06/02/2009 - Os parceleiros do
Assentamento Brasil Novo, em Querência, puderam
conhecer o trabalho realizado nas Áreas de
Preservação Permanente (APPs) nos
lotes dos vizinhos e a visita reforçou compromisso
com a Campanha Y Ikatu Xingu.
Os técnicos do ISA Osvaldo
Sousa, Luciano Eichholz e Eduardo Malta visitaram
em 24 e 25 de janeiro, lotes de 18 parceleiros no
Projeto de Assentamento (PA) Brasil Novo, em Querência,
MT. A idéia era avaliar como andavam as práticas
agroecológicas de restauração
de Áreas de Preservação Permanente
(APPs), já que a maioria desses agricultores
participou de um curso de Sistemas Agroflorestais
promovido dois anos atrás pela Campanha Y
Ikatu Xingu, e havia se comprometido a adotá-las
em suas terras. Criada há quatro anos, a
campanha tem o objetivo de reunir diversos parceiros
e atores locais para proteger e reflorestar as beiras
de rio e nascentes que fazem parte do lado mato-grossense
da Bacia do Rio Xingu.
O curso foi ministrado pelo pesquisador Ernst Götsch,
reconhecido especialista em Sistemas Agroflorestais
(SAFs), no PA Brasil Novo no qual mostrou aos parceleiros
técnicas agroecológicas que pudessem
enriquecer suas roças e promover a recuperação
das APPs - áreas próximas a rios,
córregos e represas no interior de seus lotes.
Outros assentamentos da região também
participaram do curso.
Durante a visita, os agricultores
trocaram experiências e vivências e
aprenderam com o relato dos erros e acertos dos
vizinhos. Também puderam sugerir melhorias
e reforçar algumas práticas de auxílio,
por exemplo, no controle da braquiária e
no enriquecimento do solo. O intercâmbio entre
eles reiterou seu compromisso com a campanha.
O primeiro lote visitado foi o
de Abraão Vieira dos Santos, que mora no
Brasil Novo com a esposa e quatro filhos desde 2000.
Em uma área que foi cercada para o gado não
invadir, Abraão plantou grande diversidade
de árvores em meio às culturas de
mandioca e milho. “Não sei dizer quantos
tipos de árvore têm aqui, mas lembro
de ter plantado sementes de buriti, taperebá,
cajá, jaca, goiaba, mogno, jenipapo, cagaita
e pequi”. O agricultor contou que a terra foi gradeada
(revolvida por um trator munido de grade) e a seguir
foram plantadas as sementes doadas pela Campanha
Y Ikatu Xingu. Embora algumas sementes tenham germinado,
o crescimento das árvores está comprometido
pelo solo que necessita de nutrientes e pela proliferação
de capim.
Os técnicos do ISA e outros
parceleiros sugeriram a Abraão plantar feijão-guandu
e feijão-de-porco em meio às árvores,
porque as leguminosas sombreiam o solo e impedem
o crescimento da braquiária. Além
disso, fixam nitrogênio no solo, servindo
como adubação verde. “Tenho certeza
que daqui a quatro anos essa área estará
dando frutos”, acredita Abrãao, que se diz
confiante nas novas técnicas aprendidas.
Feijão-de-proco e feijão-guandu
Já no lote da família
de Vicente Bogo, que mora há cinco anos no
Brasil Novo, o plantio foi iniciado em setembro
do ano passado em área de dois hectares.
Ali, é possível ver os resultados
das práticas agroecológicas. Crescem
pés de baru, caju, pequi e mamão.
Com as sementes dessas árvores, Bogo plantou
o feijão-de-porco e feijão-guandu
que impediram o crescimento do capim, enriqueceram
o solo e estão favorecendo o crescimento
das árvores.
Também no lote de Domingos
Ferreira de Sousa, o Dominguinhos, os parceleiros
observaram um exemplo de produção
para a subsistência aliada à conservação
ambiental. Antes mesmo de conhecer a Campanha Y
Ikatu Xingu, Dominguinhos plantava diversas espécies
de árvores em uma mesma área e deixava
intocada a área da beira do rio que passa
em seu lote. Hoje, as árvores já produzem
muitos frutos, entre mangabas e pequis, e o curso
ministrado por Götsch significou um incentivo
para o agricultor, que passou a plantar ainda mais
árvores e parou de roçar o mato que
crescia ao redor delas. Dominguinhos começou
a perceber que algumas árvores morriam quando
ele limpava o terreno.
