Brasília (14/10/2009)
- Carla Bruni e Michelle Obama são conhecidas
internacionalmente por serem primeiras-damas de
dois dos países mais desenvolvidos do mundo.
Porém, mesmo quando seus maridos saírem
do poder e apenas os historiadores se lembrarem
de Nicolas Sarkozy ou Barack Obama, os nomes de
suas esposas permanecerão eternizados. No
seio da democracia, as duas viraram rainhas. E,
como toda rainha que se preza, receberam um título
pomposo: Laelia purpurata var. Flammea ‘Carla Bruni’
Hort. Ex L. C. Menezes cult. nov. (foto à
esquerda) e Laelia purpurata var. werkhaueserii-striata
‘Michelle Obama’ Hort. Ex L. C. Menezes cult. nov.
(foto à direita).
A pessoa capaz de transformar
primeiras-damas em rainhas é a engenheira
florestal/analista ambiental e chefe do Orquidário
Nacional do Ibama, Lou Menezes. Bióloga com
habilitação em botânica e ecologia,
é uma das mais respeitadas pesquisadoras
de orquídeas do mundo. “Laelia purpurata
é conhecida como a rainha (das orquídeas).
Em meus estudos para esse novo livro, resolvi homenagear
três mulheres rainhas”. A terceira homenageada
é Maria Tereza Jorge de Pádua, ex-presidente
do Ibama e da Funatura, além de ter sido
membro da WWF e da IUCN, com a flor Laelia purpurata
‘Maria Tereza’ Hort. ex L.C.Menezes cult. nov. (foto
à esquerda) Segundo Lou, Maria Tereza é
a pessoa diretamente responsável por, sozinha,
criar as maiores áreas de proteção
ambiental do mundo, tendo participação
decisiva no estabelecimento de 15 unidades de conservação
no Brasil, que cobrem mais de 15 milhões
de hectares. “Tereza é a verdadeira musa
da conservação no Brasil”, admira
a chefe do orquidário.
Livros
As fotos desses cultivares estão no novo
livro da pesquisadora, “Laelia purpurata, A Rainha”,
lançado em julho, em Santa Barbara/EUA, num
grande evento internacional para colecionadores,
pesquisadores e paisagistas, que ocorre todos os
anos. “Esta é a flor de Santa Catarina, único
estado brasileiro que tem uma orquídea como
símbolo”, explica Lou. Ela acrescenta que,
pela planta ser reconhecida mundialmente por sua
beleza e perfume, o nome extrapola a espécie
e é usado como marketing da indústria,
sendo colocado em vários produtos, como perfumes
e sapatos.
Lou Menezes já lançou
outros seis livros e tem previstos mais dois para
o ano que vem: um sobre Cattleya walkeriana, orquídea
do Brasil Central “extremamente procurada e enaltecida
no exterior, principalmente nos países asiáticos”
e outro com o nome de Orquídeas de Brasília,
para comemorar os 50 anos da capital do país.
Segundo ela, foram os livros que tornaram-na conhecida
no mundo. O primeiro foi sobre Cattleya labiata,
espécie do nordeste brasileiro. “Esta orquídea
é muito importante porque deu origem, no
exterior, ao hibridismo com plantas de flores grandes
e cores diversas. Mas as pessoas no Brasil durante
muito tempo não souberam o valor de sua importância
no contexto mundial das orquídeas”, informa.
A pesquisadora estuda orquídeas em seus diferentes
gêneros, especialmente as do Brasil. “Meu
objetivo é divulgar e preservar as orquídeas
brasileiras por meio de livros”, revela.
Orquidário e trabalho
O local principal onde realiza suas pesquisas é
o Orquidário Nacional do Ibama, que surgiu
em 1984 e era apenas uma tenda. Ao longo desses
anos, a estrutura ganhou corpo e uma bela arquitetura
em madeira, tela e vidro. Atualmente, existe, no
centro, uma coleção de mais de dois
mil exemplares, inclusive de plantas raras ou extintas
na natureza. O orquidário é a infra-estrutura
do Projeto Orquídeas do Brasil, que abriga
as coleções, as quais vão aumentando
de acordo com as pesquisas. Cada subprojeto tem
o objetivo de produzir um livro. “A cultura de um
povo se mede por seus livros e suas bibliotecas.
