Notícia - 5 mai 2010 -
Governo lança seus planos de expansão
energética. No horizonte, mais emissão
de CO2 e mais represas. Gerações eólica
e solar continuam abaixo do nosso potencial.
Ontem saiu finalmente a nova versão
do Plano Decenal de Expansão Energética,
PDE 2010-2019. O plano anual, que projeta o crescimento
da oferta energética para os próximos
dez anos, era prometido desde o começo do
ano. A última versão, lançada
no final de 2008, foi criticada pela grande participação
de termelétricas fósseis na geração
elétrica.
A expectativa, criada pelo governo,
era de que a grande quantidade de térmicas
fósseis prevista para entrar em operação
fosse eliminada desta atualização
do plano, o que não aconteceu. Desta vez
a expansão de termelétricas movidas
a combustíveis fósseis foi reduzida,
mas ainda mostra um crescimento incompatível
um país com tanto potencial de energia renovável.
A capacidade instalada, que era projetada em 14
mil MW no PDE de 2008, foi reavaliada para 10.700
MW, sendo que todas estas usinas seriam construídas
até 2014.
O crescimento das térmicas
a carvão, portanto, chega a 80% e de óleo
combustível a 170%. Como resultado disto,
as emissões do setor elétrico dobram
no período, de 26 para 51 milhões
de toneladas equivalentes de CO2 até o fim
da década, um movimento na contramão
dos esforços globais de redução
de gases de efeito estufa.
Após este período,
a grande parte do aumento da geração
virá da geração hidrelétrica
– teremos mais do que duas Belo Monte em capacidade
instalada de novas usinas de grande porte. A maioria
delas na Amazônia – colocando a região
sob risco de novos impactos ambientais e de aumentar
a pressão do desmatamento.
As outras renováveis receberam
um tratamento mais favorável em relação
ao plano de 2008, mas ainda modesto em relação
ao potencial nacional de exploração
destas fontes. O número de parques eólicos
deve crescer nos próximos dez anos, considerando
a construção de projetos do Proinfa
e do primeiro leilão de eólicas realizado
no ano passado. Mas o número final de 6 mil
MW assume que após o leilão de renováveis
marcado para este ano, teríamos apenas mais
uma licitação deste tipo durante todo
o resto da década, o que é muito pouco
diante do potencial eólico brasileiro e da
demanda do setor de realização de
um leilão por ano.
As usinas a biomassa passariam
de 5,4 para 8,5 mil MW, uma expansão maior
do que a apontada no plano anterior, mas novamente
aquém do potencial brasileiro de geração
de duas Itaipus apenas com a cogeração
da cana-de-açúcar, até o fim
da década. Sobre energia solar, absolutamente
nenhuma menção é feita ao potencial
de geração de painéis fotovoltaicos.
Na área nuclear, o plano
continua considerando a construção
da controversa usina de Angra 3, apesar de todos
os questionamentos em relação à
segurança da usina, dos custos subdimensionados
e da falta de solução para a estocagem
de resíduos radioativos, entre inúmeros
outros problemas.
Por fim, o crescimento da oferta
de energia ainda é projetado em 56% nos próximos
10 anos, valores exagerados para o aumento da carga
neste período, especialmente se considerarmos
que o ano de 2009 registrou uma redução
de consumo como reflexo da crise econômica.
O grande potencial de ações de eficiência
energética foi novamente negligenciado. A
participação destas ações
é restrita a apenas 3,2% de redução
do consumo destes próximos dez anos. De acordo
com o cenário [R]evolução Energética,
do Greenpeace, é possível conseguir
mais de 10% de redução de demanda
até 2020, considerando a aplicação
de medidas em todos os setores de consumo.
A todos os interessados em contribuir
com críticas e sugestões ao plano,
a consulta pública está aberta até
o dia 2 de junho. Os contatos para envio são
o e-mail pde2019@mme.gov.br ou o endereço:
"Ministério de Minas e Energia – MME,
Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Energético
– SPE, Esplanada dos Ministérios, Bloco U,
Sala 509, Brasília-DF, CEP 70.065-900.
