2 de Setembro
de 2008 - Vinicius Konchinski - Repórter
da Agência Brasil - São Paulo - As
gestantes das tribos Guarani que optarem por ter
seu bebê fora da aldeia têm direito
a um tratamento diferenciado em dez hospitais públicos
do estado de São Paulo. De acordo com uma
resolução publicada em julho pela
Secretaria de Saúde paulista, nos casos de
partos envolvendo indígenas da etnia, parteiras
e pajés podem acompanhar os nascimentos,
o cardápio oferecido às mães
deve ser especial e até a placenta dos bebês
tem que ser entregue às famílias,
para depois serem enterradas.
Desde 2002, o estado de São
Paulo é o primeiro do país a manter
um programa de saúde voltado ao respeito
das tradições de uma etnia indígena.
Neste ano, o estado ampliou de seis para dez o número
de unidades de saúde credenciadas para realizar
o atendimento adaptado. “Tudo isso para deixar as
mães mais à vontade”, de acordo com
a coordenadora de saúde dos povos indígenas
da secretaria estadual, Augusta Sato.
Segundo ela, determinação
para as mudanças no atendimento surgiu de
reivindicações da própria comunidade
indígena encaminhadas à secretaria
e à Fundação Nacional de Saúde
(Funasa) a partir 2002. Os dez hospitais credenciados
para o atendimento dos índios foram escolhidos,
justamente, devido à proximidade com as maiores
aldeias guarani do estado.
Dados da secretaria apontam que
apenas 20% das índias Guarani escolhem ter
seu filho em hospitais. Contudo, certos costumes
arraigados acabam prejudicando a saúde dos
indígenas, mesmo quando eles vão às
unidades de saúde por iniciativa própria.
Por isso, o atendimento especial.
“Quando ganham bebês, as
índias não comem carne vermelha, por
exemplo. Muitas iam aos hospitais e voltavam para
aldeia muito magras”, explicou Sato, ressaltando
que, nos hospitais capacitados, o cardápio
das gestantes inclui frango novo, arroz, mingau
e milho e derivados.
“Os guaranis reclamavam que não
podiam enterrar a placenta dos filhos. Nos hospitais,
elas recebem a placenta assim que deixam o hospital”,
complementou, acrescentaando ainda que os cuidados
diferenciados também são estendidos
aos recém-nascidos e ao pós-parto,
caso seja vontade de vontade da mãe.
Sato disse que a iniciativa já
tem dado resultado. Segundo ela, as equipes de saúde
que freqüentam as aldeias já notaram
que as parteiras estão se sentido valorizadas
e as mães, mais seguras para tomarem sua
decisão. “Elas confiam no pajé e na
parteira, pois vêem que o método deles
está sendo reconhecido”, afirmou. “O número
de partos nas aldeias até aumentou depois
das mudanças nos hospitais.”
Paulo Sellera, chefe da saúde
indígena da Funasa em São Paulo, confirma
as mudanças. Para ele, a iniciativa do governo
paulista consegue integrar a medicina tradicional
e a hospitalar e já resultou em queda de
mortalidade infantil, de complicações
no parto e de internações devido a
esse tipo de complicação.
De acordo com a Funasa, dados
preliminares de 2007 mostram que, para cada mil
nascimentos, ocorreram 26,8 mortes de crianças
de até 1 ano. Em 2002, ano que o atendimento
especial começou a ser implantado, o índice
de mortalidade era de 33,5 no interior do estado
e 52,6 no litoral sul.
Roberto Karai Tataendy Veríssimo,
guarani residente da aldeia de Parelheiros, no município
de São Paulo, confirma que o sistema funciona.
Segundo ele, no Hospital Geral de Pedreira, a mais
próxima unidade de saúde capacitada
para atendimentos especiais de sua tribo, as mulheres
têm recebido cuidados diferenciados.
Veríssimo, entretanto,
afirmou que alguns ajustes ainda precisam ser feitos.
“A placenta tem que ser devolvida ao pai logo após
o parto. Faz parte de nossa tradição”,
sugeriu.