Notícia - 19 mai
2010 - Convidando quem interessa, sem critério
claro, e sem abrir participação da
sociedade civil, reunião da CTNBio move trator
sobre o arroz brasileiro.
São Paulo, 19 de maio de
2010 - O circo foi montado e o espetáculo
da falta de transparência aconteceu. Após
14 meses na prateleira, a tentativa de derrubada
do veto ao arroz transgênico voltou à
pauta da Comissão Técnica Nacional
de Biossegurança (CTNBio). Em audiência
realizada na tarde de hoje em Brasília, a
comissão organizou uma mesa redonda para
debater a liberação do arroz transgênico
da Bayer, conhecido como LL.
A maioria dos membros da comissão
contrários à liberação
do transgênico questionou os convidados, em
especial o representante da Embrapa, o agrônomo
Ariano Martins. “Cadê a Embrapa contrária
ao arroz LL no ano passado?”, questionou o membro
da comissão e pesquisador da Esalq/USP, Paulo
Kageyama.
Kageyama se referiu ao posicionamento
do pesquisador da Embrapa Flávio Breseghello,
que se mostrou contrário ao arroz da Bayer
na audiência pública da CTNBio. Organizada
em março do ano passado, na audiência,
agricultores, empresários e cientistas disseram
não à liberação do arroz
transgênico.
Mesmo com a presença de
cinco convidados - quatro a favor da liberação
e apenas um contra - nenhuma das questões
mais relevantes foi respondida, entre elas como
evitar a contaminação das lavouras,
a resistência das pragas e porque a Bayer
fez testes apenas no Rio Grande do Sul para liberar
para todo o Brasil.
Apesar do claro desequilíbrio
na mesa, nenhum dos três pesquisadores e dos
dois agricultores convidados a debater o assunto
conseguiu provar que o arroz transgênico não
irá contaminar os campos, fato dado como
certo por todos.
"Ficou claro, pela maneira
como a CTNBio conduziu a reunião, que a comissão
quer enterrar as vozes ouvidas na audiência
pública do ano passado", afirmou Iran
Magno, coordenador da Campanha de Transgênicos
do Greenpeace. "A comissão carimbadora
maluca está com o carimbo do arroz pronto",
concluiu Magno.
Por estarem em desacordo com uma
mesa que surgiu para calar a voz da sociedade civil
e tentar entuchar arroz transgênico goela
abaixo dos produtores e consumidores brasileiros,
23 organizações assinam uma nota de
repúdio à manobra da CTNBio.
Nota de repúdio à
manobra da CTNBio
Nós, organizações
não governamentais e organizações
do campo abaixo assinadas, manifestamos nosso repúdio
à manobra da Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança - CTNBio, de realizar
uma mesa redonda sobre o arroz transgênico,
evento LL62, da Bayer Cropscience. Tal proposta
tem como único objetivo invalidar a audiência
pública, com participação da
sociedade civil, realizada no dia 17 de março
de 2009, e privar a sociedade do debate acerca do
arroz transgênico.
No processo de liberação
do arroz, durante a referida audiência pública,
foram tecidas críticas pela Embrapa Arroz
e Feijão (apoiada pela presidência
da Embrapa), por produtores representados pela Federarroz
(que representa mais da metade da produção
nacional de arroz), e por organizações
da sociedade civil. Entendemos que o resultado final
dos posicionamentos ouvidos pela CTNBio foi conclusivo
em apontar que o arroz LL62 da Bayer Cropscience
não trará nenhuma vantagem para o
produtor, para o consumidor, para a agricultura
brasileira ou para o meio ambiente.
Dessa forma, a realização
de uma mesa redonda durante uma reunião de
rotina da CTNBio, com convites a expositores estabelecidos
sem critério, onde a sociedade civil não
tem voz, e acima de tudo excluindo aqueles que levantaram
questionamentos acerca do evento debatido, deixa
claro o seu propósito de enterrar todos os
questionamentos feitos em audiência pública.
Tais questionamentos, por esse motivo, só
deveriam ser respondidos em nova audiência
pública, não em reunião fechada.
