo confronto há feridos. Mas quem é
responsável por aqueles feridos é
o ministro da Justiça. Ele esteve lá
e fez um acordo para o pessoal passar para o outro
lado da cerca. Por que ele não fez isso antes,
para evitar isso? Não, ele foi o incentivador,
com as atitudes dele, incentivador daquele conflito.
ABr - E agora, quais vão
ser as ações?
Quartiero - Nós temos que parar um pouco,
raciocinar, unir as forças políticas,
econômicas, a população de Roraima
e traçar um plano de desenvolvimento. Chega
dessa política do governo federal, que vai
lá para esmagar, humilhar nosso cidadão.
Nós precisamos de uma política de
desenvolvimento que envolva nossa sociedade e aí
sim em vez de as pessoas estarem uma brigando com
a outra, todo mundo vai procurar trabalhar e progredir.
Isso é de que nós precisamos, uma
política de desenvolvimento para o estado
de Roraima. Essa política não serve,
tem que ser mudada e nós precisamos ter competência,
de nos unirmos todos, nós que moramos lá,
e exigir do governo federal primeiro que pare de
perseguir o estado, se não quer ajudar, que
não atrapalhe, e em segundo lugar, nós
nos unirmos e termos um plano de desenvolvimento,
que aí sim vai unir todos em prol de um objetivo
comum.
ABr - E até a decisão
do Supremo, que deve sair em junho, vai-se tentar
evitar conflito?
Quartiero - Mas nós somos trabalhadores.
Nós somos produtores. Estamos impedidos de
trabalhar, porque estamos presos. Se vê lá,
a crise alimentar que está se avizinhando,
nossa população dependente de produção
de arroz, de carne, de soja, que é minúsculo,
o nosso estado e nós aqui, em vez de estarmos
nas propriedades, trabalhando, produzindo, estamos
aqui, prendendo, perseguindo, querendo acabar com
o pouquinho que Roraima tem. Isso é um absurdo,
é uma política que não serve
para Roraima, não serve para o Brasil também.
ABr - Outro ponto é que
há uma crítica de que a Igreja manipula
os índios que são a favor da demarcação
contínua. Qual a sua visão em relação
a isso?
Quartiero - Em Roraima tem uma conspiração,
para a retirada dos brasileiros, colocando em seu
lugar ONGs [organizações não-governamentais]
estrangeiras. Isso é uma conspiração
que envolve órgãos do governo federal
e também envolve certamente o Cimi [Conselho
Indigenista Missionário], que é um
órgão da Igreja Católica.
ABr - E da parte dos produtores,
não existiria alguma forma de manipulação
dos indígenas que são a favor da permanência
dos arrozeiros em Raposa Serra do Sol?
Quartiero - Isso é uma coisa que envolve
até um desprestígio à figura
do indígena. Porque nós dizemos que
são manipulados os indígenas do CIR
[Conselho Indigenista de Roraima], agora do nosso
lado também estarão sendo manipulados.
Eu acho que seria desconsiderar a inteligência
e a capacidade de reflexão dos nossos indígenas,
seria uma forma de racismo.
ABr - E qual seria o prejuízo,
para o estado de Roraima, com a demarcação
contínua e a saída dos produtores
de arroz da Terra Indígena Raposa Serra do
Sol?
Quartiero - Nesse ponto eu posso falar, eu sou neto
de agricultor, filho de agricultor, estou há
32 anos trabalhando com agricultura, sou um pioneiro
em Roraima. É evidentemente o sonho nosso
transformar Roraima na vocação dele,
que é ser o celeiro da Amazônia, que
lá nós temos terra de cerrado, que
não precisa desmatar nem uma árvore
pra plantar, temos que abastecer o Amazonas, temos
que abastecer o Caribe. Nós temos um potencial
extraordinário. Eu acredito que se houver
o fechamento, vai ser o fim desse sonho em curto
prazo, em médio prazo também. Porque
quem hoje carrega a bandeira do desenvolvimento
da agricultura, que é a vocação
de Roraima, não tem outra vocação,
somos nós, os produtores que estão
lá, produzindo nesse instante.
ABr - E sobre a questão
de que há desmatamento, agressão ao
meio ambiente?
Quartiero - Isso aí eu já disse anteriormente,
é o uso do ambientalismo como arma política.
Dizer que há desmatamento naquela região...
A minha fazenda é de 1922, aquela é
uma região de cerrado, nunca teve árvores
lá e desde 1922 aquela fazenda vem sendo
utilizada para atividade econômica. Então,
falar em desmatamento, falar em agressão
ao meio ambiente... Nós, na realidade, transformamos
aquelas áreas em oásis de vida, seja
humana, seja fauna e flora. Na realidade, o agricultor
é o jardineiro de Deus. Nós estamos
lá trabalhando para melhorar a obra do nosso
Criador.
