Notícia - 18 jun 2010
Um novo Código Florestal para o Brasil está
em debate em uma comissão especial da Câmara
e deve ser votado no dia 05 de julho, segunda-feira.
O texto, elaborado por uma bancada ruralista e apresentado
pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB/SP), acaba com
a função social
das propriedades rurais, concede anistia sem critério
para quem já desmatou e coloca na mão
do contribuinte a obrigação de pagar
pela conservação ambiental.
Não satisfeito, dá
livre aval para que o fazendeiro faça o que
bem lhe der na telha nas terras que ocupa, reduz
dramaticamente a Reserva Legal, limita ainda mais
as APP´s e transfere para mão dos estados
– e até mesmo municípios – o poder
de ditar regras locais, ao sabor de interesses políticos,
sobre tudo que diz respeito a nossas florestas.
“O projeto do Aldo Rebelo é
o Código do desmatamento. Ele dá mil
oportunidades para a derrubada de florestas, e de
quebra entrega para Estados e Municípios
um poder perigoso, que pode ser usado como barganha
política, e que de forma alguma vai garantir
a proteção do meio ambiente”, diz
Rafael Cruz, Coordenador da Campanha de Código
Florestal.
O fim da função
social
A ferida é aberta logo
no primeiro artigo da nossa legislação
florestal, que desde 1934 garante que as florestas
brasileiras são bens de interesse público.
O Código Florestal que temos hoje, através
de seus mecanismos legais, exige que toda propriedade
rural, que usa um pedaço de terra do país,
cumpra uma função social: a de produzir
e ainda assim preservar a riqueza comum a todos
– as florestas.
Para garantir este direito, o Código estipula
Áreas de Preservação Permanente
(APP), como margens de rios, topos de morros e encostas
que têm função de estabilizar
o solo e guardar fontes de água e as Reservas
Legais, pedaços de mata nativa que devem
ser resguardados dentro das áreas produtivas
para a proteção da biodiversidade.
Além disso, garante a punição
para crimes ambientais e as compensações
para as florestas que já foram desmatadas.
Retrocedendo em 76 anos de evolução
da nossa legislação ambiental, o novo
texto passa a motosserra com força total
sobre as Áreas de Preservação
Permanente. Deixam de contabilizar como APP as várzeas
(áreas alagadiças às margens
de rios que protegem contra assoreamentos), a vegetação
de restinga e os topos de morro. Já as encostas
ficam na mão da bondade, rara, dos órgãos
de pesquisa agropecuária estaduais, que definirão
se valem, ou não, serem resguardadas.
Para diminuir ainda mais sua obrigação
de preservar, o proprietário poderá
computar toda a extensão de APP de sua fazenda
como Reserva Legal. Basta fazer um simples cadastro
no órgão estadual com a solicitação.
A regra vale até para aqueles que já
estão dentro do Zoneamento Econômico
Ecológico (ZEE), programa estadual que coordena
a recuperação de Reserva Legal desmatada
e que, de antemão, já reduz os percentuais
da mata a ser reflorestada.
Não satisfeitos com o pouco
que sobra de área preservada, a proposta
estipula ainda mudança no cálculo
de APP em margem de rio. Ao invés de, como
hoje, ser feito com base na época em que
o leito de água está cheio, será
feito com base na seca. Para o Pantanal, por exemplo,
que chega a ter 90% de sua área alagada reduzida
na época da seca, a perda de extensão
de APP será drástica.
Propostas irreais
Quando o assunto é Reserva
Legal, a nova proposta claramente não condiz
com a realidade brasileira. Ela define que áreas
menores de quatro módulos fiscais (cerca
de 400 hectares no caso da Amazônia) ficam
isentas de preservar mata nativa, sem levar em conta
que pouquíssimas propriedades rurais no Brasil
têm registro (na Amazônia, por exemplo,
o número de propriedades registradas beira
os 5%), ou que os sistemas de registro não
funcionam.
No Pará, por exemplo, estudos
recentes mostram que, somadas as áreas rurais
registradas chegam a três vezes a área
do Estado. Nada impede que propriedades sejam fracionadas
em cartório, transformando uma fazenda de
quatro mil hectares em dez de 400, cada uma em nome
de um dono diferente.
Sem nenhuma justificativa, o texto
transforma parte do bioma Cerrado em Formação
Campestre, o que diminui a obrigatoriedade de preservação
de 35% para 20%. Depois, declara que também
estão isentos de preservar Reserva Legal
os empreendimentos de interesse público,
embora não especifique o que, nem quem definirá
que empreendimentos entram neste critério.
Propriedades para fim de assentamento fundiário,
por exemplo, estão liberadas de preservação
independente de sua extensão.
O pouco que sobra para reposição
florestal também fica a perigo. O texto abre
brecha para a invasão de espécies
exóticas em lugar de nativas, sem necessidade
de comprovação de que aquelas tragam
qualquer benefício para a região.
O tipo de plantio que vale como recuperação
de área desmatada também fica em aberto.
Na prática, qualquer coisa pode valer, desde
árvores, até cana-de-açúcar
e soja.
Em mãos erradas
De olho em tornar a lei ambiental
mais flexível e permissiva, a proposta ruralista
transfere para a mão dos estados – e até
mesmo municípios, a palavra final sobre nossas
florestas. Do ponto de vista técnico, as
regras federais são gerais e cabe aos Estados
serem mais restritivos.
A proposta segue o caminho oposto,
sujeitando a legislação ambiental
do país aos interesses políticos locais.
