Carlos Oliveira Brasília
(28/10/2009) – Os servidores do Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio), lotados no Parque Nacional da Chapada
Diamantina, na Bahia, estão
elaborando uma lista das espécies endêmicas
(só existem em determinado local) da flora
do parque. Nesse meticuloso trabalho, eles têm
se deparado com muitas novidades.
Até agora, segundo o chefe-substituto
da unidade, o analista ambiental Cezar Neubert Gonçalves,
foram descobertas mais de 10 espécies novas
de vegetais, além das 243 listadas no plano
de manejo. No entanto, como é comum nesse
tipo de pesquisa, os dados ainda precisam de revisão,
para se ter certeza científica de que as
plantas catalogadas são realmente novas.
A lista, ainda segundo Cesar,
é feita por meio de extensiva revisão
bibliográfica. Um vasto número de
trabalhos é consultado para se chegar a uma
conclusão final. “Em alguns casos, fazemos
trabalhos em campo na tentativa de confirmar ou
encontrar certas plantas”, acrescenta ele. Por isso,
nem sempre, os resultados são os esperados.
“Por exemplo, estivemos procurando
uma planta descrita na década de 80, chamada
Rayleya bahiensis (não tem nome popular),
encontrada numa região onde fica um assentamento
de trabalhadores rurais. Infelizmente não
encontramos mais a planta. Ela pode não estar
extinta, mas a população que serviu
de base para descrevê-la está lá.
Assim, a listagem pode nos dar referências
do que procurar e onde procurar. Tanto é
que vamos tentar localizar, num mapa, a distribuição
de cada espécie,” explica Gonçalves.
Apesar de algumas dificuldades,
certos achados do grupo de pesquisadores do parque
podem facilitar novos direcionamentos. “Descobrimos
que os endemismos na chapada se concentram em alguns
grupos que têm maior número de espécies,
principalmente em famílias botânicas
como Melastomataceae e Fabaceae, que representam,
juntas, 96 das 255 espécies. Também
há muitos outros grupos botânicos que
têm apenas uma ou duas espécies endêmicas,”
relata.
Na busca por padrões para
esses endemismos, conforme conta Cezar Gonçalves,
ficou claro que a maioria das espécies é
composta por ervas ou arbustos, com, relativamente,
poucas árvores, o que é um reflexo
do predomínio de formações
abertas no local. A Chapada Diamantina é
a parte norte da Cadeia do Espinhaço, que
começa em Minas Gerais. “As espécies
exclusivas dessa a região são consequência
do fato de que as montanhas locais criam microclimas
diferenciados das áreas ao redor. Assim,
elas acabam se tornando refúgios para as
espécies não adaptadas ao clima dominante.
Com o tempo, essas populações isoladas
acabam se diferenciado das demais similares e viram
novas espécies.”
Essa explicação
para a existência de espécies endêmicas
na chapada não é única. Outra
possibilidade, ressalta o chefe-substituto do parque,
é a de que alguns grupos estavam na região
há muito tempo, do ponto de vista geológico.
“Por isso, podem ter sido isolados quando as montanhas
ergueram-se em relação as áreas
vizinhas. Diferenciar numa única explicação
é muito difícil e demandará
muito estudo,” reitera.
A única certeza nesse caso,
afirma Cezar Gonçalves, é a de que
as listas de espécies endêmicas serão
sempre preliminares. Primeiro, especificamente em
relação aos dados já colhidos,
é preciso revisar alguns grupos, remover
nomes que não são botanicamente aceitos
por alguma razão. Segundo, a listagem, mesmo
ao final dos trabalhos, vai continuar sendo preliminar
porque em todos os anos novas espécies são
descobertas na região. “Neste ano, já
temos uma que foi acrescentada à lista, publicada
há uns dois meses, e nós mesmos temos
uma espécie nova de orquídea para
descrever no final do ano”, informou o analista.
Ainda segundo Cezar, à
medida que o conhecimento sobre as espécies
aumenta, algumas plantas que eram tidas como endêmicas
são descobertas em outros locais. “Uma sapucaia
encontrada nas matas de lençóis, agora
foi detectada em florestas na região próxima
ao recôncavo baiano. O que faremos é
tentar concluir a lista como uma síntese
do que se sabe hoje sobre plantas exclusivas da
Chapada Diamantina, sabendo que no ano que vem ela,
com certeza, estará defasada.”