O Ministério da Justiça
está sendo procurado, neste momento, para
se pronunciar sobre a entrevista. O ministro Tarso
Genro está no Rio de Janeiro, onde assina,
às 12h30, convênios com o governador
do Rio, Sérgio Cabral, para a liberação
de R$ 55,32 milhões destinados a equipar
as Polícias Civil e Militar nas operações
de repressão ao crime organizado. A assinatura
será no Palácio Guanabara, sede do
governo estadual.
Antes, às 10h, Tarso Genro
participa de sessão da Caravana da Anistia
para julgar processos de ex-militantes estudantis
presos e torturados durante a ditadura militar.
Será no terreno da Praia do Flamengo que
já foi sede da União Nacional dos
Estudantes (UNE).
+ Mais
Decisão do STF sobre Raposa
Serra do Sol deve sair em meados de junho
15 de Maio de 2008 - 14h30 - Última
modificação em 15 de Maio de 2008
- 16h55
Roberta Lopes
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF) Carlos Ayres Brito, relator das ações
que contestam a demarcação da Terra
Indígena Raposa Serra do Sol, afirmou hoje
(15) que deve dar o voto sobre o caso por volta
do dia 15 ou 16 de junho.
"Diante do que houve não
é irrazoável dizer que lá para
15 ou 16 de junho o processo esteja maduro. Nunca
é bom trabalhar com datas quando se trata
de processo judicial, porque o processo é
dinâmico e a imaginação das
partes também é pródiga",
disse o ministro.
Existem no Supremo 33 ações
que contestam a demarcação da terra
indígena. A ação proposta pelo
governo de Roraima contesta, entre outros pontos,
o laudo antropológico no qual o governo federal
se baseou para homologar reserva em área
continua.
+ Mais
Tarso Genro evita comentar acusações
contra ele feitas por líder arrozeiro
15 de Maio de 2008 - 11h15 - Última
modificação em 15 de Maio de 2008
- 11h19
Isabela Vieira
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - O ministro da Justiça, Tarso
Genro, evitou comentar as acusações
contra ele feitas pelo prefeito de Pacaraima (RR)
e líder dos produtores de arroz que ocupam
parte da Terra Indígena Raposa Serra do Sol,
Paulo César Quartiero.
Ontem à noite (14), ao
deixar a carceragem do Departamento da Polícia
Federal (DPF) em Brasília - onde estava preso
desde o dia 6 de maio -, Quartiero disse que o Tarso
Genro incita o conflito por parte dos índios
da região contra os arrozeiros.
“Eu, como ministro da Justiça,
não posso responder frases de uma pessoa
que está sendo processada e que será
denunciada pelo Ministério Público
pelos atos ilegais que está cometendo”, afirmou
Tarso, que participa hoje (15), no Rio de Janeiro,
de sessão da Caravana da Anistia para julgar
processos de ex-militantes estudantis presos e torturados
durante a ditadura militar.
+ Mais
Índios de Roraima defendem
segurança reforçada em retorno de
Quartiero
15 de Maio de 2008 - 17h24 - Última
modificação em 15 de Maio de 2008
- 17h24
Marco Antônio Soalheiro
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A liberdade provisória
concedida pela Justiça ao líder dos
arrozeiros de Roraima e Prefeito de Pacaraima, Paulo
César Quartiero, foi recebida com certo temor
pelos índios, que querem a demarcação
da Terra Indígena Raposa Serra do Sol em
área contínua e a saída dos
produtores de lá. Eles se dizem preocupados
com possíveis agressões, a partir
do retorno do arrozeiro ao estado e consideram necessário
que Polícia Federal redobre a atenção
na área.
“Ele [Quartiero] nesse pedaço
sempre foi e sempre será um risco. É
importante reforçar, fazer melhor essa organização
de vigilância, para que não volte a
ocorrer o que aconteceu com as comunidades indígenas”,
afirmou à Agência Brasil o coordenador
geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR),
Dionito José de Souza, referindo-se ao episódio
em que dez índios, que ocupavam uma fazenda
de Quartiero, foram baleados por funcionários
do arrozeiro.
De sua parte, os índios
prometem não voltar a entrar na propriedade
de Quartiero até o julgamento no Supremo
Tribunal Federal (STF) das ações que
contestam a demarcação da reserva,
previsto para junho. Garantem também estar
totalmente liberado o trânsito dos arrozeiros
na estrada RR 319, que tinha sido bloqueada por
duas comunidades.
“É mentira dizer que ainda
tem bloqueio. Ninguém está nem sabendo
o que está passando, se tem arma, se tem
bomba ou fertilizante. Está livre [a estrada]
e os indígenas estão na comunidade,
dentro da aldeia”, disse Souza.
O dirigente do CIR informou que
dedicará os próximos dias a esclarecer
as comunidades sobre o estágio das discussões
da demarcação na Justiça. Mas
há uma posição intransigente:
“ Não aceitamos demarcação
em ilhas”, avisou Dionito.