28 May 2008
Por Geralda Magela
É possível aliar a conservação
da onça-pintada com a atividade pecuária?
Com o objetivo de ampliar essa discussão,
o WWF-Brasil e o Instituto Pró-Carnívoros
organizaram um encontro no último dia 26
de maio, na Fazenda São Francisco, no município
de Miranda (MS). O evento reuniu pecuaristas tradicionais
do Pantanal, pesquisadores, pecuaristas e representantes
dos produtores rurais e de órgãos
de fiscalização dos governos federal
e estadual, como a polícia ambiental e a
Embrapa
O encontro teve por objetivo apresentar
dados e pesquisas realizadas visando à conservação
da onça-pintada no Pantanal, os projetos
em andamento e perspectivas de futuro. Entre os
projetos apresentados está o Onça
Pantaneira, desenvolvido pelo Instituto Pró-Carnívoros
com o apoio do WWF-Brasil na Fazenda São
Bento, no município de Corumbá e o
projeto Gadonça, realizado na Fazenda São
Francisco, município de Miranda (MS).
Maior felino das Américas,
a onça-pintada sempre teve uma relação
de conflito com os fazendeiros principalmente devido
à predação do gado. Minimizar
esse conflito é o principal objetivo dos
projetos que buscam, por meio do conhecimento científico,
garantir a conservação da onça
e o desenvolvimento da pecuária, a maior
atividade econômica da região.
“Nossa preocupação
não é isolar a onça, mas garantir
que ela e a pecuária possam conviver”, diz
o pesquisador Fernando Azevedo, do Pró-Carnívoros.
Desde 2003, ele vem estudando o comportamento e
padrões de predação das onças
do Pantanal, primeiro com o projeto Gadonça,
na Fazenda São Francisco, e a partir de 2007
com o projeto Onça Pantaneira, apoiado pelo
WWF-Brasil. Os resultados das pesquisas estão
sendo repassados aos pecuaristas para auxiliá-los
a desenvolver técnicas de manejo do gado
que levem em conta a preservação da
onça no Pantanal.
Um dado interessante observado
na pesquisa é que a presença de presas
silvestres na região - como a capivara, o
cervo e o tamanduá - diminui o ataque ao
rebanho. “Quanto mais preservada estiver a região,
menos a onça precisa utilizar o gado para
se alimentar”, destaca Azevedo. Os estudos também
mostraram que existe um limite de até 200
metros para o ataque das presas fora da mata.
Na Fazenda São Francisco,
o produtor rural Roberto Coelho conseguiu reduzir
bastante a mortandade do gado por ataque de onça
depois que passou a usar as técnicas de manejo.
Hoje não deixa os animais perto da mata –
principalmente os bezerros que são mais vulneráveis-
e sempre muda o rebanho de lugar. Ele também
não permite a caça de animais silvestres
na fazenda, como a capivara. “Se esses animais acabarem
certamente a onça vai buscar alimento no
gado”, ensina.
Além do ganho ambiental,
a conservação também gera recursos
para a fazenda, que usa a focagem de onças
como principal atrativo turístico. “Os turistas
vêm aqui porque sabem que as chances de ver
a onça são muito grandes”, diz o pecuarista.
Na fazenda São José,
do produtor rural João Ildefonso Murano,
no município de Aquidauana, praticamente
não aparecem onças-pintadas. Segundo
ele, o maior conflito na sua região é
com a onça- parda. “Ela é mais mansa
que a onça-pintada e chega bem perto da casa
para pegar o gado”, conta. Ele diz que participou
do encontro com o objetivo de conhecer melhor esse
trabalho e poder aplicar as técnicas de manejo
na sua propriedade. “Espero que essas pesquisas
sejam estendidas também para a onça-parda”.
Envolvimento do setor produtivo
O envolvimento do setor da pecuária
nos projetos de conservação é
uma das atividades desenvolvidas pelo WWF-Brasil,
por meio do Programa Pantanal para Sempre. Esse
trabalho começou em 2003 com o estímulo
à pecuária orgânica no Pantanal
como forma de estimular a adoção de
melhores práticas produtivas na região.
A experiência acumulada com essa articulação
do setor produtivo agora está sendo ampliada
com o projeto de conservação da onça.
Na apresentação
sobre Certificação e Responsabilidade
Socioambiental na Pecuária, o assessor de
Conservação do Programa Pantanal para
Sempre, Ivens Domingos, ressaltou a importância
dessas parcerias. “A participação
de diferentes atores no encontro mostra que temos
um objetivo comum, o de trabalhar pela conservação
buscando estabelecer uma relação positiva
de ganha-ganha para a natureza e o produtor rural”,
ressaltou.
O Assessor de Meio Ambiente da
Federação de Agricultura e Pecuária
do Mato Grosso do Sul (FAMASUL), Josiel Quintino
dos Santos, elogiou a iniciativa. Para ele, é
muito boa essa proposta de parceria com os produtores
rurais do Pantanal visando identificar as causas
de predação e, em função
disso, propor um manejo para a conservação
da onça-pintada. “É primeira vez que
ONGs vêm apresentar um trabalho de conservação
que envolve o produtor rural. Considero muito positiva
essa participação”, ressaltou.
No encontro, os participantes
também puderam conhecer o Programa de Envolvimento
de Pecuaristas do Pantanal e Conservação
da Onça-Pintada, apresentado pelo pesquisador
Ricardo Boulhosa, da Wildlife Conservation Society
(WCS). De acordo com Boulhosa, não é
possível desenvolver atividades de conservação
da onça sem levar em conta a pecuária.
“É importante encorajar os fazendeiros a
encontrar soluções para uma coexistência
mais harmoniosa com a onça, reduzindo o impacto
econômico da predação em suas
propriedades”.
