Washington, DC, 29 de abril de
2010 — Os líderes mundiais não conseguiram
cumprir os compromissos assumidos em 2002 para reduzir
a taxa global de perda de biodiversidade até
2010 e, ao contrário do prometido, negligenciaram
o declínio alarmante da riqueza natural
no planeta. Essas constatações integram
um novo estudo publicado hoje na revista científica
Science, que constitui a primeira avaliação
independente e mais robusta sobre o status do cumprimento
das metas traçadas na Convenção
sobre Diversidade Biológica (CDB) . Os resultados
do estudo serão considerados também
na Global Biodiversity Outlook 3, publicação
oficial da CDB, que será lançada no
dia 10 de maio em Nairobi, no Quênia, quando
representantes de governos do mundo inteiro irão
discutir novas metas e propostas sobre como lidar
com a crise da conservação da biodiversidade.
Por meio da compilação
de mais de 30 indicadores – que mensuram diferentes
aspectos da biodiversidade, incluindo mudanças
nas populações das espécies
e nas categorias de ameaça de extinção,
extensão de seus habitats, cobertura de áreas
protegidas etc – o estudo não encontrou evidência
de redução significativa na taxa de
declínio de perda da biodiversidade e constatou
que as pressões sobre esta continuam a aumentar.
O estudo fornece evidências que comprovam
que as metas para 2010 não foram atingidas.
Os indicadores foram desenvolvidos e sintetizados
por meio da Parceria de Indicadores da Biodiversidade
2010, resultado da colaboração de
mais de 40 organizações internacionais
para o desenvolvimento de indicadores de biodiversidade
global e recursos de ponta para informação
sobre a biodiversidade global.
“Nossa análise mostra que
os governos falharam no cumprimento dos compromissos
assumidos em 2002”, diz o principal autor do estudo,
Stuart Butchart, cientista do Centro de Monitoramento
da Conservação Mundial do Programa
do Meio Ambiente da ONU e da ONG BirdLife International.
“A velocidade da perda da biodiversidade é
a mais rápida já evidenciada e há
pouco progresso na redução das pressões
sobre as espécies, habitats e ecossistemas”,
completa. Segundo Butchart, apesar de algumas nações
terem colocado em prática políticas
para diminuir a perda da biodiversidade, os resultados
comprovam que essas políticas têm sido
inadequadas e que a lacuna entre as pressões
sobre a biodiversidade e as respostas para sua mitigação
está cada vez maior.
Para ele, os dados demonstram
que 2010 não será o ano no qual a
diminuição da perda da biodiversidade
será alcançada. “No entanto, este
ano precisa ser o ano em que nós começamos
a levar esse assunto a sério e tomamos atitudes
para cuidar da biodiversidade ainda existente no
planeta”, afirma. Na avaliação de
Matt Foster, Diretor da ONG Conservação
Internacional, a exorbitante perda da biodiversidade
já atinge todos nós, mas principalmente
aqueles que já são mais vulneráveis
e dependentes da natureza para a obtenção
de água, de alimentos e de remédios.
“Os líderes mundiais, que se reunirão
em outubro deste ano para a COP-10 em Nagoya, no
Japão, durante a Convenção
de Diversidade Biológica, terão que
ser mais ambiciosos para impedir a perda da biodiversidade,
pois nossa sobrevivência depende disso”, esclarece.
O cientista chefe do Programa
do Meio Ambiente das Nações Unidas,
Joseph Alcamo, informa que, desde 1970 as populações
de fauna sofreram 30% de redução,
a área de mangues e gramas marinhas foi reduzida
em 20% e a cobertura de corais vivos em 40%. “Essas
perdas são insustentáveis uma vez
que a conservação da biodiversidade
é chave para o bem-estar humano e para o
desenvolvimento sustentável. E isso é
reconhecido nos Objetivos do Milênio da ONU”.
Avanços - O estudo reconhece
que há resultados importantes em níveis
local e nacional no combate à perda da biodiversidade,
como a delimitação de várias
áreas protegidas (como, por exemplo, o Parque
Nacional do Juruena, em Mato Grosso, com 20.000
km²), a recuperação de algumas
espéciesameaçadas (como é o
caso do o Bisão europeu), e a prevenção
da extinção de outras (pernilongo
de costas negras da Nova Zelândia).
Segundo Paulo Gustavo Prado, Diretor
de Política Ambiental da CI-Brasil, o país
avançou bastante na criação
de novas unidades de conservação,
embora ainda faltem esforços substanciais
em sua consolidação e em seu uso como
unidade de pesquisa. “Infelizmente, o arcabouço
jurídico ainda é muito confuso e frustrante
no que se refere aos usos da biodiversidade brasileira.
É preciso avançar rapidamente no detalhamento
e na implementação dos mecanismos
para o cumprimento efetivo dos acordos internacionais
de cooperaração técnico-científica
de forma a conferir maior visibilidade à
importância social da biodiversidade”, aponta.