Floresta não conhece divisão administrativa
de Estado. Além disso, falta capacidade operacional
de fiscalização e análise técnica
nas instâncias estaduais, por isso mesmo a
tarefa cabe ao governo federal. Ainda assim, pelo
novo texto, passa aos estados a tarefa de decidir
sobre quem deve preservar, o quanto, onde e até
mesmo se deve preservar.
Para realizar a mágica
do vale tudo, os ruralistas criaram o Programa de
Regularização Ambiental (PRA), que
reúne, sob comando de cada estado, as normas
de adequação das propriedades rurais
à lei. É o Programa quem definirá,
por exemplo, em que áreas deverão
ser realizadas as compensações de
floresta desmatada, embora o texto não especifique
limites para estas compensações, que
podem ser feitas, basicamente, em qualquer lugar
à escolha do agricultor.
O PRA tem nas mãos também
o poder de conceder anistia total aos proprietários
rurais que infringirem a lei ambiental, como se
a perda da floresta fosse um problema do produtor,
não da sociedade. Tudo que foi desmatado
até julho de 2008, data da aprovação
da Lei de Crimes Ambientais, deixa de configurar
crime. Daí para frente, é o PRA que
decide se exime os proprietários de serem
punidos, pagarem multas, ou recuperarem as áreas
desmatadas.
Os estados têm cinco anos
para implementar o PRA, tempo que pode ser estendido
por mais cinco. Até lá, o agricultor
fica liberado para, ao seu critério, fazer
o que bem entender em sua terra. Caso o prazo do
PRA se estenda por mais de dez anos, os proprietários
devem - voluntariamente - se apresentar às
Secretarias Ambientais para regularizar suas pendências.
O liberou geral inclui até
os municípios. Pelo novo texto, eles podem
interferir, por exemplo, na definição
do que é uma propriedades rural dentro do
seu limite e transformá-la em um imóvel
urbano. Assim, sob decreto municipal, qualquer área
considerada como de interesse social para a população
também perde a obrigatoriedade de preservar
mata nativa.
“É uma proposta inaceitável.
Em tempos de crise climática batendo à
nossa porta, o que nos obriga a construir uma nova
economia no futuro próximo, o código
sugerido por Aldo Rebelo e a bancada ruralista é
algo fora de lugar, fora de contexto. Ou a sociedade
se mobiliza para brecar esse absurdo, ou o Brasil
vai se tornar o maior exemplo de retrocesso ambiental
no mundo de hoje”, concluiu Rafael Cruz.
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Saramago amava as florestas
Notícia - 18 jun 2010
Em 25 de outubro de 2005, José Saramago lançou
o primeiro livro impresso em papel e gráfica
com certificação FSC no Brasil, "As
Intermitências da Morte". O FSC, Conselho
Brasileiro de Manejo Florestal, tem o único
sistema de certificação independente
que adota padrões socioambientais internacionalmente
de manejo florestal.
Para o lançamento dessa
então nova obra, o escritor, primeiro de
língua portuguesa a receber o prêmio
Nobel de Literatura em 1998, pediu pessoalmente
a suas editoras em todo o mundo que seguissem normas
ambientalmente adequadas para produzí-la.
No mesmo dia, Saramago divulgou
seu apoio à campanha de proteção
da Amazônia do Greenpeace. O Greenpeace encoraja
a indústria editorial em diversos países
a deixar de usar papel cuja produção
acarrete a destruição das florestas
e a adotar práticas social e ambientalmente
adequadas na utilização de produtos
florestais, como o uso de papel reciclado ou certificado
pelo FSC.
A iniciativa de Saramago representou
um importante passo para o mercado editorial diminuir
o impacto no desmatamento, estimulado pela demanda
de papel para a produção do setor.
Sua morte representa uma perda para a literatura
e para as florestas.
José Saramago nasceu em
Portugal, em 1922, e tornou-se um dos mais importantes
escritores do mundo. Escreveu, entre outros, O Evangelho
Segundo Jesus Cristo, Memorial do Convento e Ensaio
sobre a Cegueira. Sempre preocupado com as causas
sociais, nos últimos anos contribuiu com
o movimento socioambiental.
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Parece suficiente, mas não
é
Notícia - 25 jun 2010
Nem selo de certificação, nem moratória
de desmatamento, garantem completa proteção
para as florestas nativas da Indonésia, derrubadas
para plantação de óleo de dendê.
Na Indonésia, governo cria
selo que certifica o óleo de dendê
sustentável depois de intensa campanha do
Greenpeace, mas Sinar Mas, empresa produtora do
óleo, ainda tem concessão para desmatamentos
da floresta tropical.
Recentemente, o Presidente Yudhoyono
proferiu a palavra certa – moratória – apesar
dela não ser completa, nem extensiva a toda
a área de floresta indonésia, lar
de orangotangos e importante reguladora de emissões
de CO2.
Mesmo com o sucesso da campanha
do Greenpeace que conseguiu que grandes como Nestlé
e Unilever cancelassem contratos com a Sinar Mas
e o com o estabelecimento da moratória, a
empresa ainda tem garantias de uso do solo para
plantação não só para
o dendê, como para produção
de celulose e papel.
O processo que definiu os critérios
do selo de certificação também
foi alvo de críticas. “Não houve participação
de nenhum acionista das empresas interessadas, ou
representante de negócios, na elaboração
deste selo. Os critérios devem ser transparentes,
ou o selo vai virar pura maquiagem”, diz Joko Arif,
da Campanha de Florestas da Ásia.
O Greenpeace cobra do governo
indonésio que a moratória de desmatamento
valha para todas as áreas, mesmo as de concessão
da Sinar Mas. “A Indonésia e a indústria
têm uma chance única de limpar a má
reputação do óleo de dendê
do país. O selo pode ser parte da solução,
mas o desmatamento precisa parar primeiro”, conclui
Arif.