Outra experiência considerada
modelo no Brasil Novo está no lote de Armando
Menin, que possui APPs em processo de regeneração
por meio do plantio feito com “muvuca” de sementes,
além de sistemas agroflorestais. Menin vem
utilizando largamente a adubação verde,
por meio do plantio de feijão-de-porco e
feijão-guandu, comprovando na prática
que essas leguminosas favorecem as culturas agrícolas.
Para verificar a eficácia dessas espécies,
Menin cultivou milho em duas áreas: com e
sem feijão-de-porco. Na área onde
o feijão foi semeado, o milho cresceu mais
e ficou vistoso, ao contrário da parte do
milharal que não recebeu a semente.
Mudas X Sementes
Durante as visitas foi possível
avaliar alguns plantios realizados com mudas. No
lote de Jailson Gomes de Jesus, as 100 mudas de
pequi plantadas por ele sumiram no meio da braquiária
e muitas morreram. Ele também plantou leguminosas,
mas em quantidade muito pequena, insuficiente para
conter o capim. “Acho que plantar muda aqui não
adianta mais, vou experimentar a ‘muvuca’ de sementes”,
lamenta o agricultor. Além de fazer o plantio
de sementes, ele foi aconselhado pelos demais parceleiros
a plantar gergelim, batata-doce e espécies
leguminosas para conter o avanço do capim
e das formigas. Para o biólogo Eduardo Malta,
o plantio com mudas é uma técnica
tradicional de reflorestamento, mas que apresenta
custos muito altos e resultados pouco animadores.
“Isso é o que todo mundo faz: plantar muda
e ficar limpando o terreno para tirar o capim. Mas
é preciso disseminar outras formas de plantio,
com custos menores e que dêem certo”, avalia.
A Campanha Y Ikatu Xingu incentiva
a mistura de diferentes sementes de árvores
formando uma “muvuca”, que depois é plantada
diretamente no solo em pequenas covas. Junto com
as sementes florestais são plantadas espécies
leguminosas que têm a função
de proteger o solo, enriquecendo-o e controlando
o capim. Esse sistema de plantio inédito
está sendo disseminado por técnicos
da Campanha Y Ikatu Xingu, e tem se mostrado mais
barato que o realizado com mudas, que precisam ser
produzidas e depois transportadas. Além da
vantagem econômica, percebe-se que as árvores
que nascem das sementes plantadas no solo são
mais resistentes do que as mudas.
No domingo, dia 25, depois da
conclusão das visitas, o ISA distribuiu aos
parceleiros 140 quilos de sementes de 46 espécies
diferentes, além de 260 quilos de feijão-guandu
e feijão-de-porco, suficientes para cada
participante plantar 0,4 hectare. Os parceleiros
ficaram responsáveis por fazer as misturas
de sementes e dar continuidade ao trabalho de reflorestamento
da Campanha Y Ikatu Xingu.
Produção e reflorestamento
Os técnicos do ISA ressaltaram
a importância de aliar a produção
ao reflorestamento, como forma de incentivar os
parceleiros. “O reflorestamento precisa dar ao agricultor
um retorno financeiro, por isso é importante
plantar junto das árvores, a mandioca, a
banana, produtos que podem ser vendidos e incentivam
a continuidade do trabalho”, disse Malta. O biólogo
lembrou a importância de o agricultor estar
feliz com o que está fazendo, e que o grupo
se torne forte e conhecido para incentivar as outras
famílias a fazer a mesma coisa.
“Aprendemos muitas coisas novas
nesses dois dias e já vi coisas que posso
melhorar no meu lote, vendo as experiências
dos outros. Nós precisamos estar juntos porque
todos vamos ganhar com isso. Estamos comprovando
que o Brasil Novo está fazendo coisas que
estão dando certo. Estamos em primeiro lugar
na região e não estamos parados”,
avaliou Menin, que, com Aldo Teixeira da Rosa, teve
a idéia de organizar as visitas como forma
de incentivo para que os agricultores continuem
reflorestando e melhorando suas técnicas
de cultivo. “Eu não conhecia o trabalho que
cada um estava fazendo. Agora acredito que vamos
continuar fazendo nosso trabalho cada vez melhor”,
afirmou Aldo.
Para o agrônomo Osvaldo
Sousa, do ISA, é preciso fazer cada vez mais
esse tipo de atividade para atrair outros parceiros.
"Estamos aprendendo a misturar sementes e pessoas".
ISA, Sara Nanni.