+ Mais
Um rastro de contaminação
Notícia - 6 mai 2010 -
Exploração de urânio em Níger,
na África, expõe população
a níveis inaceitáveis de radiação.
Danos ambientais e humanos estão em relatório
recém lançado pelo Greenpeace.
A República do Níger,
na África Saheliana, tem um dos menores índices
de desenvolvimento humano do mundo. Seu território
é praticamente todo formado por deserto e
o país vive há anos num ciclo de pobreza
extrema, violência e instabilidade política.
Sua maior riqueza são suas jazidas de urânio.
Mas agora, graças a uma investigação
do Greenpeace, sabe-se que elas estão também
virando uma grande maldição. O recém-lançado
estudo Abandonados ao Pó – Legado Nuclear
nos Desertos de Níger, revela, além
da devastação provocada por anos de
devastação da exploração,
que há contaminação de humanos
por radiação muito além dos
níveis mundialmente aceitáveis.
O estudo é fruto de uma
parceria do Greenpeace com o laboratório
francês independente CRIIRAD e a ONG nigerina
ROTAB. Desde o fim de 2009, pesquisadores medem
níveis de radiação na água,
ar e no solo nas cidades próximas às
minas de urânio do país. Os dados reunidos
em relatório mostram que a população
de Níger respira, bebe e consome radiação
muito acima do recomendado.
Em 1971, presença do urânio
em Níger chamou a atenção da
AREVA, multinacional de origem francesa entre as
maiores do mundo em produção de energia
nuclear. Na época, a extração
foi anunciada como um esforço de resgate
de um país em miséria extrema. A verdade
é que o começo desta história
coincide com a insatisfação generalizada
contra a extração de urânio
e outras atividades devastadoras ligadas à
geração de energia nuclear em solo
europeu. Na África, a mineração
podia ser realizada sem burocracias e a baixíssimo
custo.
Para o solo, o ar, a água
e a população de Níger, os
custos, no entanto, foram altíssimos.
Nas cidades de Arlit e Akokan,
construídas em função das duas
grandes minas da AREVA, o cenário é
devastador. Imensas nuvens de poeira causadas pelo
detonar das minas chegam a tampar a visão.
Testes realizados nesta região concluíram
que quatro em cada cinco amostras de água
apresentaram níveis de contaminação
acima do recomendado pela Organização
Mundial de Saúde (OMS). O mesmo valeu para
os testes sobre a qualidade do ar. Uma hora de exposição
à radiação do local, diz o
estudo, extrapola a dose de contato recomendável
para um ano inteiro.
O resultado são índices
de doenças pulmonares duas vezes maiores
do que no resto do país, além de maior
incidência de defeitos congênitos e
casos de câncer, principalmente leucemia.
“O urânio tem tendência a se acumular
nos ossos, justamente onde fica a medula. É
lá que se desenvolve a leucemia. É
muito difícil para o corpo eliminar este
tipo de metal”, explica André Amaral, coordenador
da Campanha de Energia Nuclear do Greenpeace.
No Brasil, caso semelhante também
foi alvo de denúncia, primeiro do Greenpeace,
depois do próprio Ministério Público.
Após oito meses de investigação,
foi encontrado urânio acima dos limites estabelecidos
pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama)
e a OMS na água de dois poços da cidade
de Caetité, interior da Bahia. Os poços
estão dentro da área de influência
da estatal Indústrias Nucleares do Brasil
(INB), que faz a mineração e beneficiamento
do urânio na região.
“As minas de urânio pelo
mundo contabilizam problemas”, diz André
Amaral. “A extração é perigosa,
expõe a população a níveis
inaceitáveis de radiação e
é resultado de empresas e agências
reguladoras que agem de forma irresponsável
e leviana”, conclui.
Em Níger, a AREVA se declara
amiga do meio ambiente, apesar dos chocantes níveis
de contaminação comprovados. O Greenpeace
cobra um estudo independente conduzido pela empresa
e que, após comprovado o problema, empreenda-se
um trabalho de limpeza e descontaminação
do que ainda puder ser salvo.