19/09/2008 - Em reunião
da Comissão Nacional de Política Indigenista,
o Ministério da Saúde anunciou autonomia
financeira e administrativa dos Distritos
Sanitários Especiais Indígenas – Dseis.
Dessa forma, pretende atender às reivindicações
recorrentes que vários povos indígenas
vêm fazendo, como os Yanomami. Para isso,
vai criar uma secretaria subordinada diretamente
ao Ministério. Reunião realizada em
agosto com a Hutukara Associação Yanomami
pode ter contribuído com a nova forma de
prestação do serviço de saúde
indígena.
Durante reunião da Comissão
Nacional de Política Indigenista (CNPI),
nessa quinta-feira (18/09), em Brasília,
a representante do Ministério da Saúde
(MS), Claunara Mendonça, confirmou a autonomia
financeira e administrativa dos Distritos Sanitários
Especiais Indígenas – Dseis, a ser determinada,
em 10 dias, por uma modificação no
Regimento Interno da Funasa, retirando dela a atribuição
de cuidar da saúde indígena. Para
tanto, haverá uma recomposição
de cargos, que está em análise - já
que a descentralização implica na
necessidade de recursos humanos.
A advogada do ISA, Ana Paula Caldeira
Souto Maior, que representa a instituição
na CNPI, relata que a representante do governo anunciou
a criação de uma Secretaria de Atenção
Primária e Promoção de Saúde,
ligada diretamente ao Ministério da Saúde,
e, dentro dela, um Departamento de Saúde
Indígena. Os municípios poderão
ou não participar do atendimento à
saúde indígena, a depender de cada
realidade local.
Para alguns representantes indígenas,
entretanto, o fato de se tratar de uma subsecretaria
em vez de uma secretaria indígena no Ministério
da Saúde é motivo de críticas.
Na reunião, foram feitos questionamentos
sobre como seria a qualificação do
pessoal para trabalhar com povos indígenas,
acerca do reconhecimento dos agentes indígenas
de saúde e, principalmente, sobre a participação
dos índios no processo de criação
da nova Secretaria e da nova forma como será
feita a prestação do serviço
de saúde. Foi criado um Grupo de Trabalho
para discutir a implementação da nova
Secretaria, mas que não inclui representantes
indígenas.
Pedidos de mudança na gestão
Os anúncios dessa semana
refletem o que foi conversado no dia 20 de agosto,
em audiência no Ministério da Saúde,
na qual representantes Yanomami expuseram ao ministro
José Gomes Temporão a situação
da saúde de seu o povo e acusaram a Funasa
de não aplicar nas aldeias os recursos repassados
pelo governo, pedindo o afastamento da fundação.
Nessa data também foi discutida a inviabilidade
dos convênios com Ongs, que recebem com atraso,
prejudicando pagamento de funcionários e
dificultando as operações de campo.
Não foi a primeira vez que os Yanomami denunciaram
publicamente a situação difícil
em que se encontra a saúde indígena
em todo o Brasil.
A Hutukara Associação
Yanomami (HAY) divulgou, na ocasião, documento
que pedia a substituição do atual
modelo de saúde indígena - com a saída
da Funasa e transferência da gestão
da saúde indígena para uma secretaria
do Ministério da Saúde - e trazia
reivindicações emergenciais. O texto
expõe o caos no Dsei Yanomami, destacando
a má gestão dos recursos e a falência
do modelo de parcerias por meio de convênios,
que trouxeram o recrudescimento de doenças
e da mortalidade entre os Yanomami. Apresenta, ainda,
dados sobre o baixo índice de cobertura vacinal
das crianças indígenas e sobre a volta
da malária aos níveis hiperendêmicos
da década de 11000, apesar do aumento dos
recursos destinados aos programas de saúde
– resultado de esquemas de corrupção
e desvios de dinheiro. (Leia aqui o documento na
íntegra.)
O ministro afirmou, naquele encontro,
que o governo tem uma grande preocupação
com os povos indígenas e reconheceu que a
gestão da saúde indígena não
poderia continuar como está. Na audiência,
Temporão se comprometeu a atender, o mais
rapidamente possível, às necessidades
emergenciais apontadas pela Hutukara, tais como
a aquisição de equipamentos e medicamentos
para o Dsei Yanomami.