Por fim, a CTNBio tem invariavelmente
mantido uma postura contrária à transparência
e ao debate do assunto, tendo sido obrigada no passado
pelo Poder Judiciário a fazer reuniões
abertas e audiências públicas. Também
tem negado acesso aos processos de liberação
comercial, dentre eles o processo do arroz Liberty
Link LL62, mantendo a sociedade afastada do debate.
Assinam a nota:
AAO – Associação
de Agricultura Orgânica
ABA – Associação Brasileira de Agroecologia
AEPAC - Associação Estadual dos Pequenos
Agricultores Catarinenses
AMAR – Associação de Defesa do Meio
Ambiente de Araucária
ANAC – Associação Nacional de Agricultura
Camponesa
ANPA - Associação Nacional dos Pequenos
Agricultores
AOPA - Associação para o Desenvolvimento
da Agroecologia
APROMAC – Associação de Proteção
do Meio Ambiente/PR
ARPA – Associação Riograndense de
Pequenos Agricultores
AS-PTA
Centro Ecológico/Ipê-RS
CPC – Cooperativa Mista de Comercialização
Camponesa
Greenpeace
IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
Luiz Carlos Pinheiro Machado – Ex-Presidente da
Embrapa, Professor Catedrático aposentado
da UFRGS e UFSC
MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores
MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
Rede Ecovida de Agroecologia
Rodolfo Geiser, Engenheiro Agrônomo
Serra Acima - Associação de Cultura
e Educação Ambiental
Terra de Direitos – Organização de
Direitos Humanos
TOXISPHERA – Associação de Saúde
Ambiental
Via Campesina
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Frankenstein no campo
Notícia - 4 mai 2010 -
Companheiro inseparável da round up-ready,
semente de soja transgênica da Monsanto, o
inseticida Roundup anda criando super-ervas daninhas
nos Estados Unidos.
A agricultura transgênica,
30 anos após a sua introdução,
finalmente criou seu monstro, cortesia do Roundup,
um herbicida poderoso usado em plantações
de soja transgênica que vem transformando
as ervas daninhas que deveria eliminar em verdadeiras
super-ervas, resistentes aos inseticidas disponíveis
no mercado. Qual a consequência disso? Aumentar
a dose de agrotóxicos em nossas lavouras.
Não dando certo, a saída é
investir na criação de novo inseticida,
ainda mais mortífero. E se ele não
funcionar? Aí, o mundo maravilhoso da transgênia
vai virar pesadelo.
“Estamos de volta há vinte
anos” relata fazendeiro americano em reportagem
do jornal The New York Times. Obrigado a dobrar
a quantidade de herbicidas altamente tóxicos
e retornar para métodos antigos para conter
as ervas cada dia mais fortes e predatórias,
o produtor vê seus custos aumentarem. Para
o consumidor sobram alimentos mais tóxicos
a um preço mais alto.
O herbicida Roundup é anterior
à introdução dos transgênicos,
mas foi com o surgimento da semente de soja da Monsanto
apelidada de Roundup Ready – aquela que já
vem pronta para receber banhos do produto, que ele
se tornou popular em lavouras. Propaganda maciça
e bons preços atraíram o homem do
campo em direção ao agrotóxico
da Monsanto e hoje o Roundup, também chamado
pelo seu nome científico glifosato, é
um produtos altamente popular.
“Em toda espécie de erva
daninha temos indivíduos geneticamente resistentes
e outros suscetíveis ao efeito dos herbicidas.
O uso intensivo de um produto mata todos os que
forem suscetíveis e, a longo prazo, deixa
apenas as plantas resistentes. Elas se disseminam
e tornando-se cada dia mais fortes”, diz Dionízio
Grazziero, engenheiro-agrônomo e pesquisador
da Embrapa.
Grazziero explica que, graças
a este tipo de desequilíbrio, torna-se necessário
adicionar outros tipos de herbicida no coquetel
das sementes: “Quanto mais produto, mais caro fico
para o produtor, e, claro, maior o impacto ambiental.