Apesar desses sucessos encorajadores,
os esforços para combater a perda da biodiversidade
precisam ser substancialmente incrementados e o
investimento no estabelecimento de indicadores e
em um monitoramento efetivo da biodiversidade global
é essencial para o rastreamento e a melhoria
das estratégias de ação e a
eficácia dos resultados.
De acordo com a diretora do programa
Amazônia da CI-Brasil, Patrícia Baião,
o país irá à reunião
de Nagoya reforçando a necessidade de uma
plataforma político-científica robusta
que promova a tradução de novas descobertas
no campo da ciência em ações
concretas e claras, nos diferentes níveis,
e com agilidade e eficiência. “Além
disso, o Brasil levará à COP-10 a
proposição de critérios socioambientais
que devam ser considerados em quaisquer compras
efetuadas pelos governos, visando assim promover
cadeias produtivas mais sustentáveis. Sabemos
que as transações de compras do setor
público representam até 1/3 da economia
de países em desenvolvimento, que são
também onde teremos maiores chances para
reverter o atual quadro de declínio de espécies”,
completa.
“As preocupações
com a biodiversidade devem ser integradas em todos
os setores do governo e dos negócios, e o
valor econômico da biodiversidade precisa
ser considerado adequadamente nos processos de tomada
de decisão. Só então conseguiremos
solucionar o problema", alerta Ahmed Djoghlaf,
secretário-executivo da Convenção
sobre Diversidade Biológica.
A íntegra do artigo Global
Biodiversity: Indicators of Recent Declines está
disponível na Conservação Internacional
mediante solicitação.
Os co-autores do estudo representam
as seguintes instituições: United
Nations Environment Programme, World Conservation
Monitoring Centre, BirdLife International, Institute
of Zoology (Zoological Society of London), Statistics
Netherlands, The University of North Carolina, IUCN,
Conservação Internacional, United
Nations Environment Programme, Global Environment
Monitoring System, IUCN Species Survival Commission,
Food and Agriculture Organization of the United
Nations, Secretariat of the Ramsar Convention on
Wetlands, European Commission Joint Research Centre,
Center for Applied Biodiversity Science (CI), Global
Footprint Network, University of Virginia, ISPRA,
Royal Society for the Protection of Birds, European
Bird Census Council, University of Queensland, University
of Cambridge, National Center for Atmospheric Research,
WWF International, Centre for Invasion Biology and
Cape Research Centre (South African National Parks),
UNESCO, TRAFFIC International, University of British
Columbia, National Centre for Biological Sciences
(Tata Institute of Fundamental Research), The Nature
Conservancy, USGS Patuxent Wildlife Research Center,
American Bird Conservancy, Stellenbosch University,
University of Bath, e the Al Ain Wildlife Park &
Resort.
Sobre a Conservação
Internacional
Tendo como base os alicerces sólidos da ciência,
as parcerias e as demonstrações em
campo, a Conservação Internacional
possibilita que as sociedades cuidem da natureza
– nossa biodiversidade global -, de forma responsável
e sustentável, para o bem-estar da humanidade.
Com sede em Washington, DC, a CI atua em mais de
40 países em quatro continentes. Para obter
mais informações acesse www.conservacao.org
e www.conservation.org
+ Mais
Política ambiental gera
preocupação para ONGs
Em nota divulgada ontem, as 16
instituições signatárias justificam
os motivos pelos quais consideram como inaceitável
o projeto de crescimento econômico fomentado
pelo governo federal; leia nota abaixo
Brasília, DF, 30 de abril
de 2010 — As entidades signatárias manifestam
nesta nota sua forte preocupação com
a atual conjuntura da política ambiental
brasileira, agravada ainda mais com a situação
atual pela qual passam os servidores públicos
federais ambientais (MMA / Ibama / ICMBio / SFB),
cujas reivindicações merecem nosso
total apoio. O descaso do governo federal para com
as carreiras ambientais constitui a derradeira e
inequívoca evidência de que presenciamos
uma crise inaceitável na política
socioambiental brasileira, em pleno Ano Internacional
da Biodiversidade.
As evidências de que o projeto
de crescimento econômico fomentado pelo governo
federal ruma na contramão do desenvolvimento
sustentável são inúmeras e
graves.