Para o assessor da Comissão
Pró-Yanomami (CCPY), o médico Cláudio
Esteves de Oliveira, do jeito que está é
que não pode ficar: “De fato, o atual modelo
de assistência à saúde indígena
está falido. Nós vemos com bons olhos
essas mudanças, que vão no caminho
que desejávamos”.
Cláudio Esteves pertenceu
à Urihi, Ong conveniada à Funasa que
cuidou da saúde Yanomami de dezembro de 1999
até fevereiro de 2004, quando o governo federal
decidiu alterar o modelo de gestão de saúde
indígena. Por não concordar com a
mudança, a Urihi desistiu de continuar o
trabalho com os índios.
+ Mais
Noruega doa 130 milhões
de dólares para o Fundo Amazônia
17/09/2008 - O objetivo do país
é investir US$ 1 bilhão, até
2015, para proteger a floresta. A doação
inicial, prevista para 2009, foi anunciada pelo
primeiro-ministro da Noruega, Jens Stoltenberg,
que participou de evento em Brasília, em
comemoração aos 25 anos de atuação
do Programa Norueguês de Apoio aos Povos Indígenas
do Brasil. Porém, para continuar a receber
recursos o Brasil terá de mostrar que reduziu
o desmatamento.
Após o primeiro desembolso,
a Noruega se compromete a doar mais dinheiro de
acordo com os resultados da política de desmatamento.
O valor total previsto é de US$ 1 bilhão,
desde que o Brasil comprove a redução
do desmatamento da Amazônia no ano, em comparação
aos 10 anos anteriores, e da emissão de gases
- cada tonelada de gases de efeito estufa que deixar
de ser emitida na atmosfera valerá US$ 5.
Mas há possibilidade de ainda ampliar o repasse:
“Estamos dispostos a dar mais se o plano brasileiro
for bem-sucedido", disse Stoltenberg durante
o evento da Embaixada da Noruega, em Brasília.
O primeiro-ministro declarou que
cada país deve reduzir as suas próprias
emissões, mas também deve contribuir
para as reduções em outras partes
do mundo: “Enquanto o Brasil se dispuser a reduzir
o desmatamento nós vamos pagar. A primeira
contribuição está estimada
em US$ 130 milhões. Depois nós continuaremos
a contribuir, dependendo da taxa de redução
”, explicou Stoltenberg, que foi recebido pelo Presidente
Lula no início da tarde dessa terça-feira
(16/9), no Palácio do Itamaraty.
De acordo com o embaixador especial
da Noruega para Florestas Tropicais, Hans Brattskar,
assim como há cooperação com
o Brasil, a Noruega realiza cooperações
similares com a Tanzânia (de 5 anos) e com
a República do Congo (de 3 anos) para a Redução
de Emissões por Desmatamento e Degradação
(REDD), no valor de US$ 100 milhões cada.
Outros países também devem receber
apoio, entre eles Indonésia e Papua Nova
Guiné.
No caso brasileiro, além
de um memorando de entendimento com o governo, haverá
um acordo operacional com o BNDES, no qual a Noruega
espera definir regras relacionadas à transparência
e ao monitoramento do uso dos recursos.
O embaixador Brattskar esteve
reunido com representantes de Ongs ambientalistas
na noite de segunda-feira, quando discutiu-se o
tipo de ações que deveriam receber
o apoio do Fundo. Houve consenso sobre a necessidade
de atender a um número múltiplo de
atores, sendo possível apoiar iniciativas
dos governos federal, estaduais e municipais e da
sociedade civil, sendo que os recursos deveriam
ser destinados, principalmente, para projetos extras,
fora dos programas já estabelecidos pelo
governo brasileiro. Brattskar acha que a filosofia
é conseguir um sistema de Redução
de Emissões por Desmatamento e Degradação
- REDD, no âmbito das Nações
Unidas (pós-Kyoto), e a Noruega entende que
seus apoios bilaterais vão contribuir com
experiências que podem mostrar como esse sistema
deve funcionar.
Segundo ele, um tema em que o
Brasil pode contribuir muito é com a experiência
de monitoramento do desmatamento desenvolvida pelo
Inpe e por organizações não-governamentais,
como o Imazon. Esse pode ser um elemento de possível
cooperação técnica com a Noruega,
podendo servir a outros países.
