Carla
Lisboa - Brasília (01/12/2008) – Desde a
segunda-feira (1º), com a entrada em vigor
no Brasil do Acordo para a Conservação
de Albatrozes e Petréis (ACAP), o País
passa a integrar as 12 nações que
se destacam na conservação dessas
aves. Apesar de ser signatário desde 2001,
o País só ratificou o acordo em novembro,
quando a proposta para que se tornasse efetivamente
parte do ACAP foi aprovada pela Comissão
de Relações Exteriores do Senado Federal.
O presidente do Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio), Rômulo Mello, considera a ratificação
um reconhecimento do trabalho que vinha sendo desenvolvido
em várias frentes em defesa da conservação
dessas espécies. “Com isso, o Brasil passa
a ter direito de voto e de participação
efetiva na tomada de decisões internacionais
para a conservação dessas aves. O
acordo visa exatamente a ações integradas
internacionalmente de modo que evite a extinção
dessas espécies”, afirma.
ROMA – O governo brasileiro pretende
também intensificar as ações
de conservação de espécies
migratórias. Para isso, o coordenador-geral
de Espécies Ameaçadas do ICMBio, Onildo
João Marini Filho, apresenta na 9ª Reunião
da Conferência das Partes (COP-9) da Convenção
sobre Espécies Migratórias (CMS, sigla
em inglês) da ONU, que começou na segunda
(1º) e termina na sexta-feira (5), em Roma
(Itália), uma carta de intenções
na qual estão enumeradas dez ações
que o governo brasileiro planeja desenvolver com
a CMS para dar andamento às atividades conjuntas
de conservação de animais migratórios.
Marini informa que, no âmbito
desse acordo a ser firmado em Roma, está
prevista a realização de várias
atividades que vão desde o desenvolvimento
de outros instrumentos de cooperação
regional para conservação de espécies
migratórias além de albatrozes e petréis,
tais como mamíferos aquáticos, tubarões
migratórios, tartarugas marinhas, outras
aves, até pesquisas sobre gripe aviária,
treinamento e capacitação de pessoal
e divulgação de informações
importantes para a conservação de
espécies com hábitos migratórios.
A ratificação agregará
mais valor ao pescado brasileiro e vai dar ao Brasil
a certificação de que o País
implementa ações de conservação
marinhas, agregando valor aos produtos que vende.
A ratificação é também
o resultado do trabalho de assessoria parlamentar
do ICMBio, que, desde sua criação,
apoiou a adesão do País ao ACAP. A
carta de intenções poderá ainda
significar um passo decisivo rumo à adesão
do Brasil à CMS e a inserção
do Memorando para Conservação de Aves
Campestres na Convenção.
NORMAS – Com a entrada em vigor
do acordo, o ICMBio e o próprio Estado brasileiro
terão de adaptar-se a normas de conservação
que vão desde a informação
e educação ambiental voltada para
a comunidade envolvida na pesca e o aumento da fiscalização
até o desenvolvimento de artifícios
legais (legislação) que obriguem a
utilização de medidas mitigadoras
na pesca, melhoria do programa de observadores de
bordo e possível incentivo aos atores da
indústria pesqueira que utilizem medidas
mitigadoras do impacto da pesca sobre essas aves.
“Essas ações em
conjunto com a conscientização dos
consumidores de peixe é que pode provocar
resultados benéficos. Há que se lembrar
que, em virtude da característica transcontinental
dessas aves, esse esforço deve (e está
sendo) ser empregado internacionalmente”, explica
o analista ambiental do Centro de Pesquisa e Gestão
dos Recursos Pesqueiros do Litoral Sudeste e Sul
(Cepsul), Isaac Simão.
A adesão ao acordo se traduz
também em grandes avanços para o Projeto
Albatroz. Criado em 1991 pela bióloga e atual
coordenadora-geral Tatiana Neves, o Projeto Albatroz
é uma das ações desenvolvidas
para conservação dos albatrozes, sobretudo,
os que encontram na costa brasileira alimento e
locais para procriação.
Segundo Tatiana, “o Brasil, de
todos os países que ratificaram o acordo,
é um dos mais proativos, principalmente no
cenário sul-americano. Todo o esforço
a partir da ratificação ganha mais
força”, afirma . Marini informa que o ICMBio
está elaborando, em conjunto com o Ibama
e a SEAP, uma instrução normativa
derivada de discussões realizadas com diversos
atores, como o Projeto Albatroz, os pescadores e
os armadores, para regulamentar o cumprimento de
medidas mitigadoras na frota de espinhel pelágico,
instrumento de pescaria responsável por capturar
incidentalmente essas aves, com regras a serem exigidas
tanto de proteção como de fiscalização.
AMEAÇAS E EXTINÇÕES
– Várias espécies de albatrozes, petréis
e outras aves marinhas migratórias estão
ameaçadas de extinção em virtude
da pesca com espinhel pelágico. Essas aves
se alimentam dos descartes de pescados rejeitados
tanto por pesqueiros quanto por animais marinhos.
