16 Julho 2010
Por Nathalia Clark
Foram muitos anos de debate no Congresso Nacional
até a aprovação da lei do Sistema
Nacional de Unidades de Conservação
(SNUC). Neste domingo, 18 de julho, esse importante
instrumento para a proteção da biodiversidade
vai comemorar 10 anos e já contribuiu
bastante para a o gerenciamento e organização
das áreas naturais protegidas do país.
No entanto, as metas brasileiras para a Convenção
sobre Diversidade Biológica (CDB) não
foram atingidas por completo até o momento,
e especialistas questionam se o sistema ainda é
capaz de viabilizar os objetivos nacionais de conservação.
A consolidação do
SNUC busca a conservação da diversidade
biológica a longo prazo. Além de abarcar
todas as áreas de proteção
dos âmbitos federal, estadual e municipal,
dentro de uma mesma categoria, o que permite uma
gestão integrada, ele fortalece a relação
de complementaridade entre as unidades de conservação,
considerando suas diferenças particulares
e os distintos usos que se fazem de cada uma. Esta
forma de administração, baseada na
funcionalidade, é o que o caracteriza como
verdadeiro “sistema”, ou rede de áreas protegidas.
A lei do SNUC, aprovada em 2000,
estabelece as regras para a efetiva implementação
desse Sistema pelo governo. Ela introduziu modificações
importantes na política de criação
e gestão de unidades de conservação,
no sentido de assegurar uma maior e efetiva participação
da sociedade nesses processos, incluindo as populações
residentes dentro e fora das unidades. Neste sentido,
foi bastante relevante a criação e
oficialização dos conselhos deliberativos
e consultivos, para estabelecer e fortalecer esse
contato.
A partir da lei, o Poder Público
tem a obrigação de consultar previamente
a sociedade civil, com atenção especial
à população local, sobre toda
proposta de criação de unidade de
conservação. Essas modificações
demonstram que tal participação é
essencial para o sucesso a longo prazo da estratégia
de conservação. Além disso,
a lei estabelece multas e penalidades para os infratores
e reconhece reservas particulares oficialmente estabelecidas.
Para Cláudio Maretti, superintendente
de Conservação para Programas Regionais
do WWF-Brasil, a criação do SNUC beneficiou
consideravelmente a conservação da
natureza brasileira.
“O Sistema foi inovador à
época de sua criação e ainda
hoje o é. Alguns aspectos serão definidos
em legislação complementar, mas o
SNUC foi um grande avanço, que trouxe articulação
entre os estados e entre as categorias, além
de trazer diretrizes para gestão dessas categorias.
Ele atende à necessidade de mais recursos
para as unidades, e trouxe inovações
extremamente positivas, como, por exemplo, o aspecto
da compensação ambiental. A noção
de sistema que está por trás do SNUC
tem pouco paralelo no mundo e, se discutida na Convenção
sobre Diversidade Biológica da Organização
das Nações Unidas (CDB/ONU), pode
passar a ser implementada por outros países”,
afirmou.
Classificação das
unidades no Sistema
O SNUC define uma unidade de conservação
como “espaço territorial e seus recursos
ambientais, incluindo as águas jurisdicionais,
com características naturais relevantes,
legalmente instituído pelo Poder Público,
com objetivos de conservação e limites
definidos, sob regime especial de administração,
ao qual se aplicam garantias de proteção”.
Assim, as UCs são organizadas
em dois grandes grupos: Unidades de Proteção
Integral – com a finalidade de preservar a natureza,
sendo admitido apenas o uso indireto dos recursos
naturais, e por isso as regras e normas são
restritivas; e Unidades de Uso Sustentável
– concilia a conservação da natureza
com o uso sustentável de parte dos recursos
naturais.
Na opinião de Cláudio
Maretti, a noção de gestão
de sistema foi mal apropriada pelos especialistas
nestes 10 anos: “Como gerenciar o sistema deve ser
o debate principal. Deve-se associar nosso sistema
a metas brasileiras de conservação,
com submetas ligadas ao turismo, educação,
etc., mas que tenham instrumentos de gestão
integrada”.
