21 de
Julho de 2008 - Danilo Macedo - Repórter
da Agência Brasil - Brasília - A crise
mundial de alimentos deve se acentuar no prazo de
três anos. No entanto, o Brasil pode se beneficiar
desse fato por ser o único país do
mundo com todas as condições (espaço,
tecnologia, água, clima e estrutura de produção
de agronegócio) para aumentar a produção,
segundo estudo feito pela Organização
das Nações Unidas para Agricultura
e Alimentação (FAO). A afirmação
foi feita pelo ministro da Agricultura, Reinhold
Stephanes, em entrevista à Agência
Brasil.
O ministro disse que o Brasil
chegará ao fim da crise em posição
de destaque no cenário mundial, mas precisa
resolver, internamente, questões de legislação
ambiental. Stephanes é a favor de que haja
flexibilização em relação
às áreas que já foram degradadas.
"Eu sou tão ambientalista que acho que
não devemos derrubar uma árvore para
aumentar a nossa produção, mas eu
também acho que devemos utilizar o que já
está aí."
Entretanto, ele estima que se
as leis que condicionam o plantio continuarem avançando
nos mesmos patamares de hoje, restarão poucas
áreas para cultivo: “teremos congelado de
80% a 85% do território”.
O aumento da produtividade é
o primeiro fator para alcançar um aumento
significativo na produção de alimentos,
segundo o ministro. Por isso, a preocupação
do governo em investir em pesquisas, com a liberação
de R$ 1 bilhão para a Empresa Brasileira
de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), e de
uma linha de crédito de mais R$ 1 bilhão
para agropecuaristas interessados em recuperar áreas
degradadas.
Agência Brasil: Alguns especialistas
dizem que a crise mundial de alimentos vai durar
de cinco a dez anos. Outros chegam a falar em 20
anos. Como o Brasil pode se sobressair nesse cenário
de crise?
Reinhold Stephanes: O que acabou criando todo esse
cenário foi o crescimento da economia mundial.
Não se conhece na história um período
em que a economia mundial tenha crescido de forma
global, a taxas tão elevadas, por tempo tão
longo. Isso, evidentemente, aumentou renda e aumentou
demandas por matérias-primas, por energia
e por alimentos. Há um desequilíbrio
entre a demanda e a oferta e os preços aumentaram
bem. De qualquer forma, que isso dure cinco anos,
que isso dure dez anos - na minha visão,
daqui dois ou três [anos] esse fenômeno
vai se acentuar - é claro que isto é
uma oportunidade boa para o Brasil. Existe um estudo
da FAO [Organização das Nações
Unidas para Agricultura e Alimentação]
feito em todos os países que têm condições
de aumentar a produção, que verifica
cinco condições importantes - espaço,
tecnologia, água, clima e estrutura de produção
de agronegócio -, e o único país
que satisfaz as cinco condições é
o Brasil.
ABr: O Brasil está preparado
para assumir a frente desse processo de aumento
de produção?
Stephanes: São raros os países que
conseguem crescer em média 5% ao ano em agricultura,
em períodos longos, como o Brasil vem fazendo
nos últimos 20 anos. Dentro desse padrão
de crescimento ele mantém também um
ganho de produtividade extremamente elevado. Dos
5% de crescimento, 3,5% são ganhos de produtividade.
Por outro lado, ele vem se firmando, cada vez mais,
como país exportador de produtos agrícolas,
porque há muito tempo é o país
que mais cresce em excedentes de exportação.
Há uma situação fora e uma
situação aqui perfeita, com três
dificuldades que nós temos ainda: de infra-estrutura
interna – o PAC [Programa de Aceleração
do Crescimento] prevê já algumas obras
para isso –, uma dificuldade cambial, e uma dificuldade
da nossa dependência e vulnerabilidade de
adubos, que são três questões
que nós temos que tratar. Eu diria até
que há uma quarta, que é a questão
do meio ambiente.
ABr: Como encontrar um equilíbrio
entre produção agrícola e preservação
do meio ambiente?
Stephanes: Não quero criar um impacto maior,
mas é aquela brincadeira. Daqui a pouco nós
vamos extinguir a nossa produção agrícola,
porque se nós formos vendo os avanços
que houve nas leis que vão condicionando
o plantio, chega-se ao ponto tal que hoje nós
temos 70% do território brasileiro congelado
com áreas de preservação ambiental.
E se continuar a mesma curva que vem vindo por mais
10 anos, daqui a pouco teremos congelados de 80%
a 85% do território. Eu sou tão ambientalista
que acho que não devemos derrubar uma árvore
para aumentar a nossa produção, mas
eu também acho que devemos utilizar o que
já está aí. Quer dizer, por
um lado não derruba mais nada e, por outro
lado, se flexibiliza o que já está
antropizado, o que já está derrubado.
Eu não vou chegar em Minas Gerais e dizer:
olha gente, vocês estão plantando há
100 anos nas encostas, parem de plantar. Eu não
vou chegar para um produtor em Minas, ou no Paraná,
que utilizou 100% da área e dizer olha, agora
você vai ter que reflorestar. O dado concreto
é que quando se analisa o que há de
restrição e o que há de plantio,
significa que já tem gente irregular, porque
a parte plantada já ultrapassa os 30%. Eu
não quero levantar essa discussão,
mas só vou mostrar isso aqui para você.
(O ministro mostra o mapa de uma fazenda do estado
de Mato Grosso). Eu acho que esse proprietário
aqui mereceria elogios. Olha aqui como ele manteve
a floresta, a mata ciliar em volta do rio. Mas você
sabe o que aconteceu com ele quando foi regularizar
a propriedade? Levou uma multa de R$ 1 milhão.
Falta racionalidade. Ele não é um
criminoso. É um produtor, e que, aliás,
tem a propriedade bem estruturada, que até
merecia elogios. Mas quem foi olhar não considerou
nada disso. Porque no passado, na Amazônia,
era dito ao proprietário para manter 50%
da propriedade sem derrubar. Mas, naquela época,
não existiam essas reservas permanentes todas
que hoje tem aqui. De repente, começou todo
ano a criar uma, duas, três reservas permanentes,
com milhões de hectares.
ABr: Como resolver essa questão
ambiental?
Stephanes: Precisaria reconceituar tudo. Precisaria
bom senso, sentar numa mesa, com racionalidade,
fazer o que o resto do mundo faz. Não faz
o que a gente faz. É que nunca ninguém
havia montado esses mapas. (Ministro mostra mapa
do Brasil identificando todas as reservas ambientais).
Ninguém tinha idéia de que nós
estávamos nessa situação. Aqui
estão os cálculos: se trabalharmos
corretamente na Amazônia, só está
livre [para agricultura] 6,96% da área. No
Brasil todo, 33%.
ABr: E como enfrentar essas dificuldades
e aumentar a produção?
Stephanes: O que se procura, em primeiro lugar,
é aumento de produtividade e utilização
mais racional das áreas chamadas degradadas
ou de baixa produtividade, que são muitas,
principalmente pastagens. Ou seja, diminuir área
de pastagens, passar a produzir grãos e melhorar
a pastagem do remanescente para produzir mais boi
por hectare do que se produz hoje. O PAC da Embrapa
faz parte disso. Até porque cria três
unidades permanentes. Uma em Mato Grosso, maior
produtor de grãos e de carnes do Brasil,
que não tem uma unidade da Embrapa, uma em
Tocantins e outra no Maranhão, que também
não têm.