08/09/2008 - Caros amigos, companheiras,
ambientalistas - Eu não pedi para ser ministro,
não queria e ainda coloquei condições
para aceitar. Conhecia o tamanho do desafio, o que
a ministra Marina Silva havia penado (sempre com
o meu apoio, nas horas mais difíceis). Aqui
vai um balanço e uma resposta às questões
que foram deformadas por uma parte da mídia.
É uma prestação de contas,
sobretudo para aqueles que conhecem minha história
e sabem que não permitirei que o Pantanal
se transforme num canavial, que não pedirei
adiamento das normas para redução
do teor de enxofre no diesel, que não aceitarei
que a floresta nativa da Amazônia
se converta em plantação de exóticas.
Neste período o presidente Lula assinou 10
decretos que preparamos, como o Fundo Amazônia,
o decreto que regulamenta e reprime crimes ambientais,
o Fundo Clima, 3 grandes unidades de conservação
na Amazônia, o preço mínimo
para os produtos extrativistas; assinei outras 3
portarias: a que agiliza o acesso de cientistas
à biodiversidade, com co-responsabilidade,
a que abre a Câmara de Compensação
Ambiental (com direito a voto) às ONGs, universidades,
Anamma, Abema e empresários, e atos que incentivam
a criação de RPPNs; assinamos 5 acordos
públicos com setores produtivos e ONGs, como
a Moratória da Soja e o Pacto pela madeira
Legal e Sustentável; mas a crítica
a mim dirigida não se baseia nestes 18 atos
reais e publicados, mas sim em extratos de declarações
na mídia, especulações, TODOS
desmentidos, que não se sustentam em fatos.
Nestes 100 dias estivemos em ações
diretas na Amazônia, combatendo o desmatamento
e as queimadas, em ações no Nordeste,
defendendo o bioma Caatinga e destruindo 300 fornos
ilegais de carvão (em Pernambuco), em reuniões
com os 9 governadores da Amazônia (em Belém)
onde conseguimos reverter a pressão e manter
a resolução do Banco Central que corta
o crédito aos proprietários que estejam
na ilegalidade fundiária ou ambiental. Apreendemos
e leiloamos gado ilegal em unidades de conservação
na Amazônia. Obtivemos reduções
substanciais nas taxas de desmatamento em 3 meses,
com um resultado expressivo em julho, de queda de
60%. Estes números são instáveis
e precários, apesar do imenso esforço,
pois a pressão é enorme, agravado
pelas eleições; o ritmo das ações
do Arco Verde e de criação de empregos
sustentáveis (que depende de 8 ministérios)
é muito lenta; o Ibama fecha uma serraria
ilegal em uma hora, mas o governo não cria
50 empregos sustentáveis neste tempo, e o
desempregado vai desmatar 5 km adiante.
Relacionamos abaixo medidas executadas, suposições
infundadas e os imensos desafios.
1) PANTANAL
O IBAMA rastreou e multou em mais de R$ 400 milhões
dezenas de carvoarias que estavam transformando
áreas do Pantanal e do Cerrado em carvão
para fornecimento de 60 siderúrgicas de Minas
Gerais e do Espírito Santo. Carvoarias e
siderúrgicas deverão replantar 11
mil ha devastados.
Na discussão preliminar do Zoneamento Agro-Ecológico
da Cana-de-Açúcar defendemos que no
bioma Amazônia e no bioma Pantanal não
haja novas usinas de cana-de-açúcar.
O Ministério da Agricultura defendeu que
no planalto do Mato Grosso, fora do Pantanal, em
áreas consolidadas, poderia haver expansão
da cana. Explicamos ao governo que leis estaduais
e resoluções do CONAMA (de 1985) interditam
usinas de cana em toda a bacia hidrográfica
do Pantanal, incluindo o Planalto Pantaneiro, pelo
risco do vinhoto e dos agrotóxicos contaminarem
a planície pantaneira. Obtivemos apoio de
vários ministérios, mas devemos continuar
atentos.
