Artigo
do secretário Xico Graziano publicado no
Jornal Gazeta Mercantil
30/09/2008 - Fumaça Preta
- Omissão, descaso, ignorância. Escolha
o adjetivo para caracterizar a ação
do governo federal com respeito à qualidade
do óleo diesel. Desde 2002, no final do governo
Fernando Henrique, o CONAMA, Conselho Nacional de
Meio Ambiente, estabelecia que, em janeiro de 2009,
entraria em vigor nova fase do Proconve (P6), o
programa de redução de emissões
da poluição por veículos. O
tempo passou, e nada, rigorosamente nada, aconteceu.
Inconformado, e lutando contra
as dramáticas conseqüências da
poluição atmosférica sobre
a saúde da população, especialmente
na região metropolitana, o governo paulista
ajuízou, em 17/12/2007, uma Ação
Civil Pública contra a Agência Nacional
do Petróleo (ANP) e a Petrobrás. Exigiu
assim, na Justiça, o cumprimento da legislação
ambiental. Defendeu o óbvio.
A causa recebeu o apoio da Prefeitura
paulistana, de entidades ambientalistas e movimentos
sociais, sendo também aditada pelo Ministério
Público Federal, ampliando a demanda para
todo o Brasil. Qual parto difícil, após
9 meses saiu a decisão liminar. Estabeleceu
o Juiz Federal José Carlos Motta que, ao
virar o ano, a Petrobrás deve assegurar,
em cada posto de combustível, uma bomba para
distribuir o S-50, óleo diesel com baixo
teor de enxofre, requerido pelos novos motores a
serem produzidos. Determinou, ainda, que a ANP regulamente,
em 90 dias, a distribuição do novo
combustível. Mais. Exigiu também que
o óleo mais limpo chegue ao consumidor com
preço adequado. Vitória não
apenas do governo de São Paulo, mas do meio
ambiente.
Vence a saúde pública.
É sabido que, controlada a poluição
das chaminés de fábrica, hoje são
os escapamentos que estragam a qualidade do ar.
As emissões veiculares advindas de motores
a diesel entopem a atmosfera, especialmente, de
material particulado (MP) e óxido de enxofre
(SO2); já os automóveis à gasolina
lançam óxido de nitrogênio (NOx)
e hidrocarbonetos, precursores de ozônio.
Se não fosse o etanol, o ar estaria completamente
estragado na região metropolitana.
Estudos ligados à Faculdade
de Medicina da USP indicam que a poluição
do ar causa três mil mortes prematuras por
ano na RMSP. O cálculo sobe para 6,7 mil
mortes/ano nas seis grandes metrópoles do
país, incluindo Rio de Janeiro, Belo Horizonte,
Porto Alegre, Recife e Curitiba. Na expectativa
de vida, cada cidadão paulistano perde, em
média, dois anos devido a doenças
graves causadas pela poluição do ar.
Pergunta-se: por que o governo
federal deixou de atuar frente a tão sério
problema? Ninguém sabe responder. O Ministério
do Meio Ambiente, supostamente muito preocupado,
ainda bem, com o desmatamento no campo, nunca comprou
essa briga da cidade. Reclamava, mas nada acontecia.
A ANP, cujo papel de agência deve servir à
sociedade, virou capacho do poder. Quem manda, mesmo,
é a Petrobrás.
As montadoras de veículos,
todas grandes multinacionais, se acomodaram no descaso
federal. Vendem, no exterior, motores de última
geração, que somente bebem diesel
limpo. Mas aqui dentro enrolam, dizendo que precisam
de tempo para fabricar a melhor tecnologia. Têm
eles certa razão, pois a especificação
do novo combustível, pela ANP, somente ocorreu
em outubro de 2007. Caminhão novo na praça,
rodando com óleo sujo no tanque, adeus motor.
Espertamente, a Petrobrás
assegura que vai assegurar o diesel S-50 para todos
os motores da nova geração que chegarem
ao mercado. Mas ninguém sabe como será
distribuído. Jogo combinado de esconde-esconde.
Parece jogo de truco. A perspectiva
de haver prejuízo ambiental levou o Ministério
do Meio Ambiente a propor, na semana passada, ao
CONAMA, a antecipação, para 2012,
da fase seguinte do Proconve (P7), que viria apenas
em 2016. Ninguém ficou contra. A tecnologia
desses motores, como atualmente na Europa e EUA,
pressupõe um diesel mais puro ainda, o S-10.
Olhando para frente, fica bom. Mas como se navega,
ou melhor, se transporta, até lá?
Há apenas uma saída
para o impasse: distribuir, para todos os postos
de combustível, o diesel limpo S-50, mesmo
que atrase a chegada dos novos motores. Essa é
a proposta do Governo de São Paulo, única
capaz de compensar o custo ambiental do relaxo federal
com a matéria. Segundo um cronograma, definido
em conjunto com o Ministério Público,
poderia começar pelas regiões metropolitanas
do Brasil, onde funcionam 11,4 mil postos de venda.
Depois, progressivamente, atinge o interior, com
data-limite de 2010.
A, por enquanto, fantasia do petróleo
do Pré-sal entusiasma os brasileiros. As
doenças causadas pelos escapamentos dos motores
a diesel, entretanto, machucam a sociedade. Para
ser afortunado, o futuro exige saúde plena
e meio ambiente equilibrado. Sem fumaça preta.
Texto: Xico Graziano