A coordenadora da Iniciativa Amazônia
do ISA, Adriana Ramos, acredita que o ideal é
que o Fundo sirva para apoiar a política
do governo brasileiro, ampliando o escopo das ações
já realizadas: “O Fundo não deve apenas
estimular atividades do governo federal, mas atender
a governos estaduais, municipais e todos os demais
setores da sociedade que se engagem em ações
para reverter o processo de desmatamento. O pressuposto
básico deve ser o do desmatamento zero, conforme
proposto no Pacto pela Valorização
das Florestas e pelo Fim dos desmatamentos na Amazônia.”
ISA, Katiuscia Sotomayor.
+ Mais
Primeiro-ministro da Noruega comemora
25 anos de apoio aos índios brasileiros
17/09/2008 - O primeiro-ministro
norueguês, Jens Stoltenberg, está no
Brasil a convite do Presidente Lula. Em Brasília,
nessa terça-feira, ele participou da abertura
do Seminário 'O Papel da Universidade e da
Formação Acadêmica sob a Ótica
das Lideranças e Acadêmicos Indígenas',
em comemoração aos 25 anos de atuação
do Programa Norueguês de Apoio aos Povos Indígenas
da Amazônia.
O Programa Norueguês para
os Povos Indígenas começou em 1983,
como o primeiro programa governamental a fornecer
apoio direto para organizações indígenas
locais num âmbito internacional. O objetivo
é fortalecer as organizações
indígenas para desenvolver políticas
públicas de qualidade. Atualmente, no Brasil,
há 21 projetos com 18 parceiros, entre ONGs
ligadas à questão indígena
e associações indígenas. A
iniciativa busca, além do reconhecimento
dos direitos dos povos indígenas, condições
para que tenham a possibilidade de articular e promover
seus próprios interesses, com a garantia
da sustentação do modo de viver por
meio de demarcação de terras indígenas;
acesso a atendimento médico e escolarização
diferenciados; promoção e defesa dos
direitos culturais e conhecimentos tradicionais,
e fortalecimento do movimento da mulher indígena.
Grande parte da verba é administrada pelo
governo norueguês, que apóia também
projetos aos povos indígenas em outros continentes,
como África e Ásia. A Noruega abriga
parte da maior população indígena
européia, os Sámi, ao lado da Rússia,
Finlândia e Suécia. Representantes
desse povo indígena também estão
participando do seminário. (Veja quadro abaixo).
Para o diretor-presidente do Centro
Indígena de Estudos e Pesquisas - Cinep,
Gersem Baniwa, esses 25 anos de apoio norueguês
representam uma revolução na perspectiva
histórica dos povos indígenas, porque
havia previsão de estudiosos de que, na virada
do milênio, não existiriam mais índios
no Brasil: “Houve exatamente o contrário.
Hoje nosso crescimento demográfico é
maior que o dobro do crescimento da população
brasileira (enquanto se registra crescimento de
1,6% ao ano, os povos indígenas crescem 4%
ao ano) e isso se deve ao desenvolvimento da consciência
política e da capacidade de articulação
dos povos, resultado da cooperação
internacional, que apóia a luta pela terra
e a valorização de nossas tradições”.
Atualmente há cerca de 600 mil índios
de 227 etnias.
Segundo Baniwa, o diferencial
do apoio do governo norueguês é a flexibilidade:
“Os projetos incluem processos de capacitação
política, e não apenas técnica,
e de consolidação e fortalecimento
institucional das organizações indígenas.
Não se trata apenas de plantar mais árvores.
Isso possibilita mais cidadania, de forma que a
o fortalecimento da luta indígena possa ser
revertido em novas políticas públicas
do Brasil”.