2) DECRETO DE CRIMES AMBIENTAIS
E RESERVA LEGAL
Mais de 90% das multas ambientais não são
pagas e os criminosos ambientais enriquecem com
o produto de atos ilícitos. Preparamos e
o presidente Lula assinou decreto de 162 artigos,
que diminui as manobras de recursos, dá poderes
ao Ibama de apreender e dar destino (doar, leiloar)
produtos de crimes ambientais, como grãos,
toras de madeira, gado. Leiloamos dezenas de lotes
de soja, toras e o famoso boi pirata. Esta medida
gerou forte reação da CNA, bancada
ruralista, Fórum de secretários estaduais
de agricultura. Depusemos por 4 horas na Comissão
de Agricultura da Câmara Federal com transmissão
pela TV. Os deputados alegaram que eram exíguos
os prazos para averbar as reservas legais e recuperar
APPs (Áreas de preservação
permanentes) e que nas regiões Sul e Sudeste
as áreas produtivas ocupavam mais de 90%
das propriedades, e que a demarcação
diminuiria a produção. Afirmaram que
produções de maçã, uva,
café ocupam há 30 anos encostas de
mais de 45% , o que é considerado APP. Note-se
que há 40 anos quase ninguém cumpre
a demarcação de APPs e de Reserva
Legal, e não são incomodados. Ao darmos
prazo definido e multas, a grita foi geral. Abrimos
diálogo, em curso, envolvendo ONGs, 4 ministérios
e a Frente Parlamentar Ambientalista, que poderá
definir prazos, com compromissos e cronogramas de
cumprimento, e formas de restaurar a reserva legal
fora das propriedades, nas bacias e no bioma, definidas
por órgãos ambientais, que cumpram
a função pretendida.
3) DESMATAMENTO ZERO, ZEE , PREÇOS
MÍNIMOS PARA PRODUTOS EXTRATIVISTAS , MANEJO
FLORESTAL e PLANTAS EXÓTICAS
Lutamos pela meta de desmatamento zero. Vamos concluir
até final de 2009 todo o zoneamento ecológico
econômico (ZEE) dos 9 estados da Amazônia
com apoio técnico e recursos do MMA. Ampliamos
o combate ao desmatamento com a Polícia Federal
(PF) e a Polícia Rodoviária Federal
(PRF) e com os estados, usando os dados dos satélites
do INPE e dos satélites japoneses. Com a
estiagem prolongada e com conivência de autoridades
as queimadas continuam e os esforços deverão
ser duplicados. Obtivemos uma MP que garante preços
mínimos para 10 produtos extrativistas, como
a castanha, a seringa, o babaçu. Isto para
que os trabalhadores extrativistas possam obter
crédito, ter carteira assinada, 13º
e escapar da miséria em que se encontram
e que os sujeitam a vender madeira ilegal e permitir
a entrada ilegal de gado nas RESEX. Estimularemos
o beneficiamento das cadeias produtivas, agregando
valor a este setor.
Depois de um ano de espera começamos a licitar
áreas para o manejo florestal, ampliando
a oferta de madeira legal, melhor forma de combater
a madeira ilegal base para o pacto da Madeira Legal
de manejo, que assinamos no Pará em julho.
EXÓTICAS - Nas áreas completamente
degradas (leste do Pará, p.ex) , depois de
concluído o ZEE, deverá ser reconstituída
a Reserva Legal das propriedades com plantas nativas
do Bioma; a área produtiva (fora da reserva
legal) poderá ser utilizada com plantação
de palmáceas garantido renda, capturando
carbono, desde que esteja previsto no ZEE.
4) FUNDO AMAZÔNIA
Criado por decreto do presidente Lula em 1 de agosto,
é um fundo privado, abrigado no BNDES, controlado
por um conselho formado por 3 componentes: 5 ministérios
(gov. federal) , 9 governos da Amazônia e
a sociedade civil ( universidade, sindicato, empresários,
3º setor) , onde os países doadores
não tem assento. Os recursos financiarão
atividades sustentáveis, reflorestamento,
extrativismo, pagamento por serviços ambientais,
para manter a floresta em pé e defender o
bioma Amazônia. Garantimos a presidência
por 3 anos para o MMA e participação
relevante da sociedade civil, pois as decisões
deverão ter o apoio dos 3 segmentos.
5) LICENCIAMENTO AMBIENTAL, CONCURSO,
FISCALIZAÇÃO, PESCA
Com o Ibama agilizamos o licenciamento ambiental,
aumentando o rigor e as compensações,
como fizemos no Rio de Janeiro, na Secretaria Estadual
do Ambiente. Reduzindo burocracias, encurtando prazos,
informatizando processos reduzimos o tempo de tramitação,
com critérios mais rigorosos, descartando
empreendimentos inviáveis e obrigando os
proponentes a investir no saneamento local, no custeio
de parques nacionais e de reservas indígenas.