A programação incluiu
também espaço para o debate e a participação
do setor produtivo e das demais entidades presentes
na definição de estratégias
conjuntas para futuros projetos que possam minimizar
o conflito entre a pecuária e a onça.
Entre as propostas apresentadas
pelos pecuaristas nas discussões está
a sugestão de se criar mecanismos de compensação
para quem conserva o meio ambiente. A intenção
é mobilizar os governos para que seja concedido
algum tipo de benefício ao produtor. Eduardo
Batistoti, gerente da Estância Miranda, acha
que deve ter algum incentivo. “Nós estamos
conservando e, de alguma forma, isso deveria ser
retribuído”, opinou, embora ainda não
saiba como isso possa ser feito.
Batistoti conta que está
começando a utilizar as sugestões
da pesquisa no manejo da fazenda para reduzir a
mortandade de gado em função da predação
de onças. Para ele, o encontro foi bastante
instrutivo e espera que a experiência se repita.
“Acho que este deve ser apenas o primeiro encontro.
Ainda temos muita coisa para aprender com essas
experiências”, concluiu. A proposta foi aceita
pelos organizadores que se comprometeram a organizar
um novo encontro ainda neste ano.
+ Mais
Encontro com pecuaristas vai discutir
conservação da onça-pintada
no Pantanal
23 May 2008 - O WWF-Brasil e o
Instituto Pró-Carnívoros realizam
no próximo dia 26 de maio, na Fazenda San
Francisco, no município de Miranda (MS),
o encontro Conservação da Onça-pintada
e a Pecuária Pantaneira. O evento tem por
objetivo apresentar projetos de conservação
da onça-pintada ao setor produtivo da pecuária,
entidades de pesquisa e órgãos governamentais.
No encontro, serão apresentados
os mais recentes dados e as pesquisas feitas para
conservação da onça-pintada
no Pantanal, os projetos em andamento e perspectivas
de futuro. Os participantes também vão
conhecer experiências de pecuaristas que apóiam
projetos de conservação da onça-pintada
no Pantanal.
A programação inclui
a apresentação do pesquisador Fernando
Azevedo, do Pró-Carnívoros, sobre
os projetos Gadonça e Onça Pantaneira
e a visão do proprietário da Fazenda
São Bento, Marcos Ermírio de Moraes.
Ivens Teixeira, Analista de Conservação
do programa Pantanal para Sempre do WWF-Brasil fará
uma palestra sobre Certificação e
Responsabilidade Socioambiental na Pecuária.
Os participantes também
irão conhecer os resultados do Programa de
Envolvimento de Pecuaristas do Pantanal e Conservação
da Onça-Pintada, que será apresentado
por Ricardo Boulhosa, da Wildlife Conservation Society
(WCS). A programação inclui espaço
para o debate e a participação do
setor produtivo e das demais entidades presentes
na definição de estratégias
conjuntas para futuros projetos que possam minimizar
o conflito entre a pecuária e a onça.
O projeto Onça Pantaneira
O projeto Onça Pantaneira
é uma parceria do Instituto Pró-Carnívoros
e do Programa Pantanal para Sempre do WWF-Brasil
voltado para a consercação da onça-pintada
no Pantanal. O objetivo é utilizar o conhecimento
científico para encontrar alternativas de
produção sustentável nas fazendas
das regiões pantaneiras que levem em conta
a preservação do animal.
O projeto conta com recursos da
Fazenda Real (filial São Bento) e do Departamento
de Agricultura, Natureza e Qualidade dos Alimentos,
vinculado à Embaixada dos Países Baixos.
O trabalho é realizado pelo pesquisador Fernando
Azevedo, do Pró-Carnívoros, organização
não-governamental que desenvolve pesquisas
sobre diferentes espécies de carnívoros
em vários dos biomas brasileiros.
Nos próximos anos o pesquisador
e sua equipe vão continuar os estudos sobre
o comportamento das onças-pintadas do Pantanal
para saber como elas vivem, os padrões de
predação e outros dados sobre um dos
mais belos animais da fauna brasileira. Essas informações
serão usadas para desenvolver atividades
de manejo nas fazendas de gado nas áreas
do Pantanal onde são encontrados os felinos.
Espécie ameaçada
de extinção e, ao mesmo tempo, emblemática
das florestas brasileiras, a onça muitas
vezes é considerada pelos fazendeiros uma
ameaça, devido à predação
do gado. Diminuir esse conflito é um dos
objetivos do projeto, que busca entender melhor
os diferentes fatores envolvidos na predação
de animais domésticos e as possíveis
formas de minimizar essas ocorrências.
Os resultados da pesquisa serão
usados para sensibilizar os pecuaristas a encontrar
alternativas de convivência pacífica
que permitam a sobrevivência da espécie
e o desenvolvimento da pecuária, principal
atividade econômica da região.
A onça-pintada é
o maior felino do continente americano, podendo
chegar a 135 kg. É um animal robusto, com
grande força muscular, sendo a potência
de sua mordida considerada a maior dentre os felinos
de todo o mundo. Suas presas naturais são
animais silvestres como catetos, capivaras, jacarés,
queixadas, veados e tatus. As crescentes alterações
ambientais provocadas pelo homem representam as
principais ameaças à população
de onças, assim como o desmatamento e a caça
às presas silvestres e às próprias
onças.
A preservação da
espécie é muito importante para a
conservação da biodiversidade. Por
ser um animal com necessidade de áreas grandes
e preservadas para sua sobrevivência e por
estar no topo da cadeia alimentar, conservar a onça-pintada
é conservar o futuro de todos nós.