Estudos realizados para identificação
das causas da extinção revelaram aos
pesquisadores que em várias regiões
do mundo, populações de albatrozes,
pardelas e petréis estavam em declínio
com muitas espécies à beira da extinção
em virtude da interação dessas aves
com a pesca espinheleira industrial, destinada a
peixes oceânicos. Nessas atividades pesqueiras,
as aves são fisgadas acidentalmente e morrem
afogadas ou feridas.
Na década de 11000, organismos
internacionais, como o Birdlife International, desenvolveram
ações para evitar a extinção
e promover a conservação das aves.
Desde então estudos e ações
de mitigação das ameaças têm
sido realizados em diversos países. Outras
razões que têm levado à ameaça
de extinção são a destruição
e a interferência de espécies exóticas
nos habitats em que as aves nidificam. Gatos, ratos,
porcos e caprinos são alguns dos predadores
que introduzidos em ilhas oceânicas se alimentam
de ovos e filhotes das aves.
AÇÕES BRASILEIRAS
– Estritamente marinhas, essas aves ocorrem ao longo
de toda a costa brasileira, contudo, têm maior
freqüência na Região Sul. Em águas
brasileiras já foram registradas 40 espécies,
das quais duas se reproduzem nas ilhas de Trindade
e Martin Vaz (ES), Itatiaia (ES) e no arquipélago
de Fernando de Noronha (PE).
Apesar de o Brasil ter ratificado
o ACAP somente este ano, o trabalho de conservação
dessas espécies tem um longo caminho percorrido.
O Centro Nacional de Pesquisa e Conservação
de Aves Silvestres (Cemave) do ICMBio vem participando
de reuniões para estipular uma linha de ação
a ser adotada pelo País para conservação
dessas espécies desde 1999. No âmbito
do Acap, o Cemave tem o objetivo de pesquisar o
impacto de diferentes artes de pesca nas populações
de procellariformes, além de, na medida do
possível, devido à grande demanda
do Centro, dar suporte às atividades desenvolvidas
pelo Projeto Albatroz.
Em 2004, foi criado o Grupo de
Trabalho (GT) que, em 2006, publicou o Plano de
Ação Nacional para Conservação
dos Albatrozes e Petréis (Planacap), documento
oficial que define ações de conservação
dessas aves. Em 2007, o Cemave passou a atuar na
avaliação do impacto de outras artes
de pesca sobre as populações dessas
aves. No âmbito do ACAP, segundo Onildo Marini,
há 11 espécies de albatrozes e sete
de petréis ameaçados de extinção.
Seis destas espécies estão ameaçadas
de extinção no Brasil.
Na avaliação de
Isaac Simão, “em termos ecológicos
e ambientais, a entrada do Brasil no Acap é
o compromisso que assumimos de lutar pela conservação
destas aves, hoje extremamente ameaçadas
pela indústria pesqueira e pela destruição
de seus sítios de reprodução,
geralmente ilhas, que são ambientes frágeis.
Do ponto de vista econômico, embora seja polêmica
a questão de que muitos atores da indústria
pesqueira não conheçam ou não
queiram usar medidas mitigadoras, em longo prazo,
com o incentivo (como um selo verde) às indústrias
de pesca que utilizem medidas mitigadoras, o setor
pesqueiro deve ser beneficiado; a adoção
de medidas mitigadoras pode agregar valor ao produto,
facilitando a penetração do mesmo
na camada da população (do mundo todo)
preocupada com a conservação de espécies
e dos ecossistemas. Entretanto, há que se
ressaltar que toda a atividade pesqueira deve ser
bastante discutida e compreendida à luz de
fatos comprovados cientificamente, como a diminuição
comprovada dos estoques em razão da pesca
descontrolada, em oposição ao argumento
de que a tecnologia de pesca é que está
atrasada”, explica.
SITUAÇÃO NO BRASIL
E NO MUNDO – Existem 22 espécies de albatroz
(diomedeidae) e 84 de petréis (hydrobatidae,
pelecanoididae e procellaridae), no mundo todo.
Se ainda levar em consideração a inclusão
de espécies próximas a esses grupos,
(shearwaters – procellaridae), ter-se-á de
incluir mais 28 espécies de aves oceânicas,
totalizando 134 espécies, número que
pode variar de acordo com critérios de classificação
adotados por diferentes autores. Desse total, 19
espécies de albatroz e sete de petréis
são espécies abrangidas pelo ACAP,
que, no momento, é um acordo mais direcionado
para a proteção das espécies
do hemisfério sul.
Em tempos históricos, apenas
uma (aparentemente) – Petrel de Guadalupe, e talvez
outra mais recentemente – Petrel da Jamaica (há
que se confirmar o caso das duas espécies),
foi extinta. Confira no quadro a seguir as espécies
que estão em perigo, as que estão
vulneráveis e as que estão criticamente
ameaçadas de extinção no planeta.