No caso de Angra 3, encontramos o licenciamento
90% pronto. Somos contrários, como a ministra
Marina, que perdeu a votação no Conselho
Nacional de Política Energética, e
deu continuidade, aceitando o Eia-Rima, realizando
as audiências e preparando o relatório,
ao longo de um ano. Acrescentamos exigências,
como o monitoramento independente, a prévia
definição do depósito do lixo
atômico, adoção dos Parques
da Bocaina e da Reserva Tamoios, e R$ 50 milhões
em saneamento de Angra e Parati, declarando o apoio
às energias renováveis, alternativas
e à redução do desperdício,
metas do 1º Plano Nacional de Mudanças
Climáticas, avançando em relação
à posição anterior, mais conservadora.
O licenciamento da hidroelétrica
de Santo Antônio estava avançada; na
gestão da ministra Marina se concedeu a LP
(Licença Provisória) depois de 2 anos
e da famosa luta pela defesa dos bagres e da ictiofauna,
reduzindo em 70% a área inundada; a LI foi
concedida pelo Ibama com rigor e compensações
que incluíram o saneamento de Porto Velho,
o custeio de 2 parques e de 2 reservas indígenas.
Um documento técnico intermediário
do Ibama referia à necessidade de apresentação
de 2 documentos, que foram incluídos no dia
seguinte ao processo.
Reabrimos um processo de corrupção
no licenciamento e fiscalização no
Rio de Janeiro, que havia sido bloqueado por postura
corporativa de um grupo. Garantimos um concurso
para 400 analistas ambientais (Ibama e Instituto
Chico Mendes) para novembro/2008, com prioridade
para a fiscalização e o licenciamento.
No processo de criação
do Ministério da Pesca, que agora será
por lei, e não por MP, realizamos 3 rodadas
de discussões com o Ministro Gregolin e a
Ministra Dilma Roussef para garantir que o MMA e
o Ibama mantivessem o poder da fiscalização
integral. Os ambientalistas devem estar atentos
para impedir que emendas retirem esta competência
necessária para evitar que espécies
sobre-pescadas colapsem.
6) UNIDADES DE CONSERVAÇÃO,
MANEJO E ECO-TURISMO
O Instituto Chico Mendes administra 299 UCs, com
78 milhões de ha. Encontramos 68 destas sem
um gestor, 121 sem um fiscal, 54 das 56 RESEX sem
planos de manejo, nenhuma das FLONAS (florestas
nacionais) fornecendo madeira legal de manejo, apenas
26 Parques Nacionais (de 65) recebendo visitantes
, sendo que 90% dos 3,5 milhões de visitantes
concentrados em 2 parques: Iguaçu e Tijuca.
Os parques nos EUA recebem 192 milhões de
turistas e são mais bem cuidados. Dos R$
550 milhões disponíveis para compensação
ambiental, foram aplicados em 5 anos apenas R$ 52
milhões. Garantimos administradores para
estas 68 UCs, estamos formando até novembro
180 fiscais , para que nenhuma UC fique sem fiscal,
decidimos, com 60 lideranças dos trabalhadores
extrativistas, realizar ou licitar planos de manejo
para todas as RESEX até março 2009.
Através do Serviço Florestal Brasileiro
(do MMA) e do ICM Bio vamos dobrar a meta de 2009
para oferta de manejo florestal, incluindo manejo
comunitário para assentamentos do Incra e
RESEX. No dia 13 de setembro o presidente Lula lançará
o plano de Turismo nos Parques, do MMA em conjunto
com o min do Turismo; este define parques prioritários
e recursos para sedes, centros de visitante, de
pesquisador, trilhas sinalizadas, acesso.
7) MATA ATLÂNTICA, ARTIGO
23, GUARDAS PARQUE, FUNDO CLIMA
O decreto do Guarda Parque viabiliza convênios
com governos estaduais que receberão equipamentos
para bombeiros e batalhões florestais; estes
apoiarão a defesa das UCs federais e ações
preventivas e de fiscalização do Ibama.