Povo sem livros e bibliotecas não tem memória.
Neste sentido, meus livros são um legado
às gerações futuras”, admite.
“Conheço doutores em orquídea
que vivem em estado compulsivo de intenção
de pesquisa e nada produzem. De que serve o conhecimento
para ficar guardado numa gaveta?”, critica. Além
das pesquisas, Lou é também colaboradora
na emissão de selos para os Correios do Brasil
com textos explicativos e fotos, profere palestras
no Brasil e no exterior como convidada de instituições,
e tem dois projetos especiais: propagação
artificial de espécies nativas e um programa
de educação ambiental nas escolas
voltado para crianças. “No meu entender,
o futuro do planeta depende das crianças
e das florestas”, informa.
Descobertas e homenagens
Natural de São Luís do Maranhão,
a analista ambiental veio para Brasília com
13 anos. Por causa de sua eloquência, muitos
da família esperavam que fosse jornalista
ou diplomata. “Herdei a verve comunicadora de meu
pai”, revela. No início da adolescência,
foi “picada” pelo fascínio pelas orquídeas.
Ela diz que durante a faculdade escreveu alguns
artigos, mas apenas quando entrou no antigo Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF,
um dos órgãos que originou o Ibama,
em 1982, é que começou a trabalhar
com as família orquidácea. “À
luz da ciência, descobri quase uma centena
de orquídeas novas, descritas e registradas
por mim nas revistas especializadas nacionais e
internacionais. Hoje em dia, qualquer livro de orquídeas
que sai no exterior cita meu nome como referência
nesse campo”, avalia.
Além das “rainhas”, ela
homenageou o ex-presidente russo Gorbachev, prof.
Lutzemberger, Pe. Gonzales (“botânico, culto
e meu professor de latim”) e o Ibama, entre outras
personalidades, batizando algumas de suas descobertas
com essas alcunhas. Mas também foi muito
homenageada por outros pesquisadores. “Há
várias orquídeas com meu nome”, conta.
A pesquisadora faz um alerta:
as orquídeas, de maneira geral, estão
ameaçadas de extinção, pois
os ambientes naturais têm sido depredados
para a construção de cidades e barragens,
áreas agrícolas e desmatamento para
comércio ilegal de madeiras. “Não
sabemos quantas desapareceram sem sequer serem classificadas,
muito menos estudadas. Sumiram”. Para a chefe do
orquidário, a preservação se
faz em progressão aritmética e a devastação
acontece em progressão geométrica.
Reconhecimento
Lou Menezes cresce nas adversidades. “Sou muito
crítica e atarefada. Mas, se não houvesse
barreiras, talvez não produzisse como tem
acontecido”, analisa. Ela recebeu vários
prêmios internacionais em reconhecimento ao
seu trabalho (Prêmio Conferência Mundial
de Orquídeas – Miami, 2007 – a melhor palestra;
Prêmio Excelência, pela revista Orchid
Digest, em 11000, a maior publicação
sobre orquídeas do mundo; e a Grande Medalha
de Reconhecimento pelo Meritoso Trabalho de Pesquisa
no Mundo das Orquídeas, em 2006, pelo Orchid
Digest Corporation, que só é dado
às pessoas que mais se destacam no mundo
– a única brasileira a receber). Além
disso, foi capa na Orchid Digest e apareceu em publicações
da Rússia, África do Sul, Alemanha,
Estados Unidos e de vários outros países.
Segundo ela, não existe
uma orquídea pela qual não seja apaixonada,
apesar de ter certa predileção pelas
do gênero Cattleya e Cyrtopodium. Mas a rainha
Laelia a fascina de maneira inexplicável.
Para muitos, Lou Menezes é
espécie rara e única, como várias
das orquídeas que estuda. “Sou emocionalmente
dependente das orquídeas”, revela. Mesmo
que ela afirme isso, há apenas uma palavra
para descrever essa relação: simbiose.
Luis Lopes - Ascom Ibama