Vejamos:
1) Até agora o executivo
federal não se posicionou de forma clara,
pública e firme contrário ao movimento
de flexibilização generalizada da
nossa legislação federal, sustentado
- em dezenas de audiências públicas
recentes - por representantes governistas da bancada
ruralista no Congresso Nacional. Dentre as proposições
em curso que visam desconstituir algumas das principais
garantias legais pós-Constituição
de 1988 destacamos:
I - a desfiguração
do Código Florestal com propostas de anistia
generalizada para consolidar o uso econômico
de desmatamentos ilegais em áreas protegidas
ou de risco (Reservas legais e áreas de preservação
permanente);
II - propostas para enfraquecer
o Zoneamento Ecológico-econômico como
instrumento de planejamento fundamental para promoção
da sustentabilidade, retirando do próprio
governo federal o controle sobre a sua qualidade
e consistência;
III – proposta para eliminar o
poder normativo do Conama, órgão de
primeira importância do Sisnama por garantir
a participação, legitimidade e transparência
no desenvolvimento de normas e parâmetros
técnicos ambientais;
IV – proposta para suprimir a
prerrogativa do executivo de criar unidades de conservação,
obrigando a sua homologação pelo legislativo.
2) A aprovação na
Câmara dos Deputados, em dezembro de 2009,
de dispositivo no Projeto de Lei Complementar (12/09)
que suprime o poder supletivo do órgão
ambiental federal para o exercício da fiscalização,
ou seja, de cobrir a eventual omissão dos
órgãos ambientais estaduais, comprometendo
de forma significativa o controle do desmatamento
e, consequentemente, o controle federal sobre o
cumprimento das metas de redução de
CO2 contidas na Política Nacional de Mudanças
Climáticas.
3) O não lançamento
até hoje, pela Casa Civil da presidência
da República, da revisão do Plano
Nacional de Prevenção e Controle dos
Desmatamentos na Amazônia, revisão
esta iniciada no primeiro semestre de 2008. Espera-se
que a atual revisão inclua as ações
relativas aos compromissos estendidos para o Cerrado,
parte integrante das metas do item anterior.
4) A defesa exaltada e publicitária
de um Programa de Aceleração do Crescimento
2 pautado fundamentalmente em obras de infraestrutura
altamente impactantes e despidas de avaliação
ambiental integrada e estratégica. O PAC,
em nenhuma de suas versões, contém
planejamento correlato que indique um fortalecimento
da gestão ambiental capaz de garantir sustentabilidade
aos seus objetivos.
5) A insistência na aprovação,
inclusive com pressão política exercida
sobre técnicos do órgão de
licenciamento ambiental federal e manifestações
autoritárias na mídia por parte de
representantes do TCU e da Abin contrárias
às organizações da sociedade
civil que questionam legitimamente no judiciário
obras de infraestrutura comprovadamente antieconômicas
e flagrantemente causadoras de graves impactos socioambientais,
como a UHE – Belo Monte, no Pará, e a rodovia
BR 319, no Amazonas, cortando o coração
da Amazônia.
6) O bloqueio na Casa Civil, em
atendimento à pressão do Ministério
de Minas e Energia, na criação de
novas áreas protegidas sob pretexto de desenvolver
estudos para prospecção de áreas
para mineração pondo em risco áreas
com alto potencial de conservação
de biodiversidade.
E por fim,
7) a recusa do executivo federal
em cumprir acordo firmado com servidores das carreiras
ambientais federais, induzindo com isso a evasão
de técnicos qualificados do setor ambiental
para outros órgãos públicos
melhor estruturados e remunerados, ou mesmo instituições
privadas, o que comprometerá sobremaneira
a já pouco estruturada política ambiental
brasileira.
O fortalecimento institucional
dos órgãos responsáveis pela
implementação das políticas
e legislação ambientais é vital,
e não acontecerá sem um tratamento
sério e responsável às legítimas
demandas dos seus servidores ambientais e da sociedade
civil.
O tratamento anti-isonômico
e de 2ª categoria conferido às carreiras
ambientais nos órgãos federais precisa
ser revisto e as demandas apresentadas merecem ser
atendidas no curtíssimo prazo.
A omissão do poder executivo
federal em relação ao flagrante ataque
à nossa legislação socioambiental
em curso no Congresso Nacional é também
inaceitável cabendo aos líderes políticos
do governo federal, em especial ao Presidente Lula,
defender a implementação da legislação
em vigor e o fortalecimento das instâncias
de gestão ambiental federal."
Em 28 de abril de 2010, assinam:
Grupo de Trabalho Amazônico
Rede de Ongs da Mata Atlântica
Apremavi – Associação de Preservação
do Meio Ambiente e da Vida
Amigos da Terra - Amazônia Brasileira
Associação de Defesa Ambiental - Kanindé
Conservação Internacional - CI
Fundação SOS Mata Atlântica
Gambá – Grupo Ambientalista da Bahia
Imaflora - Instituto de Manejo e Certificação
Florestal e Agrícola
Imazon – Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia
Inesc – Instituto de Estudos Socioeconômicos
IPAM - Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
ISA - Instituto Socioambiental
ICV - Instituto Centro de Vida
Vitae Civilis - Instituto para o Desenvolvimento,
Meio Ambiente e Paz
WWF – Brasil