(19/12/2008)
O Acre é o estado brasileiro com maior diversidade
biológica e étnica, reunindo 3% de
toda a população indígena.
O projeto “Etnobiologia e Etnoecologia entre os
Povos da Floresta, Acre: os Kulina (Madija) do Alto
Rio Envira”, executado pela Embrapa Acre, pretende
sistematizar conhecimentos etnobotânicos de
tribos que habitam a região central do Estado
e identificar a importância cultural e econômica
de plantas medicinais com uso terapêutico
por estas populações.
A pesquisa contempla as Terras
Indígenas Kulina do Rio Envira, Jaminawa-Envira
e Kulina do Igarapé do Pau. As primeiras
ações visam à realização
de diagnóstico geral destas áreas
e o levantamento preliminar das plantas medicinais
usadas pela etnia Kulina. Com este objetivo, uma
equipe liderada pelo pesquisador Moacir Haverroth
percorreu nove aldeias no período de 8 de
novembro a 13 de dezembro.
Saindo do município de
Feijó, no interior do Acre, a primeira das
quatro expedições previstas no projeto
subiu o Rio Envira durante cinco dias para chegar
à aldeia Igarapé do Anjo e iniciar
a pesquisa, realizando o percurso inverso até
o ponto de partida. Esta é a primeira vez
que a unidade desenvolve um trabalho junto a populações
indígenas. “Estamos levando as pesquisas
da Embrapa para locais onde nunca havíamos
chegado e percebemos que há um imenso corpo
de conhecimento a ser estudado” afirma Haverroth.
A viagem foi autorizada pelo Conselho de Gestão
do Patrimônio Genético (CGEN), órgão
do Ministério do Meio Ambiente que regulamenta
o acesso ao patrimônio genético, proteção
do conhecimento tradicional associado e repartição
de benefícios. Uma parceria com a Organização
dos Povos Indígenas do Rio Envira (Opire)
e a participação de um intérprete
Kulina facilitaram a comunicação da
equipe com os indígenas.
Resposta concreta
Para a pesquisadora Lúcia
Helena Wadt, chefe de Pesquisa e Desenvolvimento
da unidade, a questão indígena tem
importância singular para a Amazônia
e, em especial, para o Acre. Na sua avaliação,
o projeto representa uma resposta concreta da Embrapa
em prol da valorização da cultura
e do saber tradicional, mas, principalmente, uma
forma de mostrar que a pesquisa científica
não está alheia aos problemas enfrentados
por estas populações.
Os resultados desta primeira visita
revelam as condições de saúde
e saneamento das aldeias, recursos disponíveis;
distribuição demográfica, práticas
agrícolas, tipos de plantas conhecidas e
usadas como remédio, além de outros
dados que ajudam a traçar o perfil e a localização
espacial destes ambientes.
Segundo Haverroth, a infraestrutura
nas aldeias é precária, com baixas
condições de saneamento, agravadas
pelo isolamento. Outro dado observado é que
50% da população das aldeias têm
menos de 15 anos, implicando um perfil epidemiológico
bastante jovem, com predominância de doenças
como infecções gastrointestinais,
principalmente diarréia e verminose, além
de infecções respiratórias.
Diversidade
Em relação à
agricultura, o destaque é para os roçados
consorciados, cultivando entre quatro a cinco culturas.
Conforme explica Haverroth, esta prática
dura cerca de cinco anos e implica sucessivas derrubadas
para implantação de novos plantios.
Entretanto, não consiste em devastação
ambiental por que o tamanho relativamente pequeno
e a presença de mata nativa em torno das
áreas favorecem a rápida regeneração
da floresta.
Ainda segundo o pesquisador, as
Terras Indígenas visitadas abrigam uma diversidade
enorme de plantas medicinais. Foram levantadas mais
de 100 espécies usadas como remédio,
segundo a cultura Kulina. Destacam-se, principalmente,
as usadas para curar picada de cobra, um dos problemas
mais freqüentes nas aldeias. “Os registros
dos nomes foram realizados na língua kulina
por que os indígenas desconhecem a tradução.
Um dos grandes desafios do projeto consiste na indentificação
científica destas espécies”, explica.
Pesquisador Moacir Haverroth
Embrapa Acre