A coordenadora da Iniciativa Amazônia
do ISA, Adriana Ramos, explica que a parceria com
a Noruega foi uma contribuição importante
para o fortalecimento do movimento social indígena
e, por sua vez, para a garantia dos direitos territoriais
listados na Constituição: “A efetividade
desse processo ocorreu não só pelo
trabalho do ISA, mas pelo trabalho de outras organizações
indígenas e indigenistas apoiadas pela cooperação
norueguesa”. Para ela, o reconhecimento acerca da
questão dos direitos territoriais é
um dos pré-requisitos que gerou as condições
para a Noruega fazer o investimento no Fundo Amazônia:
“A questão dos direitos territoriais das
populações locais é um dos
grandes tópicos de polêmica internacional
em relação à investimentos
em ações de combate ao desmatamento
e de valorização da floresta. Em países
em que os direitos territoriais das comunidades
locais não são reconhecidos , esse
tipo de investimento pode gerar mais pressão
sobre essas comunidades. Você valoriza mais
a floresta em pé, o que pode resultar em
mais demanda e interesse sobre a floresta e, portanto,
gerar um desequilíbrio de forças e
mais conflitos no território. No caso do
Brasil, esses recursos vêm já tendo
como pano de fundo essa garantia de direitos territoriais,
o que permite que agora a gente avance em novas
ações relacionadas à sustentabilidade
dessas terras”, conclui a coordenadora.
Jens Stoltenberg anunciou a primeira
contribuição para o Fundo Amazônia,
no valor de US$ 130 milhões, em 2009. Até
2015, a Noruega deve doar US$ 1 bilhão para
o Brasil (Saiba mais aqui). O primeiro-ministro
já visitou o Rio de Janeiro e Brasília,
onde se reuniu com o presidente Lula. Ele segue
para Santarém, na Amazônia, acompanhado
do Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, com o
objetivo de conhecer mais sobre os desafios relacionados
ao desenvolvimento sustentável e combate
ao desmatamento.
A população Sámi abrange quatro
países: Noruega, Suécia, Finlândia
e Rússia. É um dos maiores grupos
indígenas na Europa, totalizando o estimado
entre 60.000 e 100.000 pessoas. As fontes tradicionais
de sustento incluem a criação de animais,
a caça e a pesca, a agricultura e o duodji,
que é o artesanato indígena.
Durante a década de 1980,
foram fundadas a Comissão de Direitos dos
Sámi e a Comissão Cultural Sámi,
bem como o Sámediggi, o Parlamento Sámi,
cujas primeiras eleições realizaram-se
em conjunto com as eleições para o
Parlamento Norueguês (Stortinget), em 1989.
O Parlamento Sámi é supranacional,
tendo autonomia, influência e reconhecimento
formal por parte dos estados nacionais. É
a principal fonte de informação e
diálogo com o governo norueguês e assumiu
a responsabilidade por tarefas administrativas e
pela implementação de medidas políticas
em determinadas áreas, como a distribuição
de fundos a organizações e para iniciativas
culturais, econômicas e lingüísticas.
O diretor do Centro de Recursos
para os Direitos dos Povos Indígenas, Magne
Ove Varsi, conta que o Parlamento Sámi é
a assembléia nacional dos povos, que trabalha
para garantir o cumprimento dos direitos indígenas.
Mas ainda há muito o que fazer: “Mesmo com
todas as garantias que o povo Sámi já
alcançou, ainda temos desafios a serem vencidos,
como é o caso da autodeterminação,
que ainda não está definida. Desde
2005 aguardamos o resultado do processo de aprovação
e sabemos que isso ainda levará anos. Outro
desafio é implementar efetivamente a declaração
das Nações Unidas sobre os direitos
dos povos indígenas, de 2007, que é
um instrumento essencial”.
Já para o presidente do
Parlamento Sámi, Egil Olli, o grande desafio
é a questão dos direitos à
terra: “É preciso envolver os Sámi
nas definições sobre como os recursos
de nossas terras estão sendo e devem ser
utilizados, pois temos direito, inclusive financeiros,
nessa questão. A nossa expectativa com a
visita ao Brasil é ver como esse tema é
tratado na relação dos povos indígenas
brasileiros”, ele diz.
A tarde do primeiro dia do evento
foi marcada pela apresentação e debate
sobre as demandas do Movimento Indígena em
relação ao ensino superior indígena
(Coiab, Apoinme, Apin-Sul, Arpipan e Aty-Guasu).
Houve, ainda, Festival de Cinema com apresentação
do diretor do filme Sámi ”Kautokeino-upproret”,
Nils Gaup.
Promovido pelo Centro Indígena
de Estudos e Pesquisas (Cinep), com a Articulação
dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a
Embaixada da Noruega em Brasília, o seminário
'O Papel da Universidade e da Formação
Acadêmica sob a Ótica das Lideranças
e Acadêmicos Indígenas' vai até
dia 18, no Centro Cultural de Brasília.
ISA, Katiuscia Sotomayor.