Todo esse trabalho desenvolvido
pela equipe do Parque Nacional da Chapada Diamantina
faz parte de um esforço para melhor compreensão
da biodiversidade da região. “O próximo
passo é identificarmos a distribuição
das espécies, algo fundamental para a sua
preservação. Vale destacar que, das
255 espécies, 68 estão na lista oficial
das plantas ameaçadas de extinção
e muitas outras nem foram avaliadas durante a elaboração
da lista, até porque boa parte era desconhecida.
Há muito trabalho pela frente”, conclui César.
+ Mais
Nova orquídea ganha o nome
de Adamantina
Sandra Tavares Brasília
(28/10/2009) – A família Orchidaceae (orquídeas)
é uma das maiores do reino vegetal e é
conhecida por sua beleza e por suas relações
ecológicas incomuns. São importantes
em muitos ambientes, principalmente nas regiões
tropicais. Apesar disso, a maioria delas ainda tem
sua ecologia desconhecida.
No Parque Nacional da Chapada
Diamantina, unidade de conservação
do Instituto Chico Mendes localizada na Bahia, há
pelo menos 170 espécies de orquídeas
já listadas, mas com certeza muitas outras
ainda descobertas.
Pesquisa coordenada pelo chefe-substituto
do parque, o analista ambiental Cezar Neubert Gonçalves,
e apresentada no I Seminário de Iniciação
Científica do ICMBio, descreveu pela primeira
vez um fruto desta espécie, obtido por meio
de polinização artificial. A pesquisa
avaliou fatores que pudessem influenciar no sucesso
reprodutivo dessa espécie. A população
monitorada foi de sete indivíduos, todos
floridos em março deste ano.
O COMEÇO – Durante curso
promovido em 2004 em Feira de Santana (BA), o pesquisador
Cássio van den Berg, da Universidade Estadual
de Feira de Santana, mostrou ao analista ambiental
Cezar Gonçalves uma foto de uma planta da
Chapada. “Concluímos que aquela planta era
realmente diferente de tudo o que se conhecia na
época. E, por sorte, dois dias depois um
estudante da faculdade me mostrava fotos da Chapada
quando reconheci imagens desta planta em um local
acessível. Corremos para lá e a encontramos”,
destaca Gonçalves.
O que o analista ambiental descobriu
foi que a orquídea realmente não se
parecia com nenhuma outra planta conhecida. Foi
quando o pesquisador Cássio fez a análise
de DNA da planta e concluiu que ela era uma espécie
de fóssil vivo entre as plantas do seu grupo.
“A coisa mais parecida era uma espécie mexicana
e escrevemos um artigo descrevendo-a. Daí
demos a ela o nome de Adamantinia miltonioides,
o primeiro em referencia à Chapada Diamantina
e o segundo por ela se parecer com outra orquídea
chamada Miltonia”, frisa Gonçalves.
De lá para cá, os
pesquisadores monitoraram as plantas da população
que o estudante havia fotografado. Um projeto foi
montado, junto com o Centro Nacional de Pesquisa
e Conservação da Biodiversidade do
Cerrado e Caatinga (Cecat), para tentar entender
melhor esta planta: onde ela ocorre, qual a relacão
dela com o ambiente, quais as suas características.
“Foi dentro deste escopo que fizemos
o trabalho apresentado no seminário: testamos
polinizar várias flores para ver se obtínhamos
sementes. Das 14 tentativas que fizemos, apenas
uma deu certo. Como o fruto nunca tinha sido visto
antes e como não se sabia nada sobre a planta,
fizemos o painel apresentado no seminário”,
diz César.
O projeto ganhou apoio do Cecat/ICMBio
para o período de 2009/2010. Além
desta espécie, aborda outra orquídea
que só ocorre na Chapada Diamantina, chamada
Thelychista ghillanyi.
Em expedição promovida
dia 23 de setembro pela equipe de pesquisadores
do parque, o grupo teve a sorte de encontrar mais
uma população de Adamantinia. “Com
isto, o número total de plantas conhecidas
desta espécie passou de 11 para 34, todas
dentro do parque. A localização exata
destas plantas é mantida em segredo para
evitar que coletores as arranquem – o que pode levar
esta rara espécie à extinção,
desaparecendo para sempre”, comemora Gonçalves.
Ascom/ICMBio