Segundo ele, o SNUC trouxe o conceito
de trabalhar em conjunto, uma vez que cada unidade
protege uma parte de um determinado ecossistema,
e, por sua vez, os ecossistemas também são
interligados. “Um parque nacional não é
uma unidade isolada, ele faz parte de um mosaico
paisagístico, e faz parte de uma rede ecológica
que protege o funcionamento de um sistema ecológico”,
analisa.
Ele afirma ainda que “o sistema
é muito mais do que o conjunto de áreas
e o órgão que as gere. Cria-se uma
unidade de conservação, pois ela é
um ente ativo, inclusive na mudança de visão
da sociedade, ela é uma posição
dentro de um organograma de uma instituição.
E a falta de alianças e atividades positivas
locais é o que costuma dar espaço
para que reações negativas quanto
às UCs se espalhem. Uma unidade de conservação
da natureza que não tem apoio local não
sobrevive. Se não houver essa aceitação
e valorização pela sociedade local,
não há respeito à área”.
Um dos principais objetivos do
SNUC foi, portanto, implementar a noção
de que uma área não pode ser avaliada
de forma isolada, já que ela cumpre uma função
específica dentro do sistema. Um segundo
aspecto de mudança foi que, na lógica
antiga, as unidades eram criadas como se cada categoria
tivesse um objetivo em si, e não como se
elas se complementassem em um objetivo mesmo. Dessa
forma, outro importante objetivo foi trazer organicidade
às categorias entre si.
“O papel do SNUC foi integrar
todas as categorias de unidades de conservação
dentro de um mesmo sistema de gestão, e foi
isso que fez a diferença em relação
ao sistema antigo. Já existiam áreas
criadas, mas não uma só categoria.
A lei integrou a lógica da complementaridade
das diferentes unidades, criou, definiu e ampliou
áreas de proteção”, comenta
Maretti.
Eficácia questionável
da Lei
Segundo Renato Cunha, coordenador
da Rede de ONGs da Mata Atlântica e membro
do Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá),
a lei ajuda a preservar áreas com ecossistemas
importantes, que necessitam desse instrumento legal
de proteção. “Demorou para convencer
o governo da Bahia da importância unidades
no estado. Foram três anos de trabalho para
viabilizar as áreas criadas em 2010 e levou
quase um ano para termos anuência favorável.
Mas essas são propostas que precisamos incentivar”,
opinou.
De acordo com ele, a lei veio
organizar melhor o que já existia, o processo
de criação, implementação
e consolidação das unidades, “mas
ainda há muito que avançar no estabelecimento
efetivo do SNUC em termos federais, estaduais e
municipais”. Ele afirma que o Sistema ainda não
possui todas as instâncias funcionando e “ainda
não deu salto de qualidade na implementação
e manutenção das unidades já
existentes. Tampouco os estados estão organizados
para uma melhor manutenção e estudo
de novas unidades”.
O superintendente do WWF-Brasil
concorda com esta posição, para ele,
“os debates são sempre parciais, não
existe uma visão de sistema, mas é
muito positivo termos, por exemplo, um instituto
como o Chico Mendes”. Como pontos positivos trazidos
pelo SNUC ele destaca o crescimento de conjuntos
de áreas protegidas, “foi extremamente significativo,
tanto que entre 2003 e 2009 o Brasil foi o país
que mais protegeu remanescentes em áreas
terrestres”, afirmou.
As melhorias necessárias
mais citadas pelo especialista foram as questões
orçamentárias e de recursos humanos.
Segundo Maretti, o aumento do orçamento não
acompanhou em correspondência o crescimento
das áreas protegidas. No entanto, “o SNUC
pode ter pecado por não ter uma visão
mais avançada, moderna, de sistema, mas não
deixou nada a desejar em termos de gestão
de cada unidade”, ressaltou.
Saiba mais sobre as Unidades de
Conservação
Unidades de Conservação
São espaços territorais e seus ambientes,
incluindo as águas jurisdicionais, com características
naturais relevantes, legalmente instituídos
pelo Poder Público, com objetivos de conservação
e limites definidos, sob regimes especiais de adminsitração,
aos quais se aplicam garantias adequadas de proteção.
As Unidades de Conservação
são divididas em dois grupos:
Unidades de Conservação
de Proteção Integral
É permitido apenas o uso indireto dos seus
recursos naturais.
Unidades de Conservação
de Uso Sustentável
Há compatibilização da conservação
da natureza com uso sustentável de parcela
de seus recursos naturais.