Brasília
(20/03/2009) Para o Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio),
a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF),
tomada nesta semana, sobre a demarcação
da reserva Raposa/Serra do Sol (RR), representa
um avanço na relação com a
comunidade indígena local. Além de
confirmar a demarcação em área
contínua e determinar a retirada dos não-índios,
a Suprema Corte estipulou 19 condições,
entre elas a de que "o usufruto dos índios
na área afetada por unidades de conservação
fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes".
Dentro da reserva, há o Parque Nacional Monte
Roraima, que é administrado pelo ICMBio.
Também nesta semana, o
Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) criado
no ano passado para elaborar o Plano de Administração
e Gestão do Parque Nacional Monte Roraima,
que tem seus pouco mais de 117 mil hectares superpostos
à terra indígena, protocolou no ICMBio
uma minuta de proposta. O documento ainda está
sob análise. "Não há impedimento
algum ao processo de gestão compartilhada.
O que teremos que fazer agora (governo e comunidade
indígena) é sentar e negociar, sem
superioridades, e compatibilizar conservação
ambiental com respeito à cultura indígena",
afirmou o presidente do Instituto, Rômulo
Mello.
Outra condição imposta
pelo Supremo é a de que "o Instituto
responderá pela administração
da área de unidade de conservação,
também afetada pela terra indígena,
com a participação das comunidades
indígenas da área, que deverão
ser ouvidas, levando em conta os usos, as tradições
e costumes dos indígenas, podendo, para tanto,
contar com a consultoria da Funai.
Para o presidente do Instituto,
ao tratar da autoridade do ICMBio, o Supremo determinou
que a autarquia respeite os costumes e tradições
indígenas. "Os extremistas tanto da
conservação quanto da questão
indígena terão que sentar e convergir
para o diálogo. Assim como nós, os
indígenas também terão que
se adequar à decisão do STF",
disse Mello.
Segundo o presidente, a própria
Lei 9.985/00, que trata do Sistema Nacional de Unidades
de Conservação (SNUC), já prevê
a gestão compartilhada das UCs com os diversos
segmentos da sociedade, principalmente as comunidades
tradicionais. "Não existe, a meu ver,
comunidade mais tradicional do que os índios
no processo histórico desse país",
destacou.
Em um outro item, o STF determina
que "o trânsito de visitantes e pesquisadores
não-índios deve ser admitido na área
afetada à unidade de conservação
nos horários e condições estipulados
pelo Instituto Chico Mendes".
Veja, a seguir, as 19 condições
estabelecidas para demarcação e ocupação
de terras indígenas:
1 O usufruto das riquezas do
solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras
indígenas pode ser relativizado sempre que
houver como dispõe o artigo 231 (parágrafo
6º, da Constituição Federal)
o relevante interesse público da União
na forma de Lei Complementar;
2 - O usufruto dos índios
não abrange o aproveitamento de recursos
hídricos e potenciais energéticos,
que dependerá sempre da autorização
do Congresso Nacional;
3 - O usufruto dos índios
não abrange a pesquisa e a lavra das riquezas
minerais, que dependerá sempre de autorização
do Congresso Nacional, assegurando aos índios
participação nos resultados da lavra,
na forma da lei.
4 O usufruto dos índios
não abrange a garimpagem nem a faiscação,
devendo se for o caso, ser obtida a permissão
da lavra garimpeira;
5 - O usufruto dos índios
não se sobrepõe ao interesse da Política
de Defesa Nacional. A instalação de
bases, unidades e postos militares e demais intervenções
militares, a expansão estratégica
da malha viária, a exploração
de alternativas energéticas de cunho estratégico
e o resguardo das riquezas de cunho estratégico
a critério dos órgãos competentes
(o Ministério da Defesa, o Conselho de Defesa
Nacional) serão implementados independentemente
de consulta a comunidades indígenas envolvidas
e à Funai;
6 A atuação das
Forças Armadas da Polícia Federal
na área indígena, no âmbito
de suas atribuições, fica garantida
e se dará independentemente de consulta a
comunidades indígenas envolvidas e à
Funai;
7 O usufruto dos índios
não impede a instalação pela
União Federal de equipamentos públicos,
redes de comunicação, estradas e vias
de transporte, além de construções
necessárias à prestação
de serviços públicos pela União,
especialmente os de saúde e de educação;
8 O usufruto dos índios
na área afetada por unidades de conservação
fica sob a responsabilidade imediata do Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;
9 - O Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade responderá
pela administração da área
de unidade de conservação, também
afetada pela terra indígena, com a participação
das comunidades indígenas da área,
que deverão ser ouvidas, levando em conta
os usos, as tradições e costumes dos
indígenas, podendo, para tanto, contar com
a consultoria da Funai;
10 - O trânsito de visitantes
e pesquisadores não-índios deve ser
admitido na área afetada à unidade
de conservação nos horários
e condições estipulados pelo Instituto
Chico Mendes;
11 Deve ser admitido o ingresso,
o trânsito, a permanência de não-índios
no restante da área da terra indígena,
observadas as condições estabelecidas
pela Funai;
12 O ingresso, trânsito
e a permanência de não-índios
não pode ser objeto de cobrança de
quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza
por parte das comunidades indígenas;
13 A cobrança de tarifas
ou quantias de qualquer natureza também não
poderá incidir ou ser exigida em troca da
utilização das estradas, equipamentos
públicos, linhas de transmissão de
energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações
colocadas a serviço do público tenham
sido excluídos expressamente da homologação
ou não;
14 - As terras indígenas
não poderão ser objeto de arrendamento
ou de qualquer ato ou negócio jurídico,
que restrinja o pleno exercício do usufruto
e da posse direta pela comunidade jurídica;
15 É vedada, nas terras
indígenas, qualquer pessoa estranha aos grupos
tribais ou comunidades indígenas a prática
da caça, pesca ou coleta de frutas, assim
como de atividade agropecuária extrativa;
16 - As terras sob ocupação
e posse dos grupos e comunidades indígenas,
o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das
utilidades existentes nas terras ocupadas, observado
o disposto no artigo 49, XVI, e 231, parágrafo
3º, da Constituição da República,
bem como a renda indígena, gozam de plena
imunidade tributária, não cabendo
a cobrança de quaisquer impostos taxas ou
contribuições sobre uns e outros;
17 É vedada a ampliação
da terra indígena já demarcada;
18 Os direitos dos índios
relacionados as suas terras são imprescritíveis
e estas são inalienáveis e indisponíveis.
19 É assegurada a efetiva
participação dos entes federativos
em todas as etapas do processo de demarcação.