A cultura transgênica trouxe o aumento do
uso intensivo e muitas vezes inadequado de Roundup”,
complementa.
Em recente palestra no Brasil,
o pesquisador Michael Hansen, especialista em impactos
da biotecnologia na agricultura e cientista sênior
da Consumers Union, maior organização
de consumidores dos Estados Unidos, trouxe alerta
da comunidade científica para outros possíveis
efeitos do Roundup. As suspeitas são de que
o produto possa levar à reprodução
indevida de células e o aumento nas taxas
de abortos espontâneos e de má formação
fetal.
Esta história tem cheiro
de coisa antiga. Mais especificamente, de um problema
que perdurou no Brasil por mais de 25 anos. Este
foi o tempo que levamos para proibir o uso de outro
grande vilão, o DDT, inseticida banido graças
aos efeitos criminosos na saúde humana e
ambiental. Há 50 anos, quando ele surgiu,
espalhou-se a crenca que o mundo iria se livrar
dos insetos. Do mesmo modo que a transgênia,
um dia, prometeu uma lavoura sem ervas daninhas.
Promessas de vidro, que os insetos e a super erva
que começou a crescer em solo americano se
encarregharam de quebrar.
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Soja Plus: desmatamento continua
Notícia - 10 mai 2010 -
Anunciado com louros, novo programa de certificação
da soja chega acompanhado de incertezas. ONGs soltam
nota esclarecendo a diferença para a moratória
No último mês, associações
de produtores e da indústria de soja tiraram
da manga um novo programa de certificação
do produto. Batizada de Soja Plus, a novidade chega
às vésperas de a Moratória
da Soja completar seus quatro anos, e põe
na mesa outros critérios para uma produção
sustentável. Na lista de critérios,
o desmatamento zero – foco central da moratória
– ficou de fora.
Em nota, as organizações
da sociedade civil integrantes do Grupo de Trabalho
da Moratória da Soja (GTS) – entre elas o
Greenpeace – esclarecem as diferenças entre
essas iniciativas. Abaixo, uma entrevista com Raquel
Carvalho, da Campanha Amazônia do Greenpeace.
Qual a diferença entre
a Moratória da Soja e o Programa Soja Plus?
A moratória é um acordo da indústria
de não aquisição de soja oriunda
de áreas desmatadas a partir de julho de
2006. É um compromisso assinado para segurar
a expansão da soja e, consequentemente, do
desmatamento. Já o Soja Plus é um
programa de certificação.
Do ponto de vista operacional,
a principal diferença é que o Soja
Plus não incorpora o conceito do desmatamento
zero, que é o grande trunfo da moratória.
Ela é um acordo provisório, não
é solução definitiva. É
uma forma de dar um “respiro” enquanto a Amazônia
não tiver mecanismos de governança
que permitam um controle da expansão da soja
sobre áreas de floresta.
Enquanto isso, o Soja Plus trabalha
com a legalidade. Os critérios para certificação
atendem à legislação: se a
produção está dentro da lei,
a soja é certificada.
Isso já não é
suficiente?
Hoje, ainda não. Se a legislação
fosse suficiente, não teríamos os
problemas de desmatamento no campo. Apesar de a
legislação ser boa, ainda não
temos a governança necessária para
que ela seja cumprida. Por conta disso, na moratória,
a principal demanda em termos de governança
é o registro das propriedades no Cadastro
Rural Ambiental (CAR).
Por quê?
Quando o proprietário registra a fazenda,
os limites dessa propriedade passam a constar de
um sistema de acesso público. A partir dos
dados de desmatamento divulgados anualmente, temos
como cruzá-los com esses registros e identificar
os responsáveis pelo desmatamento. Sem o
cadastro, não temos como responsabilizar
nenhum proprietário, pois não dá
para saber os limites da propriedade.
Por que a moratória estipulou
como critério o desmatamento zero?
No mercado consumidor europeu a demanda por isso
é grande, já que o desmatamento da
Amazônia é o principal fator que transforma
o Brasil no quarto maior inimigo do clima do planeta.
A moratória existe por demanda de mercado.