O decreto que regulamenta a lei da Mata Atlântica
estava atrasado em um ano; realizamos audiências,
aperfeiçoamos artigos e ele será publicado
em setembro. Aplicamos R$ 120 milhões em
multas aos usineiros de Pernambuco, que arrasaram
a Mata Atlântica, deixando apenas 2,7% da
cobertura original. Ajuizamos ações
e o TAC deverá ser assinado com o MP Federal
até novembro.
O artigo 23 da Constituição define
as competências de estados, municípios
e União no licenciamento; depois de 3 anos
bloqueado, estabelecemos um diálogo, inclusive
em reunião da Abema com 23 secretários
estaduais de meio ambiente (fomos informados que
foi a primeira vez que um ministro participa deste
fórum); o PL deverá ir a voto em novembro.
O presidente Lula enviou ao Congresso o PL que cria
o Fundo de Mudanças Climáticas, que
deverá receber recursos de até R$
600 milhões da participação
especial do petróleo, para aplicações
em redução de emissões, tecnologia
limpa, prevenção e mitigação.
8) COMBATE AO DESMATAMENTO, REGULARIZAÇÃO
FUNDIÁRIA
O Ibama, com apoio do MMA, do ICM Bio , da PF e
da PRF tem se desdobrado para combater o desmatamento,
sobretudo na Amazônia. Alguns estados tem
colaborado, outros pouco. As operações
do Ibama dobraram em junho e em julho, passando
de uma média diária de 20 para 40
operações. Esta foi uma das razões
da queda do desmatamento em julho. Houve uma desarticulação
da Operação Arco Verde, de iniciativas
sustentáveis, com outros ministérios,
que será retomada. Faltam recursos, pessoal,
viaturas. As pressões para derrubar a resolução
do Banco Central que veda o crédito aos empreendimentos
ilegais continuam, e a atenção deve
ser redobrada. Existem também pressões
de prefeitos e de governadores para o afrouxamento
da operação Arco de Fogo no período
eleitoral. Está havendo obstrução,
e se verifica o incremento de queimadas. Apoiamos
um novo modelo, com manejo florestal, extrativismo,
preços mínimos, eco-negócios,
recuperação de áreas degradadas,
tecnologia limpa, pesquisa aplicada à floresta,
acordos e rastreamento das cadeias produtivas (soja,
madeira, carne, minério) e Fundo Amazônia.
Isto exige um esforço de ministérios,
governos estaduais e municipais e de toda a sociedade.
O ritmo é insuficiente.
Priorizamos a regularização
fundiária, a conclusão do ZEE e o
cadastramento; estamos trabalhando com o Incra,
Institutos de Terra e secretarias estaduais de meio
ambiente para concluir o trabalho até 2012.
Esclareço que o PL que ampliou a legalização
de terras públicas de 500 ha para 1500 ha
foi preparado pelo MDA (Ministério de Desenvolvimento
Agrário) antes da nossa chegada ao governo.
Não participamos do processo de votação
no Congresso, e posteriormente exigimos que antes
da titulação haja a demarcação
da reserva legal.
9) ENXOFRE, DIESEL E AR
Apesar das pressões não adiaremos
a Resolução do Conama, de 2002, que
estabelece padrão de emissão mais
rigoroso em 2009. Propusemos adiantar a etapa seguinte,
que estabelece o máximo de 10 partes de enxofre
por milhão no diesel. Apresentaremos até
o final do ano um Programa Nacional de Qualidade
do Ar, incluindo vistoria veicular obrigatória
(como aprovamos no Rio de Janeiro) e padrões
de emissão atmosférica mais rigorosos
para a indústria.
10) REFORÇAR O DIÁLOGO
Pouco tempo, muitos desafios, problemas crônicos,
profundos, enfrentamentos dentro do governo, no
parlamento, na sociedade; a eco-ansiedade de enfrentar
tudo ao mesmo tempo prejudicou o diálogo
constante e necessário com o setor ambientalista.
Estive 8 vezes no parlamento, 3 com a Frente Ambientalista.
Recebemos em 12 encontros ONGs e lideranças
da Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado,
extrativistas, cooperativas. Há que construir
planos conjuntos, com prioridades , metas, alianças,
no governo e na sociedade.
Saudações eco-libertárias do
Carlos Minc.