Elmano Augusto - Brasília
(11/02/2010) – O Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade (ICMBio) realiza, com o apoio
de um órgão
similar do governo norte-americano, o mais completo
mapeamento genético do peixe-boi marinho
(Trichechus manatus) no Brasil.
Denominado “Avaliação
da diversidade genética populacional e estratégias
conservacionistas para o peixe-boi marinho no Brasil”,
o estudo é executado pelo Centro de Mamíferos
Aquáticos (CMA), em parceria com o Laboratório
de Análises Genéticas do Sirenian
Project, da United States Geological Survey (órgão
que cuida da biodiversidade nos EUA), em Gainesville,
na Flórida.
A pesquisa, que conta ainda com
o apoio da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
e da Universidade da Flórida, se junta a
um projeto maior que visa traçar o mapa genômico
do peixe-boi marinho no mundo. Iniciativas idênticas
já foram levados a cabo nos EUA, México,
Belize e Guianas – países que, junto com
o Brasil, registram a ocorrência desse animal,
um dos mais ameaçados do planeta. No litoral
brasileiro, há apenas 500.
LINHAGEM – O mapeamento genético
permitirá ações de manejo capazes
de, em alguns anos, fazer surgir no Brasil uma linhagem
de peixes-bois marinhos geneticamente melhorados,
mais resistentes a doenças, intempéries,
poluição, intoxicações
e, principalmente, aos efeitos das mudanças
climáticas – uma ameça que paira sobre
a biodiversidade do planeta.
O mapeamento proporciona o levantamento
de dados que só a análise genética
pode oferecer, como a existência de sub-populações
de peixe-boi marinho e a ocorrência de híbridos
(filhotes de espécies distintas) entre peixe-boi
marinho e amazônico. Pelo menos um híbrido,
já foi identificado pelos pesquisadores brasileiros.
De posse desses dados, o CMA vai
definir estratégias de conservação
do peixe-boi marinho no Brasil. Entre elas, uma
melhor distribuição geográfica
da variabilidade genética em toda a área
de ocorrência do animal, que vai do litoral
do Amapá ao de Alagoas, e o estabelecimento
de normas e procedimentos para reintrodução
dos peixes-bois reabilitados a fim de que haja um
melhoramento genético da espécie.
“Ao constatar, por exemplo, que
em determinado local há uma subpopulação
de peixes-bois marinhos com baixa variabilidade
genética, poderemos fazer reintroduções
de animais com perfil genético diferente,
aumentando a variabilidade e diminuindo a probabilidade
de endocruzamento (cruzamento entre animais parentes),
o que pode ocasionar perdas genéticas e comprometer
a vida e a saúde dos animais e a conservação
da espécie”, diz a doutoranda em Oceanografia
e chefe do CMA, Fábia Luna, coordenadora-geral
da pesquisa.
AMOSTRAS – Segundo Fábia,
o projeto já colheu no Brasil mais de 50
amostras de tecidos e de sangue de peixes-bois resgatados
vivos ou mortos no litoral entre o Ceará
e Alagoas e de animais reintroduzidos ou pertencentes
ao plantel mantido nos oceanários do CMA/ICMBio
pelo País. No momento, a coleta é
feita no litoral entre o Pará e o Maranhão.
Após a coleta, o material
é processado no Laboratório de Mamíferos
Aquáticos do CMA, em Itamaracá (PE),
onde é feita a extração da
papa leucocitária (núcleo) da célula
através de centrifugação. O
núcleo segue para análise nos EUA
e o restante do material fica conservado no banco
genômico do CMA a uma temperatura de 20º
C abaixo de zero.
No final do ano passado, Fábia
esteve na sede do laboratório do Sirenia
Project, na Flórida (EUA), para realizar
a extração do DNA das amostras retiradas
dos animais em cativeiro nas bases do CMA e definir
as próximas solturas, bem como as áreas
e locais de destinação desses animais.
Segundo ela, o projeto adota a
análise genética por meio de microssatélites,
investigando o DNA do núcleo das células.
Esse tipo de análise foi escolhido por ser
mais preciso que os outros.
“É uma ferramenta relativamente
nova que permite fazer inferências sobre a
biologia, comportamento, evolução
e história de vida da espécie em nível
de populações. É importante
para se constatar a variabilidade genética
e como ela está estruturada para verificar
se existem diferentes sub-populações
de peixes-bois e analisar o nível de fluxo
gênico entre elas”, diz Fábia, ao ressaltar
que nunca foi realizado estudo tão vasto
como esse no Brasil.