Foi ele que pressionou as indústrias, avisando:
ou vocês adequam a produção
para que não haja mais desmatamento ou a
gente não adquire mais seu produto. O mercado
consumidor tem se tornado mais exigente no sentido
de saber a origem do produto e os impactos de sua
produção. A resposta da indústria
da soja mostra que o setor decidiu assumir sua responsabilidade
corporativa, e isso é ótimo, tanto
para o setor da soja quanto para os consumidores
preocupados com seu papel nas mudanças climáticas.
O conceito do desmatamento zero
já não é especifico de ONGs
ambientalistas. O próprio setor produtivo
hoje fala que é possível produzir
sem desmatar. Se os produtores afirmam isso, seria
esperado que um programa de certificação
conseguisse dar esse passo adiante, incorporando
o desmatamento zero como critério.
Quais os problemas no sistema
de certificação do Soja Plus?
Os pais do programa são a indústria
e os produtores de soja. Os critérios para
a certificação foram definidos por
eles e eles mesmos fariam a verificação
do cumprimento desses critérios.
Idealmente, os critérios
precisam ser construídos por atores de diversos
setores, e a certificação tem que
ser um processo independente. Tem que haver uma
certificadora de fora que analise o processo de
produção e atribua esse selo à
atividade. Tem que ter independência para
avaliar o que está sendo feito. O Soja Plus
acaba sendo uma programa autorregulatório,
pois tem a indústria e os produtores certificando
sua própria produção e comercialização.
Abaixo, a nota das organizações
sobre o Soja Plus:
As organizações
Greenpeace, WWF-Brasil, Conservação
Internacional, The Nature Conservancy, Imaflora,
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia,
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
de Santarém, que integram a câmara
da sociedade civil do Grupo de Trabalho da Moratória
da Soja (GTS) esclarecem, por meio desta nota, que
não participaram da elaboração
dos princípios e critérios adotados
para o Programa Soja Plus, iniciativa recentemente
lançada pela Abiove e outras associações
do setor produtivo.
O Programa Soja Plus não
inclui o conceito de desmatamento zero, princípio
central da Moratória da Soja. Tampouco obedece
a um princípio basilar a sistemas de certificação
voluntários: transparência e participação
de diferentes setores da sociedade na definição
de seus conceitos. Numa região com reconhecida
carência de governança como a Amazônia,
iniciativas unilaterais, por mais bem intencionadas
que sejam, não têm a credibilidade
necessária para ajudar o consumidor – corporativo
ou privado – a tomar decisões de compra que
o protejam de envolvimento com a destruição
da floresta.
O GTS é formado por empresas
e ONGs para contribuir na implementação
da Moratória da Soja, acordo assumido pela
indústria de não aquisição
da soja produzida em áreas desmatadas no
bioma Amazônia após 2006. A Moratória,
como o próprio termo define, é uma
solução provisória e foi adotada
pelas empresas integrantes da Abiove e Anec até
que condições adequadas de governança
estejam estabelecidas. Dentre essas condições,
conforme expresso no termo de compromisso assinado
em julho de 2006, está um “sistema efetivo
de mapeamento e monitoramento do Bioma Amazônico”.
Esse sistema “efetivo” exige não
apenas o monitoramento da cobertura vegetal para
identificar novos desmatamentos relacionados à
expansão da soja (o que vem sendo feito desde
2007). Exige também o cadastramento das propriedades
rurais, com mapas georreferenciados, para que eventuais
fazendas que desrespeitam a Moratória possam
ser excluídas da lista de fornecedores.
Em que pese o esforço da
Moratória, a grande maioria das fazendas
de soja ainda não estão mapeadas e
registradas oficialmente. Tampouco existe um sistema
transparente de rastreabilidade das compras diretas
ou via mercado spot.
Logo, a Moratória ainda
é necessária. Bem como são
necessários o cadastro e o mapeamento das
fazendas de soja, instrumentos de governança
urgentes para assegurar a não expansão
da soja na Amazônia e também no Cerrado,
onde mais de 50% da cobertura original já
foi desmatada.